Coleção pessoal de audreyponganborteze

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Há momentos, como no dia em que ficamos na chuva, em que eu odeio tudo e quero desesperadamente ir para casa, mas há outros dias como hoje em que as luzes brilham, as pessoas sorriem, uma música eletrônica toca e há uma sensação de liberdade inimaginável pairando no ar, Nesses momentos, as luzes e as pessoas rodopiam como num ringue de patinação e Vancouver brilha como se fosse uma enorme estrela cadente.

Que me perdoe o bom inglês, mas meu coração bate em português! Há momentos e lugares que devem ser admirados e sentidos, como o vento que vem do Pacífico e renova a alma, a geada que congela a grama nas manhãs de inverno, o rio que corre selvagem por baixo das montanhas e as luzes que brilham ao norte. "A beleza é fundamental" já dizia Vinícius de Moraes. Bem, que me perdoe o poeta, mas devo interferir na frase e dizer que "a beleza é frágil, efêmera e fundamental". Há tanta beleza no Canadá e tanta beleza no Brasil! Eu acho que não se trata de um lugar ser mais bonito que o outro, se trata apenas de ter aquele olhar estrangeiro, ter essa capacidade de olhar as coisas como se fosse a primeira vez que as vê, com os olhos limpos e a alma renovada. Acho que só assim é possível sermos mais humanos e menos máquinas, sé assim é possível sentir...

Eu acho que talvez "sentir " seja a a palavra. Acho que devemos sentir mais e pensar menos, mesmo que isso pareça difícil na sociedade em que vivemos. Devemos sentir a calma do oceano, a brisa matutina e o sorriso das pessoas que encontramos no caminho. Devemos sentir a necessidade dos moradores de rua e o conforto do lar para valorizar o que temos, e não reclamar incansavelmente do que não temos. Talvez seja necessário, imprescindível, valorizar a amizade sincera e a família, e os sentimentos mais íntegros e verdadeiros.

Ela tem olhos curiosos de jabuticaba, e tem a alma ainda pura, acreditando na vida, nas pessoas e no amor, não tendo ainda se decepcionado com as pessoas, com os amores que não deram certo, sendo ela uma brilhante chama, diferente de mim que sou puro gelo. Admito que senti uma pontada de inveja dela, mas não por ela ser mais nova e ter um namorado, mas por ela ser cheia de esperança, de olhar para vida acreditando em um mundo melhor, coisa que perdi há algumas dezenas de decepções.

08 de junho
Meu querido Rick, eu sei que prometi que não ia mais te escrever, e você sabe como essas cartas são humilhantes para mim e dolorosas- porque o amor sempre tem um quê de dor-, mas eu não pude evitar...a saudade apertou e eu não tive outro recurso senão escrever. É que escrever alivia o peso de minha alma, lava as feridas e me ilude fazendo eu pensar que um dia você lerá esses pensamentos tolos que escrevo. Os dias têm sido bons na escola, e eu achei um jeito de conseguir minha alforria e fazer os garotos não me baterem mais. Claro que isso envolve passar cola para eles, e sei que não é certo, mas é a maneira que eu consegui. Ah, e tenho feito tantas amizades, como Paloma. Queria que você tivesse a oportunidade de conhece-la um dia. Já é começo de junho e começa a esfriar, com o outono dizendo “au revoir” de maneira sutil a todos nós. Eu adoraria lhe falar de pontuação, embora você, como a maioria das pessoas, odeie português e não consiga entender a beleza da nossa língua. Ok, talvez eu não lhe explique a função de cada um, mas eu apenas lhe digo que tenho colocado vírgulas demais nesse amor que sinto, tenho dado pausas demais, separando termos e rezando para que as coisas deem certo um dia, quando deveria colocar logo um ponto final e finalizar isso tudo; essa agonia, esses sentimentos, essas cartas sem sentido que você nunca vai ler. Você me arrancou pontos de exclamação demais, fazendo meu mundo ter mais emoção, mais vida, e eu agradeço por isso, mas agora chega. Quer dizer, tem que chegar, porque eu não posso amar você para sempre. Eu só não sei como se para de amar alguém e segue sua vida, apagando memórias e sentimentos, como quem passa uma borracha em tudo. Ah, mas estou farta, muito farta de lhe amar! Estou farta como Ana Carolina na música “Vai”, que parece que foi feita para você, porque eu quero te expulsar meu coração, mas não consigo. Eu nem sei o que fazer com esses versos, esses versos que explodem dentro de mim, como um tsunami. Tudo bem, vou parar com a bobagem que foi essa carta, e eu gostaria de usar um ponto final e enterrar você para sempre, mas por enquanto eu só posso lhe oferecer um ponto de interrogação, um “será?”, um “talvez?” como uma pergunta do tipo: e será que desta vez vou te esquecer?
-Annie.

Falando em advérbios, estou encantada com essas palavras que têm o poder de modificar o verbo, o adjetivo e os próprios advérbios. Eu coloco numa frase o advérbio de lugar: “aqui” e aproxima pessoas e coisas que estão distantes. Eu escrevo o advérbio de tempo: “antigamente”, que nos torna tristes e nostálgicos. Escrevo o advérbio de modo: “apaixonadamente” e isso modifica qualquer sentimento ruim que possa existir e colore esse mundo frio em que vivemos. Eu me delicio e me encanto brincando com palavras e advérbios, sentimentos e cores e tantas outras coisas que as pessoas não veem ou não ligam, mas que deviam ser observadas, sentidas e vividas, antes que seja tarde. (Anseios de uma jovem escritora).

Hoje foi um dia bom. Mas talvez antes de falar do dia de hoje eu deva falar sobre o dia de ontem, ou das luzes do entardecer que cruzaram o céu e que ninguém viu. Quando elas surgiram, eu quis pegar um megafone e anunciar aquela perfeição da natureza a todos para que eles vissem e sentissem a beleza com o entusiasmo com que aplaudem a um jogo de futebol. Mas essa gente é pequena e vazia, não merecendo meu esforço e atenção, carecendo de um pouco de poesia, um pouco de doçura, um pouco de bondade.

Meu professor dizia que "a vida não é um croissant", e eu sei que não é mesmo, sendo sempre doce e saborosa, com os problemas se dissolvendo como areia, nada disso . A vida é mais semelhante a um sorvete, sendo maravilhosa, épica, mas passando rápido demais e derretendo nos momentos mais importantes, em que o coração é leve, as risadas altas e os compromissos quase não existem, como nas férias. Mas por ser efêmera e fugidia é que é bela e peculiar, e deve ser aproveitada, antes que passe num piscar de olhos.

Ele é só um garoto e há tantos por aí. Ele é só um garoto e eu preciso de um homem, mas preciso sem precisar. Preciso para me sentir bonita e amada de vez em quando, mas não que a conveniência seja uma necessidade, porque não é. É que é idiotice e até masoquismo condicionar nossa felicidade a uma pessoa, porque uma não depende da outra; a felicidade só depende de nós mesmos. É como naquele filme, "o diário de uma adolescente" em que a protagonista diz: "Talvez ninguém me ame. Talvez ninguém nunca me ame, mas talvez não se trate de ser amada por outra pessoa". E essa frase é verdade, pois trata-se de se amar, de sentir o vento bagunçar os cabelos e o sol aquecer a pele. Trata-se de viver como se não houvesse amanhã, de viajar e seguir seu caminho sem olhar para trás. Trata-se de abrir o coração e de perdoar, por mais difícil que seja, de rir, mesmo que de modo escandaloso e deixar a alegria te inundar de dentro para fora. Trata-se de sentir saudades, mas não deixá-la criar raízes em você. Trata-se de dançar, mesmo que pareça ridículo, e de se deixar levar pela música. Trata-se correr na chuva, sentir o perfume das flores e não abrir mão dos amigos. E finalmente, trata-se de ler muitos livros e viver infinitas vidas em uma só e fazer dessa vida algo extraordinário.

Apesar de eu querer chamá-lo e puxar uma conversa qualquer deixando aquele sentimento de atração pairar sobre mim como uma porção de borboletas , eu me detive. Eu gritei em pensamento para que ele me chamasse pois eu era orgulhosa , eu era fria , eu era ruim mesmo sem querer ser , eu me governava pelo principio da inércia do coração , que é muito parecido com o da inércia da jurisdição , então se ele não viesse atras, não dissesse que precisava de mim eu não podia fazer absolutamente nada por ele , mesmo que uma parte minha quisesse, mesmo que meus desejos fossem insanos...

Sabe o que é estranho? Eu achei que fosse sentir falta dele. Eu achei até, em certo momento quando o silêncio dele me cortou, que haveria dor. Imaginei que doeria e que haveria uma música, uma sinfonia qualquer que embalasse meu choro, mas não houve. Não houve dor, nem sequer lágrimas! E eu, que achei que estivesse me apaixonando por ele estava apenas me apaixonando pela ideia de estar apaixonada por ele. Ele foi como um vento que passou. Não, vento não, porque as ventanias são intensas e desconcertantes e ele não provocava esse efeito em mim, por isso acho que no fim das contas, ele foi uma brisa.

Estranho o destino dessa jovem mulher, privada dela mesma, porém, tão sensível ao charme das coisas simples da vida...

Me falaram que meu amor por ele não fazia sentido, que ele era muito imaturo, idiota e egocêntrico. Mas o amor não foi feito para fazer sentido. O amor não tem cor, nem idade, nem religião, então quem dirá lógica! O amor não é um cálculo matemático, cheio de frações e diretrizes; ele é irracional como um animal selvagem, pulando sobre você quando você menos espera, não obedecendo a lógica ou a gramática, apenas os seus próprios instintos.

Hoje o Ipê amarelo da rua do fórum floresceu, espalhando flores para todos os lados, e isso renovou minha alma e a encheu de esperança e da renovação que só a primavera é capaz de trazer. Quis chamar todos do gabinete para olharem, mas eles iam dizer que eu era louca de parar de fazer minhas decisões e olhar para uma árvore florida. Na certa iriam me xingar dizendo para eu me focar no que era importante. Mas será que estariam certos ? Quer dizer, nós trabalhamos todos os dias, corremos de um lado para o outro, estudamos, vivemos em uma rotina caótica e acabamos nos esquecendo de olhar as coisas bonitas da vida. O que eu quero dizer é que nos enferrujamos, não vemos a beleza com os olhos limpos de uma criança, mas com os olhos nublados de um adulto, confundindo flores que caem na rua com sujeira, o café que nos causa úlcera com um incentivo para o trabalho, o monóxido de carbono emitido pelos carros com desenvolvimento. Estamos muito errados em relação à nossos conceitos, e então talvez devêssemos começar as mudanças olhando para um ipê florido, ouvindo o canto dos pássaros e analisando a beleza da natureza, pois afinal, o trabalho estará lá amanhã , mas a primavera estará?

Eu admito que não sou fácil de lidar mas acho que o que é belo deve ser saboreado aos pouquinhos, como um capuccino ou um pedaço de bolo: pouco a pouco, mordida por mordida, saboreando a doçura de cada momento. Não é como um sorvete em um dia de calor quando você nem sente o gosto e o devora rapidamente antes que derreta. O amor não é um sorvete, ele é um bolo, é a habilidade de sentir cada momento e a possibilidade de parar e ouvir o canto dos pássaros. O amor deve ser sentido, apreciado, resguardado e valorizado e não tratado com banalidade. Já temos tantas banalidades no mundo, não é mesmo? Então por que não preservar pelo menos os sentimentos nesse mundo caótico em que vivemos?

Ele disse que eu tinha esgotado o vocabulário dele no
Inglês e para mudarmos a conversa para o português . Eu prontamente concordei e quase respondi a ele que se ele quisesse eu falava Inglês , Português, Latim , forçava um Espanhol e enrolava um Italiano, mas que a paixão não tinha idioma, que ela falava por si mesma , traduzindo nossos sentimentos e gestos de um jeito que só ela podia e nenhuma outra emoção era capaz.

Algo me diz que se eu tenho que pensar para decidir se gosto dele, e não automaticamente ruborizo nem meu coração da um salto quando penso nele , então talvez eu não goste dele. Porque o amor não pode ser pensado, o amor tem que ser sentido, como o mar na pele , o vento nos cabelos e o sol no rosto. O amor é involuntário como o piscar dos olhos ou o bater do coração, não podendo ser controlado ou forçado, pois o amor tem que ser livre para ser amor.

Então eu senti uma vontade súbita de alerta-lo, dizer para correr de mim , fugir para as colinas ,correr para bem longe porque eu sou louca , eu sou a rainha do gelo , eu talvez o magoe sem querer o deixando no vácuo por horas ou o prendendo na minha teia como se ele fosse um inseto. Queria dizer para ele se afastar pelo amor de Deus porque eu sou hipocondríaca , não sei dançar e falo sozinha na maior parte das vezes, como uma senhora caduca. Eu não consigo confiar em ninguém e não sei ser a garota fofa e carinhosa como as outras são , porque já pisotearam e escarraram na minha meiguice , me obrigando a ser fria ou morrer afogada pelas lágrimas. Queria dizer a ele que me deixasse em paz, que sou uma alma solitária e a solidão é minha absolvição e condenação neste mundo.

Senti satisfação quando ele me chamou, uma espécie de orgulho de mim mesma por ter algum tipo de poder sobre ele , exercer sobre ele alguma espécie de atração. Contudo, em momento algum meu coração palpitou , minhas mãos suaram e meu corpo tremeu. Isso fez eu me sentir como uma árvore oca e seca judiada pela geada , como se meu coração tivesse secado e não houvesse deus ou homem que o fizesse florir de novo. Talvez não haja.

É quarta- feira e estou elétrica, elétrica como se tivesse colocado o dedo na tomada e levado um choque, como se tivesse tomado 10 xícaras de café ou tivesse injetado adrenalina diretamente na veia. Mas eu só tomei uma xícara de café, e isso não é nem o suficiente para me deixar acordada pela manhã, então acho que esse estado de espírito se deve a mensagem que eu recebi daquele garoto. Isso fez eu ficar ligada no 220 e sair correndo pela casa e dar risada à toa, e isso é muito estranho. Eu fico tentando achar explicação para essa felicidade, dizendo para mim mesma que amanhã é feriado, que eu fui bem nas provas finais e que logo chega a pizza que eu encomendei, mas tudo isso não me convence, como se ele fosse o motivo do meu sorriso bobo, da minha distração constante e da minha agitação sem sentido, como se isso fosse resultado da paixão...