Coleção pessoal de MiriamMorata
Uma pessoa escreveu que idoso não é necessariamente uma pessoa boa. ele pode estar abandonado por colher o que semeou a vida toda.
Concordo plenamente mas...
Eu acho que por pior que tenha sido um pai ou mãe, eles precisam de ajuda e um filho não deveria se negar a ajudar. Compaixão não inclui cafuné, carta de amor, coraçãozinho de mãos para mandar no face, levar para casa e dormir de conchinha.
Compaixão é olhar a dor do outro e perceber que posso ser um instrumento de amor, que vai ajudar essa pessoa a terminar seus dias com dignidade.
Não me interessa o que essa pessoa fez, isso é um problema dela. Só me interessa é como eu posso ser agente da vida e ajudar um ser a passar por esta aventura com menos sofrimento. Isso inclui pai, mãe, avó cachorro, gatinho, pé de laranja, passarinho, joaninha, vagalume, borboleta, criança, gente chata...
A Vida não nos fornece Manual para que possamos compreender as regras do Jogo de existir, então escrevemos nosso manual durante toda a vida e de repente, o Alzheimer rasga essas páginas e revela a fragilidade das nossas regras e interditos; a impermanência de tudo que acreditávamos “eterno”.
Talvez exista uma tela imensa com um desenho traçado por esse Deus comandante, e nosso papel nessa grande Obra seja apenas colocar a linha na agulha e dar cada ponto, confiando que o resultado final será Bom.
O cruel disso tudo é que não temos acesso a esse desenho, não sabemos o que estamos bordando e estamos cansados e assustados demais para confiar nesse Artesão silencioso.
E se um dia, você sentir que seu coração abriga mais mágoas, medos e lembranças amargas do que sonhos, então é o momento de parar... lamber as feridas, buscar o facho de Luz no meio da noite e dizer ao seu coração que somos feitos de átomos, energia, esperança, teimosia, força, vontade e uma quantidade inimaginável de Compaixão que poderá ser um instrumento maravilhoso para recomeçar a Vida, a História e desta vez, o personagem principal é você.
Ah! O coração é o maior mistério do Universo. O cérebro é poderoso, no entanto sabemos que algumas doenças conseguem apagar seus registros, mas o que o coração guardar nada conseguirá tocar. Por isso onde não couber o seu coração, saiba que esse não é seu lugar; aquilo que não puder fazer de coração, não faça; os sonhos que não pulsarem no coração, não merecem ser sonhados; os gestos que não brotarem do coração não merecem ser realizados e aprenda a silenciar, sempre que as palavras não nascerem no coração.
"Somos seres que sonham, planejam, criam metas e inventam projetos para dar significado à vida; mas quando o Alzheimer nos atropela, descobrimos que tudo isso é só uma pequena distração, enquanto a Vida traça nosso real projeto e nos lança no mundo, solitários e assustados, tentando equilibrar o medo e a ousadia, o cansaço e a coragem, o amor e o ódio, a perplexidade e o assombro... para no final ver tudo isso escorrer pelos dedos como areia."
"O meu Deus não está no Templo, eu O encontro todos os dias, no assombro da Vida e na perplexidade que cala minhas palavras."
"Gosto do que vaza, daquilo que não cabe e derrama pelos poros e olhos; gosto do que não tem explicação e nem cabimento.
Gosto do que não cabe na palavras e nem nos gestos, do que não se explica e nem se conforma, aquilo que só o silêncio e perplexidade conseguem alcançar.
Gosto de buraco de fechadura e lapiseira 0,9 porque ambos assanham a imaginação."
... E tudo isso parece tão PEQUENO diante do “Não!” que a Senhora Morte sussurra, quando minha Alma grita “Sim!”.
É ela que há de me ensinar a diferença entre a acolhida e a despedida, entre aquilo que “possuo” e aquilo que sou - desse aprendizado, depende a felicidade ou a dor que hão de conduzir minha mão, enquanto escrevo minha história.
A Senhora Morte tudo pode sobre aquilo que “possuo”, e nada pode sobre aquilo que sou. Talvez porque só na minha imaginação, as coisas e pessoas são minhas; talvez porque minha real natureza pertença à dimensão da Vida que sussurra “Não!”, quando a Senhora Morte grita “Sim!”
Haverá momentos em que você vai perceber a vida como uma Graça que lhe é oferecida, em outros, ela será um estranho jogo, cujas regras serão reveladas a cada nova jogada e você nunca saberá quem dá as cartas; isso vai te deixar um pouco inseguro a princípio, mas aos poucos você vai perceber que Aquele que dá as cartas cuida para que nunca haja perdedores.
"A vida é ciranda, às vezes estamos tão distraídos que nem percebemos quem segura nossa mão.
Outras vezes estamos apressados demais para ouvir o “verso bem bonito” de alguém que acabou de entrar na roda.
E assim dançamos a dança da Vida às vezes contrariados porque não é a música que esperávamos; às vezes seguramos a mão de quem está do nosso lado tão displicentemente, que nem percebemos quando ele solta a mão.
A Vida é ciranda e cada um de nós tem um verso bem bonito para dizer e depois é só Adeus e vai embora.
Vai embora, mas fica o verso bem bonito e a suspeita de que essa ciranda só existe para nos ensinar a segurar a mão do outro com força, cantar bem alto e dançar junto... no meio de tudo isso, ficar atento para nunca oferecer pouco Amor."
“Nunca saberemos quando será a última vez, que aquela pessoa vai olhar nos nossos olhos, ou quando será a última vez que ouviremos sua voz.
Se eu soubesse que seria a última vez que seus olhos penetrariam nos meus, buscando algum vestígio da minha Alma, eu teria parado o tempo só para falar de amor com você;
Se eu soubesse que seria a última vez que ouviria sua voz, teria pedido que me contasse mais uma vez aquela história engraçada, só para ouvir a sua risada que parecia iluminar o meu mundo;
Se eu soubesse que seria a última vez que sentaria no meu banco, teria contado como acho seu cabelo bonito e gosto do jeito mexe as mãos, enquanto tenta explicar o que eu nem quero entender;
Se eu soubesse que seria o último abraço, teria me demorado um pouco mais e te apertado mais forte contra meu peito;
Se eu soubesse que seria a última conversa, teria relembrado nossos melhores papos e contado como é gostosa essa nossa troca repleta de ensinamentos, aprendizado e bobagens para rir.
Se eu soubesse que seria nosso último encontro, teria pedido outra saideira e brindado pela alegria e privilégio de celebrar a vida, com alguém tão querido.
Se eu soubesse que seria nossa última briga, teria pedido perdão, mesmo que eu acreditasse estar com a razão.
Se eu soubesse que seria a última vez que pisaria no meu mundo, teria te convidado para dançar."
"Nós chegamos a este planeta, sem manual, mapas, placas sinalizando perigo, ou holofotes iluminando o caminho.
Ainda bem!
Depois de alguns tombos, tropeços, ruas sem saída, sapato furado, joelho esfolado, estrada esburacada, a descoberta assustadora da Impotência e Fragilidade humanas... acho que aprendi algumas coisas. Dentre essas coisas, algumas fizeram toda a diferença na construção da mulher que eu sou.
- O Universo não faz 1 minuto de silêncio para eu chorar, a Roda da Vida não pára em respeito à minha dor. A dor é minha e só eu saberei lamber minhas feridas.
- Embora a “caixinha” ofereça uma “proteção ilusória”, o ideal é ficar fora da caixinha, de preferência em cima, para apreciar a paisagem.
- Não seja coadjuvante no espetáculo da sua vida. Seja protagonista, roteirista, diretor e cenógrafo SEMPRE! Mesmo que na plateia não tenha ninguém.
- Quando estiver em dúvida sobre qual caminho seguir, vai para onde tiver menos gente, pois o barulho abafa a voz do coração e você corre o risco de se perder de você.
- Se der medo vai com medo mesmo. O medo morre de medo de pessoas que, mesmo com medo, continuam ousadamente.
- Entre as Regras e o Justo, fique com o Justo.
- Entre a Compaixão e o Justo, fique com a Compaixão.
- Entre o Certo e o Conveniente, fique com o Certo.
- Entre os Sonhos e a Vida, fique com a Vida, esta aventura louca é maior do que qualquer Sonho.
- Sempre será preciso quebrar os ovos para fazer uma omelete, antes de quebrar os ovos certifique-se de quantas pessoas comerão dessa omelete.
- Gente foi feita para brilhar – toda gente, sem nenhuma exceção e essa é a tarefa humana.
- Se você não amou e foi amado por um bicho, ainda não sabe muito sobre o amor.
- Se a doença está na raiz, não adianta podar a árvore.
- Não adianta tentar comprar pãozinho em uma loja de calçados, eles não irão te vender, isso não significa que não gostam de você. Isso vale para sonhos, pessoas, relacionamentos...
- Algumas pessoas irão te estender a mão, algumas não terão forças para te levantar, fique atento às intenções e não aos gestos.
A vida é como uma banana, mesmo que você leia todos os tratados, pesquisas, artigos e reportagens sobre a banana... nada disso vai adiantar se você não saborear, então descasque e coma!"
"Tornar-se mulher é resultado de um projeto muito bem elaborado, que teve início quando alguém disse que Eva foi criada para fazer companhia a Adão; a expulsão do Paraíso foi culpa da mulher que desobedeceu ao Senhor e enganou seu homem.
Torne-se mulher... Só que não."
"Voltar para casa e deixar alguém amado na gaveta gelada de um cemitério é a experiência mais assustadora e solitária, que a Vida nos obriga a realizar. A bebida amarga que não podemos recusar.
O luto é solitário e silencioso. Nesse universo estranho não cabem pessoas queridas, que tentam amenizar a dor; não cabem palavras que justifiquem, ou acalmem o espanto diante da Morte.
A dor é minha e em mim doeu.
Luto é sair da historia vivida e retornar à solidão do útero, para gerar a nova pessoa que há de continuar existindo sem aquela presença amada, que preenchia cada pedaço da minha história.
Preciso de tempo, de solidão e silêncio, para sentir que a Mão Sagrada que levou o meu amor, está segurando a minha, nessa tarefa quase insana de recomeçar a escrever minha história."
“Está morrendo a geração de ferro, para dar passagem à geração de cristal.
Quem é a geração de ferro?
- Aqueles que chamávamos de “senhor” e “senhora”, porque “você” é para “seus amiguinhos”.
- A geração que não estudou porque precisava trabalhar para ajudar os pais, depois para realizar o sonho da casa própria, sustentar a família... mas chorou de emoção e orgulho na formatura dos filhos.
- A geração que antes da 22:00h colocava todo mundo na cama, ajeitava o cobertor, dava um beijo de boa noite depois de rezar junto, porque “ninguém deve dormir sem rezar, não somos bichos.”
- Aqueles que nunca viram uma carreira de cocaína, nem precisavam de comprimidos, ou energéticos para rir e dançar a noite inteira, mas não ousavam tomar manga com leite.
- E ninguém saía, ou entrava em casa sem “a bênção”... e isso fazia toda diferença.
- A geração que nunca sonhou com a Disneylândia, porque divertido mesmo era ficar na calçada com os vizinhos, contando causos enquanto ficavam “de olho nas crianças”.
- A geração que guardava o troco de moedas no cofrinho, mas não economizava nas festas de aniversário – um bolo, sanduiche, brigadeiro e suco. Sem DJ, só o som das crianças brincando e a risada dos parentes e amigos.
- A geração que anotava as dívidas na caderneta e ansiava pelo dia do pagamento para quitar todas as dívidas, porque “esse dinheiro não é meu”.
Está morrendo a geração que pagou para ver; bancou os seus sonhos e sonhou os sonhos dos filhos; sorvete era para dias especiais e comer arroz e feijão era a regra para crescer forte, porque "saco vazio não para em pé.".
- A geração que fez do trabalho o objetivo de vida, não soube o que eram férias e passear na praça com os amigos era uma aventura deliciosa, que rendia incontáveis fofocas e segredos.
- A geração que sempre deixou o último bolinho para os filhos, mas amargou a saudade e o medo, quando esses filhos não tiveram mais tempo para eles.
Está morrendo a geração que pagou todas as contas, mas não imaginou que envelhecer seria tão caro e os filhos não estariam dispostos a dividir essa conta.
Está morrendo a geração que soube arrancar comida e esperança de pedra, para cuidar da família, mas esqueceu de cuidar de si mesmo."
"Criador e Criatura, Artesão e Obra, Deus e Homem são as duas extremidades do fio que sustenta a vida; será impossível atar o laço que abraçaria o Cósmico, para sempre, sem que essas duas extremidades se toquem e juntas, realizem e consagrem o milagre de existir!"
"Por que Deus precisa do homem?
Como realizar essa obra pretensiosa, sem nos ampararmos na certeza de uma cumplicidade sagrada entre Deus e a Humanidade? Como sondar as profundezas do ser e conferir um significado que justifique sua existência, se não transcender o espaço-tempo limitado, que os sentidos conseguem apreender? Por isso, o Homem precisa de Deus!
Como desfrutar da imensa riqueza que é a experiência humana; como arrancar Espirito da matéria, sem tocar no barro e descobrir as formas infinitas que ele esconde? Por isso, Deus precisa do Homem!
Onde termina o instrumento e começa o Arte? Onde termina a Arte e começa o Artista? Como separar a obra, o artista e a matéria-prima?"
"E assim eu aprendi que não é só o Alzheimer que devasta a imagem bondosa que fazemos de nós mesmos. É a vida.
Não somos tão bons quanto gostaríamos; não somos tão corretos e justos como queremos que o mundo acredite; não somos tão fortes quando imaginamos.
Somos humanos -A vastidão dessa condição me causa vertigem.
É nessa humanidade que reside a incoerência, o medo de não sermos aceitos ou amados; a vontade inexplicável de agradar a todos, mesmo que não nos incluamos nesse público ambicionado.
Descobri que compaixão não é pena, mas responsabilidade profunda e respeito pelo outro, ainda que ele não saiba quem eu sou, ou não tenha nenhum gesto de gratidão ou amor por mim."