Piloto de Avião
" O rio que passa geme suas curvas
pilotando o infortúnio
primitivo, levado pelas correntes
desce a encosta e chora um véu
na ânsia de ser nuvem,
morre na praia
não sem antes
fertilizar o solo por onde passou...
Se você não aproveitar um espaço, não é mais um piloto de corrida.
Ou você se compromete como um piloto de corridas profissional, que é desenhado para vencer corridas, ou você vai chegar em segundo, terceiro ou quinto. E eu não fui feito para chegar em terceiro, quarto ou quinto. Eu corro para vencer.
[Perguntado se admitia que Senna era o melhor piloto da F1]
Senna é o melhor piloto? Porra nenhuma! Melhor é o Prost, que é tetracampeão.
Com força chegou a drapejar, mas com destreza e técnica, pode-se observar a experiência e frieza do bom profissional do ar.
Lições da motopista: cabeça erguida e pernas firmes. Olhar para baixo atrapalha no equilíbrio e duas rodas não andam para trás.
Eu quero ter que caminhar para por as coisas no lugar
e no outro dia ja quero logo embaralhar,
vou chorar de saudade, me culpar das vontades,
me encher de paixão, vou querer emoção.
Vou me lembrar do passado e não ficar calado,
aprender a dizer não, mas tambem muito sim,
honrar minha bagagem e ter orgulho de mim.
Amanha caberá a mim concluir a mesma missão; Sorrir.
Vou me entregar mesmo, viver mesmo, ser feliz de verdade e sorrir ate quando eu não tiver dentes.
A MAIOR MISSÃO NA TERRA
Enquanto trabalho em minhas planilhas, lembro das suas pequenas unhas do pé que precisam ser cortadas.
Enquanto almoço rapidamente, penso se as professoras da escola integral insistem algumas vezes para você comer o brócolis, assim como eu faço lá em casa.
Na academia (que tento fazer no horário do meu almoço, entre uma reunião e outra), tento levantar um pouco mais de peso nos equipamentos. Meu corpo precisa estar inteiro e saudável para organizar a sua festa de 15 anos.
Olho o extrato bancário e vejo que já debitaram a parcela mensal do meu seguro de vida que fiz antes mesmo de você nascer. Mesmo em minha ausência, caso ocorra, quero lhe deixar algum conforto.
Sorrindo, engulo mais um sapo a seco e aguento agruras no trabalho pois preciso do salário ao final do mês para o seu nobre sustento.
Viajo para as minhas aulas do doutorado muitas vezes em lágrimas e com o coração apertado por uma noite a menos com você, mas com a certeza que será melhor para o seu futuro. E com a esperança de tê-la orgulhosa citando a mãe doutora.
Faço questão de percorrer algumas horas de trânsito por dia para levá-la e buscá-la do colégio, pois são horas em que me dedico só a você, mesmo desviando dos ciclistas e cachorros que cruzam o nosso caminho.
Aliás, no percurso até a sua escola, fico inventando uma nova brincadeira para interagirmos até chegarmos em nossa casa, na esperança que não pegue no sono e durma sem jantar.
Colei os seus desenhos ao lado da minha mesa do trabalho para eu lembrar que um dia duro faz todo sentido quando se tem um “pedacinho de gente” dizendo que te ama ao final da tarde.
Declaro com um sorriso escapando do rosto que aprendi a matar baratas, fazer omeletes, cantar no chuveiro, assistir desenhos animados e cuidar bem melhor da minha saúde depois que você nasceu.
Morri um pouquinho quando me pediu, pela primeira vez, para deixá-la no portão da escola e vê-la caminhar sozinha, e não deixá-la pessoalmente dentro da sua sala, aos cuidados da sua professora, como eu sempre fiz.
E falando de novo em morrer, quase morri de culpa quando vi uma cárie microscópica em seu dente do fundo. Eu me senti a pior mãe do mundo por isso. Fui derrotada, mesmo tentando cuidar dos seus dentinhos da melhor forma possível.
Revolto-me discordando das pesquisas que relacionam mães que trabalham muito com filhos com problemas psiquiátricos. Escolha cruel e injusta demais entre ser pobre ou ter sucesso, ter filhos saudáveis ou doentes.
E falando de doenças mentais, saí chutando a lixeira do consultório do meu psiquiatra quando ele me disse que a minha doença se chamava “sono” e que bastaria eu dormir oito horas por noite para eu sarar. Alguma mãe aí pode me dizer como faço isso?
Falando de perder sono, foram incontáveis as vezes que saí da minha cama e fui até a sua só para certificar se estava tudo bem, se você respirava, se a janela entreaberta te incomodava, se algum pernilongo te rondava, se sua “bexiguinha” suportaria até o amanhecer, se a manta que te cobria te protegia do frio ou te dava calor…
Chorei com a maior das paixões quando jogamos a primeira partida de xadrez juntas. E você só tinha 4 anos.
Chorei de novo quando soletrou “batata” e “boneca”. Quando pegou os meus dedos e contou-os até dez… Em inglês.
E falando em chorar, só “aprendi” a chorar mesmo, quando você contorceu de cólicas pela primeira vez, aos 20 dias de vida, e nós duas sozinhas em casa na madrugada. Antes eram só lágrimas de crocodilo ou derramadas sem um motivo tão nobre.
Depois que você nasceu, reconheci que fazê-la dormir segurando as suas mãozinhas pequenas é muito mais prazeroso (e saudável!) do que comprar uma garrafa de absinto e beber sozinha, andar em alta velocidade com um carro novo ou fumar um maço inteiro de um importado da Indonésia, sabor canela, pela madrugada…
O suor infantil exalado dos seus pezinhos após um dia todo de estripulias é muito mais perfumado do que uma “explosão de rosas”: o cheiro daquele meu perfume que você desde bem pequenina sempre pediu um “tiquim no pecôço”.
E quando fecho os olhos, naqueles dias que parecem não ter fim, eu lembro do nosso diálogo no dia da mais terrível tempestade que passamos juntas, sozinhas, você com apenas 4 anos de vida, salvando a minha:
– Filhinha, se tudo o que temos for perdido, tudo o que a mamãe precisa para recomeçarmos está aqui dentro, ó (e apontei para a minha cabeça).
– Mamãe, não se preocupe. Só não fique olhando para a chuva, nem para o vento, nem para as árvores (que se contorciam nessa hora). Me abrace, me dê as suas mãos (pegou as minhas mãos nas delas, tão miúdas), olhe aqui pra mim, para os meus olhinhos e repita comigo várias vezes: “eu não tenho medo, essa chuva vai passar, eu não tenho medo…”.
Obrigada meu amor por me fazer piloto dessa nave, na maior missão na Terra.
Queremos ter o corpo dos outros sem pensar nem questionar como esses corpos foram construídos. Perdemos a capacidade de enxergar nossa beleza natural e de compreender nossos mecanismos de fome e saciedade, pois não permitimos que eles trabalhem da forma correta, sempre impondo dietas e restrições. E quando perdemos essa ligação, comer vira um ato desconectado das nossas sensações corporais e passamos a fazê-lo no piloto automático, sem sentir o gosto, a textura, o cheiro.
Hoje eu quero te levar pra viver na Itália
Viver uma vida tranquila, encontrar o nosso lugar
Sobe na minha Ferrari, que eu nem tenho carta pra pilotar
Montanha russa
Tem altos
E baixos
Mais baixos que altos
Quando se impulsiona pra cima
E está lá no pico
Volta a cair em queda longa
Ela vira de cabeça pra baixo
Talvez você consiga ir mais de uma vez sem vomitar
Mas as vezes na primeira subida
Dá pra sentir que não vai conseguir chegar lá
E acaba, caindo novamente
Tem vezes que está no piloto automático
Ela sobe e desce
E eu nem percebo nada
Mas assim no piloto automático
Acaba não aproveitando as voltas
E o parque de diversões
Logo fechará suas portas.
Estamos tão habituados em cumprir nossa jornada, que muitas vezes corremos sem rumo ou direção, acreditando que seguir no piloto automático em alta rotação seja o suficiente para dar sentido aos mistérios que devassam o nosso destino. Ledo engano.
Muito embora não existam fórmulas prontas que decifrem as grandes questões humanas, se houve algo que talvez aprendi em meio a minha diminuta condição humana, é que o pouco que posso encontrar de respostas para esse eterno dilema de existir, não está exterior, mas no interior, dentro de mim.
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