Coleção pessoal de alinemariz
Do português: permanecer, parar, deter-se
Quedar-se:
quem dera fosse de cair,
quem dera significasse
minha queda em ti
Quedar no tempo:
ficar grudada em ti,
naquilo que sobrou de nós,
naquilo que teimo em juntar os pedaços
Permanecer na tua mente
no teu coração
em toda tua alma
e carne
Quedar-me em ti
por completo
Querer dar-me ao amor,
deter-me apenas em ti
e no sentimento
Quedar tua queda em mim,
quedar minha queda em ti:
guardar-te
Somos instantes
Somos minúsculos pedaços de acontecimentos que se repetem continuamente na vida. Somos memórias. Somos esse filme velho que vemos passar todos os dias pelas ruas, calçadas, ônibus, casas. Somos partes pequenas e ambulantes que andam procurando um destino. Somos instantes que se somam. Nascemos do moer e remoer dos momentos. E nascemos, assim, cada vez menores, cada vez mais insignificantes, cada vez mais moídos de nós mesmos, como a areia que virou pó quando antes era pedra, mas continuando necessária também. É preciso buscar o que se busca e andar desse nosso jeito desandado para ser o que se é. Somos o mundo dando voltas, o coração batendo em cada quarto vazio, o olho chorando as tão cansadas e repetidas memórias, o passo que dança o que se sente. Somos os instantes que construímos com os outros grãos que se encontram na vida.
I'm lost in my old, in my own green light
Eu gosto do amor quando ele me derruba ou quando me faz voar. Se não for assim, não quero não. Não vale a pena. Nem sequer é amor.
Amor é quando a gente flutua devido à leveza do sentimento que nos preenche de tudo. Amor é quando a gente dói por qualquer besteira, porque ama tanto e concentrado em cada pedaço do corpo, que dói de bonito que é. Amor é quando a gente transborda, seja praquilo que é bom ou ruim. Amor é aquilo que eu sinto falta de sentir.
Saudade do amor dos domingos ensolarados ou chuvosos, mas sempre debaixo dos lençóis vendo filmes. Saudade do amor escrito e lido nos olhos do outro, sem precisar de tradução nenhuma. Saudade do amor da dança dele, de ver uma alegria fácil naquilo. Saudade do amor criado pelo pescoço, sinais e coxas. Saudade de tanto, de tudo.
Amor é aquilo que me desconcentra dessas coisas da vida, que me bota num rumo forte, que me traça uma coisa só e aquilo é. Eu sinto falta da bagunça que o amor me causa. Ultimamente eu tô bagunçada do meu próprio jeito, dessa minha mania de doidice mesmo. Tô perdida de mim mesma, da minha maneira, das minhas coisas.
Me perco dentro de mim e sempre esqueço onde fico.
Talvez no nó da garganta. Ou no da tua orelha.
Teus girassóis
Teu girassol cresce
dentro de ti
e floresce
dentro de nós
Gira teu sol-coração
e nos ilumina,
sempre
Cais conturbado
Minha saudade é que nem maré:
preciso saber se está vazia ou cheia
antes de decidir se vou mergulhar
Imediatista
Quero hoje e agora. Quero pra ontem. Amanhã não sei – nem sei quem sabe. Não deixe para trás a minha bagunça: queira me arrumar. Queira reparar os erros, juntar meus pedaços, cantar uma música para mim. Ou suma de uma vez, você que sabe, mas decida logo. Eu tenho vontade de seguir, mas acabo ficando. Fico esperando que tanta coincidência dê em algum lugar, que me dê ao menos uma resposta das tantas outras que me faltaram. Eu quero passar, quero ir. Quero parar de ter tanta contradição assim dentro de mim. Mas o que faço com você? Quero o sim, mas também quero o não. Quem quiser que se atreva a me entender.
Coração na mão, quase caindo.
Depois pode ser tarde demais: não me perca.
De que são feitos os sonhos?
Hoje acordei achando que estava dentro de um sonho teu. Por quê? Será que você sonhou comigo também? Será que a gente pode entrar assim no sonho do outro? Sem bater na porta, sem pedir licença? O que será que se passa dentro de você? O que será que acontece aqui dentro de mim? Sinto como se eu estivesse repetindo palavras buscando um jeito de traduzir o meu interior. Talvez o silêncio explique a bagunça que me preenche. Ou talvez seja necessário criar palavras. Talvez, ainda, fosse necessário apagar memórias para que desse jeito teu rosto não me apareça mais na mente. Nem teus olhos, orelhas, sobrancelhas, boca, nariz, pescoço, costas, barriga, tudo. Nem teus sinais e essas coisas que me aparecem repentinamente e eu acho que podem significar qualquer coisa. Nunca sei. Tem como saber? E se for nada? Mas e se for tudo? Quase enlouqueço. Meu subconsciente vê teu nome sempre e em todo lugar. O que faço? Queria que cada vez que eu escrevesse teu nome tuas aparições diminuíssem em minha cabeça. Eu dançava, tu me olhavas. De longe, nossos olhos estavam juntos. E nossos corações? Me abraçavas. As palavras sumiam. Onde mais eu buscaria palavras quando todas me desapareceram em plena madrugada? Por que as músicas são mais tuas do que dos próprios autores? Por que mal consigo escutá-las? Nunca mais darei Chico, Caetano, Otto, Beatles ou qualquer outro para ninguém.
Momento de lucidez: é minha cama agora, onde está você?
Por que eu chorava? Por que tu calaste? Ainda é sonho? Onde terminou esse devaneio? Era meu ou era teu?
A gente parece filme quase queimado, negativo de foto que esqueceram de revelar.
Longe
Às vezes lembro
que ainda não te esqueci,
e enxergo:
pontinho preto,
bem pequenininho,
bem ali no fundo
bem escondido dentro de mim
Verde na memória
Lembro daquele dia verde. Nublado, mas verde.Era de um chove-mas-não-molha impressionante. E tanto era, que ficamos nós dois ali, deitados na tua cama: eu tentando te convencer de que o dia valia ao menos um mergulho na piscina, e você dizia que ia começar a chover. E chovia, sempre. Você olhava nos meus olhos, eu olhava teus sinais e tentava ligá-los, fazer algum desenho no teu rosto; e aí meus olhos encontravam os teus, tão atentos e sorridentes em mim. Eu me perdia em você. Ria, chacoalhava pra lá e pra cá. Te beijava os olhos fechados, e te amava mais uma vez. Pelo menos eu tinha consciência do quanto estava feliz ali, naquele momento - e em tantos outros. Hoje, só me resta saudade. E quando o dia é assim, parecido com aquele verde-nublado, meu coração dói, meus olhos choram a cor deles para fora, minha boca treme tua ausência, meu corpo sente a falta do teu contorno. Dias assim me fazem querer estudar física e o que mais for necessário só pra poder construir uma máquina do tempo e te viver mais uma vez, sem ser apenas dentro de mim desse jeito.
Das cartas sem destinatário
Precisava te escrever alguma coisa. Por mais que eu nunca te entregue essas cartas que ainda teimo em fazer; por mais que a gente não se encontre no mesmo caminho. Eu quero te lembrar sempre, mesmo que seja por uma dessas coisas que te escrevo antes de dormir porque preciso te colocar pra fora de algum jeito para que eu não passe mais uma noite inteira com você dentro da minha cabeça. Já faz tanto tempo, e tudo continua sendo teu aqui. Sinto tua falta quase todos os dias: me preenche e nunca me deixa em paz. A gente nunca sabe o que se passa dentro do outro... e talvez continue sempre assim. Mas não minto: bem que eu queria poder entrar em você e ver com teus olhos, me sentir na tua pele, tentar decifrar tua mente, e fazer qualquer coisa mais que eu possa estando dentro de você. Eu quero te lembrar porque você me dói. E dor de amor, benzinho, talvez não passe nunca.
Com todo o amor que eu gostaria que já não existisse mais dentro de mim,
Aline.
Sobre domingos e minha mania de água
Domingo me mete o maior medo. Se eu já penso muito - talvez até demais -, não queira nem imaginar o tanto de coisa que passa pela minha cabeça num dia em que eu não faço nada. Sem falar de hoje, especialmente: nublado, com chuviscos o dia inteiro, vazio, parado no tempo.
Dias assim me deixam aérea. Voo longe, me perco dentro de mim. São tantas perguntas sem respostas. Tantos rostos, corpos, olhos, corações. Tantos lugares, esconderijos, mentiras e coisas velhas, guardadas de todo jeito. Tantos eus espalhados por aí. Tanto de nós que se foi.
Gosto muito de chuva. Rega meu jardim, cuida do meu interior e faz crescer (não sei mais pra onde) meu coração. Lava minha alma. Leva embora o que já não me pertence mais. E peço, sussurro, rezo: que chova mais em mim. E que dias assim - por mais que me baguncem completamente por dentro – se repitam mais vezes.
Numa de suas músicas, Cazuza perguntou qual era a cor do amor. Será que é cinza?
Até de manhã
É como se por metade de um segundo
eu vivesse tudo de novo:
mais do que teu amor guardado
e que um fim mal explicado,
saudade, benzinho,
é o que dói mais
E eu aqui,
só querendo comer tua presença,
esconder cada detalhezinho,
não lembrar dos teus olhos
(nem de nada mais),
ou qualquer coisa
que me acalme a alma
e me dê o sono de volta
Gosto de parar pra sentir
como tudo é tão lindo
e frágil
A carta que nunca entreguei
Quero teus pés colados nos meus, feito minha boca na tua. Quero teus ossinhos marcando meu quadril feito teus olhos marcam minha alma. Quero tuas palavras marcando meu coração feito teu amor faz comigo. Quero mais de você, quero mais de mim. Quero mais de nós dois. Te quero sendo comigo. Me diga, me mostre, me olhe, me ame. Canta outra vez no meu ouvido que quer o nosso bem, que faz tudo pelo nosso amor. Não perca o costume de me desequilibrar, muito menos de me segurar no último instante. Contorna meus lábios com teus dedos e para bem na ponta do meu nariz; me olha bem no fundo de mim e diz com aquele teu olhar o que sempre me disseste.
Dia desses, antes de dormir, percebi uma coisa. Pensei que o amor fosse meu, mas não: é todo teu. Guarda com cuidado, num canto escondido qualquer que seja. Lembra dele, vez ou outra. Olha.
Sente saudade,
como eu faço.