Coleção pessoal de ranish
Nas entrelinhas da
loucura habita uma
lucidez desconcertante.
Gente doida enxerga coisas invisíveis aos nossos
olhos domesticados.
Pós-pandemia
Depois da hecatombe coroada
Será a hora de abrir o caderno do futuro.
De expandir pulmões castigados, escandecidos,
Para respirar o sonho líquido da esperança.
Depois da hecatombe coroada
Será tempo de arrimar a rocha na planície
E outra vez rolá-la monte acima
Apenas para vê-la descambar
Ainda antes do cume do desejo.
Depois da hecatombe coroada
Será vez de obedecer ao vaticínio dos deuses
De reconstruir e reconstruir sempre,
De morrer e renascer em ciclos,
Na busca inatingível do eterno.
Hoje foi o Bargadinho,
um bom bezerro de cabeceira.
O encontrei lá,
deitado à beira do malheiro,
inturgescido,
rodeado dos casacas pretas.
Dona cascavel cuidou de lhe dar
o derradeiro beijo.
Jeito que teve foi arrastá-lo para
o canto dos finados.
Um cortejo fúnebre me seguiu,
num farfalhar aéreo,
flap, flap, flap.
Pelo carreadouro,
um passante que vinha
me confirmou o dito
dos antigos:
'só perde quem tem', meu amigo!.
Me lembrei doutra feita,
na mesma vira...
O Bargadinho se foi
e o meu coração
é que ficou embargado.
Coisas da lida,
da morte e dos percalços
lá nas bandas
da Vertentinha.
Carnaval
sob os olhos da esposa
é felicidade
quase tão grande
quanto a de um curió
cantando,
aprisionado
em uma gaiola
Pelas beiradas do curral
a poeira verde levantava,
no arrastar da botina.
Arremate de quatro dias
de estio.
Antevi no revolto do tempo
que ele vaticinava chuva.
Aberta a derradeira cancela,
minha vista alcançou
no longe,
um véu esbranquiçado
de noiva virgem
entremeando os angicos.
Já molhava metade do alto.
Apurei meu passo sentindo
o sorriso que se desenhava
nos meus lábios.
Lá vem ela
colorir a pastaria
com a esperança das vacas.
Já vem ela
molhando de alegrias
os meus olhos pagãos.
E derramou.
Fiquei um tempo dentro da cabina da D20,
apreciando o barulho sonoro na lataria.
Vida de vaca
é felicidade à toa,
simpleza d'água,
ingenuidade de nuvem...
Minha alma velha
me arrepia os meus
ouvidos,
me deixa o meu corpo
bambo de emoções.
Já fui escravo,
sou escravo.
Minha liberdade
são meus olhos:
Capoeira!
A morte é
um sem remédio.
O jeito é tocar o carro adiante.
Rangendo sorrisos,
respirando a brisa pouca
desses dias ariscos.
Outra fotografia
no caderno da lembrança,
pena.
Tem um lagarto verde morando
no meio da minha testa.
Penso fazer um buraco
com a furadeira
entre os meus olhos
para puxá-lo pelo rabo.
Taparei com uma rolha, depois.
Me dói muito a minha cabeça
com as andanças do sáurio.
Desparafusa minhas ideias.
Açoita meu sínus
Quando fica impossível
reinventar o inesperado,
o amor se amorna
em amizade.
O lado bom passado
continua dentro de você,
do jeito mesmo que aconteceu.
Os dissabores amarelam
com o tempo
e acabam esquecidos.
Sempre que encontramos
um amor do passado,
hoje amizade,
é uma volta pra dentro
do coração,
uma lembrança terna
e sem possibilidades.
Olhos não veem o
'é',
eles enxergam apenas o
'foi'..
Sufrágio, ó sufrágio: até quando sua ilusão de escolha enganará as gentes. Até quando a estupidez cegará essa humanidade escravizada.
Eles nem sabem
que têm um nome
tão pomposo.
Acham que são apenas ratos,
ou delinquentes,
ou pulhas,
ou gatunos...
Abigeatários é o que eles são
na verdade.
E eles voltaram
de novo.
Agora furtaram
a minha novilha
mais bonita.
Triste viver
nessa terra
sem lei.
Triste trabalhar duro
para sustentar
essa corja abjeta.
Viraram donos
do meu suor,
esses ladravões.
Dia desses,
nalgum abacto
costumário,
toparão com besouros zumbizantes
de estanho quente.
Dia desses
aprenderão que pra ser amigo
do alheio
é preciso
gostar de comer capim
pela raiz.
Sobre a tinta nos cabelos
Você não pode enganar
a morte.
Mas qualquer um
pode enganar a si mesmo.
Então pinte o seu espelho
com a cor dos seus olhos.
Abra um sorriso largo
que juventude é isso:
Acreditar.
Mesmo nas mentiras
que contamos a nós mesmos..
Boi meu
morreu.
Tristeza besta que
me deu.
Cascavel enganou o santo
e ofendeu.
Asseverou o compadre
Alceu:
Antes ele
que eu.