JWPapa

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Se é Carnaval


Os blocos estão nas ruas, meu amor...
Feito os sorrisos que acompanham as lágrimas
ou as lágrimas que acompanham os sorrisos.
Se as pessoas, felizes, sambam suas amarguras
é porque há muita felicidade em trânsito.
E se faço silêncio, é porque hoje é carnaval.
Por que, meu amor, é assim que tem de ser...
Amar com fantasia, fantasiando a perfeição.
Como se o carnaval jamais tivesse fim.
E se é carnaval,
vamos brincar até o dia amanhecer e a noite se cansar de nós.
Depois a gente vai pra casa e se ama como se não houvesse o fim.

As bibliotecas são os QG’s da supra-inteligência, onde estrategicamente são tramadas as guerras contra a ignorância e o não conhecimento.

“Livro”

[...] Vestiu-se com as suas asas de capa dura e repleto de novos conhecimentos saiu por aí, voando apressado pela imensidão daquele livro, página por página, até se sentir livre.

E se é Carnaval...
Primeiro a gente se ama,
como se não houvesse o fim.
Depois, a gente vê como fica
todo o resto.

Livros são asas... Voe!

E se faltar feijão, a gente come os livros...

"Não esquenta, por que se faltar feijão, a gente come os livros e se farta de conhecimento. Com o cérebro plástico e a mente cheia de possibilidades, serão tempos sombrios para os oportunistas de plantão que vivem de explorar a inocência e a ignorância do povo mais humilde. Vai ser cada vai se ferrar diferente, que vai dar gosto de ver a cara de espanto deles".

FOGO AMIGO

Da escuridão à quase luz
ao flagelo que não se encerra
da amarga palavra que reluz
tornando os teus corpos à terra.

Dos ataques kamicazes nas madrugadas
à velha guerra psicoemocional em voga
ao arsenal de agressões já retrógradas
às decepções desnecessárias que sempre evoca.

No ventre no vão mais profundo do útero
o último laço que os une e os reemenda
das mágoas trazidas à tona de modo abrupto
ao silêncio profundo que agora os desorienta.

Chega! Vai chegar mais dia menos dia
e o fim será logo ali na esquina dos lábios
se insistir por este caminho mãe e filho
o destino será cada um para o seu lado.

O perdão é um caminho extenso e sem volta
há que ser sincero e caloroso no abraço
pois a palavra que acolhe, ameniza e renova
também magoa, encerra e promove embaraço.

chega de autossabotagem e de agir como ilha
vida nova, casa nova e o passado sempre obscuro
não haverá no presente convívio em família
se daqui para frente não enxergarmos somente o futuro.

Vamos curtir o momento sem ataques ou fogo amigo
e colocar um sofá enorme no banheiro
vai ser deslumbrante dar a volta por cima e eu digo
independente se na cor rosa, branco, cinza ou vermelho.

<Resiliência> [...] Resiliência é a capacidade de sair de dentro de si mesmo naqueles momentos em que tudo parece estar muito ruim e encarar o mundo do lado de fora de cabeça erguida, olho no olho e com o maior sorriso que tiver em seu arsenal de sorrisos.

Balada dos desempregados

Nem vivo nem morto, em estado catártico.
O desemprego àquela altura os imobilizava completamente.
Muitos de seus planos já haviam sido abandonados. Deixados de lado. Simplesmente.

A frustração e o sentimento de impotência invadiam seus corpos, tomando-os de assalto por completo.
A insônia, a impaciência, a desesperança já eram uma constante em suas noites/dias.

A escuridão que lhes afagava a face, também os confundia um tanto.
Face a face com a versão mais cruel de suas vidas, via o número de iguais se multiplicarem dia a dia:
- Por todo o bairro, por toda a cidade, muitos desocupados, precarizados, sambando pra desenrascar o feijão com arroz e o leite das crianças antes de o sol se por. Dia após dia.

Muitos ainda não haviam apreendido o real tamanho do problema que, feito um iceberg tendo apenas uma pequena parte à mostra, despontava de forma aterradora.

Mais de quatorze milhões de desempregados... Greves múltiplas. Revolta nas ruas. Educação na UTI. Saúde em total colapso. A população da periferia sendo dizimada pela criminalidade e pelas drogas. E o país imobilizado. Desgraçados...
Há de haver punição pra tanta maldade, se não aqui na terra, em algum lugar há de haver uma mão pesada o suficiente pra parar essa gente que não sente empatia por qualquer um que seja.

O filhinho da minha vizinha morreu ontem de sarampo. SARAMPO. Pois é... Inacreditável não é mesmo?

O vizinho da rua de cima se enforcou. Não aguentou o acúmulo de tantas dívidas e por isso se matou.

Aqui no bairro não é novidade ver gente mendigando alguma coisa pra comer. A fome como todos pensavam também não foi erradicada. Por aqui parece epidemia. O alcoolismo quadruplicou. Os andarilhos e moradores de rua são inúmeros.

Pequenos e constantes furtos aos comerciantes são frequentemente relatados, repetidas vezes os poucos comerciantes que ainda resistem de pé são vítimas de espertalhões que não querem se enquadrar na dinâmica cruel de agora.

Pelas ruas do bairro tem gente vendendo de tudo:
- Ovos, picolé, cigarros do Paraguai, abacaxi, vassouras, panelas, produtos de limpeza, balas e doces, derivados de milho, amendoins torrados, pizza de dez...

A vida está difícil mesmo. Os preços aumentaram muito.
Nos supermercados as sacolas estão quase sempre vazias. Até o macarrão instantâneo e o milho para pipocas de micro-ondas foram reajustados em mais de trinta por cento em menos de uma semana.
O preço do botijão de gás é hoje praticamente um assalto a mão armada.

O que fazer com tanta desesperança senhor prefeito? O que fazer senhor governador? Senhores deputados? Senhores senadores? O que fazer senhor presidente? Acabou o milho, acabou a pipoca. É isso?

Assobiar


É evadir-se de dentro do peito enquanto emancipa-se da dor
e descer ao céu de pés descalços, feliz.
É também subir ao chão de nariz rijo, e de pé,
por-se arrogantemente como se nada tivesse ocorrido.
É pôr de sol de final de vida,
nos limites da tarde, no quase noite, a beira mar.
Assobiar é lamento, é sair de dentro, como se não tivesse opção.
Assobiar é saber-se sabido, e saber-se sonoro
é entender-se canário, cantante, livre.
É fugir pra longe de si, carregado pelo vento,
em pó de flor que poliniza os olhos,
e faz nascer uma plantação inteira de gotas de lágrimas.
Assobiar é cantar pra subir, e descer em seguida
pra o mais profundo íntimo de sua singularidade humana.

[...] As madrugadas são mesmo frias e sujas e estão quase sempre vestidas de silêncios e gritos horrorosos, prontos a nos assombrar já na próxima esquina.

A Revolução dorme na Periferia

Revolução nasceu na periferia, magrela e desdentada mal podia chorar. Não teve forças pra mamar pela primeira vez no peito murcho e já quase seco de sua (ama de leite), vizinha de parede, que havia parido alguns meses antes uma dupla de desajustados (como fez saber alguns anos depois a escola). Ela, Revolução, cresceu em uma rua de terra agitada no bairro mais violento da Zona Norte, onde até o medo tinha medo de estar. Lá não tinha nada (parques, praças, quadras, ruas asfaltadas, essas coisas), mas também não tinha nada de mais, era um lugar comum, feito qualquer um, feito outro lugar qualquer. Era lugar onde se podia encontrar a mais variada gente, onde a alegria vivia cercando as pessoas e a vida pulsava em uma intensidade diferente.
De fato, lá tudo era mais intenso! Os sorrisos, o choro, o cheiro de frango frito, a catinga da cachaça no hálito seco e duro dos bêbados quase mortos caídos na calçada de qualquer jeito e o cheiro da erva, da pedra e da dor que ecoava da tristeza dos olhos da mãe resoluta, sem saber o que fazer diante do excesso que a intensidade do lugar propiciava. Lá democracia era na (b) fala de quem pudesse se impor e, o silêncio, a primeira lição aprendida já ao nascer. Lá buraco era buraco mesmo, fundo, bem fundo! E cavava-se até não ter mais como continuar e quando o buraco já estava mudo, criando impossibilidade de se continuar, cavava-se ainda um pouco mais até o fundo escondido abaixo do fundo que existia no buraco, antes desse se tornar cova. O que não era incomum!
De Revolução só se sabe os sonhos que contava baixinho ao pé dos ouvidos da professora, única pessoa que ela confiou até hoje. Uma senhorinha bem velha, com hábitos estranhos e vestes (alternativas), que contava com orgulho ter pegado em arma nos tempos de escola, durante o período da ditadura militar, onde se reunia com suas colegas durante a noite dentro de uma manilha abandonada na Rua Um (primeira rua a ser pavimentada no bairro), e lá tramavam subversivamente contra os desmandos do governo golpista. Revolução lembra-se dos limões que chupava pra matar a fome e do nó nas tripas que sentia sem poder gritar, lembrava-se dos amigos e amigas que morreram mudos e também dos que conseguiram a liberdade, ainda com pouca idade, na mão de algum salafrário abusador. Revolução reconhecia naquela senhorinha a sua única saída, se espelhava nela e em sua filosofia de vida; a Educação tanto falada pela professora tornou-se seu hino da mudança, sua única esperança de evoluir, já que tudo ali parecia fadado a murchar. As manchas brancas e a pele áspera de Revolução eram dos vermes e das lombrigas adquiridas no contato com a água podre que corria sob sua casa. Revolução cresceu faminta, lambendo os beiços enquanto assistia o frango rodar na ilha de assar exposta no passeio da padaria de seu bairro, onde aprendeu desde muito cedo a se virar. Aos treze anos, Revolução se perguntava por quem todos ali morriam? E perguntava-se também, porque morriam tantos ali todos os dias? Revolução era feliz, apesar de tudo! Talvez procurasse algo, talvez não soubesse ainda o quê, tateando sempre no escuro era mesmo difícil de saber.
Revolução já dava sinais de cansaço e andava meio sonolenta nas aulas, já não se importava com as revoltas nas ruas, nem se revoltava com as incursões da polícia na favela, nem com a iminência da morte de seus amigos subindo e descendo vidrado(s) feito soldados, nos becos e nas vielas, nem com o cheiro de pó e pólvora que impregnavam as suas narinas e oprimiam seus olhos. Revolução incrédula olhava pela janela e sem poder acreditar via a vida diferente. Mas não sabia explicar o que estava vendo ou sentindo! De repente, tudo que foi sempre torto parecia ter se endireitado, parecendo fazer algum sentido. Revolução sentia as juntas doerem e parecia ter os sentidos alterados, as pernas reclamavam o peso de seu corpo e os enjoos e náuseas acentuavam. Já sem paciência, Revolução curvou seu corpo franzino e em meio ao sangue que jorrava angustiante por entre as suas pernas juvenis, pariu gêmeos. Caída no chão da cozinha e sozinha no barraco, nem lamentar podia. E se lhe perguntassem quem era o pai... O que ela diria!
Os dois filhos de Revolução foram criados pela professora e cresceram e viveram até a vida adulta e, apesar da culpa, todos entenderam a importância da luta daquela mulher. Filhos (bem sucedidos) da Revolução nasceram do ventre estreito de sua genitora, mirrados, sem esperança e famintos, foram acolhidos pela professora; e apesar do karma em seus (DNA’s) cresceram argutos, espertos, astutos e hoje lutam pra que outros também possam revolucionar. Lutam para que outros vivam, para que outros não se calem, nem sejam silenciados. E se hoje vivem, é para servir de exemplo, ser espelho da Revolução que na periferia ocorreu... Preta, catadora de lixo e guerreira que nos pariu e morreu. Revolucionária do dia a dia que viveu e morreu um dia de cada vez, que cresceu ouvindo a professorinha dizendo que quem luta e não se cala, cala a fala de muitos e muda a forma que o mundo conforma quando distribui a sorte e desenforma a forma que o deus dos brancos escolheu. Cresceu ouvindo a professorinha dizendo que: - “Quando a periferia tomar consciência de sua importância para a sociedade verá, nesse dia, o desencadeamento da maior revolução da história do Brasil”. E de tanto ouvir a professora falar moveu seu mundo e mudou o rumo de tudo, revolucionando o rumo que a vida preestabeleceu, seguiu em frente orgulhosa enquanto o futuro moldava o presente de toda aquela gente que o passado estranhamente esqueceu. Hoje dorme na memória revolucionária da periferia que na história dos livros ninguém leu.

"Oração do perdão

Eu me perdoo e te perdoo verdadeiramente, sem mais nem menos, agora acalma o seu coração, fique em paz e seja feliz".

Borracho


Com as chaves nas mãos
Entrei pela porta da frente.

Não!
Entrei pela porta da frente depois de arrombá-la com os pés.

Não!
Meti o pé na porta e ninguém entrou na frente.

Não!
Entrei na ponta dos pés
Pela porta de trás
Depois de a porta da frente não abrir de jeito nenhum.

Malditas cervejas! Malditas chaves! Malditas portas!
E maldita parede, que não para de se mover.

Poesia maldita!


De dia é só tapinha nas costas, sorrisinhos e tal.
Durante toda a noite desrespeita-me.
É sempre tão agressiva quando estamos só!
Quando estou só, muda de face.

Transfigura-se em disformes anagramas, anárquica,
disfarça-se de anjo (durante todo o dia).
Só pra manter a velha farsa,
a velha covardia de sempre.

Trata-me como se fosse uma (sua) vadia.
Maldita! Tomara que vire (pó) e (sia).
Tomara que se perca em sua maldade e
sem cor, versos, nem rima, padeça.

Um dia ainda te enquadro na lei, na lei da Maria da...
Poesia...Tem pena de mim, né! Maldita! Maldito.
Mal dito foi o poeta que inventou essa prisão um dia.
Maldita prisão de lápis (caneta) e papel, mal se respira.

[...] Todo mundo precisa de alguém.
Eu preciso de alguém que precisa de alguém que precisa de mim...
Mas isso não precisa ser um toma lá dá cá! Pode ser natural.
Sem ninguém ter de se machucar.
A vida é curta demais para sermos arrogantes.
Quando se vê já passou, perdemos, e ai já não adianta de nada.
Podemos sempre recomeçar, é claro, mas as lágrimas demoram a cicatrizar e recomeços podem ser um grande martírio para alguns.

<Bocetinha> Bem no meio da conversa
sacou de um dos bolsos da calça uma dessas bocetinhas
feitas de pau de sucupira e couro cingido em estórias e metáforas.

Com o movimento dos dedos polegar e indicador da mão direita
- articulados em pinça - apanhou um punhado de pó de imburana e infringiu-o às narinas, uma após a outra.

Os olhos oprimidos piscaram umas duas ou três vezes seguidas
reagindo às lágrimas que se formavam latentes
na medida em que o espirro se condensava corpo adentro
prestes a entrar em erupção.

E antes mesmo de a bocetinha voltar para o bolso da calça
viu-se um sorriso desses ainda bem tímidos, de meia boca apenas
tomar forma no rosto daquele senhorzinho e
assumir contornos que faziam lembrar Minas Gerais.

Nas mãos enrugadas e cheias de marcas do tempo,
aquela bocetinha, erguida à frente de todos
a nos ofertar um trago daquele pó mágico de cheiro extravagante
Oferta irrecusável a qualquer iniciado!

E assim foi... Experiência compartilhada com todos os presentes
o rito de desvirginalização surpreendente, impactante e viciante.
pra uns, o aceite inédito foi transformador
pra outros, a desconfiança típica de quem não sabe, mas quer saber.

Desde criança, aprende-se que aqui nas Minas Gerais
um trago de rapé de imburana na bocetinha
quase sempre antecede uma boa prosa repleta de sabedoria e nostalgia.

Aos iniciados nas coisas, nos troços e nos trem da terra
é possível inclusive,
ver revelada em uma simples caixinha de guardar rapé
todos os traços que caracterizam a identidade deste povo.
A tal mineiridade, já ouviu falar?

O Bem e o Mal

Vibre o bem, por que quando ele ressoa, não há mal capaz de frear o teu ímpeto. Vibre sempre na dimensão do bem, por que conheço intimamente o mal e todo o seu potencial destruidor e reconheço também a sua força sobre as pessoas quando e se elas abrem a guarda. A vibração positiva emanada de consciências positivas atrai para si o melhor das pessoas e quase sempre o melhor e o pior das pessoas está na energia com que as relações sociais são evidenciadas ao se desenrolarem. O mal está em nós tão intrinsecamente impregnado quanto o bem e compõe indistintamente apenas mais uma das tantas faces que nos torna bicho ou homem.

Máquina de moer jovens e afins


Tá! Eu me deixei levar. Mas o assédio era grande demais!
Aqui na periferia é tudo meio assim, páh!
Tá ligado? Difícil de segurar.
E sem perceber, Tum! Seu mundo cai.
Feito o mundo de tantos outros por aqui.

Aqui na quebrada é foda, ninguém goza dos direitos plenos
aqueles garantidos pela Constituição.
Os políticos quando aparecem, agem como se fizessem favor pra geral
parecem fingir que não existem problemas,
se pudessem, invisibilizariam-se. Mas não podem!
De vez em quando têm de mostrar a cara.

Aqui não tem praça, não tem quadra de futebol, não tem lazer pro jovem
não tem quase nada. Tem muita coisa; ciladas e tal.
E agora, é esse cada um por si de todos os dias
essa agonia de caminhar pelo bairro observando 360 graus
sendo observado, como se presa fosse. Aviso: - Fácil a caçada não será.

Posso garantir que haverá resistência, luta e sangue também terá.
Talvez, amanhã, até corpos encontrem pelas sarjetas. Garanto:
- Não terão pouco mais de uns verões e algumas primaveras.
Dados estatísticos de uma realidade cruel, números
que, infelizmente, incrementarão a próxima campanha de um político qualquer.

Canção à Inoportuna

Morte e Vida se encontram
em trechos convergentes de uma mesma história,
eu te amo e te odeio vida,
eu te amo e te odeio morte.
Com sorte é a paz que encontrarás
nas lembranças que nos acalentam a alma.
Há de haver esperança
nessa trama que se desvela a vida,
enquanto vagueia a mente perdida,
sopra sombrio o vento que nos conforma a sorte.
Um adeus aos entes queridos que se foram,
que se vão de forma inesperada todos os dias.
As vezes de forma trágica, morna e ou inoportuna ( uma paixão não correspondida, uma vida cheia do mais absurdo vazio, uma queda da própria altura...).
Há de haver luz que robustença as nossas memórias,
há de haver conforto
nessas tão insuportáveis horas.
Eu te odeio e te amo vida,
eu te odeio e te amo morte,
e apesar de tanta ira em teus olhos,
aguardo-te ansioso inoportuna sorte.
Na derradeira hora venha me buscar cerimoniosa e, não se atrase.
Também não precisa acelerar demais!
Quero ouvir-te chegando lentamente,
passo a passo pisando o chão duro que me servirá de leito na noite mais escura.
Mas vá com calma!
Por que a minha alma está encomendada ao universo e o meu corpo já nem é lá grande coisa.

A Fórmula da eterna beleza


Adolescente em sua maioria é excesso, barulho, inquietação!
Não se recorta ou faz-se um corte etário capaz de dar conta
de definir plenamente essa faixa da população,
ou que permita enquadrá-la em teorias que expliquem
ou que tentem explicar porque não se adequam a este mundo,
provocando nele (ao agir) tamanha desacomodação.
A itinerância dos extremos e a extensão das desmedidas
são suas características mais óbvias. Não como rótulo.
Mas como algo intrínseco à sua condição de ser jovem,
quase uma dimensão de suas configurações biológicas.
Sem exceção. Basta olhar!

Mapeiem-se os genes da beleza, do belo e do sublime
e os descobrirão, de certo, em uma sequência de filamentos de (DNA)
de um(a) jovem, provavelmente, entre quinze e dezoito anos.

É impressionante perceber, ao observar-se, o quão belos(as) estão todos(as) os(as) jovens nessa faixa etária
independentemente de cor, raça, etnia, sexo, compleição física.
Basta observar com um pouco mais de atenção e perceberá...
O brilho nos olhos, a vivacidade e a gana em seu agir (des)medido.
Também, a vibração dos sentidos aguçados
ao explorar as múltiplas possibilidades desse mundo.
Desse, porque podem haver outros mundos. Duvida?
Então postule como oposição esta afirmativa a um adolescente
e verá surgir em suas argumentações, tantos mundos,
quanto jamais imaginou existir.
Provavelmente, a origem da pólvora e da turba,
vêm de estudos sobre as juventudes.

Quer descobrir o segredo da eterna beleza?
Então, (re) aprenda a ser jovem por todo o sempre,
independentemente de sua idade biológica,
pratique com frequência a inconformação.

Resiliência

Resiliência é a capacidade de sair de dentro de si mesmo naqueles momentos em que tudo parece estar muito ruim e encarar o mundo do lado de fora de cabeça erguida, olho no olho e com o maior sorriso que tiver em seu arsenal de sorrisos.

<Poema da Resistência>

Rasga o véu e o céu é infinito
veste a lua, da dor e do pranto
descortina a noite do breu interdito
resta aos olhos a surpresa e o encanto.

Despe a dor do peito em prantos (tantos)
rasga a pele e a carne é crua
brilha os olhos do prata desnudado
nua é a rua das verdades desveladas.

Negra é a cor que segreda a lua
e as vestes do corpo nu (ébano)
que se veste de silêncios calados
negra é a cor que silencia a chibata
negros são os olhos dos sonhos roubados.

Com os punhos sempre cerrados
a resistência é mote da realeza
a negra (o) lua persiste resiliente
enquanto a noite dá sinais de fraqueza.

Todas as bombas do mundo

Todas as bombas do mundo caíram hoje...
Caíram sobre a cabeça dos reis; sobre a cabeça dos tolos;
caíram bombas e explodiram morteiros,
inundaram o quintal da minha casa de chumbo e de pólvora.
Ninguém sobreviveu ao ataque químico e à ofensiva com gás letal.

Hoje o dia inteiro não se ouviu outra coisa na vizinhança
a não ser as explosões horrorosas
e os chiliques das granadas de mão
e das bombas de toda ordem
caindo nas casas das famílias durante as refeições.

Os aviões lançavam dezenas, centenas, milhares de torpedos...
Olhando para o céu eu via as ogivas nuas caindo e criando asas,
com a visão ofuscada pela fumaça e pelo pó das construções em ruínas
ouvia o torpedo atingir a igreja, via o medo nos olhos das crianças
e o terror que frequentava minha alma quando a terra tremia.

Cada bomba que beijava o chão, cada grito, cada choro,
cada corpo soterrado nos escombros,
cada assombro noturno provocado pelo sobrevoar afoito dos aviões a jato,
cada fuga bem sucedida, nas sucessivas fugas necessárias para escapar,
cada dia a mais de sobrevida... Tudo importava.

Aquela foto que salvaram antes do teto desabar.
O objeto por mais insignificante que parecesse a todos.
Cada segundo no quintal regando as flores, sentado no terreiro,
olhando o cachorro enlouquecido, enlouquecendo
com o barulho dos morteiros.

Só de imaginar o sangue nas mãos das pessoas,
a garganta seca, a expressão de horror em suas faces,
só de imaginar a fome, o medo, o pânico que sentiam
me senti paralisado com tamanha crueldade.
Não há humanidade em territórios sitiados. A guerra é o fim.

Liga, desliga!

Aparentemente me consome a vida,
enquanto se aproxima o fim
em cerimoniosa sorte.
E ao que parece,
caminha de braços enlaçados com a loucura.

Quem é que diz ao cérebro chega
ou rouba dos sujeitos o sopro vital?
Quem é que dá a ordem de liga ou desliga
e sopra dos corpos já moribundos
os últimos resquícios existentes de vida?

Quem é que ensina ao cérebro
a hora de parar
antes que venha a vertigem, a ânsia e a tontura
ou libera a alma do corpo pra ocupar outros corpos
e ou viver outros carmas?

Ao que parece,
tripudia a vida da minha miserável sorte,
enquanto me consome e violenta,
afaga-me e acaricia descaradamente a face
que, fria e pálida, já nem disfarça tanto descontentamento.