Coleção pessoal de FilipeMarinheiro
fecho os olhos
abro-me nos teus como uma balada impune no seu sangue
oscilante
entretido percorro-te, estremeço-me nas veias singulares
depois com a ponta da língua
afável caligrafia reponho as cordas giratórias
e andas no meu imenso chão
um chão embalado p'los nossos sorrisos de cetim
só teu, só meu a transformar-se
porém nunca a concluir ou terminar salvo esse romance
nada súbito a apertarem violetas durante
jactos perfumados
decerto uma bondade eterna
eis donde chegam os meus afectos
e nas artérias de seda cristal
crias novas meigas cores novos ligeiros ares
novos amantes tons
novos endurecidos ruídos
novo auroreal amor para eu continuar a ver
a ver-te debruçada sobre mar transparente
com veludo de orvalho entre os poros
a ver-nos encalhados continuando a moldar
brancos banhos
como numa nossa gargalhada
a dormir no cume de videntes astros adentro
só dessa maneira
estaremos destinados a tais grandes coisas
desviassem filamentos de pedras pomes ao lume
que mergulha o meu corpo violino
na devassidão das noites picantes conseguiria modelá-la
e antes disto ouvi-la transpirar estanque potência
entretanto faço parar o giro desse sol
em espiral indolente
para encher o tempo com sabor corajoso
solto-me do soluço maníaco
de um mar afrodisíaco dedal
tanto se mente a si mesmo como devora
o chilrear do aroma azul-celeste divertido
dessa alma apêndice a apêndice embalada
desculpem-me
se cravo as estrelas estrondosas à desprendida lua
sonâmbula
e a minha maciça boca tinge-se da alcova
entre o aconchegante céu de portas amordaçadas
onde potente tudo perdoo
Sei como te fazes
procurar pelo ar atmosférico
numa atribulação
formando delicadas
palavras clandestinas.
Basta fazeres-te naqueles dias
sem regaço à chuva
para simpaticamente assumir
a melancolia desfeita
como a tocar as alturas
sobre tremendas paisagens
a incidirem gentis, calmas, isoladas
e algumas letras
sem alívio sabotagem.
Ou pouco ninguém
diabolicamente se cantará
no instante da matéria a rodear
o peso bárbaro das mãos em espasmos.
Pedem pois vidas maravilhosas,
fazendo renascer o sopro casto
virado para dentro do pulso cantante
e bailas perante os teus dedos espantados
despenhando-os na pureza da carne a furar
a esplêndida noite dita
durante a curva do sangue intenso,
como se procurasse
a estabilidade daquilo que encontrei
porque tu, numa voz, o perdeste.
Senão,
encontras a luz esmigalhada
contra a pele
a estrangulá-la na fímbria
à cabeça crepuscular adentro.
Virarias um rolo de papel sôfrego
que não se percebe
enquanto atravessa naquela comoção
da próxima curva abstracta, céptica, iminente,
ensinando à parte,
quanta estrada chumbo
cheira os ganchos
quando roçam a ventania curiosa
entre corpos fortes.
Nem mesmo com a parada
de desejadas chaves frágeis,
em turbilhão,
por se fecharem,
inventas toda essa estrada de vitalidade
a manquejar pormenores sábios
mas realmente o farás
como outras palavras esgravatariam
o céu inteiro lá pelos lados empurrando
certas maravilhas que gráceis brilham.
Deitas-te entre joelhos
na dança de meus lábios deslizantes.
Como num edifício de bruma redonda,
ardes toda a boca pousada
onde o beijo me procura
e te sabe.
Devorei pulsos em chamas.
Amplamente o rosto envolto por coágulos de sangue luzidio
a trespassarem as veias estanques como a enrolar
as cores existentes
por dentro.
Certo é percorrerem
todo esse ar
que engole o corpo celeste mergulhado
na textura do nosso corpo temporal.
Fico com as mãos
cheias de ossos trancados.
Levanto
a cauda de um espelho
e alongo as vísceras astronómicas,
com bastante força química,
a dilatar numa circulação sanguínea
até a leveza
da garganta se alagar
na sombra líquida
das artérias
contra o alto esquecimento das coisas profundas,
contra os tendões severos a racharem a boca desvairada.
Relembro quando adormecia
sobre todas as
coisas vivas ou mortas
por fora.
Submetia os lábios
a girarem a voz louca
ao lume pedestre
e ardia pelo estremecimento terrível
dos nervos cabeça adentro,
donde múltiplas
estrelas demoníacas
a baterem-se em mim longamente
param, a pouco e pouco, a potência que nunca me sorriu
e vago ou inocente deixo de caber
nos sítios superficiais
à minha volta.
Releio todas as cumplicidades translúcidas
a moverem toda a pele num feixe de pérolas
das salgadas mãos,
aos braços a escorrerem aquele alimento
metidos nas águas sentadas
no túmulo dessas estrelas tubulares.
A destreza deste poema extingue-se quando as unhas
tocarem na carne abaixo, rompendo,
com sinceridade,
a desvastação simbólica
da escrita furibunda
ou silêncio furibundo
a pesar com delicada melancolia.
Ouço o rasgão
do corpo a sangrar
com os tecidos dos versos
a palpitarem porque se nomeiam
e se escrevem dentro
da pulsação ininteligível.
Por cima,
devoro os pulsos em chamas.