Coleção pessoal de CarinaSBarros
Lavar a bicicleta cedinho no quintal faz-me recordar a minha infância. De quando eu, o meu irmão e a minha irmã ligávamos a mangueira, pegávamos os produtos de limpeza escondidos da mamãe e ficávamos a manhã inteira com a bicicleta de cabeça pra baixo disputando quem deixava o quadro mais limpo e os aros mais brilhantes. Era uma verdadeira festa. Sempre nos divertiamos fazendo as coisas mais simples dessa vida. Hoje, cada vez que jogava a água na bicicleta e ela caía molhando os meus pés, eu recordava de nós e dava um sorriso. Um sorriso leve, que faz eu me sentir gente-viva e me ensina que nessa vida, o que importa não é o dinheiro, muito menos o poder, o status ou as riquezas materiais. O que importa é o que permenece dentro da gente mesmo quando o outro decide/precisa voar. Sigo aprendendo diariamente, buscando remar contra a maré do ter/parecer, carregando o coração, a voz e a resistência para onde vou. Amar e mudar as coisas, como diria Belchior, me interessa muito mais.
Estávamos eu e minha sobrinha, Ana Liz, no quintal quando ela viu a chuva cair pela primeira vez. Tinha apenas três meses de idade. O olhar atento sentindo as gotas cair no chão, nas plantas, ao seu redor. Tamanha calmaria, leveza, sensibilidade. Ela foi crescendo, e nos dias de chuva aprendendo a tocar na àgua que caia sobre as suas pequenas mãos. O olhar fixo parece que está contando gota por gota. Além de enxergar a chuva, ela sente. Além de sentir ela transborda, e me ensina a reparar a beleza das gotas caindo sobre nós, sobre o mundo. Ana Liz desde pequena aprendeu a gostar da chuva, talvez ela gosta de ser regada como as flores. A cada chuva que cai, Ana Liz floresce, cresce, cria raízes. Ela me ensina sobre as etapas da vida, o tempo, o reeinventar. Hoje, quinta-feira, da janela do ônibus vejo a chuva que cai em Fortaleza, penso na Ana Liz, recordo do seu olhar atento e sigo. Resisto aos maus tempos, a desesperança, o medo. Assim como a Ana Liz hoje deixarei a chuva me regar para que possa brotar flores de resistência no meu peito. R(e)existo. Vamos juntas pequena, estamos juntas.
Se eu pudesse falar pela poesia e a poesia pudesse falar por mim certamente eu falaria neste 8 de março sobre aquelas mulheres borboletas que criam os seus filhos sozinhas e a sociedade as julgam chamando de mães solteiras
Se eu pudesse falar pela poesia e a poesia pudesse falar por mim certamente eu falaria hoje sobre todas as mulheres guerreiras que enfrentam duras filas, sol, chuva e humilhação na porta dos presídios para visitar os seus filhos porque eu sei sociedade que a culpa não são delas não
Se eu pudesse falar pela poesia e a poesia pudesse falar por mim certamente eu falaria da Dona Inês que recolhe material reciclável todos os dias pelas ruas de Fortaleza e não desiste de sorrir porque tem a capacidade de enxergar a felicidade nas coisas mais simples da vida
Se eu pudesse falar pela poesia e a poesia pudesse falar por mim certamente eu falaria de todas as mulheres benditas de histórias tão bonitas que se tornam invisíveis nesse mundo onde o ter é bem mais importante do que o ser
Se eu pudesse falar pela poesia e a poesia pudesse falar por mim certamente hoje eu faria um simples pedido para que todas as mulheres fossem livres para conjugar o verbo amar e acima de tudo que todas fossem livres e felizes no caminhar
Poesia, Mulher
Resistimos
Mulher, Poesia
Existimos
O nosso dia certamente são todos os dias
O dia tinha sido pesado, a cabeça dava voltas e o coração apertado. Sento na rede e canto uma canção para nós duas. Ela ouve a minha voz, me olha com um sorriso no canto da boca como já soubesse quem eu sou. Em seguida vem aquele olhar mais profundo e atento que me enxerga para além da minha cor, roupa, cabelo bagunçado, rosto cansado de quem passou o dia realizando atendimentos e ouvindo histórias de pessoas invisíveis para o mundo, que dói, dói na alma. Desde os primeiros dias de nascida que ela tem essa mania de segurar os meus dedos, mas dessa vez veio de um jeito diferente. Ela segurou a minha mão com uma força e um afeto tão bonito, que por alguns minutos eu me esqueci de tudo que estava me afligindo naquele dia. [...] Como o afeto, a mão junta/estendida, o abraço e o olhar sem pressa nos salva de dias em que nos sentimos humanamente frágeis e sem esperança. Sim, pequena Ana Liz, precisamos de mãos unidas para continuarmos caminhando em tempos tão difíceis. Um dia, pequena da titia, todas nós voaremos alto, livres e felizes. Num mundo mais justo e humano, um dia...
Céu azul distante. cheio de pequenas estrelas. enxergo no cantinho uma lua que sorri. aqui bem perto caminhando vejo crianças vendendo bombons nos sinais. enquanto isso segundo turno. políticos falando mentiras nos jornais. para eles a solução é. mais policiais policiais policiais. olho para o céu novamente. a lua? continua sorrindo. as crianças? nos sinais. e os políticos? nos jornais. e a solução? mais policiais policiais policiais... são tempos difíceis. respiro. busco forças. sigo.
Hoje cedo eu conheci duas borboletas coloridas, mãe e filha. A borboleta mãe com os olhos cheios de lágrimas me narrou uma história difícil, doída, cheia de julgamentos e violações. Os nãos recebidos durante a vida lhe impediram de voar para alguns lugares. Aqueles nãos tecnicistas/juridicistas, que enquadra o outro em regras/leis/portarias teve a capacidade de cortar as asas de uma borboleta que foi feita pra voar, voar alto. (...) Enquanto isso a borboleta filha voava livremente na sala de atendimento, cheinha de leveza, com o sorriso estampado no rosto, sem nenhuma preocupação. E com as asas ainda pequenas, aproximou e me abraçou com tanta força como se eu fizesse parte do seu jardim encantado. (...) Duas borboletas coloridas, uma de asas cortadas, machucadas por seres humanos que não compreenderam a sua história, cheia de nãos violadores e cruéis. A outra, ainda pequena, com as asas inteiras, que abraça sem medo, segue acreditando que todos são habitantes de um jardim livre, igual e humano. Duas borboletas humanas que transformaram o meu dia. No final desse encontro ficou a indignação pelas violações de direitos narrados, mas também, a esperança de que a borboleta filha, ao contrário da mãe, seja vista como gente humana e sentida com mais cuidado, afeto e justiça para continuar voando livre, alto e feliz.
Aprendi com um poeta que a saudade tem gosto de algo, alguma coisa. A saudade que eu sinto hoje tem nome de irmão mais velho, gosto de proteção, de mãos dadas voltando da escola, de frutas que tirávamos do pé de árvore, das voltas de bicicleta no fim de tarde. Tem cheiro das brincadeiras de infância, de corda, elástico, amarelinha, vólei na garagem. A saudade hoje tem gosto de tanta coisa, e mais que isso, ela me faz lembrar que nessa vida, o que fica de verdade, é o amor sincero que damos ao outro, são as histórias... Ah saudade danada, ás vezes tu vens só pra me lembrar: o tempo é hoje, repara menina, olhar atento e peito aberto. Segue.
Voa passarim, sem medo, pra onde o teu coração deseja estar
E quando quiseres um ninho tu sabes onde pousar
Voa passarim que a vida é feita de encontros
E pra chegar em alguns lugares é preciso ousar
Voa passarim, tu és livre pra conjugar o verbo amar
Voa... Pousa... Ama... Ousa...
Há um mundo inteiro para revolucionar
Ainda bem que na amizade verdadeira a gente não precisa esconder a dor, o sorriso, o choro, a tristeza, nem a alegria. Não precisa ser rico, belo, alto ou forte. Não precisa concordar, nem elogiar. Não precisa fingir ser ou ter. Na amizade verdadeira o amigo permite ao outro ser ele mesmo, com defeitos e qualidades.
De vez enquando eu volto no tempo e lembro daqueles momentos verdadeiros que a distância, a saudade, nem o tempo foram capazes de apagar. Dizem que o verdadeiro fica guardado dentro da gente ocupando o espaço das coisas eternas, naquele espaço que muita gente chama de coração. É bem lá dentro que eu guardo vocês, meus amigos. E o tempo nem existe lá dentro.
Entra aqui, deixa lá fora essas regras do mundo moderno que diz que você é o que tem. Esquece essa ideia de querer mostrar para o outro aquilo que não é. Tira essa máscara do rosto. Mostra- me suas qualidades, mas acima de tudo seus defeitos e medos. Você não é uma máquina que vive feliz e sorridente. Senta aqui e me conta da sua vida, dos seus sentimentos, do que faz você sorrir. Eu quero saber sobre você , das suas manias. Eu quero acreditar que você é mais que essa roupa que veste, que esse carro que anda, que essa tela de computador, que essa vida de fantasia que leva. Eu quero conhecer a tua essência, a tua vida do lado de dentro, a tua pessoa de verdade. Vem... Eu também sou humana como você.
Não perde tempo acumulando no coração aquilo que é passageiro. Expulsa o falso, abre espaço para os sentimentos verdadeiros, eles chegam e permanecem pra sempre.
A vida pode até ser pública, mas o coração é privado e só entra quem tem a senha. E não adianta querer invadir, ele tem segurança que conhece os moradores pela alma.
Hoje eu só quero carregar comigo sentimentos bons. Aqueles que me levam a sorrir e a sonhar. Sentimentos bons que me faz ter esperança e alegria. São com eles que hoje eu vou caminhar. Bons sentimentos, porque são eles que me faz acordar diariamente acreditando que a vida e as pessoas podem ser bem melhores, apesar de tudo. Esperança.
Ah tempo, não sei se rezo pra tu passar ou se rezo pra tu voltar. É que tem dias que a saudade doí mais que o normal...
Amizade: Quando a gente tem certeza que aquela pessoa está e estará sempre ali, independente do tempo ou lugar. E que mesmo conhecendo nossos limites e defeitos, sem motivo ou recompensa, decide permanecer fazendo diferença...
Não gosto de estar em lugares onde não quero estar ou onde não me cabe. Nem de multidões e excessos vazios. Muito menos de modismo. Gosto mesmo é de lugares e de pessoas que fazem me sentir em casa. De presença simples, de conversa que olha nos olhos, de abraço sincero. Não consigo me adaptar com modas, elas são passageiras e costumam tratar ser humano como objetos e objetos como gente humana. Coisificação de ser humano comigo não, somos gente de muito valor pra ser tratados como coisas, objetos, tanto faz.
Ah lua, quanta beleza e simplicidade. Hoje resolveu guardar todos os sorrisos do mundo, todas as estrelas do céu, todos os motivos para a felicidade. Cabe tudo, sempre cabe tudo nela. Cabe uma eternidade inteira.