Cartas de Amor para a Pessoa Amada
Gente Grande é Mesmo Idiota -
Ontem,
enquanto brincávamos no
quarto,
meu filho e eu,
lembrei de certas
coisas corrosivas que, hora ou
outra,
ainda me alfinetam o peito,
me tiram a calma.
E então,
junto àquelas lembranças,
eu fiz aquele som com a
boca, que denuncia
alguma insatisfação, algum
lamento ou incômodo.
Meu filho,
que agora está com quatro
anos e meio,
ouvindo aquele estalo
me questionou:
"o que foi, pai?"
"Nada". Eu o respondi.
"E por que essa cara feia,
então?!" Ele outra vez.
Eu,
sem graça,
pensei:
gente grande é mesmo
muito idiota - desperdiça o pouco
tempo que lhe resta,
sofrendo por coisas e pessoas
estúpidas.
O Cinza é a Minha Cor Preferida -
Eu esqueci,
durante alguns segundos,
esta tristeza profunda
que bagunça minha morada
interna.
Nestes poucos segundos de
desatenção, eu respirei livre,
sem dor, sem angústia.
Neste breve estar de leveza,
eu não fiz quase
nada.
Serviu apenas
para lembrar-me que, apesar
de muito difícil,
hora ou outra, sem muita explicação,
a vida nos traz traços de felicidade
em pequenas e raras porções de paz e tranquilidade.
Aproveite para aprender:
há uma saída, ainda que a gente morra
no final.
Sim,
meu universo já voltou
ao normal.
O Último Não, Será o Meu -
Eu estava errado quando
na primeira oportunidade de
deixá-la eu não a deixei.
Havia chance... (?!)
E veio a segunda, a quinta,
a décima-quarta e eu
continuei errando.
Me transformei em uma
máquina de colecionar
derrotas e mais
derrotas.
Logo
eu era a própria derrota.
Fui ao inferno, vi o diabo de ser
humano de perto,
mais de perto ainda, algumas
outras vezes.
(Perdido, eu só era mais um
entre tantos).
Mas eu estava certo quando,
certa vez,
com lágrimas de sangue nos
olhos e um coração de
calos endurecidos,
me virei para ela e em claro
e grave som disse-lhe:
Não!
E o último não, será o
meu.
Distância -
É sempre muito,
muito complicado quando
amamos alguém que
está longe.
Longe o suficiente para sentirmo-nos
inúteis, impotentes diante
da sinuosa e fria
distância.
É um troço meio esquisito:
é a coisa amada lá - longe -
e os sentimentos
explodindo cá - dentro.
Um aperto sem toque;
um sentir sem cheiro;
uma saudade sem
tamanho.
Fecho, abro os olhos
e tudo é deserto,
vazio, distante.
Tudo, menos o teu
nome.
Esse...
ah, esse é segredo!
Não Há Escapatória -
Eu entendo:
não há escapatória.
Não posso estar muito
longe do cinza das
tempestades,
da névoa da melancolia,
do abismo da rejeição - da tristeza.
A maior parte da minha poesia
morreria.
Assim como não posso viver
totalmente
mergulhado nesse
caos,
nessa escuridão sombria,
sem um pouco de luz quente,
gestos leves, alegria
genuína.
Minha cabeça explodiria.
Morreria, então,
o poeta.
Eu sei parte dos motivos
e escolhas
e consequências.
E,
independentemente
da cor do dia,
do estado meteorológico,
mental, físico,
tudo que eu preciso é
escrever,
somente escrever.
Nada além de
escrever.
Tortura Sentimental -
Não acredito mais
na conquista sentimental
do outro
através de uma longa
insistência.
Não.
A grande maioria das pessoas
hoje,
faz disso um jogo, e desse
jogo
alimento para inflar seus
egos cebosos e
gordurosos.
Essas pessoas nunca dizem
um "não" categórico.
Elas costumam colocar certos
limites,
fazer certas restrições,
mas estão sempre deixando
cair migalhas de reciprocidade,
aproveitando-se do nobre sentimento
do outro,
para mantê-lo por perto (acorrentado, rastejando),
aprisionado a esse caos psicológico,
a essa condição humilhante
em que se perde paz, dignidade,
tempo - vida.
E tudo isso,
para alimentar desejos egocêntricos,
gostos superficiais,
vaidades fúteis,
através de uma maldosa, dolorosa
e traumatizante tortura
sentimental.
Não há,
certamente,
uma verdade absoluta
para isso,
mas:
ou tudo acontece
de maneira natural (claro, com todos os esforços e entraves naturais das relações interpessoais),
ou,
naturalmente, não
acontece.
(Não como deveria
acontecer).
Correndo -
Às vezes,
eu fico olhando adolescentes
à toa, se divertindo como
jovens que são
e acho graça da maneira como fazem as coisas.
É tudo tão tosco e bobo e
besta,
e nada é tão sério e tudo
tão necessário.
E então,
me percebo rindo
e logo me sinto velho, triste
e bobo e besta,
e agora tudo é tão sério
e nada mais tão
necessário.
(Contaram-nos a história
errada?).
Desabafo Inútil –
Sem cerimônia,
fui expulso do “Paraíso”
de escolhas e consequências.
Então,
me vi na necessidade
de uma releitura da vida,
para novos rumos,
novos sentidos, novos caminhos,
mas agora,
através de uma outra perspectiva,
um novo momento,
um novo olhar:
dúbio.
Com novos personagens à volta,
cama e cômodos diferentes,
vozes diferentes,
cheiros e sons diferentes.
Um outro endereço,
na mesma rua, em direção ao
nada
eu fui e voltei
e não mais voltei para casa
ou nunca fui.
Acúmulos de expectativas
e decepções
tão inerentes a
mim.
Um novo dia nasceu (turvo),
poeticamente cinzento e
dolorosamente ensolarado,
com cicatrizes e possibilidades,
velhas novidades, novos ciclos
de amizade,
encontro e reencontros e
desencontros e
perdas.
Alguns raros sorrisos – quase
uma volta à adolescência – um
filme em dias frios,
cobertas e pele e um moleque
inquieto – dono de tudo ali – sonho
e realidade para novas,
velhas lágrimas.
O real e o desejável;
o medo e a experiência;
a sorte e o hiato;
a saudade e a necessidade
do seguir em frente... a poesia e o
vazio.
Entendo: não volta mais!
Não pude fazer escolhas,
simplesmente, fiquei de fora
delas.
Não aceitei, nunca aceitarei
(hei de me adaptar), mas o
que ainda restou de mim
– inútil poeta –
são restos essenciais de
batalhas que,
enfim,
venci, derrotado.
A Lua -
Hoje cedo
lembrei aquele teu riso fácil
e olhar adolescente de quase
meio-dia.
Lembrei de coisas
que nem pensei que faziam falta
como: a tua falta de jeito ao derrubar
coisas.
Lembrei teu espaço rebelde,
teus traços e passos
e trejeitos - jeito moleque.
Manias - tão tuas - que nem sei
se existem em outras.
Agora,
neste exato momento,
estou em total silêncio
buscando algo da tua fala.
(...)
Em vão.
Por favor, pequena:
não me chames como tu chamas
a todos os outros.
Tu sabes, né?!
Ah!
Mas quando foi que tudo escureceu,
afinal?
Sim,
eu amo a noite,
mas não esta - sem teu canto,
sem teu colo, teu encanto,
tua luz.
Se,
ao menos, como antes,
me restasse a lua.
Ah, a lua...
no céu da tua boca.
Amanheças aqui!
3h17 da Madrugada -
A gente só se dá conta mesmo
do quanto está
perdido,
quando o quarto está
escuro,
o relógio marca 3h17 da
madrugada e há silêncio demais
(fazendo barulho),
e vazio demais (transbordando),
e passado demais
(presente).
Neste instante,
o tempo corre (lentamente)
e
não há sono
nem sonho
nem desculpa: essa é a
realidade.
Não há, se quer, alguém
para quem ligar.
Nessa altura, nem
esperança mais
há.
E eu já não sei mais
se quero que o dia
amanheça.
(Mas ele sempre
amanhece).
À Sorte -
Com promessas e sorrisos e
cheiros e descobertas
(por meu querer), de mãos dadas
fui conduzido até bem perto
de algum paraíso,
aparentemente, natural de sonhos
e beleza e
poesia.
Tão logo,
depois do sonho,
despertei-me abandonado
no meio de um oceano
qualquer (e não sei onde estou,
para onde ir).
Estou à deriva, em um pequeno
bote a remo.
Exausto. Desanimado.
Com medo.
A vista só alcança horizontes: magnificamente tão belos
e iguais e distantes.
Meu olhar contempla a
inutilidade do querer, encoberto
pelo desespero da realidade
de não pertencê-lo.
Sempre tive uma relação de
curiosidade e admiração
para com o Tempo, o Universo e
a Sorte.
Neste momento,
sobretudo,
com a Sorte.
Mas nunca a entendi
muito bem.
Ainda assim, intimamente,
a tenho buscado
sem muita pressa ou
exigência.
Porém, agora onde estou
não há tempo para uma
má sorte.
É fim de tarde; é quase noite;
é quase tarde; é quase
o fim.
Espero,
ao menos, que ela,
por ventura,
esteja no vento que (na urgência
do agora),
dou-lhe a mão e deixo-me
levar...
(Avisarei se chegar).
Por Acaso -
Provavelmente, está
aqui - no íntimo do meu
ser - como uma pequena parte
do que habita a força do
Universo.
Mas sinto que escrevo
por acaso.
Não sei se sou eu
quem acha a poesia ou ela
quem me acha primeiro.
Depois da última palavra,
não sei quando será o
meu próximo momento de
inspiração.
Até lá
vou ficar me sentindo
o maior idiota do
mundo.
Quando começou essa fase?
Quantas horas de TV você assistiu sobre o assunto do momento?
Quantas páginas de livros você leu?
Quantos cursos online você fez?
Quantas anotações importantes?
Quantos minutos de meditação você fez?
Para quantos parentes e amigos ligou perguntando se estão bem?
Essa "fase" irá passar e virão outras milhares de fases em sua vida. Independente da fase, use seu tempo para de tornar, a cada dia, uma pessoa melhor.
Aquilo que você pensa você se torna.
Viva Mais e Entenderá -
Já me fizeram chegar
ao ápice (e não é que tenha
sido ruim), mas segundos
depois,
eu queria, imediatamente
fugir dali,
pois me sentia totalmente
vazio e descartável.
E já encostaram (meio
que sem querer),
alguns dedos em minha
pele,
acompanhados de um,
desconcertante meio
sorriso sem
graça,
e eu me senti um Rei de
coroa e trono.
Eu sei,
isso acontecerá
para poucos.
Mas um dia, feito
um dia qualquer,
então você
saberá:
Não é com quantos. É com quem.
Na Mesma Moeda -
Às vezes,
diante de algumas situações
ruins,
precisamos nos colocar
à altura: cerrar os punhos,
fechar a cara,
endurecer o coração e estar
preparado para o que tiver
que ser.
O melhor caminho sempre será
o da paz e do amor.
Mas um coração — vivo —
ainda é alimentado
por sangue.
O Senhor -
Certo dia,
enquanto eu estava no sofá
de casa,
com aquela velha angústia
das minhas manhãs,
vi pelo portão um senhor parado
na rua em frente.
Percebi que estava perdido,
pelos movimentos repetitivos
da cabeça — que ficava de um lado
para o outro, à procura de algo.
Logo
notei que era um senhor
conhecido,
inclusive por
mim,
que já o vira outras
tantas vezes
por aí,
e, assim como a maioria,
eu sabia que se tratava de
um pobre dependente
de álcool (ignorado como
tantos ignorados),
precisando de ajuda desde
sempre na vida.
Então
eu desci e fui até ele.
— O que deseja? — perguntei-lhe.
— Ir para minha casa. — respondeu-me.
— Onde o senhor mora? — questionei-lhe, mais uma vez.
E após ele dizer o nome do bairro,
eu o instrui para que,
dessa vez,
pudesse pegar o caminho
correto até sua casa.
Chamei-lhe e disse:
Olha,
o senhor vai direto,
e na primeira esquina
vira à esquerda até
chegar à avenida
principal — apontando-lhe
o sentido com um dos braços.
Ele,
que havia perdido um dos
pés das sandálias,
assim o fez.
E enquanto ele seguia,
meio cambaleando,
lentamente seu
destino,
eu voltei para minha
casa, para minha vida,
minhas angústias
diárias.
Minutos depois,
outra vez sentado no
sofá da sala,
agora com uma xícara
de café na mão,
para minha surpresa
(como num déjà vu),
me aparece o mesmo senhor,
no mesmo local, fazendo os
mesmos gestos.
Por um instante,
pensei em descer e, outra vez
ajudá-lo.
Mas percebi que,
independentemente do
quanto demorara,
ele já havia entendido a vida
e seus labirintos íngremes e esburacados — mais cedo
ou mais tarde, no seu tempo,
tomaria o caminho de volta
até sua casa — como o
fizera tanta e tantas
vezes.
Eu é que nada sabia
da vida,
além da porta
de casa,
e era, de fato, quem
mais estava
perdido.
Encontros Trágicos -
Se a vida fosse, de fato,
boa,
não permitiria tantos
encontros trágicos.
A maioria das pessoas,
simplesmente
não liga.
Uma pequena parte
tem sorte.
O resto
vive à beira deum precipício.
Assim,
a vida acontece,
e se, de fato,
ela fosse boa,
não permitiria tantos
encontros trágicos.
Infinito Distante -
Somente a morte é algo
inteiro,
e ainda assim,
com uma parcela do
infinito distante,
imaginada, desconhecida.
Viver é despedaçar-se (diariamente),
em fragmentosde verdades, mentiras e ilusões,
a fim de adiar o
inevitável e profundo
sono eterno.
Sonhar, então,
é manter-se ainda acordado.
Insistências -
Há,
em mim,
um enorme
cansaço feito
deinsistências.
Há um acúmulo de
frustrações e derrotas
em forma de
rejeição.
Assim,
é preciso parar,
respirar... enxergar-me,
cuidar-me.
Dar chance para que
algo diferente,
de alguma forma,
possa acontecer: nascer
ou morrer.
Será Para Sempre -
O Tempo,
inevitavelmente
continuará a passar.
As pessoas tomarão
seus rumos,
cada uma à sua
maneira,
cada uma banhada
sob as consequências
de suas escolhas,
de seus atos.
Conhecerão novas pessoas,
criarão novos vínculos,
atarão novos laços
e,
de todos os amores que
ficaram por acontecer,
digo,
de todos os amores
suspensos no
tempo — com todas as
quase glórias
e as quase tragédias,
e todo o desconhecido
dos quase — um deles
será mais lembrado.
Mesmo se já houver um
outro;
mesmo que não haja mais
o mesmo fogo, o mesmo
desejo, os mesmos
motivos,
ele será lembrado.
Hora ou outra,
sem a mesma intensidade
será lembrado.
Sem a mesma urgência
de outrora
será lembrado,
sem nunca, de fato,
ter sido.
E porque nunca será,
será para sempre.