Coleção pessoal de bonecadepano
No início, os filhos amam os pais. Depois de um certo tempo, passam a julgá-los. Raramente ou quase nunca os perdoam.
Já não se encantarão os meus olhos nos teus olhos,
já não se adoçará junto a ti a minha dor.
Mas para onde vá levarei o teu olhar
e para onde caminhes levarás a minha dor.
Fui teu, foste minha. O que mais? Juntos fizemos
uma curva na rota por onde o amor passou.
Fui teu, foste minha. Tu serás daquele que te ame,
daquele que corte na tua chácara o que semeei eu.
Vou-me embora. Estou triste: mas sempre estou triste.
Venho dos teus braços. Não sei para onde vou.
...Do teu coração me diz adeus uma criança.
E eu lhe digo adeus.
A Dança/ Soneto XVII
Não te amo como se fosses rosa de sal, topázio
ou flecha de cravos que propagam o fogo:
amo-te como se amam certas coisas obscuras,
secretamente, entre a sombra e a alma.
Te amo como a planta que não floresce e leva
dentro de si, oculta a luz daquelas flores,
e graças a teu amor vive escuro em meu corpo
o apertado aroma que ascendeu da terra.
Te amo sem saber como, nem quando, nem onde,
te amo diretamente sem problemas nem orgulho:
assim te amo porque não sei amar de outra maneira,
senão assim deste modo em que não sou nem és
tão perto que tua mão sobre meu peito é minha
tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho.
Ainda que chova, ainda que doa. Ainda que a distância corroa as horas do dia e caia a noite sem estrelas, o mundo brilha um pouquinho mais a cada vez que você sorri.
E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei... Serás... Seremos...
Sou hoje um caçador de achadouros da infância.
Vou meio dementado e enxada às costas cavar no meu quintal vestígios dos meninos que fomos.
E, aquele
Que não morou nunca em seus próprios abismos
Nem andou em promiscuidade com os seus fantasmas
Não foi marcado. Não será exposto
Às fraquezas, ao desalento, ao amor, ao poema.
A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores
e até infinitos.
AMOR
Todas as palavras
de amor já foram ditas,
desde o começo,
todos os espantos.
E no entanto,
há que carregá-las
no bolso,
sempre ao alcance
das mãos,
há que desdobrá-las,
encharcadas de aurora,
de crepúsculo,
de tempo,
para que digam
uma e outra vez.
VIDA
A vida entra por minhas janelas
e com seus pregões e pássaros vai tingindo a casa.
Devassando os sonhos, desmanchando as teias,
desarrumando as sombras,
a vida com seus pequenos objetos fúteis.
Entra por minhas janelas em vento cheio de gonzos
e senta-se à minha mesa partilhando
comigo o café.
Adagas
há os que na vida
se sentem confortáveis
como se a vida fosse
uma velha conhecida
uma vitrine eternamente posta
eu por mim sou daquela
tribo errante
dos que já nascem
com as veias cortadas
atravessar planetas e horizontes...
e domesticar adagas
Poema das Bruxas
Metade de mim é fada,
a outra metade é bruxa.
Uma escreve com sol,
a outra escreve com a lua.
Uma anda pelas ruas
cantarolando baixinho,
a outra caminha de noite
dando de comer à sua sombra.
Uma é séria, a outra sorri;
uma voa, a outra é pesada.
Uma sonha dormindo,
a outra sonha acordada.
Quero asas de borboleta azul
para que eu encontre
o caminho do vento
o caminho da noite
a janela do tempo
o caminho de mim
Tateando Caminhos
passo as mãos no rosto
debaixo da minha pele
quem é esse ser que me habita
tão envolto em penumbras
qual cigana em seus panos?
que mulher é essa
fazendo de mim labirintos
como um peixe no oceano?
passo as mãos no rosto
feito um louco em seu passado
e nem me decifro nem me devoro
abro a janela e bebo a manhã
em grandes goles
Cada partido compreende que interessa a sua própria conservação não permitir que se esgote o partido contrário; o mesmo ocorre com a alta política.