Valter da Rosa Borges
No agora não há palavras:
o que se fala, passou.
A palavra é sempre eco
do que não existe mais.
A percepção é agora.
O pensamento é depois.
Não vejo as tuas pegadas
nem escuto os teus passos,
pois és feito de silêncio
e de invisibilidade.
O real não é a medida
da nossa percepção.
Eu creio no que não vejo,
no que não ouço, nem toco.
Os sentidos me apequenam
e a razão me aprisiona,
o corpo me faz mortal.
Tempo e espaço são o cárcere
do prisioneiro ilusório.
Quem crê em suas paredes,
não pode ver o infinito.
Ninguém vai chorar por você,
mas pela falta que você fará,
a companhia e a presença,
o tempo compartilhado,
os espaços preenchidos,
seu ouvido disponível,
sua voz consoladora.
A morte destrói o corpo,
não o amor que ficou,
embora em dor e saudade.
Lembrança é quase pessoa,
vagando por toda a casa,
perfume de coisas órfãs,
gemendo em cada lugar.
Só somos uma vez e nunca mais:
não há repetições na Natureza.
Não se confunda o som com o seu eco.
Os fantasmas são ecos que assombram
os ouvidos sensíveis da saudade.
Somente quando te fizeres vazio,
experimentarás o Vazio.
Somente quando não tiveres vontade,
conhecerás a Vontade.
Somente quando deixares de ser,
encontrarás o Ser.
Somente quando te despojares
do que julgas ser teu,
possuirás o que é teu.
Somente quando te sentires vazio de tudo,
reconquistarás a Plenitude.
Sentimos a flor conforme a vemos
não pelos átomos que a compõem.
Quem disseca a flor, não vê a flor.
É procurar o homem no cadáver.
Da janela do presente
observa-se o presente
com os olhos do passado.
Da janela do presente
observa-sse o futuro
como extensão do passado.
Quando somos o presente,
não há futuro e passado,
porque só há o presente
observando o presente.
Liberdade de uma folha
girando solta no ar,
nas circunstâncias do vento,
o vento que é sem caminho
embora seja caminho
onde vaga o seu voar.
Se o vento é que nos dirige
por que, folha, nós queremos
dirigir nosso voar?!
O vento sopra impetuoso,
vergando a copa das árvores.
As folhas caem no chão:
folhas secas, folhas verdes.
Por que não somente as secas?
Nascer é uma aquisição
em meio à luta feroz
de milhões de seres possíveis.
Morrer é uma perda solitária
Porque ainda somos cegos,
tateamos deuses falsos.
A bengala é falso guia.
A fé devolve a visão
e permite ver o mundo
além do mundo trilhado
pela bengala dos cegos.
O tempo vazio.
O espaço vazio.
O coração vazio.
Um oco que não tem fim.
A solidão sem fronteiras.
Um silêncio surdo-mudo
é testemunha do nada.
O futuro é o próximo ato,
o próximo passo,
o próximo fato.
Ele existe enquanto não existe
e morre logo que se torna hoje.
Aquele que envelheceu,
não sonha mais impossíveis.
Conformado e conformista,
o mundo é o seu cansaço.
Ele é o que já foi
e o futuro será igual.
O passado que não existe
habita o presente morto.
Envelhecemos quando o que fomos
é maior do que o que somos.
Se por aqui vaguei, meu corpo sabe.
As células festejam meu retorno.
Meus pés andam sozinhos, eles sabem
onde encontrar os passos que ficaram
gravados na memória das areias.
Os átomos que fui, andam no mundo.
Um dia, me dirão por onde estive.
O sol de fim de tarde pouco aquece.
Em tudo sopra uma saudade fria.
Recolho os sonhos e recolho os fatos:
todos serão iguais no anoitecer.
A lógica não é o metro da realidade. É uma atividade pragmática do espirito e limitada a uma determinada área operacional.
A lógica não apreende o real. Não está nas coisas, pois se constituí em mera atividade do espirito. Nem prova o real, embora demonstre que certos fatos aparentemente se comportam segundo seu modelo. Por isso, somos inclinados a admitir que os fatos que acontecem segundo a nossa lógica são reais e os que assim não se comportam são ilusões.
A lógica, por outro lado, tem uma função psicológica: dá ao homem o sentimento de
controle sobre os fatos. Daí o seu apego a tudo o que é lógico, pois a lógica lhe dá uma sensação de segurança e poder. A lei da causalidade se torna, assim, de importância fundamental para o homem: é a certeza de sua capacidade de controle sobre as coisas. Explicar é uma tentativa que lhe proporciona um sentimento vicário de dominar situações. Por isso, o homem é tentado a explicar tudo para se sentir senhor dos fatos.