Coleção pessoal de demetriosena
MEUS IGUAIS
Demétrio Sena - Magé
Tem um mundo apressado ao meu redor,
num estouro de gente sem destino,
numa dor coletiva que se oculta
em quem dança, quem malha e dá porrada...
Vejo muita pobreza em lixo e luxo;
como tudo está cheio de vazio;
fico murcho com tantos eus inflados
que desfilam nos palcos de quimeras...
Há um surto que ri de nervosismo,
auto estimas forjadas por pressão,
no mesmismo do posso, quero e faço...
Nas mazelas da minha realidade,
meus iguais estão cada vez mais presos
nessa desigualdade que os recolhe...
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Respeite autorias. É lei
RENÚNCIA
Demétrio Sena - Magé
Abro mão do que sinto por você;
deixo tudo voar; seguir o vento;
a razão me cobrou prioridade,
porque meu sentimento foi ferido...
Resolvi que não quero mais ficar
nesse creio-não creio em seu afeto,
em um mar de sentidos flutuantes
onde surfam certezas e temores...
Nunca mais catarei os seus abrolhos;
os meus olhos ficaram mais profundos
e conseguem romper as utopias...
Eu me venço da própria solidão;
eu me peço perdão por tanto tempo
que perdi como peça do seu jogo...
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Respeite autorias. É lei
SOCIEDADE MASCARADA
Demétrio Sena - Magé
Exclusão social tem muitas caras;
muitas bocas, palavras e silêncios;
tem aparas, disfarces e desenhos
com que torna seus danos aceitáveis...
Preconceitos vestidos de sorrisos
ou de gestos e traços cordiais,
têm avisos "fraternos" e fluentes
de quais são nosso canto e nossa vez...
Não entenda que teve a sua voz,
porque disse verdades permitidas,
desfiou seu retrós de frustrações...
Preconceitos expulsam dando a mão;
exclusão social parece abraço,
quando gente perversa quer aplauso...
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Respeite autorias. É lei
CONVERSÊ BÍBRICO
Demétrio Sena - Magé
Na longa fila do banco, a conversa entre dois idosos evangélicos, aparentemente conhecidos um do outro, estava bem animada:
- Paz do sinhô, irmão! Faz tempo que nóis não se vê!
- A paz, irmã! Sube que a sinhora tá com netinho novo! É home, né?
- isso, irmão! É um varão abençoado!
- Qual é o nome dele, irmã?
- É bíbrico, irmão; quero vê se o sinhô adivinha!
- Hum... é Jusé? Sadraque? Abidinego?
- Não. Vô dá só uma dica. É o nome da pessoa que botô os animá na arca de Noé!
- Aí a sinhora já disse! O nome dele é Noé!
- Noé? Não, irmão! O nome dele é Abraão! Foi Abraão quem botô os animá na arca!
- Não, irmã; foi o Noé mermo; ajudado pela famía!
- Nada disso! Eu sô professora da escola dominicá! Sei o que tô dizeno!
- Irmã, me adescurpe; mas acho que a sinhora tá inganada...
Foi, não foi; não foi, foi; parecia o poema OS SAPOS, de Manuel Bandeira. O diálogo foi esquentando, com ambos querendo saber mais que o outro, até que um senhorzinho franzino, enfiado em um terno laranja e com cara de veterano em assuntos "bíbrico" resolveu entrar na questão.
- Os sinhores me adescurpe; mas os dois tão errado. Não foi Abraão nem Noé quem botô os bicho na arca.
- Uai; mas entonce quem foi, se não foi nenhum deles? - Perguntou a mulher, com ares de muita indignação.
- É, eu tomém quero sabê; proque agora fiquei na dúvida. - Desafiou o outro.
- Foi Pilatos, meus irmão na fé... ocês tomém são invangélico, num são?
- Somo sim. Somo - Respondeu a mulher -; mas fala, irmão. Eu nunca sube dessa; que foi Pilatos quem botô os bicho lá.
- Eu tomém não; mas o senhô tem arguma prova? Prova mermo? Bíbrica?
- Os dois pense comigo: quem a Bíbria disse que lavô as mão? Num foi Pilatos?
- É; isso foi, mas... - A mulher tentou questionar.
- Pois entonce, meus irmão! Se Pilatos lavô as mão, foi proque as mão ficô tudo suja, de tanto animá que pegô!
- Agora o sinhô pegô nóis.
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PRA REVIVER
Demétrio Sena - Magé
Desta vez entendi que o que sinto é tão só;
tantos anos perdida no seu faz de conta,
que minha'lma ficou embevecida e tonta
por um laço que a mágoa transformou em nó...
De repente o castelo ao vento se desmonta,
como todos os sonhos se tornaram pó;
minha voz perde as notas, o que tenho é dó,
mas nem é musical; a música me afronta...
Sairei desta sombra, porque sempre o fiz;
tantos tombos na vida me deram destreza
pra seguir outra vez e tentar ser feliz...
Entre todos os meios de chegar ao fim,
decidi que não vou me render à tristeza
por alguém que brincava de gostar de mim...
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Respeite autorias. É lei
SOMOS MAIS
Demétrio Sena - Magé
Tem silêncios que avisam quase aos gritos
e com isso nos dão mais uma chance;
tantos males benditos nos despertam
por nuances que a vida não define...
Há palavras miúdas, mas tão fortes,
que nos tiram do caos na hora exata;
mudam sortes, futuros, trajetórias,
feito erratas que salvam documentos...
Nossos olhos precisam ouvir mais;
os ouvidos precisam ver mais fundo,
pois o mundo requer esse divã...
Nossas vidas não cabem nos viveiros
em que tudo é notório e previsível;
somos mais do que olheiros ou ouvintes...
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Respeite autorias. É lei
PRECONCEITOS
Demétrio Sena - Magé
Preconceitos, para mim, nem em forma de brincadeira; nem com aquela onomatopeia de risos ou disfarçados daquele "kkk". Piadinhas preconceituosas nunca têm graça para meus ouvidos... ou meus olhos. Aí, me fazem a pergunta: "Vai dizer que você não tem nenhum preconceito?". Não; não vou dizer, porque pelo menos um eu tenho... e profundo. Tenho preconceito de pessoas preconceituosas.
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Respeite autorias. É lei
MOMENTO ESPACIAL
Demétrio Sena - Magé
Retomei o controle do bom senso
que perdeu as estradas em você;
já não penso amarrado ao coração
nem ao corpo que andou desgovernado...
Não fiquei nos guardados do seu ego;
arrombei essa bolha e vim pra fora;
fiquei cego, porém, por pouco tempo
e agora consigo ver mais fundo...
Você foi um momento espacial
que deu asas forjadas ao meu sonho,
nesse mal provisório que fez bem...
Aprendi a ver mais do que meus olhos,
ao olhar mais atento e dar por mim;
foi o fim do que nunca começou...
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Respeite autorias. É lei
VERDADE MAIS SINCERA
Demétrio Sena - Magé
Nunca fui uma cela pros afetos;
quem foi preso, não foi porque prendi;
o meu teto foi sempre o céu exposto,
as paredes o vento em mutação...
Muitas vezes alguém me fez cativo
nos meus próprios limites, ao ficar
por motivos que nada explicaria
ou pra ser um conflito na minha'lma...
Sempre tive um apego à liberdade,
que ninguém entendeu, e atentei
contra minha verdade mais sincera...
Sou apenas um livre prisioneiro;
cativeiro e cativo, pois meu peito
vai e volta na mesma pororoca...
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Respeite autorias. Isso é lei
PLANETA MULHER
Demétrio Sena - Magé
A mulher quer usar a própria chave;
destrancar os caminhos, abrir mundos;
conduzir sua nave pro futuro;
não pros fundos do chão patriarcal...
Hoje sabe vencer a força bruta,
já é dona das próprias estruturas
e não foge da luta contra o medo
às escuras do sonho; da esperança...
Porque sabe que a terra é feminina;
despertou do silêncio milenar,
pra calar os arroubos dos covardes...
Ela soma com quem não subtrai
seus espaços e suas decisões;
as visões do planeta da igualdade...
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Respeite autorias. É lei
CURVA DO BOM SENSO
Demétrio Sena - Magé
Persisti na procura da certeza
do que havia em seu peito para mim,
sem achar que devesse desistir,
se não fosse do fim arrematado...
Quero sempre manter na consciência,
que não fui desertor, já no começo;
não voltei do que ainda viveria
nem cedi ao tropeço inicial...
Aprecio chegar onde se alcança
e não ter frustrações do que não sei,
pra nenhuma esperança se perder...
Caminhei o que havia sob o pé;
retroajo da curva do bom senso;
minha fé nesse laço não deu nó...
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Respeite autorias. É lei
REFLEXÃO PATERNA
Demétrio Sena - Magé
Ninguém escolhe o pai que terá. Ser filho é uma sorte favorável para uns, desfavorável para outros... na verdade, para maioria, sobre ter pai. Aliás, o número de filhos que nunca teve um pai, de fato nem de mentirinha, consanguíneo nem adotivo, é imenso. Infelizmente, há casos em que não ter a presença de um pai é melhor do que ter. É aí que tantas mães viram pais, o que não é comum vice-versa.
Ser pai é uma escolha. Essa escolha não pode ser apenas a de fazer uma filha, um filho. Ela deve ser intensa e verdadeira, do fazer ao criar, com afeto; provisão; orientação; acompanhamento presente, com todas as responsabilidades que acompanham o amor. Não entendo como alguém escolhe ter filho e não ser pai; "modelar" simplesmente, um ser humano, e não cuidar. Deixar de lado, abandonar ou ser presença negligente. Muitas vezes brutal; violenta; opressora.
Não chamo de abandono a separação da mãe, e sim, ao tornar essa essa mãe sua ex-mulher, também transformar o filho, a filha em ex-filho; ex-filha. O mundo está cheio de órfãos de pais vivos. Também há mãe que abandona, mas o número de pessoas criadas apenas pela mãe é incontável. São milhões que não têm ao lado nem nos registros de nascimento, a referência do pai. Só conhecem mãe.
Sonho com um tempo de mais filhos felizes. Mais pais presentes, em todos os contextos e sentidos. E de menos dias dos pais que só servem para muitos lamentarem ausências paternas ou presenças que seriam melhores como ausências. Espero que as minhas falhas como pai, até então, ainda estejam naquele grupo das que fazem um homem "passar raspando" em suas provas finais
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TEU MILAGRE
Demétrio Sena - Magé
Chego antes do corpo em teu abraço;
meu olhar é mais rápido que os pés,
os meus olhos, até os pensamentos
cujos passos flutuam de prazer...
Levo sonhos que a lua não explica;
minha noite se banha em teu luar;
tudo paira no ar dos meus pulmões
revolvidos nos panos de minha'lma...
Quando chego me deito ao teu redor,
meu amor já te louva igual fiel
e a dor já ganhou o teu milagre...
Entro antes de mim em tua rosa;
minha prosa liberta o meu poema
pra colher o teu pólen; fazer mel...
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Respeite autorias. É lei
MAIOR QUE TUDO
Demétrio Sena - Magé
O que sinto ti,
e não sinto muito por isso,
é maior do que meu medo;
minha ética;
meu compromisso...
minha estética social.
Maior do que todo status
(que não tenho),
do que meu empenho
pra parecer correto;
do que meu teto...
o bem; o mal...
o certo; errado...
Que toda história contada
e todo conto anti-fada
de santidade ou pecado.
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SOCIEDADES E SUB-SOCIEDADES
Demétrio Sena - Magé
Mazelas como preferências, exclusões e parcialidades que prejudicam os menos favorecidos e determinam quem é quem com base nos favorecimentos recíprocos, não são exclusivas da sociedade externa. São replicadas em sociedades restritas como locais de trabalho e de lazer, condomínios, escolas, grupos religiosos, academias (de ginástica e de letras) e aglomerados familiares. Onde convivem mais de três pessoas, há sempre como um ou mais mais membros criar e impor alguma forma perversa, mesmo silenciosa, de hierarquia baseada em quem precisa mais; quem precisa menos; quem tem maior prestígio ou prestatividade notória.
Não raras vezes, os mais influentes na sociedade externa serão também na interna, pelo status acadêmico, profissional ou religioso que tenha para ostentar. Às vezes, algum título adquirido; quem sabe um prestígio ilusório, conquistado com bajulações. Por esse reflexo, quem tem menos "pontos" em sociedades internas deve se prontificar a servir, concordar e obedecer, sempre que ordenado, sob pena de uma exclusão que fará ter inveja dos excluídos na sociedade externa. Há que se ter muito tato, no contato com ambas as sociedades. Ou com as sociedades e sub-sociedades.
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PINGO É PINGO
Demétrio Sena - Magé
Em algumas entrelinhas,
o contexto vira bingo
e precisa de clareza...
Na leitura dos olhares,
para mim o pingo é pingo,
por transparência; franqueza...
No cultivo do poema,
só a rima não faz feira;
é apenas uma rima...
Dê um texto pro seu tema,
porque só a chuva inteira
dará certeza do clima...
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TÃO NINGUÉM
Demétrio Sena - Magé
Minhas forças são fracas pra minhas fraquezas,
meu estado é de coma na cama da alma;
tenho tantas certezas, mas todas incertas,
numa calma nervosa que me fantasia...
Faço todas as poses de pouso seguro,
porque vivo de fugas da morte precoce,
há um porto inseguro que ancora meus medos
e dá posse aos assombros das noites eternas...
A fraqueza tem força que me faz dobrar
feito galho delgado e fibroso no vento,
mas o meu pensamento resiste à pressão...
Eu me venço e me perco derrotado em mim,
sou alguém tão ninguém para tantos estágios
de vertigens, presságios e contradições...
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Respeite autorias. É lei
RESISTÊNCIA
Demétrio Sena - Magé
Se não viro esse disco é porque na verdade
minha indignação não é moda fugaz;
novidade volátil que perdeu a massa
feito gás ao ar livre; nos braços do vento...
E não viro esse disco porque sou assim;
digo não ao silêncio, se vejo injustiça;
vou ao fim do meu sonho de mundo melhor,
e sonhar, no meu caso, não perde sentido...
A canção da maldade não saiu do ar,
a má fé não cedeu e o preconceito medra,
ninguém pôs uma pedra sobre o fanatismo...
Pra virar esse disco eu preciso sentir
que será sem mentir sobre ter esperanças
nas mudanças viáveis e na resistência...
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Respeite autorias. É lei
TODO MUNDO
Demétrio Sena - Magé
Na verdade, ninguém me surpreende;
as pessoas são isso; são pessoas;
todas boas, perversas como eu;
meus espelhos em seus desdobramentos...
Fico triste, raivoso, alegre ou calmo,
mas entendo que tudo é de quem somos;
temos nossos momentos, nossas vezes,
nossos gomos de nós em cada fase...
Somos todos iguais nas diferenças
ou nas ordens inversas, nas medidas
e nas crenças de sermos algo além...
Ninguém vai me pegar desprevenido;
não me sinto traído, porque sei,
todo mundo é apenas todo mundo...
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Respeite autorias. É lei
NÓS E O EU
Demétrio Sena - Magé
Empatia
é amar ao próximo como a si mesmo.
Auto estima
é amar a si mesmo como ao próximo.
Narcisismo
é só amar a si mesmo.
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Respeite autorias. É lei