Coleção pessoal de Picolotto
As crianças chatas
Não posso. Não posso pensar na cena que visualizei e que é real. O filho que está de noite com dor de fome e diz para a mãe: estou com fome, mamãe. Ela responde com doçura: dorme. Ele diz: mas estou com fome. Ela insiste: durma. Ele diz: não posso, estou com fome. Ela repete exasperada: durma. Ele insiste. Ela grita com dor: durma, seu chato! Os dois ficam em silêncio no escuro, imóveis. Será que ele está dormindo? - pensa ela toda acordada. E ele está amedrontado demais para se queixar. Na noite negra os dois estão despertos. Até que, de dor e cansaço, ambos cochilam, no ninho da resignação. E eu não aguento a resignação. Ah, como devoro com fome e prazer a revolta.
No momento em que paramos a pensar se gostamos de alguém, já deixamos de gostar dessa pessoa para sempre.
Todo o homem que é um homem a sério tem de aprender a ficar sozinho no meio de todos, a pensar sozinho por todos – e, se necessário, contra todos.
Em uma boa biblioteca, você sente, de alguma forma misteriosa, que você está absorvendo, através da pele, a sabedoria contida em todos aqueles livros, mesmo sem abri-los.
As pessoas que me dizem que eu vou para o inferno e elas vão para o céu de certa forma deixam-me feliz de não estarmos indo para o mesmo lugar.
A única maneira de conservar a saúde é comer o que não se quer, beber o que não se gosta e fazer aquilo que se preferiria não fazer.