Coleção pessoal de nelson_rodrigues_da_costa
Não sou feito de aço,
nem de pedra erguida contra o vento.
Sou o que passa em silêncio,
o que cresce nas sombras,
longe dos olhos que só veem
o músculo tenso, a muralha imponente.
Mas o que é a força, afinal?
Será o grito que se impõe
ou o sussurro que resiste,
a raiz que, sem alarde,
se infiltra nas fendas do chão duro
e ali permanece, paciente,
até que a pedra ceda?
Desprezam-me,
os que se acham donos do mundo,
os que medem o valor
pelo peso que carregam nos ombros.
Mas o que carregam, realmente,
senão o vazio de não entender
que a força também é delicadeza,
que o músculo pode ser frágil
diante do silêncio que dura?
Não sou deles,
nem preciso sê-lo.
A verdadeira força não grita.
Ela cresce,
como a erva que ninguém vê,
até o vento mudar,
e a muralha cair.
Não somos todos feitos de pedra
ou de aço que o sol endurece.
Há os que nascem de água,
de uma flor que desponta no silêncio,
e não sabem o peso do ferro,
nem medem a força no punho cerrado.
Mas dizem-me que são fracos,
os que não carregam montanhas,
os que não rompem o vento com o corpo.
E eu pergunto:
o que vale a muralha se a raiz cresce em silêncio,
se o vento a toca e ela cai?
Há uma força que não se vê,
uma coragem que não precisa de gritos.
No invisível dos dias,
nas pequenas lutas que ninguém repara,
ali também se ergue o mundo
e o seu peso é suportado
por mãos que não seguram espadas.
O desprezo não lhes cabe,
nem o desdém dos que se crêem gigantes.
Pois no fim,
não são os músculos que seguram o tempo,
mas o coração que, em silêncio,
faz nascer o dia.
A cultura é o vento que alarga as velas da mente, para que ela não se encoste às margens de uma vida pequena.
Hoje sou outono,
quarenta e oito vezes.
Há em mim o peso das folhas,
mas também a promessa das raízes
que nunca deixaram de se agarrar à terra.
Não conto os anos,
conto os abraços,
as vozes dos amigos que resistem
como rochedos ao vento.
A família,
são os rios onde mergulho o coração,
sempre frescos, sempre certos,
a correr pela alma
como um alívio antigo.
Olho o horizonte e há luz,
mesmo que o inverno venha,
há calor guardado nas mãos,
como sementes que esperam a hora certa.
Sigo em frente, confiante,
porque cada estação traz consigo
a promessa de um recomeço.
Agradeço a todos que se lembram de mim
neste dia simples,
e aos que partiram,
carrego-os comigo,
como sombras que dançam ao sol,
um eco de memórias que nunca se apaga.
Outono chegou, sem mistérios nem sombras,
as folhas caem como quem se despe por vontade,
o ar frio não traz aviso, é apenas o que é.
A castanha abre-se na mão, oferta simples,
uma bênção da terra, sem pedir nada de volta.
O mundo veste-se de cor, mas não por vaidade,
as árvores mudam como quem aceita o tempo,
e eu, no meu caminhar tranquilo, olho e sorrio,
não há mais do que a alegria de estar aqui,
o outono é apenas o que o outono deve ser.
Tudo é tão claro como o ar entre os ramos,
não preciso de mais para entender,
que o sol que se põe não se despede triste,
apenas dá lugar à noite, e isso também é alegria.
A virtude de esperar é não pensar no tempo,
É deixar que o sol se ponha e nasça,
Sem pedir que a noite acabe ou que o dia se prolongue.
A paciência é a simplicidade de quem vive,
De quem sente a terra debaixo dos pés,
E sabe que a árvore cresce sem que ninguém olhe para ela.
O segredo é não apressar os rios,
Que correm como devem,
Nem olhar o relógio como se ele fosse o dono da vida.
A serenidade vem de não querer além do que há,
De aceitar que o vento passa,
E que a folha, ao cair, encontra o chão no tempo certo.
A paciência não é espera imposta,
É estar em harmonia com o que é.
O mundo segue o seu rumo,
E nós seguimos com ele,
Simples, como quem sabe
Que tudo chega quando tem de chegar.
Hoje, o dia brilha como nunca, pois é teu aniversário, e com ele a celebração do milagre que és. És como a primavera que, sem esforço, transformou meu mundo, afastando o inverno que antes o habitava. Tu és a simplicidade da natureza em flor, o vento suave que acaricia as folhas, o sol que aquece a terra.
Não te posso explicar, porque as coisas belas não se explicam, apenas se vivem. E vivo-te, Rosa Brava, todos os dias, com o mesmo espanto com que se olha para uma árvore antiga, que, sem pedir nada, só nos dá sombra e paz.
Parabéns. Que cada dia teu seja uma nova pétala, abrindo-se para a luz.
Venha, venha, venha a mim, ó pilim,
em toda a tua vil glória, cintilante e fugaz,
talvez não traga felicidade, é verdade,
mas nunca vi um rosto entristecer
ao encontrar-te perdido, esquecido no chão.
Ah, doce ilusão de papel e metal,
não devemos viver sob teu jugo,
nem erigir altares em teu nome,
mas, quando vens, és bem-vindo,
como a chuva inesperada em tarde de verão.
Traz contigo o conforto, o alívio momentâneo,
não a essência da alegria, mas um suspiro,
um descanso breve na jornada.
Não te idolatro, pilim, mas acolho-te,
com a mesma simplicidade que acolhe a flor,
sabendo que, apesar de efêmero,
teu brilho pode, por um instante,
aliviar o peso do cotidiano.
Venha, venha, venha a mim, pilim,
não como senhor, mas como servo,
um convidado que chega sem aviso,
e cuja partida deixará apenas
um eco suave, uma lembrança de luz.
Às vezes, no ímpeto de acertar, a alma é um rio que se desvia do seu leito natural, cortando a terra com fúria silenciosa, mas sem perceber que ao querer tanto fazer bem, faz mal. Tentamos, com a pureza de uma estrela solitária, iluminar o caminho dos outros, mas a nossa luz cega, atravessa os olhares e não encontra compreensão.
É no fervor de agradar que nos perdemos, tal como uma flor que se abre demais e se desfaz ao vento. Nossas intenções, como barcos à deriva, colidem com rochedos invisíveis, fazendo-se em pedaços antes de alcançarem a margem desejada. Queremos dar o melhor de nós, mas, em nosso excesso, desajustamos a harmonia do mundo ao nosso redor.
Não lemos os sinais, não escutamos o sussurro das folhas, o chamado dos silêncios. Apressamo-nos, os olhos fixos no horizonte, sem ver o presente que se dissolve como um sonho matinal. Somos egoístas, não por escolha, mas por descuido, pela cegueira do coração que deseja ser amado.
Na ânsia de sermos compreendidos, esquecemo-nos de compreender, de ouvir os murmúrios que nos são destinados. E assim, com as mãos cheias de boas intenções, derrubamos as pontes que queríamos atravessar, ficando, ao final, ilhados na nossa própria solidão.
Neste tempo de excessos e abundância, em que os mares digitais transbordam com mais saberes do que jamais imaginámos, há um paradoxo que se instala silenciosamente nas nossas almas. Há mais acesso à informação do que em qualquer outra época da nossa história, e no entanto, parece que caminhamos rumo a uma ignorância cada vez mais densa, como se a verdade se perdesse entre sombras e ecos distorcidos.
É um mundo onde a sobrecarga de informações nos sufoca, onde o excesso de dados nos cega. Em vez de clareza, encontramos confusão; em vez de luz, encontramos névoas que obscurecem o discernimento. As pessoas, perdidas nesse mar revolto, buscam refúgio em fontes que confortam, que confirmam as crenças já formadas, recusando o desafio do contraditório. É o viés de confirmação que governa, um farol falso que guia os navegantes por rotas enganosas.
A desinformação floresce nesse terreno caótico, as fake news propagam-se como sementes de dente-de-leão ao vento, alimentadas por medos e preconceitos. As redes sociais, com seus algoritmos insidiosos, tecem câmaras de eco onde cada voz apenas repete, incansavelmente, a mesma melodia, criando um concerto de ignorância e polarização.
O tecido social fragmenta-se, os laços se desfazem. Cada um em seu nicho, em seu canto, reflete apenas a si mesmo, ignorando o outro. As instituições, outrora baluartes de confiança e credibilidade, são agora vistas com desconfiança. Cada notícia, cada palavra, é recebida com um olhar cético, como se o mundo estivesse repleto de sombras e fantasmas.
Para navegar este oceano de dados, precisamos de uma bússola firme. A promoção da diversidade informacional, para que possamos ouvir múltiplas vozes e perspectivas; o fortalecimento das instituições, para que a confiança possa ser restaurada.
Nesta era de abundância, a verdadeira sabedoria reside em saber escolher, em discernir, em cultivar um espírito crítico e aberto. No entanto, esta era de desinformação faz-nos regredir à Idade das Trevas, onde a ignorância se torna uma opção consciente. O “Grande Irmão” e o “Ministério da Verdade” de Orwell parecem cada vez mais reais, governando nossas percepções e crenças. A grande questão que se coloca é como podemos fazer surgir novamente um Renascimento e um Iluminismo, como reacender as chamas da razão e do conhecimento num mundo que se perde em sombras? Encontrar a resposta a esta pergunta é o desafio do nosso tempo, e nele reside a esperança de um futuro mais lúcido e iluminado.
A cultura é essencial para expandir os horizontes da nossa alma, e não se trata de uma questão de elitismo ou presunção. É, antes, uma maneira de crescer, de rasgar as paredes do nosso pequeno mundo e de nos entregarmos ao universo. Fechar os olhos ao que nos rodeia é limitar-nos a uma vida estreita e sem cor. Procurar cultura não nos torna arrogantes; é uma forma de iluminar o espírito e enriquecer a existência.
Viajar, mesmo que seja até ao fim da rua ou até ao fim do mundo, é essencial para que o mundo nos mostre mais do que a nossa redoma. Encontrar novas paisagens, cruzar olhares desconhecidos, tudo isso alarga o horizonte do coração e da mente. Permanecer em casa, a ver televisão ou a navegar no tablet, pode restringir-nos do mundo e empobrecer a nossa experiência. Sair, explorar, deixar que o vento e as palavras nos toquem, isso sim, é viver. É na cultura e na experiência do mundo que encontramos a verdadeira essência de ser, a plenitude de uma existência rica e verdadeira.
O poeta brasileiro Mário Quintana disse que "o verdadeiro analfabeto é aquele que sabe ler, mas não lê." E aqui se passa o mesmo: o verdadeiro cego é o que tem visão e se recusa a ver. Pássaros com as mesmas penas voam juntos, mas é preciso querer voar. Não presumo estar certo, nem ditar aos outros como viver. Esta é apenas a minha maneira de entender a vida e de como procuro melhorar como pessoa. Cada um tem o seu caminho, e o meu é este, guiado pela curiosidade, pela sede de conhecimento e pela vontade de ser mais, de ser melhor.
No imenso circo da humanidade, onde a lógica se perdeu há muito entre os truques da retórica e as acrobacias da desinformação, estamos todos presos numa marcha descontrolada em direção ao abismo. O mundo, tão amplamente ligado pela tecnologia, fragmenta-se em facções que se observam desconfiadas e se armam com tweets raivosos.
De um lado do ringue, os idealistas tocam suas flautas utópicas, clamando por justiça social e mudança climática, enquanto do outro, os reacionários erguem suas bandeiras de tradição e conservadorismo. Ambos se empurram para o precipício com uma convicção cega, ignorando que o chão está a ruir sob os seus pés.
Enquanto isso, os arautos da mídia manipulam as massas, distorcendo a verdade até que ela se desintegre num caleidoscópio de meias-verdades e mentiras convenientes. É a polarização que dita o tom, a tonalidade dissonante de um mundo que rapidamente se move em direção a um estado de disfuncionalidade global.
A ironia reside no fato de que, apesar de nos vermos cada vez mais próximos do abismo, os que empurram são os mesmos que gritam que estão a ser empurrados. E assim continuamos, numa dança sinistra de culpa e inocência percebida, enquanto o solo cede sob o peso das nossas próprias contradições.
Enquanto o mundo arde em fogueiras de indignação digital, os líderes políticos jogam xadrez com vidas humanas, cada movimento calculado para agradar os seus seguidores leais e enfurecer os seus adversários declarados. A verdade tornou-se um acessório opcional, substituída pela conveniência da narrativa que melhor se alinha aos preconceitos e receios de cada grupo.
No final, estamos todos juntos nesta queda livre em direção ao desconhecido, com o abismo à nossa frente e a desunião às nossas costas. Agarramo-nos às nossas convicções como tábua de salvação num mar de incertezas, mas talvez seja hora de reconhecer que o verdadeiro precipício não é apenas físico, mas moral e intelectual. Num mundo quebrado pela polarização e pela manipulação, a ténue esperança de uma revolução de mentalidades que traria o "Admirável Mundo Novo" contrasta com a implosão do velho. Quer a selvajaria, quer a complacência terão um preço pesado. Resumidamente, estamos fodidos.
Na calmaria do meu dia-a-dia tranquilo,
Sem pressas nem aflições que perturbam,
Contemplo a vida com a serenidade de quem se entrega,
Não à procura do amanhã, mas à plenitude do presente.
Vejo as pessoas correndo atrás de ilusões fugidias,
Esperando encontrar a felicidade num horizonte distante.
Mas eu, na quietude do meu ser, prefiro saborear o agora,
Pois a alegria reside na simplicidade que exploro.
Não sou poeta de grandes feitos ou narrativas épicas,
Prefiro a delicadeza das palavras que acarinho.
Por que complicar o que é tão simples e belo?
Viver é o caminho, sorrir é meu consolo.
Assim, vivo o momento com serenidade e sem receio,
A vida é para ser vivida, no presente e com meu apreço,
E a paz interior no agora é a chave para minha felicidade.
Nasci buscando a liberdade,
Quero ser livre, e quem quiser,
Que me aceite assim.
Procuro a sabedoria que ilumina como o sol,
Encontrar beleza que quase me cegue,
E desejo que a força nunca me falte.
Sonho voar como os pássaros,
Com a mente leve e sem correntes.
Quero ser um alquimista do ser,
Estranho como uma ave rara,
Nem sempre fácil de entender ou aceitar.
Às vezes estou distante,
Às vezes estou calado,
Às vezes estou radiante,
Às vezes estou falante.
Perco-me em mim,
Como se o pensar fosse um oceano sem fim,
Onde navego e me transmuto.
Sou simples, não simplório, sou como as estações,
Que mudam sem razão aparente.
Quero ser como a natureza,
Livre e sem amarras,
Deixando-me levar pelo vento e pela corrente.
Busco apenas ser,
Ser em plenitude, ser livre,
Simples e verdadeiro,
Como a ondulação do mar.
E quem quiser, que me aceite assim.
Silêncio
Há sabedoria no silêncio das pedras, No murmúrio quieto do rio que passa. Não falam as árvores, e ainda assim conhecem os segredos da terra e do vento.
O silêncio do campo é cheio de respostas, Que as palavras não conseguem dizer. A brisa suave que toca a face, Diz mais do que qualquer voz humana.
Vejo a verdade na luz da manhã, No balançar das folhas ao sol. Tudo fala sem palavras, Tudo responde sem perguntar.
Há um entendimento profundo No simples ato de não falar. O silêncio é a resposta mais pura, Que a natureza nos oferece sem cessar.
Quando me calo, ouço o mundo, E nele encontro a paz que as palavras perdem. No silêncio há uma sabedoria tão profunda, Que transforma o vazio em plenitude.
Aquieto-me na sombra das árvores, E deixo que o silêncio me ensine. Pois há mais verdade na quietude, Do que na língua bífida da humanidade.
No silêncio das lojas, entre pedras que guardam memórias antigas, ecoa a voz sussurrante da fraternidade, como um murmúrio de água entre os rochedos. Homens, artífices da alma, esculpem gestos de simetria e equilíbrio na pedra bruta que os alberga.
No ritual, desvendam-se símbolos entrelaçados, onde o esquadro mede a retidão da alma e o compasso traça os limites do saber. Sob a abóbada do céu estrelado, revelam-se mistérios como constelações esquecidas.
Reúnem-se à volta do templo, onde a luz ténue das velas ilumina o caminho, e nas sombras das colunas que guardam os segredos, ergue-se a sabedoria, forte e bela da tradição e entoada com a voz grave da experiência. É um cântico que atravessa gerações, ressoando no coração daqueles que, na busca constante pela luz, encontram a libertação.
A minha existência é um pequeno clarão,
Que brilha por instantes na vastidão,
E ilumina a noite fugazmente sem pedir permissão.
Sou um relâmpago que não sabe por que surge,
Um lampejo que não questiona seu destino.
A vida é simples, como a luz de uma vela ao vento,
E eu sou apenas o que sou, sem intenção ou lamento.
As estrelas observam-me sem curiosidade,
Assim como eu observo o campo, a árvore, o rio.
Nada tem propósito além de ser,
E nesse ser, encontro minha paz e meu viver.
Não há mistério no clarão que sou,
Não há desejo de eternidade ou de compreensão.
Sou um instante de luz na escuridão do mundo,
E isso basta, sem razão, sem ilusão.
A vida não se pede, nem se rejeita,
Apenas se é, como o sol, como o mar.
E ao findar do meu brilho, algo persiste,
Pois na vastidão, meu clarão resiste.
Ser é suficiente, ser é tudo,
E o pequeno clarão que sou,
Ilumina outros caminhos na escuridão,
Deixando uma fugaz e efêmera recordação.