Coleção pessoal de cacaubraga
Se você não lutar pelas coisas que você quer e ficar esperando sempre o melhor momento pra tudo, vai acabar caindo no esquecimento. Enquanto você é dúvida, alguém é certeza. E é assim em todos os setores da vida.
Esquecer, para mim, é tão natural que me espanta quando algo fica na minha cabeça! Se você é uma dassas pessoas das quais eu lembro sempre, pode se sentir um mistério!
Tinham cinco estrelas perto do chão, cada uma com um brilho diferente e o céu contemplava a luz que subia intensa!
No meio da noite
Sentada no banco
O banco que se esconde atrás do jardim
A madeira é aconchegante
Ela entende como a solidão é má
A madeira e a menina
A menina é má ou a menina entende?
Não importa
A lua não precisa de detalhes para consolar
A menina percebe que não está sozinha
Ela tem o gelo do banco e o rosto da lua
O rosto que a menina aprendeu a notar cedo
Via nele um rosto triste
Onde a mãe via um coelho
COISA DE SEGUNDO
Passos lentos
Arrastados
Complicados
Confusos e silenciosos
Até o ar sai em silêncio
Como se precisasse se esconder
Como se fosse errado se mover
A boca nem se atreve a abrir
Mas também não consegue se manter serena
Fica tensa e mordisca os lábios
Enquanto os olhos acompanham tudo
Absolutamente tudo
Até o ar que não sai
Até a lembrança que não some
Até a água que deles não cai
E os passos...
Lentos...
Flutuam por falta de opção
Pelo menos até encontrarem outra vez
O chão.
POUCO DE TUDO
Naquele momento a saudade esperava mais
Mais emoção
Mais vontade
E até mais agonia
A saudade achou que era muito grande
Mas o corpo reagiu de forma estranha,
Calmo demais
Ficou seco
Uma dorzinha contínua, mas fraca
A saudade não parou como deveria
Saudade estranha essa que fica mesmo quando não tem motivo de ser
Pois como sentir falta de alguém que está presente?
E como sentir tão pouco de tudo?
Vai ver não fazia tanto tempo...
Vai ver a importância era pequena...
Pode ser que até que nem merecesse emoção alguma
Mas, certamente, era saudade.
Você
Com esses grandes olhos de jabuticaba
Grandes para mim...
Pretos como aquela noite
Quando o escuro aprendeu a ter luz, e ainda sim ser escuro...
Você
Que fala com as mãos, os pés, a nuca
Poupando a boca de muitas palavras
Esperando que os lábios só saibam beijar
Você
Um copo de vinho, um sofá e um filme
Tão previsível final
Inusitadas lágrimas
Você
E seus dedos encontrando as notas
Me procurando pela sala, talvez?
Você
Simplesmente comigo
Eu
Simplesmente com você
A FALTA
Um vazio de palavras que não suporto! Os sentimentos por vezes são tantos que os pensamentos não acompanham de modo algum. Correm, mas não chegam! Indecifráveis verdades rondam meus dias... e as noites são absolutamente mudas. Dê-me ao menos notas ou sorrisos e lágrimas! Grite, mas esteja! Desvende meus olhos, oras! Mas, faça-me o favor: explique-me... se as palavras sumiram no exato momento da sua ausência, não acha que em algum bolso seu elas devem estar? Como então devo falar-te da falta que me faz se tudo o que me resta são letras esparsas? Complicado te encontrar... mais complicado ainda te deixar.
JAVALI
Como quem lamenta muito ela me disse e eu imediatamente questionei:
- Um javali? Por que justo um javali?
Ela não tinha uma resposta, simplesmente deu de ombros e suspirou. Com tantos bichos no mundo ela queria justamente um javali?! Não fazia sentido algum para mim:
- Por que não um gato felpudo ou um cachorrinho pidão? Um coelho branquinho ou ainda uma chinchila?!
Ela jogou-me um silêncio que ecoou pela sala. Pensei que poderia dar-lhe mais opções:
- Tem gente que cria iguanas ou miquinhos. Já vi até cobra e aranha tratados a pão-de-ló!
Ela olhou-me fixamente:
- A escolha já está feita!
Eu dirigia e ela indicava o caminho. Faria a sua vontade, mas não teria como entender a estranha preferência. Pensava nos possíveis motivos... nada parecia razoável! Quem sabe não estava em busca de algum animal mais selvagem? Um tigre não seria melhor, nesse caso? Pelo menos seria extremante belo e com porte de felino, ao contrário de um porco desengonçado e peludo! Ela olhava através da janela ansiosa pela chegada, estava deveras decidida, mas eu ainda via um lamento naquele olhar:
- Tudo bem, nós vamos buscá-lo, eu respeito a sua decisão. Não precisa ficar assim...
- Você não entende... Eu quero muito esse javali, mas ele não me quer!
Pulou do carro nesse instante quase junto com a parada dos pneus! O lugar era aberto, um grande pasto. Ela andou devagar se aproximando de uma touceira e logo apareceram dois pequenos olhos no meio da vegetação. Eu não precisava de mais nada! Estava claro feito o sol... Cinco segundos olhando nos olhos do animal para entender o que ela sentia. Duas horas inteiras para concluir que eu também não saberia explicar!
Antes que se pudesse pensar, o javali sumiu por entre as árvores que rodeavam o pasto.
MAR DE ROSAS
Foi de súbito! De repente os sentimentos se viram quietos demais, parados no espaço como se estivessem num vácuo inesperado. Nada de intenso surgia pela mente que, como que em filmes de ficção, sentia-se sugada, oca. Só era possível captar paz. Os sorrisos, as cortesias, afagos, conquistas... tudo estava guardado na “meia-memória”. A lembrança tratou de jogar fora os maus bocados que pesavam inconscientemente. Tudo o que justificava a existência do rancor e dos males que o mundo trazia fora ignorado de uma hora para outra. Não como uma opção! Não! O corpo simplesmente resolveu tomar as suas providências, e os outros seres do mundo – todos eles!- fizeram o mesmo. Eu... Ah, eu... Que era dura feito uma rocha, azeda e inexorável, fiquei oca. Sim, oca! O conhecimento não encontrava uma forma de entrar em mim! Eu não precisava mais da educação que aprendi quando menina. Quem lembraria as minhas ofensas? As mentes livravam-se imediatamente das lembranças ruins, sem deixar tempo para tristezas, raiva ou revide. Então, como o previsto, era também o fim das reconciliações, desentendimentos, corações partidos, provas de amor... Aliás, o amor ficou seco, sem sentido. Se só existia amor, qual a importância que ele teria?
Então a vida virou um verdadeiro mar de rosas. Rosas penduradas num dos quadros da parede.
DESCRIÇÃO
O salto deixa o chão delicadamente
E volta a tocá-lo
Como um cetim caindo sobre a pele
O chão ganha desenhos imaginários
De círculos imperfeitos
Mas que ficam em harmonia
Com os outros muitos
Que há pouco foram desenhados
Segundo as regras dadas pelo ar
Ar pesado de ritmo.
Círculos perfeitos roubam a cena,
A atenção e tudo mais
Olhos atentos aos olhos alheios
-Nossa primeira dança-
As letras vinham meio perdidas
No meio das folhas do livro
Aquelas informações meio sem sentido
Em meio a gráficos e estatísticas
Provaram que tudo era meio insosso
Mera questão de oxitocina e não existia meio-termo
Meio cá meio lá eu acabei perdendo a certeza
E me vi sentada naquele meio-fio
Em um meio que não me pertencia
Meio atônica e amuada
O sol do meio-dia fervendo a cabeça
Apenas na companhia do meio–busto que me fitava pensativo
E foi por meio dele que concluí:
Aquela atopia científica meio lógica
Não passava de um meio utópico de classificar o amor
BRANCO
Os espaços em branco
São muitos
O branco aparece em todo lugar
E, ao contrário da paz,
Ele traz conflito,
Vazio...
O vazio conflita com o todo
Porque é algo que não deveria existir
Com tanto de tudo
O vazio não cabe
Nem para trazer o eco
Nem para ilustrar a solidão
O CICLO
Faz, cansa, pára
Quer continuar
Porque parar também cansa
Continua, faz, cansa
Quer parar
Porque continuar cansa
Pára, cansa, continua
Mesmo cansado quer continuar
Continua, cansa, pára
Mesmo parado quer cansar
Então pensa...
E começa tudo outra vez.
SÓ PALAVRAS
Tudo que vira palavra
Antes era sentimento
Pensamento vago ou insistente
Vontade de sair correndo
E a palavra escrita
Não é nada mais que um grito preso
De quem não sabe querer
Fernando estava certo:
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer