Verônica Miyake
SONETO DE UM AMOR PROIBIDO
Eis que não posso estar longe de ti
Tu que tocaste tão fundo minh’alma
Quando te vi tanta dor pressenti...
Fui qual cigana lendo minha palma.
Eis que todos os erros repeti
E nas noites já não encontro a calma
Pois teu toque (proibido) consenti
E só ele, agora, é que me acalma
Oh, meu doce amor, como me invades
Só teu é agora o meu pensamento
E só por ti choro todas as tardes
Pararia o mundo por um momento
Mas basta, amor, apenas que me guardes
E serei eu (prometo) o teu alento.
AZAR
Ainda que ter saúde me conforte,
Pouca coisa eu teria como azar.
Não me seria azar estar com a morte,
Pois muita dor poderia amenizar...
Mas muito considero como sorte,
Como ter boa educação, um lar,
Estrutura, dignidade e suporte...
Qualquer muro onde eu possa escalar.
Pois se fala em lutar pela vida,
Mas isso é a mentira mais vil:
Com que arma o pobre enfrenta a lida?
Esta pátria não é assim tão gentil
Para quem já tem a luta perdida:
Azar é nascer pobre - e no Brasil!
Por dentro, somos ondas num vaivém
Em um mar, no infinito a se estender…
Assim, somos espaço, mar, além…
Às vezes, eu sou tantas num só ser
E por vezes, um corpo sem ninguém…
É materialista a era,
Este tempo que é moderno,
Onde muito se venera
O que pinta bem o inferno...
E onde Deus é só quimera.
Ah, modernidade…
Engoliste cartas,
Fizeste lagartas
Que sem qualidade
E sem humildade
Se julgam normais
(por serem iguais)
Vivendo de abraços,
Sorrisos e laços
Que são virtuais…
E foi no meu silêncio que encontrei
A dúvida, só ela, nada mais,
Pois hoje ao saber tanto, nada sei…
Saudade é quando a ausência
Se faz mais presente na vida
Do que toda e qualquer presença
No nosso próprio presente…
Não quero ser igual a toda a gente
Eu gosto de andar na contramão
Me diz mais um silêncio eloquente
Do que as vozes de toda a multidão.
Ninguém escapa ao pó, à despedida
Mas deram-nos, um dia, a decisão...
Já me tiraram tudo nesta vida,
Mas não o que guardei no coração!
Espero acordar sempre com um canto
Diferente do canto d’outro dia...
Talvez, ouvir a mesma melodia,
Que não nova, me traga novo encanto.
Seja o amor irmão da esperança,
Um sábio ancião dos sentimentos,
E que não viva só numa aliança,
Tampouco morra, preso aos casamentos.
Quero viver o que me dá o dia,
Deixar os medos e seguir adiante,
Ouvir os pássaros, ser melodia!
Mas eu desejo também, não obstante,
Que finde a morte minha estadia,
Pois sou no mundo, apenas viajante!
Cartas
Eu sinto saudade
Da carta escrita,
Tão leve e bonita
Na simplicidade
Da intimidade
De quem escrevia…
Hoje, todavia,
É brega, passado,
Foi posta de lado
Nesta era fria…
As coisas pequenas
Perderam valor.
Moldaram o amor,
Puseram antenas
E formas obscenas
Nas coisas mais belas…
Ficaram nas telas,
O calor, a vida
A mão não sentida
Nas frases singelas…
Ah, modernidade…
Engoliste cartas,
Fizeste lagartas
Que sem qualidade
E sem humildade
Se julgam normais
(por serem iguais)
Vivendo de abraços,
Sorrisos e laços
Que são virtuais…
SONETO SEM FIM
Não há ninguém no fundo de um poço,
Quem adivinha as voltas deste mundo?
E quem já sente “a corda no pescoço”
Descobre que o poço não tem fundo.
Quem sabe a vida seja só esboço,
De tão breve que é cada segundo?
Pois há no mundo ainda o alvoroço
De um fim - e eu ainda me confundo…
Eu escondi meus “nãos” ao dizer sim,
Descobri no que a vida aqui, consiste:
Só trago o que guardei dentro de mim!
Esboço riso e torno ao olhar triste,
Minha tristeza nunca chega ao fim,
Pois o fim realmente não existe!
PEDRA
Pelos dias que passaram,
Pelos que passam em vão,
Pelas pessoas que ficam,
Por aquelas que se vão,
Pelo tempo que voou
Entre os dedos destas mãos,
Pelo que me magoou,
Pela vida, pelos “nãos”,
Pelos sonhos destruídos,
Pelos que nem asas têm…
Pela voz, pelos ruídos,
Pela fé que me mantém,
Os segundos se demoram
E o choro já não vem…
Bem sei que pedras não choram.
Inda quero florescer
Numa outra estação…
Deus, não deixe endurecer
O meu frágil coração!
PALAVRAS
Elas se perdem no ar,
Evaporam-se no espaço,
E tendo ouvidos de aço,
Podem p'ra sempre ecoar...
Não voltam, isso é certo,
Mas têm tamanho poder
De fazer ou desfazer,
Afastar ou trazer perto.
E há quem as faz refém
Fazendo tudo promessa,
Também quem as arremessa
Feito pedras, contra alguém.
E não se pode guardá-las
Porque quem fala se esquece,
Nem todo querer é prece.
Talvez por isso, te calas...