Coleção pessoal de anaferreira

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HOMI NUM CHORA

Hoje aqui, oiando pra vancê meu pai,
To me alembrando quanto tempo faz
Que pela primeira vez na vida, eu chorei.
Não foi quando nasci pru que sei que vim berrando...
E disso ninguém se alembra, não.
Foi quando um dia eu caí...levei um trupicão,
Eu era criança. Me esfolei, a perna me doeu,
Quis chora, oiei pra vancê, que esperança.
Vancê não correu pra do chão me alevanta.

Só me oiô e me falô:
Que isso, rapaz ? Alevanta já daí...
HOMI NÃO CHORA.
Aquilo que vancê falô naquela hora,
Calou bem fundo,
pru que vancê era o maió homi do mundo.
Não sabia menti nem pra mim nem pra ninguém...
O tempo foi passando...cresci também...
Mas sempre me alembrando..

HOMI NÃO CHORA. Foi o que vancê falô.
O mundo foi me dando os solavanco,
Ia sentindo das pobreza os tranco...
Vendo as tristezas vorteá nossa famía,
E as vêiz as revorta que eu sentia era tanta,
Que me vinha um nó cego na garganta,
Uma vontade de gritá...berrá, chorá...mas quá..
Tuas palavra, pai, não me saía dos ouvido..

HOMI NÃO CHORA
Intão, mesmo sentido, eu tudo engolia
E segurava as lágrima que doía...
E elas não caía, nem com tamanho de quarqué uma dô...

Veio a guerra de 40...e eu tava lá...um homi feito,
Pronto pra defendê o Brasí.
Vancê e a mãe foram me acompanhá pra despedi.
A mãe, coitada, quando me abraçô, chorô de saluçá.
Mas, nóis dois, não.
Nóis só se oiêmo, se abracêmo e despedimo
Como dois HOMI. Sem chorá nem um pingo.
Ah, me alembro bem... era um dia de domingo.

Também quem é que pode esquecê daquele tempo ingrato?
Fui pra guerra, briguei, berrei feito um cachorro do mato,
A guerra é coisa que martrata..
Fiquei ferido... com sodade de vancês...escrevi carta
Sonhei, quase me desesperei, mas chorá, memo que era bão
Nunca chorei...
Pruque eu sempre me alembrava daquilo que meu pai falô:

HOMI NÃO CHORA.
Agora, vendo vancê aí...desse jeito...quieto..sem fala,
Inté com a barbinha rala, pru que não teve tempo de fazê..
Todo mundo im vorta, oiando e chorando pru vancê...

Eu quero me alembrá...quero segurá...quero maginá
Que nóis dois sempre cumbinemo de HOMI NÃO CHORÁ...
Quero maginá que um dia vancê vorta pra nossa casa
Pobre... e nóis vai podê de novo se vê ansim, pra conversá

Intão vem vindo um desespero, que vai tomando conta..
A dô de vê vancê ansim é tanta...é tanta, pai,
Que me vorta aquele nó cego na garganta e uma lágrima
Teimosa quase cai..

Óio de novo prôs seus cabelo branco...e arguém me diz
Agora pra oiá pela úrtima vez..que ta na hora de vancê
Embarcá.

Passo a minha mão na sua testa
Que já não tem mais pensamento....
E a dô que to sentindo aqui dentro,
Vai omentando...omentando, quage arrebentando
Os peito...e eu não vejo outro jeito senão me descurpá.

O sinhô pediu tanto pra móde eu não chorá..
HOMI NÃO CHORA... o sinhô cansô de me falá...mas, pai,
Vendo o sinhô ansim indo simbora...me descurpe, mas,
Tenho que chorá.

Arrumação

Josefina sai cá fora e vem vê
Olha os forro ramiado vai chuvê
Vai trimina riduzi toda criação
Das bandas de lá do ri gavião
Chiquera pra cá já ronca o truvão
Futuca a tuia, pega o catadô
Vamo planta feijão no pó
Futuca a tuia, pega o catadô
Vamo planta feijão no pó
Mãe purdença inda num cuieu o ai
O ai roxo dessa lavora tardã
Diligença pega panicum balai
Vai cum tua irmã, vai num pulo só
Vai cuiê o ai, o ai da tua avó

Lua nova sussarana vai passá
Sêda branca, na passada ela levô
Ponta d´unha, lua fina risca o céu
A onça prisunha, a cara de réu
O pai do chiquêro a gata comeu
Foi um trovejo c´ua zagaia só
Foi tanto sangue que dá dó

Os cigano já subiro bêra ri
É só danos, todo ano nunca vi
Paciênca, já num guento as pirsiguição
Já só caco véi nesse meu sertão
Tudo que juntei foi só pra ladrão

TINHA QUE SÊ ANSIM !
(poeta Cumpadi Caipirinha)

E agora?
Qui façu eu da minha vida sem ocê?
Custei tantu a aprendê a vivê só
Mais issu foi antis de ti conhecê

Pru quê ocê tinha que chegá
Meu coração caipira conquistá
Dispois du amô em mim prantá
Dizia me amá toda hora
Agora ocê diz que vai imbora

Se tem que ir... vai,
Mais vai devagarinhu
Pra eu me acustumá
A vivê aqui sozinho

Num vai de uma veiz
A dô vai sê maió
Vai di vagá, sem fazê baruiu
Pra num ispantá
Os pobri passarinhu

Eles tudo se acustumáru
A vê ocê mais iêu
A cuidá desse cantinhu
Que nu tempu nois se perdeu

Inté, intão, vai com Deus
Chegô o dia da dispidida
Vô mi iscondê lá nas campina
Pra num vê sua partida

Vô ficânu aqui
Comu passarinhu seim asa
Cuns bicu machucadu
E a vida seim graça

Mais num vô recramá
Tenho a companhia di Deus
Se ele mandô issu pra mim
É que tinha que sê ansim

CASA VAZIA
(Cumpadi Caipirinha)

To vortânu das campina
Onde lá fui si iscondê
Pra num vê o meu amô
Que foi imbora e me dexô

Tudu aqui é tão vaziu
Tão cheio de sodade e dô
Nossu quartu tá tão friu
Como faiz farta meu amô!

Agora neim iscuto mais
Os cantu dus passarinhu
Neim veim na minha janela cantá
Meu amigu o sabiá

Logu mais vai sê noiti
Num sei se vai tê luá
E se as istrêla vão briá
Comu briáva pra sinhá

Numa noite de natá
Dei elas tudu pro meu amô guardá
Dissi que maió dus presenti
Num pudia a ela dá

Será que ela foi imbora
E levô a lua e as istrêla
Aleim de ficá na solidão
Me dexô na iscuridão
E tirô di iêu, o céu e o chão

Aqui tá tudu tão friu
Tão seim graça e tão vaziu
Poeta Athos ocê tinha razão
Num dá pra aguentá
Essa tristi separação

Mesmu qui iêu se acrediti
Que tinha que sê ansim
Essa vida num queru não!
Que se isproda meu coração!

Moda do Fim do Mundo
Cumpadi em brasília, espaiaram
Um boato muito chato
Que o mundo vai se acabar

Vancê fique de oreia no rádio
Vancê fique de oio no jorná
Porque, vou te contar,
No dia que o mundo se acabá

Nesse dia a gente tem que resolver
Que nós temo que esconder
Aquele galo bolinha
Prá dispois do fim do mundo a gente ter
Um macho prás galinha,
Um macho prás galinha

Cumpadi também temo que esconder
Aquele touro garanhão,
Grandão e arruaceiro
Prá dispois no fim do mundo a gente ter
O bicho que sabe fazer bezerro,
O bicho que sabe fazer bezerro

Vancê fique de oreia no rádio...

Cumpadi pense bem no dia d
Que porva vai garrá fedê
E tudo nóis vira mingau
Prá dispois do fim do mundo a gente ter
Um casal do bicho que faz miau,
Um casal do bicho que faz miau

Cumpadi também temo que alembrar
E a sete chave nós guardar
O cachorro e a cachorra
Prá dispois do fim do mundo a gente ter
Que evitar que a raça morra
Vancê fique de oreia no rádio...

Cumpadi acabei de me alembrar,
Que o jegue irará
Também temo que esconder
Prá dispois do fim do mundo a jega ter
Um jegue prá lhe comer,
Um jegue prá lhe comer

Cumpadi sabe que na afobação
A gente quase se esqueceu
De guardar uma comadre
Prá dispois do fim do mundo a gente ter
Um pecadinho prá confessar com o padre
Um pecadinho prá confessar com o padre

Bão Pessoá?!
(Cumpadi Caipirinha)

Bão pessoá, que sodade de ocêis
Tive passanu pruns bão apertu
Mais num me deixei se intregá
E to aqui otraveiz

Num sô homi de pedi arrego
Nas hora apertada que Deus me dá
Num corro das provação
Memu que seja pesado meu jacá

Nas andança da vida se aprendi
Que o Pai num dá pra nois peso maió
Que os lombo consegue carregá
Intão esse peso foi fácil suportá

To de vorta pra cá
Adispois de descançá
Aos pouco vou inté
Uns causo novo contá

A oceis tudo iêu agradeçu
Pelas preocupação e carinhu
Nunca se senti sozinho
Andanu no meu caminho

Intão, intão e um abraçu
Beim apertadinho
Do cumpadi Caipirinha

Ai! Se sêsse!...

Se um dia nós se gostasse;
Se um dia nós se queresse;
Se nós dos se impariásse,
Se juntinho nós dois vivesse!
Se juntinho nós dois morasse
Se juntinho nós dois drumisse;
Se juntinho nós dois morresse!
Se pro céu nós assubisse?
Mas porém, se acontecesse
qui São Pêdo não abrisse
as portas do céu e fosse,
te dizê quarqué toulíce?
E se eu me arriminasse
e tu cum insistisse,
prá qui eu me arrezorvesse
e a minha faca puxasse,
e o buxo do céu furasse?...
Tarvez qui nós dois ficasse
tarvez qui nós dois caísse
e o céu furado arriasse
e as virge tôdas fugisse!!!

*Poeta: Zé da Luz

^♥^

PASSARINHU
(Poeta Caipirinha)

Um belu dia, um piquenu sabiá
Oiava a vida di longi
Cansadu di vivê sozinhu
Num quiria mais avuá

O tempu passô
Ele, já cansadu di tantu sonhá
Batenu as asa pra lá e pra cá
Adesistiu di procurá

O que quiria, na verdadi o passarinhu
Sua fêma encontrá era o sonhu qui ele tinha
Mas nada aconticia e ele si adesistiu
Intão o pobri passarinhu arresorveu vivê sozinhu

Já cansadu aproveitô a casa du Juão di Barru
Que tava abandonada e nela foi morá
Toda arrumada, du seu jeitu reformô
Cum isperança sua casa, ele toda infeitô

Num belu dia, beim di manhãzinha
Foi matá a sedi e a fomi, lavanu sua tristeza
Quanu vortô, pra sua casinha
Lá dentru um baruiu dus mais lindu
Que carsô muita surpresa

O sabiá triste, imaginô perdê sua casa
Será que arguem achô
Ela tá abandonada?
Num podi sê!
Só tenhu ela e mais nada!

Precupado foi entranu de vagá
Nu otro cantu assustada
Uma linda sabiá
O oiava incantada

O sabiá, nunca mais veio me visitá
Num sei comu a vida deli istá
Mais ocê, que tem um coração
Por que num continua a contá?

QUISERA IÊU!
(Poeta Caipirinha)

Quisera iêu
Sê cheradu cum seu orfatu e alí se prendê comu um prefume mágicu
Sê os brilhá du seu oiá e alí se prendê a iluminá seus caminhu e sempri nêis me incontrá
Sê o gostu da sua bôca e alí se prendê e sempre iêu ocê prová
Sê o ar que ocê respira, sê sempre inspiradu e nunca ocê mi expirá
Sê o que ocê iscuita pra sempri a me orvi dizênu: - amo ocê!
Sê o que faiz batê seu coração e sempri dentru dêli iêu está e ni ocê circulá
Sê seu cravo, seu jasmim e vivê senu cuidadu nu seu jardim
Sê, um dia, o seu amô... e sempri ansim continuá

Quisera iêu
Sê simprismenti todus seus sintidus
Sê arguém pra ocê
E nunca mais me vê perdidu

Quisera iêu!...

Inté, intão! E um abraçu beim apertadu du cumpadi Caipirinha!

PIDINDU A TUA MÃO
(Cumpadi Caipirinha)

Quiria fazê vancê minha muié
Tá todu us momentus presenti
Acordá e si alevantá
Dizê amo vancê e ti bejá

Bão... intão vô discansá
Deitá um pocu e relaxá
Mais sabenu qui nu deitá
Cum vancê num paru di sonhá

Uns beju cum carinhu
Dessi Caipirinha paxonadu
Que leva vancê nu coração
Cum amô e paxão

Se iêu pudessi e tivessi jeitu
Di demonstrá minhas emoção
Faria tudu beim direitinhu
E pidia suas mão

Amo ocê sinhazinha
Druminu ou acordadu
Nas mais linda fantasia
Meu amô, minha doci alegria

VIDA PERDIDA
(cumpadi Caipirinha!

Pra vancê iêu guardei
Meus mió momentus
Pra vancê iêu ti dei
Todus meu pensamentus

Pra vancê iêu fiquei
Pra vancê se guardei
Vida intêra pra vancê
A minha tie dediquei

Fiz di vancê minha vida
E da sua vida u meu norti
Fui cum ela sonhandu
Sonhei tantu e tão forti

Que inté si isqueci di acordá
Quânu acordei tomei um sustu
Foi um sustu tão forti
Pra iêu foi comu a morti

Quânu ví o sonhu tinha passadu
I muitu tardi si acordei
Procurei pru vancê o restu da minha vida
I nunca mais ti incontrei

Caipirinha

SONHUS
(cumpadi Caipirinha)

Sonhei tantu cum vancê
Seim ao menus ti vê
Neim tão pôcu ti conhecê
Mais só queria qui fosse vancê

Meu marditu coração ti imaginô
E dentru deli si formô
E ansim si transformô
Em um novu i grandi amô

Cadê vancê qui num chegô
Sozinhu aqui iêu tô
Precisânu di vancê
Meu coração só qué ti vê
Mais num sei queim é vancê

Veim aqui
Num me dexa tão sortu
Veim lugu pra iêu
Meu amô é tantu
Mais u desancantu
Podi tudu distruí

Veim logu meu sonhu
Veim me fazê acordá
Cum você quero vivê
Noiti i dia seim pará

O Caipirinha no céu
(Cumpadi Caipirinha)

Enquanto isso no céu...

De repente o Caipirinha se viu em um lugar lindo. Se espantou com tudo o que viu e já chegou reclamando.
- Ô de casa!... Ô de casa! Num teim ninguém modi recebê nois aqui não, sô! Iêu tô entranu... Num teim neim portêra... Ô de casa!
Com tanto barulho e reclamação chega um anjo, com cara de anjo, roupa de anjo e jeito de anjo. Era um anjo mesmo!
- Calma Caipirinha! Por que está tão nervoso meu amigo? Aqui é um lugar de paz e tranquilidade. Seja bem-vindo Caipirinha!
- Oia aqui sô! Num sô seu amigo! Tô cum sistema nervosu sim! E como ocê sabe meu nome? Que lugá é esse e como vim pará aqui?
O anjo, calmo como um anjo, tentou acalmar o matutinho.
- Calma! Não fique assim! Aqui você não precisa ficar nervoso, agitado, irritado. Aqui é paz e tranquilidade. É sua nova casa e é aqui que você vai viver agora.
- Como vô vivê agora?! Tava druminu na minha cama, inté sonhanu, e acordo aqui. Que lugá é esse seu moço? Quero vortá pra minha roça, pra minha tapera, o que tô fazênu aqui? Queim que manda, queim é o dono... Quero vortá... Quero vorta... Quero vortá... Quero falá cum dono!
- Daqui você não sai mais Caipirinha. Você veio para ficar para sempre.
- Como ansim, pra sempre? Num vô ficá aqui jeito e manêra!

O anjo então resolveu ser bem claro com o Caipirinha.
- Vem cá Caipirinha, olha aqui comigo uma coisa. Está vendo aquela nuvem ali, ela vai se abrir e você vai se ver... Olha lá!
A nuvem se abriu e mostrou, como uma tela de cinema o Caipirinha em casa, deitado em sua cama e cercado por amigos. Na janela um poleiro de pássaros tocando uma sinfonia triste. Do lado de fora o mugido e o muar de lamentação dos animais.
- Uái sô! Que tô fazêno deitado na minha cama cum minha ropa nova que comprei num viajante modi usá no domingo, na missa. E o pessoá todo em vorta diêu? Os passarinhu e os animá... E a Mariinha chorânu tantu se segurânu na minha mão... O que é isso moço?
- Caipirinha a sua missão na terra foi cumprida. Você hoje está no céu.
- Como?... Eu num pedi! Ninguém ...
- Caipirinha você morreu! - interrompeu o Anjo.

O compadre Caipirinha ficou branco e logo enrubesceu e virou bicho.
- Óia aqui seu anjo, ninguém se arresorve as coisa pru mim, num sabe?!.Num morri nada! Tô aqui vivinho falânu cum ocê. Eu quero vortá pra minha roça agora.
- Você morreu Caipirinha. Sua missão agora é aqui, no céu.
- Morri nada, de jeito argum! Como ocês se arresorve trazê iêu pra cá seim me avisá? Quero vortá, seu anjo! Ta na hora das coieita, ocê num sabe como é a dificulidadi aprepará a terra, semeá, moiá, ficá torcênu pra chuva chegá e dispois coiê... E queim vai cuidá das minhas coisa, tirá leite da mimosa, da rosinha, da maiada e da cherosa? Queim vai cuidá das criação e dos animá.
- Alguém vai cuidar. Não se preocupe - disse o anjo.
- E queim vai cuidá da Mariinha? Ocê tá mangando diêu, se ademorei tanto pra agarrá aquele treim, ocê num sabe comu pelejei, como assuei e como foi a dificulidade pra pegá aquela potranca brava, que me deu tanto trabaio modi aprumá e amansá aquela cabrocha, assuei inté e agora ocê tá dizênu que num tenho mais nada... Queim vai cuidá do Joquinha, num vô dexá a sinhá Mariquinha sozinha cuidanu do mininu! Ocê tá ficânu é abilolado das idéia home!? Eu quero vortá e vô vortá de quarqué jeito.
O anjo, olhando aquela cena, ao ponto de rir...
- Ta quase se escancaranu modi ri das disgraça dusotro é seu anjo! Chama o dono, o casêro, o capataiz, o seu chefe... Chama todo mundo que eu quero vortá! De quarqué jeito eu vorto e num fico aqui jeito argum!
-Não tem como voltar Caipirinha!
-Se eu vim pará aqui, teim o caminho de vorta. E aquele moço lá, de barba e cabelo branquinho. É o Papai Noé disfantasiado?

O Anjo ficou um pouco constrangido...
- Não. Aquele moço ali é o São Pedro. É ele que tem a chave daqui.
- Uái gente num é que é mêmu. Comu é que vô ficá seim as festa junina, São Pedro, São João de sortá balão, Santo Antônho, casamentêro. Fiquei esperâno o ano intêro podi consegui se casá mais a Mariinha e agora ocês vem aqui e... Vô lá falá cum ele!
- Licença São Pedro? Bão?... Bão tameim!... Iscuta aqui ocê... Que história é essa de me trazê pra cá seim me convidá. Num chegô ninhum convite lá na roça. O Zé dos correio faiz tempo que num dá as cara ee neim telegrama chegô! Eu quero vortá... E agorinha!

São Pedro com toda a tranquilidade e paz tenta convencer o Caipirinha.
- Como voltar meu filho. Você já cumpriu sua missão. Você estava chateado com as pessoas que criticavam sua poesia dizendo que sua maneira de falar e escrever deseducavam as crianças.
- Intão ocê intendeu isso São Pedro?
- Foi!... Então eu resolvi trazer você para o céu, pois você andava muito triste.
- Uái, sô! Mais iêu tive cuns pensamentu mió. Ocê sabe aquea lorinha, que tinha dois treinzinho marrado nos canto da cabeça e às veiz inté no coco, que insinava prus baxim as linguage do xis, ninguém se cramô dela. Óia que inté ela veiz inquanu dava uns cocoroti nos baxim.
- Sei sim! - disse São Pedro.
- Intão! E agora as modernidade do tar do orkut e da interneti, que os pessoá iscrevi tudo miudinho, parece que teim priguiça e coloca apilidu nas palavra que nun dá pra intendê. Iêu nun intendo nada... E ninguém tameim crama deles.
Eu sei Caipirinha! – Continuou São Pedro
- Intão! Iêu onti, antis de drumi, tava pensanu ansim como disse. Me arrependi de ficá triste e querê morrê de tristeza. Ocê num viu não??? Num viu que iêu se arrependi??? Ocê drumiu antes diêu né sô?
- Olha Caipirinha... - tentou dizer São Pedro...
- Intão! Drumi feliz e de repente se acordo nesse lugá bunito que só, céu azurzim, tudo arrumadim, cheio das fulô perfumosa, dos passarinhu cantadô, os bichu tudo juntim, montigenti sorrinu e feliz. Aqui num tem chuva, frio, seca... num teim não?
- Não Caipirinha! – Disse São Pedro - Aqui só tem paz, harmonia e tranquilidade para as pessoas viverem felizes. Aqui é como Deus criou. Não é como lá em baixo, onde as pessoas estão destruindo tudo.
- Uài São Pedro. Se Deus é o criadô de tudo, incrusive de nois, modiquê num insinô nois a num istragá as coisa. A num brigá cunsotro cumpadri, a nun distruí as coisa que teim na terra?
- Mas Deus ensinou. Ele disse amai-vos uns aos outros e a si mesmo. Mas as pessoas não entenderam o que quer dizer isso. Deus também deu a cada um dos seres humanos o livre arbítrio. Vocês têm o poder de decidir o que fazer, qual passo dar e como viver. Mas infelizmente vocês não entendem também o que significa isso. Vocês destroem tudo. Se matam. Brigam por causa de um arranhãozinho no carro, por um par de tênis, por coisas tão banais que a própria vida já está banalizada. Mas Deus espera que isso mude.
- São Pedro o que qué dizê banal e banalizada é tipo banana e doce de banana?
- Não Caipirinha. Quer dizer qualquer coisa, coisa à toa, sem valor entendeu?
- Intendi! É mesmo num é!? Os pessoá tão nem um pouco se atolerânu e tudo se acaba nas briga e nas confusão. E como mudá as coisa sô?
-É muito fácil, Compadre Caipirinha, é só abrir o coração e deixar o amor entrar. Amor por vocês mesmos. Amor pelo próximo. Amor pela natureza. Amor pelos animais. Amor por tudo. Deus não perde a esperança.

- Intão neim iêu. Eu quero vortá agora. Num pedi modi morrê e num vô ficá aqui jeito e manêra, São Pedro! Oia... Se eu tivesse cum meu facão aqui, viu seu Pedro, iêu incostava no seu gogó e mermu o sinhô tão bunito e santu iêu ia forçá ocê a se adervovê iêu pra terra.
- Viu Caipirinha – Disse São Pedro - Como as pessoas estão assim... violentas... Você, um matutinho dos bons também tem suas horas de intolerância não é?
- Se adescurpe intão. Prometu num mais sê ansim. Mais pru favô santo, iêu tenho a precisão de vortá, os pessoá tá tudo pedinu modi iêu vortá e continuá a iscreve puisia e contá meus causos, sentá pra uma prosa... Num é justo iêu morrê agora. Iêu já tinha inté se arrependido de pedi pra modi morrê. Se arrependi... Ocê é que drumiu antes di iêu e nun iscutô minhas oração de arrependimento. Ocê São Pedro tenha pena de mim sô. Me adevorve pro meu pessoá. Faiz fazê vortá o tempo. Num sei comu, se avire, mais iêu aqui num fico sô. Num fô ficá feliz. Lá sô mais feliz do que ficano aqui no céu, pru favô São... Ocê num pode sê tão marvado...

São Pedro, já cansado da ladainha do Caipirinha...
- Olha aqui... "Ô treim difícil, sô"...
- Uái, Ocê é bão no caipirêis né são Pedro? – Disse o Caipirinha com ar de gozação.
- Olha aqui seu Caipirinha que parece um boi daqueles bem bravos. Vou te devolver para a terra. Mas é só dessa vez. Fique atento pois da próxima vez te trago pra cá e não tem volta. Pode ir. Conversa com o anjo que ele sabe o que fazer...
O Caipirinha pulou sobre o santo e o abraçou forte e até encheu o rosto dele de beijos e saiu correndo até o anjo, feliz da vida...
- Num disse que vortava... Num disse que ia falá cum home pra modi me fazé vortá... intão...

O anjo, sorrindo, disse ao Caipirinha
- Também pudera... A barafunda que você fez aqui nem São Pedro aguentou. Vai Caipirinha, volta pra sua roça e continua a fazer poesia. Mas não se esqueça do que o santo lhe falou sobre ter mais amor no coração. Senta ali naquele lugar tranquilo, recoste sob aquela árvore e descanse... durma...
- Intão tá. Inté, intão seu Anjo!

E o Caipirinha dormiu... Sonhou... e voltou a fazer poesia.
http://www.planetaliteratura.com/index.php?view=detalhesartigo&codigo=66152

" Seus dentes e seus sorrisos
Mastigam meu corpo e juízo
Devoram os meus sentidos
Eu já nã me importo comigo
Então são mãos e braços
Beijos e abraços
Pele, barriga e seus laços
São armadilhas e eu não sei o que faço
Aqui de palhaço,
seguindo os seus passos..."

Ser Carioca é... Começar alguma conversa com o usual "olha só..."
Ser marrento porque pode ser... afinal, olhe só onde a gente mora!
Dar inveja nos "não cariocas" pelo simples fato de sermos cariocas...
Indignar-se com a inveja dos "não cariocas" com o habitual "faaala sério"
Tratar tanto homens quanto mulheres de "cara" sem que isso seja considerado afronta...
Ter certeza de que esta é a cidade mais linda do mundo,
Falar com o "R" arrastado e com o "S" com som de "X" e exagerar ainda mais quando está perto de paulistas;
Saber que as maiores torcidas do mundo estão aqui!
Saber que o maior estádio do mundo é o Maracanã;
Saber que a maior floresta urbana do mundo é a Floresta da Tijuca;
Saber que a maior favela do mundo é a Rocinha;
Entender porque a maioria dos estrangeiros acham que o Rio de Janeiro é a capital do Brasil;
Aplaudir o pôr-do-sol no posto 9;
Beber no AM/PM antes da night
Comer na Pizzaria Guanabara depois da night;
Parar no meio da night estrategicamente no Bar do Osvaldo e depois chegar na boate à uma da manhã;
Ver o nascer do sol na praia depois da night;
Ficar feliz com o horário de verão começa, porque isso significa uma hora a mais na praia;
Agir com naturalidade ao encontrar artistas globais na rua;
Buzinar assim que o sinal abre;
Tomar mate sempre que estiver com sede;
Torcer para alguma escola de samba, mas viajar no carnaval por que a cidade fica cheia de paulistas;
Sair no bloco do Suvaco e no Simpatia é quase amor;
Sair da Faculdade na segunda-feira e passar no Baixo-Gávea pra tomar uma gelada.
Ir à praia sempre no mesmo lugar;
Acampar na Ilha Grande pelo menos uma vez na vida;
Odiar os argentinos que vão para Búzios nas férias e tratam as brasileiras como lixo;
Passar horas na academia, nem que seja fazendo social;
Ter amigos no condomínio onde mora;
Ter amigos na academia onde malha;
Fazer amigos na praia;
Ir ao shopping fazer compras e não fazer social, porque isso é coisa, de paulista;
Saber que as obras do "Rio Cidade" foram desnecessárias, mas até que ficaram bonitinhas;
Odiar a atual situação das praias da Zona Sul;
Estar sempre perto de uma favela;
Morrer de rir ao ver paulistas dançando funk na televisão, como se esta fosse a última moda;
Usar os engarrafamentos para comprar biscoito Globo e apreciar a paisagem;
MAS PRINCIPALMENTE...
Amar e respeitar muito esta cidade porque, mesmo com todos os seus problemas, ela é a CIDADE MARAVILHOSA!!!!!!

O Amor

ENTÃO Almitra disse:
-Fala-nos do Amor.

Ele levantou a cabeça
e olhou o povo;
um silêncio caiu sobre eles.
E disse com voz forte:

- Quando o amor vos fizer sinal, segui-o;
ainda que os seus caminhos sejam duros e escarpados.

E quando as suas asas vos envolverem, entregai-vos;
ainda que a espada escondida na sua plumagem vos possa ferir.

E quando vos falar, acreditai nele;
apesar de a sua voz
poder quebrar os vossos sonhos
como o vento norte ao sacudir os jardins.

Porque assim como o vosso amor vos coroa,
também deve crucificar-vos.
E sendo causa do crescimento,
deve cuidar também da poda.

E assim como se eleva à vossa altura
e acaricia os ramos mais tenros
que tremem ao sol,
também penetrará ate às raízes
sacudindo o seu apego a terra.

Como braçadas de trigo vos leva.

Malha-vos até ficardes nus.

Passa-vos pelo crivo
para vos livrar do palhiço.

Mói-vos até à brancura.

Amassa-vos até ficardes maleáveis.
Então entrega-vos ao seu fogo,
para poderdes ser
o pão sagrado no festim de Deus.

Tudo isto vos fará o amor,
para poderdes conhecer
os segredos do vosso coração,
e por este conhecimento
vos tornardes um bocado
do coração da Vida.

Mas, se no vosso medo,
buscais apenas a paz do amor,
o prazer do amor,
então mais vale cobrir a nudez
e sair da eira do amor,
a caminho do mundo sem estações,
onde podereis rir,
mas nunca todos os vossos risos,
e chorar,
mas nunca todas as vossas lágrimas.

O amor só dá de si mesmo,
e só recebe de si mesmo.

O amor não possui
nem quer ser possuído.

Porque o amor
basta ao amor.

Quando amardes, não digais:
-Deus está no meu coração,
mas antes:
- Eu estou no coração de Deus.

E não penseis
que podeis guiar o curso do amor;
porque o amor, se vos julgar dignos,
marcará ele o vosso curso.

O amor não tem outro desejo
senão consumar-se.

Mas se amardes, e tiverdes desejos,
deverão ser estes:

Fundir-se e ser um regato corrente
a cantar a sua melodia à noite.

Conhecer a dor da excessiva ternura.
Ser ferido pela própria inteligência
do amor, e sangrar
de bom grado e alegremente.

Acordar de manhã com um coração alado
e agradecer outro dia de amor.

Descansar ao meio dia
e meditar no êxtase do amor.

Voltar a casa ao crepúsculo
com gratidão;
e adormecer tendo no coração
uma prece pelo bem amado
e um canto de louvor na boca.


in "O Profeta"
de Khalil Gibran

Legenda dos Dias

(Raul de Leoni - Rio de Janeiro - 1895-1926)

O Homem desperta e sai cada alvorada
Para o acaso das cousas... e à saída,
Leva uma crença vaga, indefinida,
De achar o ideal nalguma encruzilhada...

As horas morrem sobre as horas... Nada!
E ao Poente, o Homem, com a sombra recolhida,
Volta pensando: "Se o Ideal da Vida
Não veio hoje, virá na outra jornada “...

Ontem, hoje, amanhã, depois, e, assim,
Mais ele avança, mais distante é o fim,
Mais se afasta o horizonte pela esfera...

E a Vida passa... efêmera e vazia;
Um adiamento eterno que se espera,
Numa eterna esperança que se adia...

As Pombas

Vai-se a primeira pomba despertada...
Vai-se outra mais... mais outra... enfim dezenas
De pombas, vão-se dos pombais, apenas
Raia, sanguínea e fresca, a madrugada...

E, à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais, de novo, elas serenas,
Ruflando as asas, sacudindo as penas,
Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações, onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam,
Como voam as pombas dos pombais:

No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam,
E eles ao coração não voltam mais.

Ato de Caridade

(Djalma Andrade - Minas Gerais - 1894-1975)

Que eu faça o bem e de tal modo o faça,
Que ninguém saiba o quanto me custou.
- Mãe, espero de Ti mais esta graça:
Que eu seja bom, sem parecer que o sou.

Que o pouco que me dês, me satisfaça
E, se do pouco mesmo, algum sobrou,
Que eu leve esta migalha onde a desgraça
Inesperadamente penetrou.

Que a minha mesa, a mais, tenha um talher,
Que será, minha Mãe, Senhora Nossa,
Para o pobre faminto que vier.
Que eu transponha tropeços e embaraços:
- Que eu não coma, sozinho, o pão que possa
Ser partido, por mim, em dois pedaços!

O Frade e a Freira

(Benjamim Silva - Espírito Santo - 1897-1954)

Na atitude piedosa de quem reza
E como que num hábito embuçado,
Pôs naquele recanto a natureza
A figura de um frade recurvado.

E sob um negro manto de tristeza
Vê-se uma freira tímida a seu lado,
Que vive ali rezando, com certeza,
Uma oração de amor e de pecado...

Diz a lenda - uma lenda que espalharam -
Que aqui, dentre os antigos habitantes,
Houve um frade e uma freira que se amaram...

Mas que Deus os perdoou lá do infinito,
E eternizou o amor dos dois amantes
Nessas duas montanhas de granito!