Coleção pessoal de camilaisabela

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Possuir é perder. Sentir sem possuir é guardar, porque é extrair de uma coisa a sua essência.

A experiência direta é o subterfúgio, ou o esconderijo, daqueles que são desprovidos de imaginação. Os homens de ação são os escravos dos homens de entendimento. As coisas não valem senão na interpretação delas. Uns, pois, criam coisas para que os outros, transmudando-as em significação, as tornem vidas. Narrar é criar, pois viver é apenas ser vivido.

A vida prejudica a expressão da vida. Se eu vivesse um grande amor nunca o poderia contar.

A única atitude intelectual digna de uma criatura superior é a de uma calma e fria compaixão por tudo quanto não é ele próprio. Não que essa atitude tenha o mínimo cunho de justa e verdadeira; mas é tão invejável que é preciso tê-la.

As figuras imaginárias têm mais relevo e verdade que as reais.

Ver e ouvir são as únicas coisas nobres que a vida contém. Os outros sentidos são plebeus e carnais. A única aristocracia é nunca tocar.

Tenho pensamentos que, se pudesse revelá-los e fazê-los viver, acrescentariam nova luminosidade às estrelas, nova beleza ao mundo e maior amor ao coração dos homens.

Eu não tenho muitas respostas. O que eu tenho é fé. E uma vontade bonita, toda minha, de crescer.

Às vezes, na estranha tentativa de nos defendermos da suposta visita da dor, soltamos os cães. Apagamos as luzes. Fechamos as cortinas. Trancamos as portas com chaves, cadeados e medos. Ficamos quietinhos, poucos movimentos, nesse lugar escuro e pouco arejado, pra vida não desconfiar que estamos em casa. A encrenca é que, ao nos protegermos tanto da possibilidade da dor, acabamos nos protegendo também da possibilidade de lindas alegrias. Impossível saber o que a vida pode nos trazer a qualquer instante, não há como adivinhar se fugirmos do contato com ela, se não abrirmos a porta. Não há como adivinhar e, se é isso que nos assusta tanto, é isso também que nos dá esperança.

É fácil amar o outro na mesa de bar, quando o papo é leve, o riso é farto, e o chope é gelado.
É fácil amar o outro nas férias de verão, no churrasco de domingo, nas festas agendadas no calendário do de vez em quando.
Difícil é amar quando o outro desaba. Quando não acredita em mais nada. E entende tudo errado. E paralisa. E se vitimiza. E perde o charme. O prazo. A identidade. A coerência. O rebolado.
Difícil amar quando o outro fica cada vez mais diferente do que habitualmente ele se mostra ou mais parecido com alguém que não aceitamos que ele esteja.
Difícil é permanecer ao seu lado quando parece que todos já foram embora. Quando as cortinas se abrem e ele não vê mais ninguém na plateia. Quando o seu pedido de ajuda, verbalizado ou não, exige que a gente saia do nosso egoísmo, do nosso sossego, da nossa rigidez, do nosso faz-de-conta, para caminhar humanamente ao seu encontro.
Difícil é amar quem não está se amando.
Mas esse talvez seja, sim, o tempo em que o outro mais precisa se sentir amado. Eu não acredito na existência de botões, alavancas, recursos afins, que façam as dores mais abissais desaparecerem, nos tempos mais devastadores, por pura mágica. Mas eu acredito na fé, na vontade essencial de transformação, no gesto aliado à vontade, e, especialmente, no amor que recebemos, nas temporadas difíceis, de quem não desiste da gente.

Mas não tenho mais tanta pressa. Comecei a aprender a ser mais gentil com o meu passo. Afinal, não há lugar algum para chegar além de mim. Eu sou a viajante e a viagem.

O amor, devagarinho, esgarça o tecido que veste as nossas defesas e deixa a nossa alma toda de fora. Depois, sorri, encantado, diante da beleza singular da nossa nudez.

Muitas vezes dizemos amar, mas estamos só desrespeitando. Dizemos amar, mas estamos só impondo. Dizemos amar, mas estamos só olhando para nós mesmos. Dizemos amar, mas estamos só fazendo adoecer as belezas disponíveis. Dizemos amar, mas estamos só amarrando sementes e calando primaveras. Dizemos amar, mas estamos só inflando nuvens que escondem cada vez mais o sol. Dizemos amar, mas estamos só dizendo. Amor tem outro cheiro. Outra natureza. Outra frequência. Outro chamado. É para ser luz pra dois, com todas as sombras de cada um.

Todos os amores deveriam ser possíveis.
Pessoas não deveriam chegar nem antes nem depois.
Tudo deveria ser exatidão.
Pontualidade vital para que o amor aconteça.
A Terra deveria girar com esse único propósito: O encontro das almas.
O resto seria resto.
E tudo seria pra sempre
Brilhar pra sempre.
Brilhar como um farol.
Brilhar com brilho eterno.
Gente é pra brilhar.
Esse é o meu slogan.
E do sol.

Não deixe para depois. Depois é um tempo sempre duvidoso. Depois é distante daqui. Depois é sei lá.

Tem dia em que eu acordo e, de verdade, pouco importam as minhas dificuldades, sejam elas até já desgastadas pelo tempo, sejam elas viçosas, recentemente inauguradas, tudo me parece perfeito. Tudo é como pode ser agora, eu estou onde consigo estar, o tempo das coisas é o tempo das coisas, e isso vale também para cada pessoa que compartilha a sala de aula comigo.

Tem dia em que eu acordo e faço contato com uma gentileza tão linda que desconhece essa história de acertos e erros, sejam meus ou alheios, viver é trabalhoso e todo mundo se atrapalha, de um jeito ou de outros. Toda gente só precisa de consciência, cura e amor. Toda gente só quer ser feliz. Não há motivo para pressa e também não há estagnação, eu permito que a vida possa simplesmente fluir, sem tentar, em vão, amarrar ou alterar o jeito de dizer das suas ondas.

Este sentimento pode durar poucos quarteirões do dia, um monte deles, até mesmo só alguns centímetros de passo, enquanto dura é absoluto. E eu me sinto feliz e grata por tudo, vejo amor, mestria, chance de aprendizado, em cada ínfima coisa que me acontece. Ainda que chova, e às vezes chove muito, a memória da ternura luminosa e imutável do sol faz eu lembrar da natureza preciosa da vida. O sol não vai a lugar nenhum, ele fica exatamente onde está, mas a nuvem, a chuva, sempre passam.

Tem dia em que eu acordo lindeza e coloco bobagem pra dormir porque a nítida prioridade é a harmonia do meu coração, o contentamento natural capaz de me nutrir, proteger e me ajudar a seguir. Este sentimento pode durar poucos quarteirões do dia, um monte deles, até mesmo só alguns centímetros de passo, enquanto dura é lembrança da realidade divina perene que é sol por trás da temporária nuvem, da temporária chuva, que possam molhar os olhos da personagem. Enquanto dura é alegria e descanso e eu lembro do que, de verdade, me importa.

Nos raros e vastos instantes em que consigo experimentar a liberdade da ausência de expectativas, costumo receber melhor o presente. Um bocado de vezes, recebo o presente melhor. Enquanto eu o desembrulho, percebo, em geral um tanto surpresa, que não preciso necessariamente que algo mude para eu ser feliz porque já sou. Apesares, pesares, incluídos.

É claro que os acréscimos são muito bem-vindos.

A gente não precisa de certezas estáticas. A gente precisa é aprender a manha de saber se reinventar. De se tornar manhã novíssima depois de cada longa noite escura. A gente precisa é saber criar espaço, não importa o tamanho dos apertos.

Parece milagre, mas as sementes de cura começam a florescer nos mesmos jardins onde parecia que nenhuma outra flor brotaria. A alma é sábia: enquanto achamos que só existe dor, ela trabalha, em silêncio, para tecer o momento novo. E ele chega.

Às vezes eu tenho a impressão de que alguns sorrisos são ondas que começam no coração, brincam de sol nos olhos e, instantaneamente, levam clarão para a boca, para o rosto todo, para a vida inteirinha.