Coleção pessoal de hannylih
Tudo que existe existe talvez porque outra coisa existe. Nada é, tudo coexiste: talvez assim seja certo.
Amar é cansar-se de estar só: é uma covardia portanto, e uma traição a nós próprios (importa soberanamente que não amemos).
Ver e ouvir são as únicas coisas nobres que a vida contém. Os outros sentidos são plebeus e carnais. A única aristocracia é nunca tocar.
Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens.
O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela.
Ver muito lucidamente prejudica o sentir demasiado. E os gregos viam muito lucidamente. Por isso pouco sentiam. Daí a sua perfeita execução da obra de arte.
A vida me fode, não nos damos bem. Tenho que comê-la pelas beiradas, não tudo de uma vez só. É como engolir baldes de merda.
Cheguei numa fase da minha vida que vejo que a única coisa que fiz até agora foi fugir, fugir de mim mesmo, do meu nada, e agora não tenho mais para onde ir, nem sei o que vou fazer, fui péssimo em tudo.
Esperamos e esperamos. Todos nós. Não saberia o analista que a espera é uma das coisas que faziam as pessoas ficarem loucas? Esperavam para viver, esperavam para morrer. Esperavam para comprar papel higiênico. Esperavam na fila para pegar dinheiro. E, se não tinham dinheiro, precisavam esperar em filas mais longas. A gente tinha de esperar para dormir e esperar para acordar. Tinha de esperar para se casar e para se divorciar. Esperar para comer e esperar para comer de novo. A gente tinha de esperar na sala de espera do analista com um monte de doidos, e começava a pensar se não estava doido também.
E minhas próprias coisas eram tão más e tristes, como o dia em que nasci. A única diferença era que agora eu podia beber de vez em quando, apesar de nunca ser o suficiente. A bebida era a única coisa que não deixava o homem ficar se sentindo atordoado e inútil o tempo todo. Tudo mais te pinicando, te ferindo, despedaçando. E nada era interessante, nada. As pessoas eram limitadas e cuidadosas, todas iguais. E eu teria que viver com esses putos pelo resto de minha vida, pensava. Deus, eles todos tinham cus, e órgãos sexuais e suas bocas e seus sovacos. Eles cagavam e tagarelavam e eram tão inertes quanto bosta de cavalo. As garotas pareciam boas à distancia, o sol provocando transparências em seus vestidos, refletido em seus cabelos. Mas chegue perto e escute o que elas tem na cabeça sendo vomitado pelas suas bocas. Você ficava com vontade de cavar um buraco sobre um morro e ficar escondido com uma metralhadora. Certamente eu nunca seria capaz de ser feliz, de me casar, nunca poderia ter filhos. Mas que diabo, eu nem conseguia um emprego de lavador de pratos.
Talvez eu pudesse ser um ladrão de bancos. Alguma porra. Alguma coisa flamejante, com fogo. Você só tinha direito a uma tentativa. Por que ser um limpador de vidraças?
Não sei quanto às outras pessoas, mas quando me abaixo para colocar os sapatos de manhã, penso, Deus Todo-Poderoso, o que mais agora?
Sentia-me contente por não estar apaixonado, por não estar contente com o mundo. Gosto de estar em desacordo com tudo. As pessoas apaixonadas tornam-se muitas vezes susceptíveis, perigosas. Perdem o sentido da realidade. Perdem o sentido de humor. Tornam-se nervosas, psicóticas, chatas. Tornam-se, mesmo, assassinas.
Tudo o que era mau atraía-me: gostava de beber, era preguiçoso, não defendia nenhum deus, nenhuma opinião política, nenhuma ideia, nenhum ideal. Eu estava instalado no vazio, na inexistência, e aceitava isso. Tudo isso fazia de mim uma pessoa desinteressante. Mas eu não queria ser interessante, era muito difícil.
Nunca me senti só. Gosto de estar comigo mesmo. Sou a melhor forma de entretenimento que posso encontrar.
É este o problema com a bebida, pensei, enquanto me servia dum copo. Se acontece algo de mau, bebe-se para esquecer; se acontece algo de bom,bebe-se para celebrar, e se nada acontece, bebe-se para que aconteça qualquer coisa.