na contra mão
da mudez,
a nudez do não.
no que acho, nada mudo:
para tanta mudez no mundo,
a nudez da mudança é tudo.
a pergunta condoída
sobre o sabor do chorado:
com tanta
amargura na vida,
para quê esse choro salgado?
se quisesse Deus
que a lágrima
fosse para nós um alento,
não teria posto o sal
dando gosto ao sofrimento.
saudade é dor em rio,
do olho-d'água da gente
à foz no mar do vazio.
serei eu, minha gente,
um tolo a cumprir os prazos,
se o próprio tempo, ultimamente,
tem sido fiel aos atrasos?
do ido assentado,
faz pouco sentido:
um doido acentuado
nem sempre édoído.
coleciono
insônias de paz;
durmo pouco,
suspeito,
porque acordado
sonho mais.
em meio aos cacos
de um mundo louco,
os fracos acham
que poesia é pouco.
aqui, eleitor
não é leitor.
o poema lúcido
no espaço cívico
seria lúdico
não fosse trágico.
hoje não vejo
um grande futuro
para a saudade
escrever é entrar em casa.
auge da ansiedade
de hoje, a saber:
já se morre de saudade
do que ainda se quer viver.
é o que é:
a saudade, um deus
que ignora a fé.
seria a desilusão
uma ponte
entre o espanto e o encanto?
arte é tudo o que tenta
repetir o encanto
ou ressentir o espanto
de quem não se aguenta.
às vezes, o poema é sangria evaporada.
dechoro pralamentar
temos sobrando…
cronotopo da pandemia:
hoje e amanhã vivemos ontem
um novo primeiro último dia.