Coleção pessoal de MERRAH
Memória
Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão
Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.
A Flor do Amor
Eu te trouxe a Flor do Amor.
É presente.
É simples.
É singela homenagem.
Lembrança.
O que seja, contanto que seja
recebida por teu coração
como fluido, excelente
doador de novas energias
e forças do Bem!
Recebe esta flor que vem
do céu. Transparente, bela.
Presente de um coração
que se preocupa contigo
e que está sempre ao teu lado
te indicando o caminho do Bem!
Quer saber quem sou?
Me chamo Amigo.
Anjo de Guarda do teu coração,
que conhece a fundo todas as tuas manias, segredos, baboseiras,
infantilidades, rompantes de generosidade.
Sou quem se preocupa
quando erras, e te mostra
pacientemente, o caminho de volta,
o refazer das coisas
no momento apropriado.
E a flor que te trago é a Flor da Amizade.
Surgida no coração que ama como te amo , como se ama a um filho ou filha.
Como se ama um amigo querido
com o qual me preocupo
e procuro auxiliar.
Recebe então, amigo do peito,
a flor que tem jeito de flor do coração,
pois encontrará dentro dela
um perfume diferente,
um cheirinho de amizade
que encantará teu coração!
Aqui eu te amo.
Nos escuros pinheiros se desenlaça o vento.
Fosforesce a lua sobre as águas errantes.
Andam dias iguais a perseguir-se.
Define-se a névoa em dançantes figuras.
Uma gaivota de prata se desprende do ocaso.
Às vezes uma vela. Altas, altas, estrelas.
Ou a cruz negra de um barco.
Só.
Às vezes amanheço, e minha alma está úmida.
Soa, ressoa o mar distante.
Isto é um porto.
Aqui eu te amo.
Aqui eu te amo e em vão te oculta o horizonte.
Estou a amar-te ainda entre estas frias coisas.
Às vezes vão meus beijos nesses barcos solenes,
que correm pelo mar rumo a onde não chegam.
Já me creio esquecido como estas velhas âncoras.
São mais tristes os portos ao atracar da tarde.
Cansa-se minha vida inutilmente faminta...
Eu amo o que não tenho. E tu estás tão distante.
Meu tédio mede forças com os lentos crepúsculos.
Mas a noite enche e começa a cantar-me.
A lua faz girar sua arruela de sonho.
Olham-me com teus olhos as estrelas maiores.
E como eu te amo, os pinheiros no vento,
querem cantar o teu nome, com suas folhas de cobre.
O teu riso
Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas não
me tires o teu riso.
Não me tires a rosa,
a lança que desfolhas,
a água que de súbito
brota da tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.
A minha luta é dura e regresso
com os olhos cansados
às vezes por ver
que a terra não muda,
mas ao entrar teu riso
sobe ao céu a procurar-me
e abre-me todas
as portas da vida.
Meu amor, nos momentos
mais escuros solta
o teu riso e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso
será para as minhas mãos
como uma espada fresca.
À beira do mar, no outono,
teu riso deve erguer
sua cascata de espuma,
e na primavera , amor,
quero teu riso como
a flor que esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.
Ri-te da noite,
do dia, da lua,
ri-te das ruas
tortas da ilha,
ri-te deste grosseiro
rapaz que te ama,
mas quando abro
os olhos e os fecho,
quando meus passos vão,
quando voltam meus passos,
nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
Poema do silêncio
Sim, foi por mim que gritei.
Declamei,
Atirei frases em volta.
Cego de angústia e de revolta.
Foi em meu nome que fiz,
A carvão, a sangue, a giz,
Sátiras e epigramas nas paredes
Que não vi serem necessárias e vós vedes.
Foi quando compreendi
Que nada me dariam do infinito que pedi,
-Que ergui mais alto o meu grito
E pedi mais infinito!
Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas,
Eis a razão das épi trági-cómicas empresas
Que, sem rumo,
Levantei com sarcasmo, sonho, fumo...
O que buscava
Era, como qualquer, ter o que desejava.
Febres de Mais. ânsias de Altura e Abismo,
Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.
Que só por me ser vedado
Sair deste meu ser formal e condenado,
Erigi contra os céus o meu imenso Engano
De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!
Senhor meu Deus em que não creio!
Nu a teus pés, abro o meu seio
Procurei fugir de mim,
Mas sei que sou meu exclusivo fim.
Sofro, assim, pelo que sou,
Sofro por este chão que aos pés se me pegou,
Sofro por não poder fugir.
Sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!
Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação!
(Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição...)
Senhor dá-me o poder de estar calado,
Quieto, maniatado, iluminado.
Se os gestos e as palavras que sonhei,
Nunca os usei nem usarei,
Se nada do que levo a efeito vale,
Que eu me não mova! que eu não fale!
Ah! também sei que, trabalhando só por mim,
Era por um de nós. E assim,
Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade,
Lutava um homem pela humanidade.
Mas o meu sonho megalómano é maior
Do que a própria imensa dor
De compreender como é egoísta
A minha máxima conquista...
Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros
Me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros,
E o meu silêncio, como incenso, atingir-te-á,
E sobre mim de novo descerá...
Sim, descerá da tua mão compadecida,
Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida.
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome
Saciarão a minha fome.
Amor é síntese
Por favor, não me analise
Não fique procurando
cada ponto fraco meu
Se ninguém resiste a uma análise
profunda, quanto mais eu!
Ciumenta, exigente, insegura, carente
toda cheia de marcas que a vida deixou:
Veja em cada exigência
um grito de carência,
um pedido de amor!
Amor, amor é síntese,
uma integração de dados:
não há que tirar nem pôr.
Não me corte em fatias,
(ninguém abraça um pedaço),
me envolva todo em seus braços
E eu serei perfeita, amor!
Sábio
Sábio é o que se contenta com o espetáculo do mundo,
E ao beber nem recorda
Que já bebeu na vida,
Para quem tudo é novo
E imarcescível sempre.
Coroem-no pâmpanos, ou heras, ou rosas volúteis,
Ele sabe que a vida
Passa por ele e tanto
Corta à flor como a ele
De Átropos a tesoura.
Mas ele sabe fazer que a cor do vinho esconda isto,
Que o seu sabor orgíaco
Apague o gosto às horas,
Como a uma voz chorando
O passar das bacantes.
E ele espera, contente quase e bebedor tranqüilo,
E apenas desejando
Num desejo mal tido
Que a abominável onda
O não molhe tão cedo.
ATITUDE
Pintei as minhas telas de ilusão
Deixei-lhes um aroma a utopia;
Sementes eu lancei de grão em grão
Sonhando que bons frutos colheria;
O tempo deu-me sempre este refrão:
Que nada em qualquer tempo mudaria!
Senti no meu trajecto um outro chão
Dif'rente desse chão que eu descrevia.
Então, notando sonhos na valeta,
Cheguei a abandonar minha caneta
- De que valia a pena escrever poemas?
Mas algo me constava da memória:
Ideias dos avanços que na História
Se dão, quando se afrontam os sistemas.
Joaquim Sustelo
(em ENQUANTO A BRISA SOPRA)
Mãos dadas
Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros.
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considero a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.
TRADUZIR-SE
Uma parte de mim
é todo mundo;
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera;
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta;
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente;
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem;
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?
Amo como ama o amor. Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar. Que queres que te diga, além de que te amo, se o que quero dizer-te é que te amo?
Eu te trouxe a Flor do Amor.
É presente.
É simples.
É singela homenagem.
Lembrança.
O que seja, contanto que seja
recebida por teu coração
como fluido, excelente
doador de novas energias
e forças do Bem!
Recebe esta flor que vem
do céu. Transparente, bela.
Presente de um coração
que se preocupa contigo
e que está sempre ao teu lado
te indicando o caminho do Bem!
Quer saber quem sou?
Me chamo Amigo.
Anjo de Guarda do teu coração,
que conhece a fundo todas as tuas manias, segredos, baboseiras,
infantilidades, rompantes de generosidade.
Sou quem se preocupa
quando erras, e te mostra
pacientemente, o caminho de volta,
o refazer das coisas
no momento apropriado.
E a flor que te trago é a Flor da Amizade.
Surgida no coração que ama como te amo , como se ama a um filho ou filha.
Como se ama um amigo querido
com o qual me preocupo
e procuro auxiliar.
Recebe então, amigo do peito,
a flor que tem jeito de flor do coração,
pois encontrará dentro dela
um perfume diferente,
um cheirinho de amizade
que encantará teu coração!
Tenho um mistério na alma e um segredo na vida:
Eterno amor que, num momento, apareceu.
Mal sem remédio, é dor que conservo escondida
E aquela que o inspirou nem sabe quem sou eu.
A seu lado serei sempre a sombra esquecida
De um pobre homem de quem ninguém se apercebeu.
E hei de esse amor levar ao fim da humana lida,
Certo de que dei tudo e ele nada me deu.
E ela que Deus formou terna, pura e distante,
Passa sem perceber o murmúrio constante
Do amor que, a acompanhar-lhe os passos, seguirá.
Fiel ao dever que a fez tão fria quanto bela,
Perguntará, lendo estes versos cheios dela:
"Que mulher será esta?" E não compreenderá.
Felix Arvers (Frances)
Ideal
Aquela que eu adoro não é feita
de lírios nem de rosas purpurinas,
não tem as formas lânguidas, divinas,
da antiga Vênus de cintura estreita.
Não é a Circe, cuja mão suspeita
compõe filtros mortais entre ruínas,
nem a Amazona, que se agarra às crinas
dum corcel e combate satisfeita.
A mim mesmo pergunto, e não atino
com o nome que dê a essa visão
que ora amostra ora esconde o meu destino.
É como uma miragem que entrevejo
Ideal, que nasceu na solidão,
Nuvem, sonho impalpável do Desejo...
Amor
Amemos! Quero de amor
Viver no teu coração!
Sofrer e amar essa dor
Que desmaia de paixão!
Na tu’alma, em teus encantos
E na tua palidez
E nos teus ardentes prantos
Suspirar de languidez!
Quero em teus lábio beber
Os teus amores do céu,
Quero em teu seio morrer
No enlevo do seio teu!
Quero viver d’esperança,
Quero tremer e sentir!
Na tua cheirosa trança
Quero sonhar e dormir!
Vem, anjo, minha donzela,
Minha’alma, meu coração!
Que noite, que noite bela!
Como é doce a viração!
E entre os suspiros do vento
Da noite ao mole frescor,
Quero viver um momento,
Morrer contigo de amor!
A arte de ser feliz
Houve um tempo em que minha janela se abria
sobre uma cidade que parecia ser feita de giz.
Perto da janela havia um pequeno jardim quase seco.
Era uma época de estiagem, de terra esfarelada,
e o jardim parecia morto.
Mas todas as manhãs vinha um pobre com um balde,
e, em silêncio, ia atirando com a mão umas gotas de água sobre as plantas.
Não era uma rega: era uma espécie de aspersão ritual, para que o jardim não morresse.
E eu olhava para as plantas, para o homem, para as gotas de água que caíam de seus dedos magros e meu coração ficava completamente feliz.
Às vezes abro a janela e encontro o jasmineiro em flor.
Outras vezes encontro nuvens espessas.
Avisto crianças que vão para a escola.
Pardais que pulam pelo muro.
Gatos que abrem e fecham os olhos, sonhando com pardais.
Borboletas brancas, duas a duas, como refletidas no espelho do ar.
Marimbondos que sempre me parecem personagens de Lope de Vega.
Ás vezes, um galo canta.
Às vezes, um avião passa.
Tudo está certo, no seu lugar, cumprindo o seu destino.
E eu me sinto completamente feliz.
Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas,
que estão diante de cada janela, uns dizem que essas coisas não existem,
outros que só existem diante das minhas janelas, e outros,
finalmente, que é preciso aprender a olhar, para poder vê-las assim.
4º Motivo da Rosa
Não te aflijas com a pétala que voa:
também é ser, deixar de ser assim.
Rosas verás, só de cinza franzida,
mortas intactas pelo teu jardim.
Eu deixo aroma até nos meus espinhos,
ao longe, o vento vai falando de mim.
E por perder-me é que me vão lembrando,
por desfolhar-me é que não tenho fim.
Nunca diga te amo se não te interessa.
Nunca fale sobre sentimentos se estes não existem.
Nunca toque numa vida se não pretende romper um coração.
Nunca olhe nos olhos de alguém se não quiser vê-lo se derramar em lágrimas por causa de ti.
A coisa mais cruel que alguém pode fazer é permitir que alguém se apaixone por você quando você não pretende fazer o mesmo.
Quero, um dia, poder dizer às pessoas que nada foi em vão... que o AMOR existe, que vale a pena se doar às amizades a às pessoas, que a vida é bela sim, e que eu sempre dei o melhor de mim... e que valeu a pena!
ALÉM DA TERRA, ALÉM DO CÉU
Além da Terra, além do Céu,
no trampolim do sem-fim das estrelas,
no rastro dos astros,
na magnólia das nebulosas.
Além, muito além do sistema solar,
até onde alcançam o pensamento e o coração,
vamos!
vamos conjugar
o verbo fundamental essencial,
o verbo transcendente, acima das gramáticas
e do medo e da moeda e da política,
o verbo sempreamar,
o verbo pluriamar,
razão de ser e de viver.