Coleção pessoal de DamVob
Nada se movimenta quando as cabeças estão paradas. Malditos sejam todos os intermediários, catapultadores de mentes, atravessadores gananciosos e entregadores de mensagens mediúnicas truncadas aos deuses da covarde preguiça humana.
Aprendemos a nos emocionar com a ficção enquanto perdíamos a capacidade de nos sensibilizar com a realidade. Mas o que mais poder-se-ia esperar de seres montados sobre bases falsas, cuja hipocrisia é mais latente que seus próprios corações?
Família: ou você tem, ou não. Se não tiver, nem tente formar uma. É bem possível que a mesma já nasça desfeita, por sua falta de intimidade com o conceito.
Nossa existência representa um curto período de corrente alternada dentro da incomensurável corrente contínua da eternidade. E toda nossa metafísica se resume na questão: consiste uma tal corrente contínua de vida consciente... ou de inconsciente morte? A julgar pela banalidade de toda experiência, mesmo os mais otimistas deveriam rever seus conceitos fantásticos, aceitando a impossibilidade de uma eternidade saudável para uma mente tão mesquinha quanto a humana.
Há uma classe de homens que parece deslocada no tempo, estranhamente decadente, ao menos aparentemente. Há uma classe de homens que não se envolve com os delírios de sua época, de todas as épocas, misantrópica e isolada em uma espécie de orgulho senil e rabugento. Há uma classe de homens que superaram a classe dos homens, para a qual toda humanidade não passa de um grupo choroso de crianças perdidas num parque sombrio, esquecidas pelos pais, sem ter a quem recorrer. Nenhum adulto por perto... e as crianças imaginam pais que jamais tiveram, órfãs estrepitosas que são desde seu incerto nascimento. Há uma classe de homens que compreendeu isso, entendendo também a inutilidade de suas fantasias.
Beber um mar de vinho e naufragar na própria insuficiência. O que se é? Um micróbio nadando contra a corrente. Nunca deixando de ser um espermatozoide perdido no dédalo de um útero seco, de ovários arenosos e óvulos de pedra.
Não há o que fecundar na vida além da aridez da vida em si.
Se eu pude aprender algo no decorrer da vida até aqui é que depois de uma certa idade torna-se impossível fazer verdadeiros amigos. Talvez isto de deva a um mecanismo do cérebro que se atrofie com o passar do tempo, alguma pane de natureza sinistra no sistema límbico ou o irremediável azedume da pituitária, qualquer coisa do gênero. E tudo que se pode fazer diante de tais circunstâncias é lutar pela conservação dos amigos que foram feitos, lutar consigo mesmo, na maioria das vezes.
Como se ver livre dos discursos hipócritas? Se eles estão em toda parte, inclusive dentro da gente. A racionalidade é um discurso hipócrita.