Coleção pessoal de brunobarcellos
Pessoas pacíficas também promovem o caos.
Em geral associamos sabedoria à calma ou mansidão, e contém alguma verdade, pessoas pacificas conseguem controlar melhor seus sentimentos e contornar os conflitos.
Mas há algum tempo um amigo repete que tudo depende da dose, e eu sigo este mantra. A fronteira entre a pacificidade e a passividade é muito tênue e se vai de uma à outra dependendo da dose.
No meu baú de memórias também guardo a frase de uma outra amiga, é necessário o confronto para evitar o conflito, e confrontar é olhar nos olhos, de frente, e assim se expor.
Muitas pessoas em busca de uma relação pacificada fogem dos confrontos e acabam vivendo em conflitos, conflitos com o que desejam, com o que recebem, com o que suportam e com o que calam.
A tentativa de não brigar a qualquer custo muitas vezes corroem como ácido a relação, e assim vivem uma relação vazia, mas "pacífica". Um peito vazio, mas ainda sim, farto.
Relacionamento envolve ação, movimento, atitude, se lançar em direção ao que deseja e na construção da relação com o outro.
Assim, o alerta é para que não confundam pacificidade com anulação, harmonia com servidão, opinião com agressão, justiça com abstenção e não transforme em dívida a gratidão.
Se tivesse me escutado
O abismo teria sido notado;
O esforço teria sido economizado;
O desentendimento contornado;
O carinho preservado;
O medo superado;
O sofrimento evitado;
O amor libertado;
Ah, se eu tivesse me escutado.
Gentileza não é natural.
As vezes precisamos complicar as coisas para levarmos a sério, e reduzir a ideia ao "não custa nada" nem sempre ajuda.
Ser gentil está muito longe de um gesto natural, pois a sobrevivência é sempre egoísta, sempre está em jogo o cada um por si.
Quando conseguimos ser gentis é uma enorme sofisticação, é um ato complexo, pois significa conseguir perceber algum benefício indireto, ou seja, ser gentil ou generoso ao longo de um processo também nos trará algum benefício em algum momento.
Ser egoísta é priorizar a mim primeiro é muito mais direto, objetivo e muitas vezes mais eficaz.
Portanto, ser gentil custa alguma coisa sim, custa tolerar os malandros que estão sempre apontando para nós e dizendo que somos burros ou otários por ficarmos na fila, por não pararmos em lugar proibido, por sermos honestos, por seguirmos as regras, pagarmos em dia, e sermos comprometidos com a nossa própria palavra.
Ser gentil é ter consideração, é respeitar a vez do outro e acima de tudo, mesmo quando não for a vez, ter a generosidade de ceder o lugar. É dizer que vai e ir e também dizer que não vai, é chegar no horário marcado, é compreender que algumas pessoas cumprem regras e respeitar quando te disserem não.
Ser gentil é um esforço diário, que envolve confiar mais nos seus valores do que na maioria. Ser gentil é conseguir olhar para a vida medíocre dos malandros e ver que mesmo que tente, jamais conseguiria ser feliz junto a eles.
O luto é um umbigo.
Tudo que existe, existe dentro de nós.
Pois quando nomeamos, deciframos, identificamos, absorvemos o mundo.
E quando o mundo se parte, nós partimos também. Pois o desencaixe é sempre sem nome.
E quando alguém parte, nos parte, e assim parimos. Parimos uma dor que não se identifica, que não possui código a ser transcrito, é apenas dor.
E nossa tentativa de manter vivo esta parte que se foi, é um cordão que se rompe, e aquele furinho é o luto, o registro do amor.
O que estamos empenhando nas relações não é nossa necessidade de sermos compreendidos, mas o desejo de sermos amados mesmo quando não pudermos ser traduzidos.
Um passo além da empatia.
Ser empático é o exercício de tentar se colocar no lugar do outro, de buscar compreender as motivações das ações de uma outra pessoa. Tentar alcançar seus sentimentos, valores, ideias, modos de perceber e se posicionar diante do mundo.
Essa ferramenta é útil e importante, ela pode também ser chamada de conexão, e para a convivência, a empatia é uma forma de facilitação.
Porém, como toda ferramenta, ela é limitada, limitada por nossas capacidades, por nosso acesso às informações, por nossos sentimentos, valores e ideias.
É muito difícil ser empático com alguém que nos causa desconforto, e aí precisamos buscar este passo além.
O desafio colocado neste século é transcender a empatia, ultrapassar a ideia de que para conviver precisamos nos compreender.
Afinal esta compreensão sempre é um recorte, uma fotografia que retrata uma parte ou um momento, mas jamais o todo.
O que estamos empenhando nas relações não é nossa necessidade de sermos compreendidos, mas o desejo de ser amados mesmo quando não pudermos ser traduzidos.
Se tudo é novo diariamente, tudo o que sabemos possui pouca serventia, pois o saber pressupõe coisas estáveis, para as instáveis é melhor a criatividade, o improviso.
E contra a corrente nos resta lutar por mais amor e mais coragem, pois com auxílio podemos sim propor uma evolução criativa e corajosa para mergulharmos no abismo, em especial no abismo que habita dentro de nós.
O medo nos leva para trás.
Dar voltas, essa é a origem da palavra revolução, e assim vemos o mundo mais xenófobo, homofóbico, machista, dogmático.
Teóricos afirmam que estamos na pós-modernidade, em que as tradições perderam aderência e a existência precisa ser inventada por cada um.
Diante disso, vivemos uma era de consumismo e depressão, exibicionismo e solidão, fé cega e descrença.
A busca por uma revolução aponta para uma busca de referências, de um olhar para trás em busca de um conforto.
-"Na minha época a vida não era assim não..."
Todos nós já ouvimos isso, o passado parece um lugar maravilhoso, cheio de alegrias, paz e união, pois diante das angústias de um mundo livre (entenda livre como promovedor de maior possibilidade de escolhas religiosas, sexuais, profissionais, identitárias...) o pavor assume maior poder.
Se tudo é novo diariamente, tudo o que sabemos possui pouca serventia, pois o saber pressupõe coisas estáveis, para as instáveis é melhor a criatividade, o improviso.
Em um mundo medroso, resta o ódio ao medo, que se traduz por ódio a causa do medo.
E contra a corrente nos resta lutar por mais amor e mais coragem, pois com auxílio podemos sim propor uma evolução criativa e corajosa para mergulharmos no abismo, em especial no abismo que habita dentro de nós.
Algumas pessoas preferem fazer um grande esforço para não ver a realidade do que se empenhar para modificá-la.
É o modo de mudar para manter tudo igual.
Qualquer um é passível de se tornar um estranho.
A relação de intimidade é uma construção, pode ser lenta ou rápida, mas é um processo a ser desenvolvido. E para durar necessita de manutenção, interesse, atenção, cuidado, envolvimento, respeito.
Porém, com o esfriamento da relação, uma distância se cria entre as pessoas e a relação de intimidade passa por um estranhamento.
Ao perder ou relaxar a percepção de conexão com o outro as diferenças ganham relevo, são mais nítidas e começam a facilitar dúvidas, ansiedades, desconfianças sobre a relação.
E se não houver movimentos para recuperar a relação por todas as partes envolvidas é possível que se perca totalmente a conexão e se tornem um par de estranhos, como foi antes do início da relação.
A intimidade é um ninho para as nossas diferenças e a estranheza é o estado original.
Crimes de intolerância e a liberdade que ofende.
Ser livre é uma definição muito ampla e pode variar de acordo com os valores e circunstâncias de cada pessoa, e sabemos que a liberdade plena não existe.
Mas é possível usufruir de alguma autonomia sobre as nossas escolhas, desejos, prazeres e sonhos, desde que consigamos "bancar" isto.
Bancar financeiramente, bancar socialmente e acima de tudo, bancar psicologicamente, enfrentando os atravessamentos que questionam estas escolhas, desanimam, apontam erros ou até pecados.
Desta forma, aquelas pessoas que persistem em sua autonomia podem ofender intensamente aqueles que não "bancam" uma vida autônoma e optam por uma vida enquadrada, emoldurada por algum padrão filosófico/religioso/moral de conduta.
Pois se enquadrar é abrir mão de um grande percentual da liberdade em busca de algo, seja segurança, aprovação, salvação, reconhecimento...
Assim vemos que muitos crimes de intolerância são motivados por um sentimento de ofensa, e não se limitam a questões religiosas, pois machismo também é dogma e atravessa dos religiosos aos ateus.
O que ofende é que eles podem.
Que estas pessoas demonstram com seus atos um desinteresse nas tradições, nos dogmas. Elas não limitam suas vidas ao que esperam delas, elas vão além e fazem suas escolhas, bancam suas existências para além das molduras, e isso muitas vezes ofende aos encaixotados, que vivem suas vidas em armários, tentando esconder suas fantasias, seus desejos, seus próprios conflitos e optam pela falsa anestesia da segurança ao conflito da liberdade.
E quando um outro banca sua liberdade, vive suas escolhas, mostra que esta vida é possível e involuntariamente promove em alguns um colapso na estrutura de segurança deste sistema de opressão dos sujeitos, que para sobreviver busca a eliminação das diferenças, afundando todos em um mesmo buraco.
Pessoas inseguras estimulam o medo, a desistência, a dependência e desarmonizam o seu grupo de convivência.
Pessoas confiantes estimulam a criatividade, a coragem, a independência e promovem maior articulação do seu grupo de convivência.
É impossível atender às expectativas.
Tento ao escrever não enrolar muito, ser mais objetivo e já entregar nas primeiras linhas ou ao menos no título aonde quero chegar.
Porém, nem sempre atinjo esta minha expectativa, e fico surpreso com o que quem lê enxergou na minha letra.
Fora o texto, sempre fico surpreso com as expectativas que as pessoas criam sobre tudo, carreira, relacionamento, tratamento, até sobre o desafiante propósito de ir a praia num sábado de verão e por fé de que não terá trânsito e de que será fácil estacionar.
Confesso que esta última expectativa me choca mais que as outras, mas está lá no hall de expectativas impossíveis.
E sim, todos criamos expectativas, temos nossos planos e anseios, mas ignorar a realidade ou ao menos os riscos é um pouco de exagero.
Não precisamos nos tornar pessimistas ou paranóicos, mas podemos considerar qual caminho necessário para alcançar esta expectativa e os obstáculos à ultrapassar.
E nessa dinâmica temos que ter muito cuidado para nãos ficarmos reféns das expetativas dos outros, caindo em uma chantagem emocional em que tentamos eternamente agradar o que não pode ser satisfeito.
E por outro lado também termos cuidado para nos tornamos mimados à espera de algo ou alguém que nos satisfaça plenamente.
Toda satisfação é parcial, transitória, e surge de um movimento nosso. Outros podem participar e contribuir, mas somente nos mesmos podemos saborear as nossas conquistas.
Assim, não gaste sua vida tentando encontrar um dia perfeito, busque encontrar algo que te satisfaça em um dia imperfeito, seja um aprendizado, um orgulho por uma forma que reagiu, ou mesmo a nobreza de reconhecer que você teve um dia difícil.
O pior sofrimento é o da ignorância, então tenha consciência dos desafios, riscos e aporrinhações e tente considerá-los como parte do processo, nada sai exatamente como o planejado, então trabalhe com alguma margem de erro.