Poemas de Luto
Navegar nas mesmas
águas onde Luis Brión
obteve a primeira vitória,
e contigo fazer história.
Ler por antecipação o quê
pode vir a nos ocorrer
onde as estrelas sempre
serão mais visíveis.
Por Los Frailes e por todo
o Mar do Caribe navegar
o quê há em nós é deste mar.
Para receber o teu amor
tenho preparado um refúgio
para nada vir nos dispersar.
Procissão a esmo
Vejo os seguidores e vou junto.
Não pergunto do que se trata.
Apenas sigo os passos.
A quem eu sigo?
E o que eu persigo
Nesta procissão a esmo?
Reflexões sobre o ocaso III
O que dirão os futuros vermes
Que hão de comer minha matéria?
O que dirão a respeito do que lhes espera?
Ficarão satisfeitos com tanta podridão?
Eu estou longe de ser imaculado.
Reflexões sobre o ocaso IV
O que me sobra
Ao fim da caminhada?
Um punhado de terra
E ser comida de bactérias.
Reflexões sobre o ocaso V
A sensação de chegar ao topo
É desanimadora.
Cheguei até aqui para nada?
Qual é a minha recompensa?
Eu não sou o vencedor?
Marcha fúnebre
Quem será o responsável
Pelo meu olhar acabrunhado?
Quem carregará
O fardo de puxar o gatilho?
Quem vai embalsamar
O meu corpo para a hora da partida?
Quem trará uma lágrima,
Ao menos uma, para o meu funeral?
Quem?
Eu, que guardei tantas dores,
Acumulei desilusões
E chorei tantos dissabores,
Agora sei rir sem motivo aparente.
Tudo que sofri acabou com apenas um toque.
Vi que toda névoa se dissipou
E agora tudo faz sentido.
Esse é o lema que vai ser guia. O principal oposto de felicidade não é tristeza, é agonia.
O caminho é a alforria. Melhor rosto molhado do que carne que ardia. E no alto da sua libertação, vão apontar em suas costas e urrar: pega-ladrão! Mas aprenda a ficção, porque o conto real é ser vilã para quem é vilão. Pele aberta roçando em fantasia. Melhor a busca do ponto do que a busca da cura. Veja a rua cheia que é vazia. O principal oposto da verdade é falta de postura.
(Vanessa Brunt)
Navegar com muita calma
pelas Pequenas Antilhas
para ter sempre precisão
por onde for e além dos dias.
Levar a vida com diversão
ir para Jack-A-Dan Island
mergulhar entre os corais
e quem sabe vir a te alcançar.
Com as minhas mãos e o olhar
nos teus olhos nas profundezas
de nós do nosso jeito de amar.
Assim há de ser para a nossa
hora de viver vir acontecer,
e não haverá nada para impedir.
O Silêncio Que Fala
Existe algo divino nas palavras silenciosas que habitam a fala do olhar.
Um idioma que não se aprende nos livros, mas no sentir.
É preciso que haja um acordo sutil entre quem vê e quem transmite,
um pacto invisível onde a verdade não pode se esconder.
Assim como moldamos nossa fala e afiamos nossa escrita,
deveríamos ter em mãos a cartilha da linguagem das almas: o olhar.
Olhar que acolhe, que desnuda, que grita em silêncio.
Há olhares que embalam, há os que ferem,
há os que são porto seguro, e os que são tempestade.
Alguns são abismos, outros, pontes.
Mas poucos sabem realmente escutar o que os olhos dizem.
Poucos compreendem que, antes da palavra,
foi o olhar que desenhou o primeiro poema do mundo.
Na desabitada Black Rock
em plena bela Granada levo
os meus pensamentos
para navegar em dia de Sol.
Nas Pequenas Antilhas
medito sobre as tuas manias
lindas de amar o amor
e te embalo com todo o louvor.
Não faço questão de explicação,
e assim me permito ser também
a tua tripulante da imaginação.
No embalo destas correntes
deixo a sedução do silêncio
de ocasião te trazer para perto.
Entre a Ilha Grande e a Ilha Frigate
a Rose Rock, Ilha da Pedra Rosa,
e aquela vontade de navegar adiante
em busca de não me deixar levar.
Tudo aquilo que me impede
de conviver bem nunca pertencerá,
porque o quê realmente
importa nem o tempo há de apagar.
Sei por onde vou por Granada
aqui nas Pequenas Antilhas
e estou a continuar determinada.
Conheço quem sou e não
permito que nada pare ou pese
para impedir para onde vou.
A MENINA DE PALMARES
Havia uma menina
cuja infância se foi na cheia
afogada nas águas pretas
e escuras do Rio Una
Daqueles tempos molhados
carrega consigo meia dúzia de fotos
e os espaçamentos da memória
cujas lacunas completam o inteirar de sua história
Na inocência dos seus olhos
brincava com a farra das águas
assistindo do alto da casa que lhe era abrigo
junto com outras crianças que como ela
aguardava o retorno desalojado dos pais
Era uma infância úmida devorada pela fome da boca
inundada de dilúvios e pelo banhar selvagem do rio
Não nasceu dos ossos das costelas
mas da mesma argila e do mesmo barro que Adão
Por sobre as águas das chuvas e do lado
boiavam entre bonecas e tiaras
as sobras flutuantes de suas lembranças
e do vestido submerso de sua primeira comunhão
apenas sobreviveu o terço presenteado de sua mãe
No leito em que hoje dorme convivo com suas noites
e me banho todo dia me enxaguando
nos afetos encharcados dos líquidos
de seus mais profundos amores
Minha filha não conheceu meus pais
mas eu conheci meu neto
Por isso faço versos
para que ele saiba
o que meus retratos sentiam por dentro
CORDÃO UMBILICAL
Quando nasci
cortaram-me o cordão umbilical,
só esqueceram de cortar
o fio que me deixou atado ao tempo
Perdi tempo perdendo tempo
em olhar o relógio com pressa de chegar
e nem me dei conta da paisagem
em que havia canteiros de jasmins
que não levarei comigo na memória
Ela é a cara da mãe,
que em tudo puxou de sua avó.
A avó, por sua vez,
é idêntica à mãe que um dia teve,
que vejo em apagados retratos,
e que, conforme antigamente contavam,
era cópia fiel da bisavó da mãe
da mulher que hoje amo,
e que é a cara esculpida da minha sogra.
Creio que me apaixonei
foi por uma mulher do começo do século XIX
Acordei,vesti os sonhos,
calcei os desejos,e sai de casa
fantasiado de realidade.
Quando voltei,
a roupa estava suada,
os sapatos estavam gastos,
deitei a fantasia de lado,
enxaguei os desejos manchados,
ensaboei meus sonhos molhados,
deitei-me na cama cansado,
encobri-me com o véu da noite
e esperei o corpo dormir
no acordar da minha alma
DOMINGOS
Ruas deitadas sobre o chão dos domingos
descançam do pisotear das multidões
que no atravessar corrido das esquinas
são indiferentes aos seus sentimentos
"Quem é Diogo Oliveira?
Ele é apenas um nômade escritor que brinca com as palavras, e veleja nos rascunhos de um espectro poeta, a procura de conduzir a imortalidade dos seus meros pensamentos através dos borrões de seus textos."