Coleção pessoal de mnora
Vermelho
Ruge a voz dos bons conselhos
Caro horror que fere e fura
No sangrar dos teus joelhos
Redentora dor que cura
Os teus olhos, como espelhos
Refletindo seus vermelhos
Cor que sangra vida pura
Pena
É prazer? É dor? vontade?
Ou será que você tem
a cruel necessidade
de ferir quem te quer bem?
Quem não vê que, na maldade,
mora um pouco de saudade,
de remorso e amor também...
Fome e sede
... e disseram: — foi bem feito!
Quem mandou roubar sua horta?!
Nunca mais esse sujeito
bate aqui na sua porta.
Uma dor me ardeu no peito:
— E do homem, que foi feito?
— Eu não sei, mas... Quem se importa?!
Lucas 6, 41
Não há cruz que me segure,
que me impeça de gritar;
não tem fé que me torture
e que faça eu me calar!
Quem quiser, pois, que procure
um remédio e se cure
de querer vir me curar...
Lex talionis
Se os frutos que eu colho
minha vida é quem rega
de bom grado eu acolho
até mesmo quem me nega
Fico em paz e me recolho,
Pois, de tanto olho por olho,
a justiça ficou cega...
Uma lava a outra
Falam da reputação
da direita, tão honesta...
Mas, virando situação,
a esquerda faz a festa!
E, assim, de mão em mão,
mostram que a corrupção
no Brasil é ambidestra!
Pindorama
Solo santo invadido
Transformado em nação
Fruto podre, corrompido
Sem raíz, sem coração
Hoje o chão é devolvido
a um índio bem vestido
em camisas de botão
Livre-arbítrio
Quanto bem fica de lado
nas escolhas que alguém faz?
Lá, perdido no passado,
quanto amor deixam pra trás?
pensa Deus, desconfiado...
Com razão, pobre coitado...
Escolhemos Barrabás!
Fogueira
Se pensar é meu pecado,
a caneta - qual cilício -
me flagela e vou, calado,
escrevendo meu suplício
pelo qual eu sou julgado,
torturado e condenado.
Eis aí meu Santo Ofício!
Passo
Sinto aperto no meu peito
Sigo andando meio manco
Sigo, canso e me deito
Sinto, tenho que ser franco
Num poema tão sem jeito
Eu percebo só ter feito
outra página em branco
Escalando As Montanhas
A inércia dura e fria
da granítica muralha
que se ergue sobre a via
da humana e vã batalha
Guarda, em si, como quem cria
em seu ventre a fantasia
de um sol que não se espalha...
Nu (flagra)
Quem pegou o meu soneto
e jogou metade fora?
Encontrei só um quarteto
Ai, meu livro! e agora?
Quando abri o meu terceto
Eu flagrei meu poemeto
Com redondilhas de fora
Assombro
O nó seco na garganta
O meu passo meio manco
Nada disso me espanta
É preciso ser bem franco
O Terror que me encanta
vem da alma sacrossanta
dessas páginas em branco
Biblioteca
Entre gritos abafados
no silêncio da Babel
Pensamentos empilhados
entre sonhos de papel
Ideais catalogados
deuses, reis empoeirados
Um inferno! quase céu...
Nada feito
Lá se foi um verso inteiro
e eu não disse coisa alguma
Esse aqui já é o terceiro
e a rima mal se arruma
desperdiço meu tinteiro
escrevendo, assim, ligeiro
antes que a palavra suma