Coleção pessoal de Peralta71
“Todos os humoristas que conheci são depressivos. Sorrisos e lágrimas fluem da mesma fonte. São como frutas cítricas, que expelem acidez e doçura a um só tempo. “
“Na aurora boreal de 2020, o mundo transformou-se num grande hospício. Estamos cometendo grave injustiça, mantendo pessoas em nosocômios psiquiátricos. Aqueles `loucos`, na verdade, estão com a higidez mental melhor do que a nossa. São seres sensitivos que enxergaram a realidade, enquanto nós, nos mantemos presos no negacionismo. “
“Embora pareça bobagem, as conversas do primo Joel, carecem de peneiragem. Muitos fatos ele aumenta e da verdade se afugenta. Pra entender é preciso de prática e adoção de uma tática. É questão de CALIBRAGEM, com trinta por cento de defasagem, a gente fecha a contagem. Quando ele fala de dez, numa pesca de traíra, a gente já entende sete, descartando os três da mentira. Pior é sua irmã do meio, que precisa de mais calibre, na taxa do manuseio; dela só se aproveita a metade e o resto vai pro escanteio. No convívio com o sujeito, vai se pegando o jeito, identificando o trejeito e descartando o rejeito.”
“Biblicamente falando, só agora conseguimos compreender porque era errado acreditar em um `messias` político. “
“É irônico acreditar que o protestantismo brasileiro tenha se transformado no maior pilar de sustentação do CONSERVADORISMO. O histórico dos evangélicos confunde-se com o dos PROGRESSISTAS, alterando constituições, leis e costumes até demarcarem seu espaço na rotina do nosso povo.”
“Sabe aquele cara que dirige na contramão da autoestrada movimentada e ainda buzina e xinga todo mundo que vem em sentido contrário ? Então... ele agora é o presidente. “
“Essa `vibe` NEGATIVISTA é contagiante. Estou cada vez mais convicto de que George Orwell não morreu. Ele está lúcido em algum lugar do planeta acompanhando atento às notícias pela internet e colhendo material para seus livros. `A revolução dos bichos` e `1984` foram escritos em 2020.”
“Surge com grande efervescência uma religiosidade híbrida rotulada de evangélica e cercada de símbolos e ideologias judaicas. A bíblia diferencia gentios e judeus com uma clareza vítrea. Cristianismo e judaísmo são religiões absolutamente diferentes e incompatíveis - cada qual com seus preceitos e valores."
As relação entre os poderes deve pautar-se na autonomia e independência, não admitindo-se qualquer tipo de `GambiAras’.
No Brasil, a esquerda e a direita são como fossas nasais que aparentam distinção e separação bem definidas, mas logo no início do trajeto convergem ao centro e seguem para o mesmo rumo.
“Não existe ditadura de esquerda ou de direita. Toda ditadura é um projeto pessoal para servir a um grupo reduzido de pessoas. ”
“Leno, o cara vital. Preocupado com a saúde, evita gordura animal e nunca abusa do sal. Acorda pro treino matinal e aos domingos, no geral, segue a turma do pedal. Dorme sempre antes das nove e desliga o celular quando chove. Não há cigarro que prove. Detesta carnaval e qualquer discussão banal. Faz check-up semestralmente, cuidando do corpo e da mente. Hoje pela manhã, caminhava pela região central, quando parou frente a um espelho pra conferir o peitoral. Caiu a placa da igreja pentecostal, golpeado-o na retro-orbital. Falecido, chegou ao hospital. Uns dizem que foi um chamado, inopinado, por escolha do imaculado. Outros dizem que ele estava em pecado, por si próprio apaixonado e seu fim foi decretado. Eis o defunto mais saudável da cidade, outra vítima da vaidade.”
“Joel, marido da Janete, comprou uma lanchonete que virou um restaurante, ao lado do Rio Brilhante. Por conta da diabete e do joelho lesado, largou o serviço pesado. Nessa mudança de vida, passou a servir comida, de domingo e feriado. O movimento é bastante, mas o lucro é faltante, pelo excesso do fiado. Pra não fechar a empresa, Joel reduziu a despesa, e a carne que era de boi, com a carestia se foi. Agora a receita caseira é galinha passada da idade, que perdeu a utilidade na granja do fim da cidade. A carne é um tanto dura, mas Joel acrescenta à mistura, espremido de laranja pura - que amolece a musculatura e facilita a fervura. Um freguês quebrou a dentadura e outro engasgou com a nervura. O risco compensa no preço e movimenta o endereço. O prato não é enxugado e o pano que limpa a mesa, com pouca delicadeza, é sujo e todo rasgado. E tem o cheiro do toalete, que não incomoda a Janete, que usa o garfo da pia pra coçar a joanete. E assim o negócio vai indo. Uma hora vai aluindo e em outra vai fluindo. Tem gente que se revolta e volta, tem cliente que come e some. Aquilo que não mata o `home` e serve pra espantar a fome, não compromete o renome e a natureza descome. “
“Já ensinava Churchill, o primeiro ministro: tem negócio que é muito sinistro. O povo deve ser poupado de saber como são feitas as salsichas, as eleições de mesas diretoras, as indicações para os Tribunais de Contas, as privatizações das estatais, os detalhes dos editais e outros segredos mais.”
“O velório do `Zé Moage`, foi de grande simplicidade. A viúva não serviu nada, faltou eletricidade. Na sala o sofá rasgado, disputado por tanta gente. Mantendo a tradição, dona Neuza do salão, chorava copiosamente. Manelito contava piada e ria no corredor, e o Leno na entrada da casa com seus causos de pescador. A certa altura da madrugada, com a conversa silenciada, a coisa deu uma desanimada. Inventaram uma vaquinha, pra comprar uma cachacinha. E assim vararam a noite, e assim chegou o dia, com o carro da funerária apressado igual cutia. Na avenida da cidade, passou com velocidade e o enterro no cemitério não teve nenhum mistério. Com a pá na terra vermelha o coveiro enterrou o defunto, e o povo ia saindo e assim esquecia o assunto. Inventário não foi preciso, pois não tinha o que arrolar, e a viúva no prejuízo, não achou com quem casar. Pouca gente nessa terra, se recorda do “Zé Moage”. Esqueceram de sua alma, apagaram sua passagem. Foi a sina do pobre homem, é a sina do homem pobre. “
“JOÃO E SEUS PÉS DE FEIJÃO. Na pequena propriedade, e com certa dificuldade, vendia na cidade o fruto da produção. Ouviu de um alcoviteiro, que isso não ia vingar, porque não dava dinheiro e que num tempo venturo, no banco devia emprestar. Com a escritura na mão, pro banco seguiu o João e de lá saiu animado, deixando consignado o seu pedaço de chão. Porém, na safra seguinte, a chuva não foi parceira e deixou o pobre coitado, perdido e abandonado - sem dinheiro na gibeira. Com o fim da parceria, mudou pra periferia, de favor na casa da tia. Foi pro bico de boia fria, e de tanto pensar na desgraça, João se entregou à cachaça e migrou-se pro banco da praça. Hoje vive no submundo, maltrapilho e sujismundo e ainda lhe deram a pecha de preguiçoso e vagabundo. Seu sítio foi a leilão e quem comprou foi um “João” , que é dono de uma empreiteira e de uma família bacana e que da mesma desfruta em algum final de semana. De uma mesma terra brotou dois “João”: o que faliu trabalhando e o que lucrou descansando.”
“TEMPO é coisa relativa, como digo nessa narrativa: Tem gente que vive no ócio - o tempo todo reclama - desde a hora que apeia da cama. Tem gente que por labutar, nem vê o tempo passar. Criança tem ele de sobra. Pro velho já vai faltando, à medida em que na obra, a tarefa vai findando. Tem coisa que é tempo perdido, e tem perda que é ganho de tempo. “