Coleção pessoal de HermesFernandes
Cartão Postal
Há sonhos que nunca vou viver
Lugares que jamais sequer vou conhecer
Perfumes e sabores
Texturas e mil cores
(Que existem)
Mesmo assim quero sonhar
Não custa nada!
Sim, eu vou sonhar
Se a vida resolver me surpreender?
Quem sabe quanto ainda vou viver?
Não resta tempo pra desperdiçar
Com mágoas e rancores, ilusões
Nem pense que eu vou me sabotar
Com afetos impostores, projeções
De um ego que falhou ao se impor
Em vez de se entregar a um puro amor
Amor que me transpassa
Amor que é pura graça
Amor que não disfarça
Amor que é pra valer.
INTENSO
Como não ser intenso
Num mundo tão imenso
e uma vida tão fugaz?
Como não ser intenso
Se cada vez que penso
Algo fica pra trás?
Pra tornar algo eterno
Três coisas são essenciais:
Interatividade, intensidade e intenção.
Pra transformá-lo num inferno
Bastam três coisas banais:
Egocentricidade, displicência e rejeição.
É o receio de que nossa imagem fique riscada que nos impede de arriscar. Quer romper com o previsível? Corra riscos.
Viver dói
Viver dói.
Existir, nem tanto.
Já a morte é só um susto.
Bancar o herói?
Fingir não ter espanto?
Que suporte então o custo.
Querer corrói.
Cede ao toque do encanto
Mesmo quando se é justo.
Desejar me mói.
Me destrói o tanto quanto
Até que encontro o que busco.
Dica do dia: convide a seus inimigos a
tomarem assento na mesa que o Senhor lhe
tem preparado. Reparta com eles o seu pão.
Isso é graça na prática.
Aos olhos de Deus, ‘ímpio’ não é quem peca, mas quem não reconhece sua impiedade. O Filho de Deus sente-se muito mais ‘em casa’ entre pecadores que admitem sua condição do que entre santos que se veem no direito de julgar os demais
Tanto a fé, quanto a ansiedade são lentes com as quais vislumbramos o futuro. A diferença é que a ansiedade nos inquieta por dentro e nos paralisa por fora, enquanto a fé nos aquieta por dentro e nos mantém em movimento por fora.
Édipo
A você me revelei por inteiro
quando me trouxe para fora
a fim de mostrar-me a beleza
que havia no mundo
Tirou-me do conforto do cativeiro
quando já se avançava a hora
E minh’alma ainda presa
em um sono profundo
Tão logo os olhos abri
Foi como sair do ovo
E ver que a vida era bem maior
Mas a primeira coisa que vi
neste bravo mundo novo
Ofuscou tudo ao meu redor
Por isso lhe amei de imediato
E me encantei com seu sorriso
Ser-lhe-ei para sempre grato
Por me trazer ao paraíso
Nestes meus primeiros passos
Quero ver-lhe sempre perto
Apoiar-me em seus braços
Se algo não estiver certo
Isso é tudo o que preciso
Isso é tudo o que lhe peço
Não me prive de seu riso
E perdoe meu excesso
Sob os seus cuidados sigo
Num caminho sem regresso
Se sua ausência é um castigo
Me declaro réu confesso
Num estalar de dedo
Quem me dera se num estalar de dedo
Eu pudesse alterar todo o enredo
E a juventude assim não terminasse tão cedo
Quem me dera se num estalar de dedo
Eu descobrisse o mais guardado segredo
Que me fizesse encarar qualquer que fosse o medo
Quem me dera se num estalar de dedo
Toda arma fosse um mero brinquedo
Nossas guerras se tornassem o tão desejável sossego
Quem me dera se num estalar de dedo
Eu acordasse sempre ao som do passaredo
E cada noite fosse estrelada como as noites de Penedo
Quem me dera se num estalar de dedo
Já não me importasse se às vezes excedo
Se a pressão do dia-a-dia me fizessem um rochedo
Quem me dera se num estalar de dedo
O caminho pelo que me enveredo
Jamais fosse o mesmo pelo qual retrocedo
Ofegante
Ofegante.
Busco ar, porém em vão.
Num instante,
Sinto disparar o coração.
Tenho pressa.
Corro contra o tempo.
Que me resta?
Soltar-me ao vento.
Fôlego.
Na jornada sigo sendo peregrino.
Trôpego.
Cambaleio rumo ao meu destino.
Sôfrego.
Da vida só provei o aperitivo.
O que quero?
Justo aquilo de que me privo.
O que espero?
Desta vida sou apenas inquilino.
O quanto eu te amo
O quanto eu te amo?
O tanto de areia que há no mar
e de estrelas no céu
Até quando eu te amo?
Até a abelha se cansar
de fazer seu mel
O quanto eu preciso?
O mesmo que o barco a velejar
do vento a soprar
O quanto eu te quero?
É como um deserto atravessar
e um lago avistar
Até quando eu te quero?
Enquanto houver troca de estação
Do inverno ao verão
E quando te abraço
Me sinto inteiro uma vez mais
Não quero soltar
O tempo que passo
Pensando em teu sorriso
Nem vou calcular
O quanto me importo?
O suficiente para esperar
o tempo voar
O amor nunca falha
Não se enaltece
Nem se vangloria
Se é o que permanece
O que mais nos importaria?
O amor não tem pressa
Não se esconde
Nada há que o impeça aqui, ali,
não importa onde
Tal qual um rio flui sem parar
Nunca se esgotará
O amor sustém
O amor provê
Muito além do
que se possa ver
O amor protege
Sempre espera
Quando emerge
O amor tudo supera
O amor são os braços que vão lhe embalar
Não lhe abandonará
Se o meu coração me trair
Nele não puder confiar
Se o céu sobre mim cair
Nada é maior que o amor
Maior que o amor
O amor está aqui
pois sobreviveu
Ele é o sentido que
o mundo não percebeu
O amor é um rio que flui sem parar
O amor são os braços que vão lhe embalar
O amor lhe solta pra você voar
Não lhe desapontará
PILATOS REDIMIDO
Uma bacia diante de mim
Não sei ao certo o que farei
Do meu dever me isentarei
As minhas mãos eu lavarei
Como lidar com tanta pressão?
A quais interesses terei que ceder?
Passo minha vez, minha voz à multidão
De sangue inocente vou me abster
Sem me importar com quem
consequências sofrerá
Resta tornar-me refém
da imagem que eu poupar
Olha pra mim!
Pilatos, eu me tornei
Olha pra mim!
Os fatos ignorei
Uma bacia diante de mim
Já sei de antemão o que farei
Se é pra amar, vou até o fim
Até os seus pés eu lavarei
Na frente de todos me desnudarei
Aos que digo amar enfim servirei
E me cingirei só com uma toalha
Sem disfarçar minha dor, minha falha
Apostando no amor
que minha vida transformou
Desistindo de impor
meus valores a quem for
olhar pra mim
Pilatos chegou a fim
Olha pra mim!
Meus atos falam por mim
A liberdade cristã repousa no fato de que nada que façamos será capaz de surpreender a Deus, enquanto se move no afã de surpreender o mundo.
O maior poder que a liberdade nos confere é o de surpreender e o maior privilégio é o de ser surpreendido.
Quem quiser redescobrir o prazer de viver terá que percorrer uma estrada de mão dupla: reinventar-se na jornada e reencantar-se com a paisagem.