Coleção pessoal de lasana_lukata

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⁠fórceps

garça força a saída do peixe;
dentista, a saída do dente;
poeta, a saída do verso;
inclusão, entrada forçada;
este mundo
nem me ouve,
nem se abre,
só a sabre
penetrei.

⁠alienação


um homem ia ao mercado,
ia tão alienado,
sem saber que repolho
brota aberto e, trancado,
ensimesma-se do mundo.

⁠dos pastores,


não seja um Melquizedeque,
se vende por um copeque.

⁠⁠
teia


a tristeza tem feito teias em meus olhos
e vez por outra outros olhos são capturados
e me descobrem completamente nu
enquanto são devorados

⁠pela claraboia da tua blusa,
a primavera entra e espalha flores,
em nenhum momento se recusa,
ira pra sempre aonde fores.

⁠e pela linha vermelha,
numa tarde de pudim,
vieste como uma abelha,
deixaste teu mel em mim.

⁠inefável
o impossível coice de um cavalo-marinho
abriu a ostra onde havia pérola
e se eu não tivesse naufragado
jamais veria esta cena
e não teria este colar de ilusões
para aliviar a aspereza destas noites nervosas
em que o poema não vem
ou rebenta ao mínimo ruído como se fosse solitária
e o que deveria ser tudo metros mais de quinze
no papel é pouco milímetros quase nada
e em mim fica presa uma enorme madrugada
inefável indizível cá por dentro deformada


Imagem hedionda


desastrado,
seaamadaénegra,
nãoinscrevaseunome
numtroncodeárvore:
chegadetronco.

Eu sou auditivo
As pessoas dizem que uso palavras rebuscadas, umas maldosas dizem que quero ser diferente e não é isso. Eu quero oferecer aos ouvidos os sons diferentes. Eu sou aquele menino que reúne diferentes conchas do mar numa latinha e começa a buscar um ritmo, também assim faço com as palavras sacudindo-as dentro do poema. As palavras que causam estranhamento no leitor são palavras que eu amei pelo som como a palavra Flostriar, Conquassivo, Indelével com o L sendo pronunciado. Eu sou a simbiose de judeu com africano, dois povos extremamente auditivos.

⁠boquiaberto
com a técnica oriental
de se olhar por dentro
o capitalista percebeu
que tinha coração
e assim começou a venda de órgãos

⁠o diabo é mais rápido que Deus
porque escreve em papel-carbono,
mas sai tudo ao contrário.

⁠Fosforescência
nascida da putrescência
é excrescência.

⁠remembrar


depois do trabalho de cavar
à espera do profundo,
decepcionada com o ninho
e o ritmo ordinário,
a saúva sobe o abismo
e, entre as folhas do outono-,
reencontra suas asas.

⁠periferia
o vento de outono soprou
e fui colhendo folhas...
em cada uma havia um verso
e todas juntas um poema,
que agora averbo em teus ouvidos
e na margem deste mundo.
o meu poema te rodeia,
espaço branco producente,
de umidade e razão.
garça, alba plumagem
onde escrevo teu nome.

⁠abertura do ano mal começou,
na fala do amigo a rima com ou,
Fátima morreu e Jorge se enforcou.

⁠tarde atijolada
o pai pedreiro
trabalha no céu
erguendo o muro
que nos separa da loucura

⁠ah, se toda pancada fosse de chuva
e a pouca distância, de fato, uma curva...
minha vida envolvida em água tão turva,
tropeçando, caindo, infinitos estorvos.

⁠A insaciável sede tem de ser atingida,
repetidamente,
pela água.

⁠meus versos são chapiscos,
sempre fogem dos apriscos,
voam fora do teu céu.

⁠Brasil, rotina: em cada esquina uma propina.