Memória

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Retrato do Poeta Quando Jovem

Há na memória um rio onde navegam
Os barcos da infância, em arcadas
De ramos inquietos que despregam
Sobre as águas as folhas recurvadas.

Há um bater de remos compassado
No silêncio da lisa madrugada,
Ondas brancas se afastam para o lado
Com o rumor da seda amarrotada.

Há um nascer do sol no sítio exacto,
À hora que mais conta duma vida,
Um acordar dos olhos e do tacto,
Um ansiar de sede inextinguida.

Há um retrato de água e de quebranto
Que do fundo rompeu desta memória,
E tudo quanto é rio abre no canto
Que conta do retrato a velha história.

Que coisa maluca a distância, a memória. Como um filtro seletivo, vão ficando apenas as coisas e as pessoas que realmente contam.

Do novelo emaranhado da memória, da escuridão dos
nós cegos, puxo um fio que me aparece solto.
Devagar o liberto, de medo que se desfaça entre os
dedos.
É um fio longo, verde e azul, com cheiro de limos,
e tem a macieza quente do lodo vivo.
É um rio.
Corre-me nas mãos, agora molhadas.
Toda a água me passa entre as palmas abertas, e de
repente não sei se as águas nascem de mim, ou para
mim fluem.
Continuo a puxar, não já memória apenas, mas o
próprio corpo do rio.
Sobre a minha pele navegam barcos, e sou também os
barcos e o céu que os cobre e os altos choupos que
vagarosamente deslizam sobre a película luminosa
dos olhos.
Nadam-me peixes no sangue e oscilam entre duas
águas como os apelos imprecisos da memória.
Sinto a força dos braços e a vara que os prolonga.
Ao fundo do rio e de mim, desce como um lento e
firme pulsar do coração.
Agora o céu está mais perto e mudou de cor.
É todo ele verde e sonoro porque de ramo em ramo
acorda o canto das aves.
E quando num largo espaço o barco se detém, o meu
corpo despido brilha debaixo do sol, entre o
esplendor maior que acende a superfície das águas.
Aí se fundem numa só verdade as lembranças confusas
da memória e o vulto subitamente anunciado do
futuro.
Uma ave sem nome desce donde não sei e vai pousar
calada sobre a proa rigorosa do barco.
Imóvel, espero que toda a água se banhe de azul e que
as aves digam nos ramos por que são altos os
choupos e rumorosas as suas folhas.
Então, corpo de barco e de rio na dimensão do homem,
sigo adiante para o fulvo remanso que as espadas
verticais circundam.
Aí, três palmos enterrarei a minha vara até à pedra
viva.
Haverá o grande silêncio primordial quando as mãos se
juntarem às mãos.
Depois saberei tudo.

A imaginação é a memória que enlouqueceu.

Mario Quintana
Caderno H. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013.

A luz do entardecer está batendo nos seus cabelos e eu quero guardar para sempre na memória esta imagem de você assim tão linda.

A amizade é indispensável ao homem para o bom funcionamento da sua memória. Lembrar-se do passado, carregá-lo sempre consigo, é talvez a condição necessária para conservar, como se diz, a integridade do seu eu.

Milan Kundera
A identidade. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

A memória não tanto produz, mas revela a identidade pessoal, ao nos mostrar a relação de causa e efeito existente entre nossas diferentes percepções.

Aquele que à inatividade se entregar deixará de si sobre a terra memória igual ao traço que o fumo risca no ar e a espuma traça na onda.

Dante Alighieri
A Divina Comédia

Nossa memória virou um depósito de informações inúteis.

Se você quer testar sua memória, tente se lembrar hoje sobre o que você estava preocupado há um ano atrás.

Na verdade, a imaginação não passa de um modo da memória, emancipado da ordem do tempo e do espaço.

Educação não é o quanto você tem guardado na memória, nem mesmo o quanto você sabe. É ser capaz de diferenciar entre o que você sabe e o que você não sabe.

Todos reclamam da sua falta de memória, mas ninguém se queixa da sua falta de senso.

Não é com os livros que se deve ensinar, é com a memória e com a razão.

A leitura reaviva a memória e nos coloca a par do desconhecido.

Nós apenas trabalhamos para encher a memória e deixamos o entendimento e a consciência vazios.

A razão, sem a memória, não teria materiais com que exercer a sua atividade.

Só nos recordamos verdadeiramente daquilo que nos era destinado. A memória não lê as cartas alheias.

Há imensas pessoas que confundem a imaginação com a memória.

A memória dos velhos é menos pronta, porque o seu arquivo é muito extenso.