Coleção pessoal de leofraden
Falar com prudência.
Cautelosamente com os rivais e decentemente com todos os demais. Sempre há tempo para proferir uma palavra, mas não para fazê-lo voltar. Fale como se redigisse seu testamento: quanto menos palavras, menos processos judiciais. Treine em coisas pouco importante para saber das mais importantes. A arcanidade tem um ar de divindade: aquele que fala levianamente está muito
perto de ser vencido e convencido.
Nem tudo mau, nem tudo bom.
Um certo sábio reduziu toda a sabedoria ao caminho do meio. Levar o certo longe de mais e ele se torna errado. A laranja espremida ao máximo dá só amargor. Mesmo no prazer não devemos ir a extremos. A própria inteligência se esgota se exigida demais, e se ordenhamos uma vaca em excesso teremos sangue por leite.
Não brincar o tempo todo.
A prudência é reconhecida pela seriedade e granjeia mais respeito do que talento. Quem vive brincando não é um homem que mereça confiança. São comparados aos mentirosos e nunca lhes dão crédito. De um tememos a trapaça, do outro, a zombaria. Nunca se sabe quando estão exercitando o juízo, o que equivale a não tê-lo. Não existe humor pior do que o contínuo. Alguns ganham fama de espirituoso e perdem a de sensato. Há momentos para o riso, mas o resto do tempo pertence à seriedade.
Ter bons repentes.
Eles nascem de uma feliz presença de espírito; graças à sua vivacidade, não há apuros, nem acasos incômodos. Alguns pensam muito e fazem tudo errado,
enquanto outros fazem tudo certo sem antes ter pensado. Alguns têm reservas de antiperístase? As dificuldades revelam melhor deles. Trata-se de monstros que prosperam com a improvisação e erram sempre que pensam em algo. O que não lhes ocorre de imediato jamais lhe ocorrerá, e de nada adianta pensar depois. A rapidez arranca aplausos, pois revela uma capacidade prodigiosa: argúcia no pensamento, prudência nos atos.
Nunca perder o controle.
Grande ênfase deve pôr a prudência em não perder o controle. Assim se portam os grandes homens, pois a magnitude dificilmente se abala. As paixões são os humores da alma, e qualquer excesso indispõe a prudência. Se a moléstia sai pela boca, sua reputação estará em perigo. Tendo completo domínio de si próprio na prosperidade como na adversidade, ninguém irá censurá-lo, mas admirá-lo.
Não ter nenhuma imperfeição.
Poucos são os que vivem sem alguma falha moral ou defeito natural, ao qual se entregam quando seria fácil deles se livrar. A prudência alheia vê com pesar um talento sublime, universal, obscurecido por um pequeno defeito: uma única nuvem eclipsa o Sol. Os defeitos são máculas no rosto da reputação, e a malevolência as percebe rapidamente. Requer uma grande habilidade
transformá-las em brilhos. Desta maneira César soube laurear seu defeito.
Conhecer seu principal atributo
Seu dom de destaque. Cultive-o e incentivo os demais. Todos alcançariam a excelência em alguma coisa se conhecessem sua qualidade dominante.
Identifique o rei dos seus atributos e se dedique a ele com afianço. Alguns se destacam com discernimento e outros, na coragem. Os demais violentam a sua
aptidão e não alcançam a superioridade em nada. Deixem-se cegar a lisonjear pelas paixões até que - tarde- demais!- o tempo as desminta.
Associar-se àqueles com quem pode aprender
Seja o convívio amigável uma escola de erudição e torne a conversação instrutiva. Faça dos amigos professores e combine a utilidade da aprendizagem com o gosto da conversa. Alterne a fruição com a instrução. O que você diz será recompensado com aplausos; o que ouve, com aprendizados. O que nos leva aos outros, em geral, é a nossa própria conveniência; aqui ela tem um sentido maior. Os prudentes freqüentam as casas de renomados heróis que são mais palcos de heroísmo que palácios de futilidade. Alguns são notáveis pelos conhecimentos e bom senso; pelo exemplo e pelo modo de agir, são
oráculos de toda grandeza. Aqueles que os cercam formam uma academia refinada de discrição e sabedoria elegantes.
Escolha um modelo heróico. Mais para emular do que imitar. Existem exemplos de grandeza, textos vivos de reputação. Cada qual escolha o primeiro em seu campo, não tanto para segui-lo quanto para superá-lo. Alexandre chorou sobre a tumba de Aquiles, não lendário herói grego, mas por si próprio, pois, ao contrário daquele, sua glória ainda não nascera. Nada atiça tanto a ambição do espírito quanto o clarim da glória alheia. O que afugenta a inveja incentiva a generosidade.
Ninguém consegue dominar-se se não compreende a si próprio. Existem espelhos para o rosto, mas não para o espírito, tome lugar do espelho a ponderada auto-reflexão. E, ao se esquecer de sua imagem exterior, tente corrigir e aprimorar a interior. Conheça a força da sua prudência e perspicácia. Verifique se tem condições de se empenhar. Explore seu íntimo e verifique seus recursos para tudo.
Caráter e Inteligência. Um sem a outra é apenas meia felicidade. Não basta ser inteligente; é preciso também ter o caráter apropriado.
O homem nasce bárbaro. Redime-se da condição de besta cultivando-se. A cultura nos transforma em pessoas; e tanto mais, quanto maior for a cultura. Por isso, a Grécia pôde chamar o resto do mundo de bárbaro. A ignorância é rude e
grosseira. E até a sabedoria é áspera quando carece de polimento. Não é apenas a inteligência que devemos apurar, mas também nossos desejos e principalmente nossa conversa. Alguns exibem um esmero natural tanto nas qualidades interiores quanto nas exteriores, tanto nos conceitos quanto nas palavras, tanto no adorno corporal (que é como a casca) quanto nos dons espirituais (o fruto). Já outros são tão brutos que embaçam tudo, até suas qualidades superiores, com um intolerável desasseio bárbaro.