Coleção pessoal de gilpinna
Ecos do Meu Ego
Ouço vozes, não nego
Mas não são vozes do além
São ecos do meu ego
Do meu id, superego
E de toda alquimia
Que existe em meu corpo
Viu? Não estou louco
Estou ciente de que existe
Não só um pouco
Mas muita gente
Falando dentro de mim
Segundo a ciência
Toda gente é assim
Mas ó:
A alma não é uma só?
Então por que este nó cego
No meu ego?
Por que o que sinto no peito
Embaralha na mente
E o que penso a respeito
O peito mente que sente?
É muita informação
São muitos dados
Máquina nenhuma
Tem algoritmo tão sofisticado
É tristeza ou é só sono?
Liberdade ou abandono?
Exercício, meditação
Qual remédio pra depressão?
E a felicidade:
É saciedade?
Vem com a idade?
Tem validade?
Como realizar meu desejo
Se quero tudo que vejo?
Como morder a maçã
Sem que a serpente se torne vilã?
Hã?!
Alguém disse meu nome?
Ou é só o estômago
Incomodado com a fome?
Difícil saber o que sentir
Mas é melhor que sentir nada
A sensação do todo
É o objetivo da jornada
Observo, absorvo
E quando encontro não me apego
Ouço vozes, não nego
Pior cego é aquele
Que não quer ouvir o ego
Maria, Margarida
Maria, Margarida
Marca a vida
Amargurada
No peito uma ferida
Que te faz ser sempre ouvida
Que te faz ser sempre amada
E eu a te regar
Pra você crescer mulher
Pra você desabrochar
Pétala de bem-me-quer
Maria, Margarida
Mais querida
Mais quebrada
Branca como a flor
No pólen sua cor
Amarela esverdeada
No laço do compasso
Que te trago meu abraço
No fim do infinito
Pro teu sonho mais bonito
Deixar tudo aqui escrito
Que te amo e não disfarço
És mania, és maravilha
Tens perfume pelo ar
Vem depressa primavera
Alivia a minha espera
No jardim da minha vida
Traz Maria, Margarida
Quero ver ela brotar
A Gruta
Sempre que a noite vem, eu me lembro da escuridão daquela maldita gruta. E dos gritos ecoantes de meu melhor amigo, Victor. A ideia foi dele: fazer a Trilha da Morte. A trilha mais perigosa da Chapada dos Guimarães. 5km exaustivos por cima da terra e 9km infernais por debaixo dela. Os poucos profissionais, que já se arriscaram, tiveram incidentes tão graves que a trilha acabou sendo proibida. Mas meu amigo Victor viu, tanto no grau de dificuldade quanto na ilegalidade dessa expedição, um desafio à altura de sua audácia. Quando atravessamos a guarita da Polícia Florestal, disfarçados de ambientalistas, tive a sensação de que aquela aventura poderia ser divertida. Mas eu estava enganado. Depois de 6 horas subindo, descendo, escalando, desviando, caindo e levantando, chegamos ao Trevo. Um local exatamente como descrito por nossos antecessores. E, segundo eles, onde realmente começava a Trilha da Morte. Após uma revitalizante pausa de 25 minutos, goladas de água e algumas barrinhas de cereais, ligamos as lanternas de nossos capacetes e entramos na Gruta. Apesar de ser caminho único, ele era cheio de dificuldades. Algumas quase intransponíveis. Mas Victor, determinado, foi vencendo os obstáculos, um a um, enquanto eu o seguia. Quanto mais andentrávamos a imensidão da Gruta, mais a escuridão e o silêncio nos envolviam. O lugar tinha uma atmosfera densa, quase fantasmagórica. Respirações, passos, reflexões. Essa era a dinâmica de nossa caminhada. Interrompida, de repente, por um grito forte de dor que ecoou feito um trovão pela caverna. Imediatamente vi Victor no chão, abraçando suas pernas, enquanto gemia. “O desgraçado me picou! O desgraçado do escorpião me piscou!”. Corri ao seu encontro e tentei ajudar, mas fiquei atônito diante dos efeitos imediatos provocados pela ferroada. Parte da perna de Victor estava preta. Rapidamente lavei o local ferido e, com os itens que tinha na mochila, desinfetei-o. Mas Victor continuava se contorcendo no chão, enquanto o hematoma preto em sua perna aumentava. Apoiei-o sobre o meu ombro, tentando carregá-lo, mas ele não suportou a dor e se atirou no chão novamente. Eu não conseguia raciocinar com os gritos contínuos e cada vez mais agonizantes de Victor. Analisei sua perna mais uma vez, e ela já estava inteira tomada pela podridão preta. Ele também olhou e entrou em pânico. “Corta! Corta!”. Relutante, peguei o canivete e o cravei em sua perna. Victor gritou ainda mais alto, enquanto seu sangue escorria, empretecido. Contendo a ânsia de vômito, cortei a perna do meu amigo. Depois o arrastei por uma distância além de minha capacidade física. Ele gritava, gritava e gritava. Sob a luz de meu capacete, reparei que as veias de seu corpo estavam escuras. “Dói muito!”. E, dizendo isso, começou a morder sua própria mão, dilacerando seus dedos. Tentei o conter, mas ele estava ensandecido com a dor. Bati forte com o canivete em sua cabeça, e ele desmaiou. Segui arrastando-o por todo o caminho de volta da Gruta, parando apenas três vezes: para amputar seu pé, inteiramente preto, depois, suas orelhas, e, depois, uma de suas mãos. Ao alcançarmos a saída da Gruta, fui impactado pela luz do dia, e minhas pupilas tiveram que se readaptar. Passando o clarão, fui surpreendido por um Victor absolutamente saudável. Ele me olhou assustado e disse: “Ufa! Ainda bem que você acordou. O escorpião que te picou era dos mais venenosos”.
Desesperança
Chega de esperar,
preciso fazer algo!
Mas, pera aí,
eu já esperei tanto
sem saber o que fazer.
Será que não vale
esperar mais um tanto,
para que algo
possa acontecer?
Não! O mundo segue
esperando algo de mim.
Mas por que ninguém
no mundo espera por mim?
E como eles alcançaram,
se não esperaram?
Será que se cansaram
de esperar e venceram
pelo cansaço?
Eu não, não sou de aço!
A minha espera
é só um passo que eu desdou.
Permanecer onde estou
é esperar em desespero.
Durmo esperando acordar.
Trabalho esperando
o final de semana chegar.
E amo esperando o fim.
Esse, sim espera por mim.
Não é porque eu
não sei o que fazer que eu
não deva fazer nada.
é preciso pegar uma rua
para poder chegar na estrada.
É isso! Sentado eu não fico.
Mais vale a desesperança
de ser pobre do que
a esperança de ser rico.
Não sei para onde, mas vou.
Não sei por que, mas sou.
Não espero mais
a esperança que me faltava.
Se nada acontecer amanhã,
tudo bem:
por essa eu já esperava.
Cordel Astral
Fui perguntar aos astros
O quão perfeito é o nosso amor.
Marte falou primeiro,
Num impulso verdadeiro,
Que nosso amor é guerreiro
Por não ter medo da dor.
Saturno, mais oportuno,
Não deixou de se impor.
Disse, num tom maduro,
Que o amor pode ser duro,
Mas, mesmo sem crer no futuro,
Crê no futuro do nosso amor.
Mercúrio pediu a palavra
E explicou com a razão:
Que não existe amor perfeito.
Porque amor que não tem defeito
Não se define como amor,
Considera-se paixão.
A Lua foi nua e crua,
E falou com sentimento,
Que o amor nos olhos dela
É igual ao amor aqui dentro.
Dando luz ao nosso caso,
Diz que não é por acaso
Que isso vai dar casamento.
Urano, pra variar,
Não rotulou o amor da gente.
Disse só que é diferente
O nosso jeito de amar.
Júpiter filosofou,
Falando da nossa jornada.
Disse que nosso amor é casa,
Mesmo quando a casa é estranha.
Netuno falou bem pouco,
Pois preferia rezar.
Pro nosso amor deste mundo,
Continuar tão profundo
Como já foi em um outro lugar.
O Sol se agigantou
E chamou a minha atenção.
Sua frase foi uma só,
Mas aqueceu meu coração:
“Eu sou Ela”, disse ele.
E eu não discordo, não.
Plutão foi um pouquinho
Mais difícil de entender.
Ele afirmou que o amor perfeito
Só nasceu no nosso peito
Porque a gente soube morrer.
E Vênus ficou por último,
Porque de amor entende mais.
Disse que um amor desse jeito
É uma escolha dentro do peito,
Que a gente até pensa a respeito,
Mas é o amor da gente que faz.
Eu sou o responsável pela minha queda e pela minha reerguida. Mas você é fundamental para o meu equilíbrio.