Twoany R
E em mais um fim de tarde me peguei sentindo a tua falta. Um súbito pensamento clareou minha mente e abriu meus olhos. A ideia de que tu podias ser um quebra-cabeça desmontado e que eu podia te montar. Resolvi então pegar um caderno velho que ficava entre as madeiras da minha cama.
Aquelas folhas meio manchadas afloraram todas as lembranças que eu guardava de ti e que não queria — por nada — traze-las à tona. Peguei uma caneta preta e rabisquei teu nome só para me lembrar do quanto ele me deixa ébria. Respirei somente teu nome a tarde inteira e pensei em o que escrever sobre/para ti.
Pensei em qual seria a primeira peça desse quebra-cabeça. Quando você nasceu ou quando nos conhecemos? Deduzi, então, que todo esse quebra-cabeça começara quando resolvi te amar… Talvez “resolvi” não seja a palavra certa, pois se eu pudesse não escolheria.
Levantei e botei na xícara o café que acabara de ficar pronto e lembrei da primeira vez te trouxe aqui. Você elogiou a minha cortina cor ócre e disse que meu café era muito fraco. Você gostava de café forte e a partir daí meu café nunca mais foi o mesmo.
Aliás, minha vida nunca mais foi a mesma. De alguma forma eu sempre tentava me encaixar ao tipo de mulher que você queria. Elegante e determinada. Nunca consegui. Minha insegurança era muito grande em relação a você… Mas de alguma forma, você me amou. Ou pelo menos disse me amar. Foi bom enquanto durou, mas depois de alguns meses a única coisa que me restou de ti foram as lembranças.
A partir daí afogo-me todos os dias em uma imensa nostalgia e em uma pseudo-felicidade. Agora espero te trazer para mais perto de mim, rabiscando-te nesse caderno velho com folhas machadas por gotas de café. Mas não se preocupe, esse café é forte.
Realmente o tempo passa e passa rápido. Lembro-me de quando eu ainda te tinha comigo e de como era bom estar contigo, mas o tempo passou. As coisas não são mais as mesmas. O outono chegou. As flores murcharam e caíram ao chão. Hoje busco tuas partes por aí. Pelas ruas, pelos bares e boates. Procuro tudo que se relaciona a ti e ao seu gosto esplendido e dissemelhante. Nada acho. Perco-me em meus pensamentos melancólicos e em minhas lágrimas frias.
Quebra-cabeça nunca foi meu forte. Aliás, tudo que me fazia pensar excessivamente nunca foi meu forte. Sempre fui muito explosiva. Achar suas partes está sendo muito difícil para mim. Você não sabe quantas vezes pensei em desistir e rasgar esse quebra-cabeça.
Mas eu ainda preciso de ti. Preciso ter você completo. Preciso lembrar-me de todas as coisas que vivemos. Todas as discussões que tivemos… De todos os beijos e abraços que trocamos. Preciso te ter de volta nem que seja decifrado em palavras e guardado nesse pequeno caderno com folhas manchadas pelo seu café favorito. […] Abri meu cofre que se encontrava ao lado da minha cama; em cima do criado mudo de cor desbotada. Nele guardava teu cheiro. Derramei-o no caderno. Seria mais uma parte de ti. Teu cheiro e todas as lembranças que ele me traz.
Embriaguei-me com teu cheiro a noite inteira, até não ter mais controle sobre mim. Recusei-me a abrir os olhos, tentando evitar uma saída para as lágrimas. Mas elas foram mais astúcias que eu. Escorreram pelos cantos dos olhos e mancharam a minha caligrafia torta. Não me importei. Teu cheiro estava impregnado em mim e em meu quebra-cabeça. Eu estava chorando, mas estava feliz. Estava menos vazia e mais completa, estava com uma parte de ti.
Ela havia se esquecido de que tudo que nasce morre um dia. Ela pensou que seria para sempre. Que o amor nunca iria acabar, mas estava enganada. Da mesma forma que nasceu ele morreu. Rápido de mais.
O céu fazia de tudo para não chorar. Sabia que suas gotas não desceriam sós. Elas carregariam toda sua raiva e tristeza acumuladas e causariam destruição. E eu sabia que já havia prometido nunca mais chorar por qualquer coisa relacionada a ti e mesmo assim a estúpida vontade de soltar as estúpidas lágrimas não ia embora. Hoje eu estou como o céu. Triste e nublado. E embora eu saiba que a probabilidade de chuva é 99,9%, eu estou tentando não chorar.
Estou tentando ser menos o céu de hoje e ser mais o céu de ontem, que diferente desse estava feliz e azul… Estou tentando não me destruir por dentro e matar milhões de sentimentos que não merecem morrer só porque uma pessoa me fez sofrer. Mas talvez seja impossível. Lembrar de ti não é tão fácil quanto parece ser. Não são apenas lembranças. São as suas lembranças que fazem questão de ainda viverem em mim. São lembranças da época que o amor parecia ser para sempre, como ele sempre parece ser, mas não foi.
Ele acabou. Fez as malas e foi embora junto contigo. E como tu, nunca mais voltou.
— Eu não quero estar sempre com a pele pálida e olhos inchados.
— Só por um sorriso no rosto que tudo dá certo.
— Também não quero. Eu costumava usar esse sorriso quando queria enganar a minha tristeza. Perda de tempo. Não se engana a tristeza.
— O que tu queres então?
— Quero ser feliz.
— O que te impede?
— Você.
— Eu? Por quê?
— Não dá.
— Não dá o que?
— Pra ser feliz…
— Por quê?
— Não sem ter você…
Silêncio.
Ela sabia que só precisaria de quatro passos para mudar sua vida e mesmo assim hesitou em realiza-los. Ela queria deixar tudo para trás e esquecer o que havia acontecido, mas era impossível controlar sua mente e seu coração à noite. Eles insistiam em relembrar a sua vida inteira em apenas 8 horas de sono.
Mas agora ela estava ali. Cem centímetros separavam seu corpo do ônibus que a levaria para bem longe. Para onde as lembranças não a atingiriam tão intensamente… Sua mala já estava lá dentro. Só faltava o corpo. Aquele corpo cansado e ferido… Ele precisava se descongelar. Precisava esticar as pernas e dar alguns passos, mas seu coração o impedia. Pobre coração, queria mais dor. Mas ela não. Ela sabia o que queria. E eram apenas quatro passos.
Levantou uma das pernas delicadamente. Ela tremia. Tudo tremia e ela lembrou-se da primeira vez que decidiu partir. Lembrou-se de quantas malas e roupas foram com o ônibus e ela continuou ali parada. Não é que em outros lugares as lembranças não a atingiriam, mas é que estar ali, naquele lugar, naquela cidade, a machucava tanto. Ver o rosto do seu amado todos os dias e não poder toca-lo a machucava mais ainda.
Ela queria outra vida. Outras ruas, outros bares, outras pessoas. Queria entrar em outras cafeterias e não encontra-lo lá. Ir ao cinema e não vê-lo nos braços de outra garota…
Ela entrou no ônibus. Não tinha mais medo; não lhe faltava coragem, mas lhe faltava forças para vencer aquela batalha entre a mente e o coração. Suas pernas não sabiam mais que caminhos traçavam, não sabiam quem obedecer ou o que fazer. Então elas retrocederam. Desceram o degrau que as mesmas subiram há poucos segundos atrás. Ela iria sair do ônibus. Mais uma vez iria desistir.
— Senhora? Estás bem? – perguntou um sujeito de aparência humilde.
Ela não respondeu. Nunca gostou de mentir para as pessoas. Ela só mentia para si mesma.
Mentia todas as vezes que sorria e todas as vezes que acordava. Ela não queria sorrir e nem acordar. A única coisa que queria era partir e agora ela estava ali, mentindo mais uma vez para si mesma. Estava retrocedendo. Estava desistindo.
— Senhora? – insistiu o sujeito.
— Não… – ela disse baixo.
— Quer ajuda?
Ela só esticou os braços e ele a puxou. Entregou sua passagem e sentou. Pela primeira vez ela observara a cena de outro ângulo. Observou o ônibus partindo de dentro dele, não de fora, e não mentiu ao sorrir.
Não era amor, não era loucura, não era tpm e nem paixão. Era a estação. A estação havia o mudado, o inverno chegou. Com seu ar frio e seus flocos de neve pesados. Ruas vazias cobertas de gelo. Sem movimento, sem ânimo. Mesmice penosa e maçante. Carência de vida e de cor. Não há nada que possa ser feito, nem sol, nem calor derretem esse coração, só amor!
“Augusto
Já começo lhe pedindo desculpas, pois sei o que você irá pensar ao ver essa carta na sua caixa de correios… Mas antes que me xingue em voz alta, quero dizer o motivo pelo qual resolvi enviá-la.
Hoje pela manhã enquanto caminhava até a padaria reparei no meu jeito de andar. Ando chutando qualquer pedrinha que vejo pela frente. Reparei que faço de todas as minhas manhãs um mini jogo de futebol chutando aquelas pedrinhas. A ida eu classifico como o primeiro tempo, e a volta como o segundo. Espero que se lembre dessas manhas. Não das minhas, mas das nossas. Quer dizer, percebi que sinto a sua falta. Sinto falta de chutar a pedrinha com você. Cansa muito levar um jogo inteiro de futebol sozinha. Digo de novo, sinto falta de chutar pedrinhas com você.
Mas não se preocupe, está carta não é um convite para um jogo, acho que ela é mais um desabafo. Hesitei muito em escrever para ti e sei que hesitarei muito mais ao te enviar isso, porém é preciso. Não posso calar-me e deixar a situação como está. Quer dizer, não posso seguir com a minha vida sem antes dizer tudo que penso sobre nós.
Acho que tu foste embora muito cedo, lembro-me que nos separamos muito rápido e que não tive alternativa de retorno. Não tive como reverter e trazer-te de volta para mim. Classifico isso como uma tremenda falta de respeito e uma injustiça comigo. Você não pediu minha opinião e muito menos me disse tchau. Você apenas pegou suas coisas e foi embora junto com o vento daquela tarde. Nem uma carta Augusto, com um “Te cuida, beijos” você foi capaz de deixar. Digo, se tu deixaste eu iria te retornar e perguntar o por que da sua ida. Mas agora já se passaram sete meses e eu ainda não sei por que foste.
Eu sei… Sei que quando voltaste para pegar o resto das suas coisas eu te mandei me esquecer, mas por favor me entenda, eu estava estressada e magoada. Você havia ido embora e esperasse que eu ficasse como?
Eu não queria te mandar me esquecer literalmente, eu só queria que você fizesse o contrário.
Oras, não sabe o quão contraditórias são as mulheres?
Você não me merece, não mesmo. Você não soube me entender. Não soube traduzir minhas palavras para a sua língua. Quando eu disse “me esquece” eu queria dizer “fica comigo”.
Por isso passei esses sete meses em profunda melancolia. Por que você não merece? Eu queria tanto que me merecesse. Queria tanto que me entendesse e ficasse comigo, ou que pelo menos tentasse. Mas você nem tentou. Não apareceu dia nenhum na minha janela e em nenhum dia passou pela minha calçada.
Como pode? Como pode mudar sua rotina só para não me ver. Eu te magoei? O que fiz? Eu juro que não sei das suas magoas, mas eu sei das minhas. E são muitas que não as escreverei. Tu já deves saber ou talvez não. És mais estúpido do que eu pensava ser. Não soube valorizar o meu “eu te amo”, mesmo tendo o conquistado tão rápido.
Apaixonei-me até pelo teu nome, Augusto. E apesar de tudo o que tu e teu nome fizeram comigo e não consigo odiá-lo. Eu só sei odiar te amar, mas se eu pudesse, juro que eu amaria te odiar.
Com amor, sua Lis Lisiel.
Que maldade a sua abrir a porta e sair sem se despedir da dona da casa. Sair sem dar “tchau”, sem dizer para onde ia e depois nunca mais voltar. Mas tudo bem, talvez essa sua ida seja um aprendizado para mim. Talvez eu aprenda a trancar a porta da próxima vez. Não para tu não saíres, e sim para não entrares mais sem a minha permissão. Mas eu sei... Tu não irás mais voltar. Eu digo, não irás mais tentar me fazer sua de novo. Você não quer, e se quer, finge que não. É complicado, eu sei. Sua mente é frágil. Você é frágil, mesmo tendo essa fama de durão; mesmo fingindo não se importar; mesmo mudando sua rotina só para não me encontrar, mesmo estampando outras garotas em seus lençóis só para encobrir a minha falta. Você é esse tipo de homem: durão, prepotente, narcisista, egocêntrico... e frágil por dentro. E mesmo sendo isso tudo minha mente não consegue te deixar quieto no canto da sala ou te varrer para de baixo do tapete. Ela só te quer na minha cama, abraçado comigo, me fazendo carinho. Mente a fraca a minha que sempre insiste em querer algo que não posso ter.
Pensei estar perto, mas na verdade estava muito longe. Foi quando vi dois metros se transformarem em duas milhas, e quanto mais perto estávamos mais longe parecíamos estar, e mais fria e gélida nossas almas ficavam. Nossas bocas não mais proferiam palavras bonitas e carinhosas; não mais existia “eu te amo” em nossos dicionários e o “estou com saudades” continha um significado diferente do real. Era dito da boca para fora, como se precisássemos agradar um ao outro com palavras. Coitados de nós… Tão bobos e tolos, mal sabíamos que as palavras não têm valor nenhum se comparadas às atitudes. Mas tenho que admitir: agora eu sinto sua falta; e embora minhas atitudes se contradizem com as minhas palavras, elas não se contradizem com os meus sentimentos. Sinto mais do que deveria e esperava sentir. Meu orgulho não consegue mais encobrir a sua falta em mim.
É impressionante o poder que tens. Mesmo estando distante suas forças conseguem superar as minhas; mesmo não querendo você modificava meu dia inteiro… Mesmo não sabendo o teu “olá” torna-se o sol do meu dia escuro e sombrio.
Mas o que posso fazer se tudo o que vem de ti é totalmente contraditório; se você é inverno e primavera ao mesmo tempo, se é dia e noite, se é amarga e doce… O que fazer com nossas vidas que deram um giro de cento e oitenta graus?
Continuar onde estou não me parece uma péssima escolha, na verdade é a melhor delas. Porque às vezes você parece como uma rosa, linda e com um perfume encantador, mas eu sei que de uma rosa só lhe sobraram os espinhos e quem sabe uma pétala oca e murcha; sem vida… Tu não és mais primavera, não preservaste suas pétalas. Tu és inverno, frio e maçante, e eu preciso do verão. Preciso de um “olá” quente aquecendo meu coração, e se o seu “olá” não quiser mais ser meu sol, eu não me importarei. Procurarei outros “oláres” em outros bares, ou quem sabe, em outros bosques… Porque você sabe: eu preciso de outra rosa, pois a sua já perdeu as pétalas.
Foram te roubando de mim aos poucos. Você foi gostando e eu fui deixando; não fiz questão de te procurar. Você não fez questão de voltar. Enquanto você estampava novos amores em seus lençóis, eu estampava novas lágrimas. A cada dia era uma nova marca... Você não me procurou; não demonstrou saudade. Então eu fiquei na minha. Fiquei esperando um sinal de saudade. Nem que fosse um pouquinho, só um pouco.
Esperei em vão.
Chorei na minha; senti na minha, aguentei na minha e levei tudo sozinha.
Mas agora você disse que quer voltar.
Ligou para mim e nem fez questão que eu atendesse, deixou apenas um recado na secretária eletrônica.
“Ainda tem um lugar aí para mim?”
Pra você? Aqui?
“Sempre tem, you know, sempre tem...” sussurrei para mim mesma. Eu estava esperando você ligar de novo.
Você não ligou. Não queria escutar minha voz. Só queria um lugar.
Uma cama de solteiro em um quarto de solteiro para comer uma comida de solteiro, e assistir programas de solteiro. Você não queria a mim, só queria um pouco mais de ti. Só aumentar mais o seu ego, só me conquistar de novo para me deixar mais uma vez. Logo agora que a ferida estava quase sarando.
“Então não... Não tem lugar para você. Está tudo preenchido com um enorme vazio, mas preenchido. Arrume outra casa, outra menina para ludibriar.”
Eu quis te dizer. Mas não disse. Ao contrário disso eu te liguei e disse que sim.
“Ainda tem um lugar para você.”
“ Tem certeza?”
“Tenho. Infelizmente.”
Nunca me diga “eu te amo” se a sua intenção não for me amar. Poupe suas palavras comigo. Não as diga se não forem verdadeiras e eu prometo que farei o mesmo. Não quero que nos tornemos aquele casal que perde tempo com mentiras, que discute quem ama mais, que se abraçam de cinco em cinco minutos e se fazem de fofos; que mentem para si mesmos a troco de nada.
Que não sejamos assim. Não quero perde-te para uma mentira… Para um “eu te amo” que ainda não existe em nós.
Porque, quem sabe, nós só nos gostamos… Pois amar é diferente. Tu sabes. O amor é muito diferente do que vivemos. O amor não acaba. Mas e a gente? Para onde essa nossa inconstância irá nos levar? Para o fim? O fim do nosso suposto amor. Suposto, sim. Porque o amor não é inconstante, então por que nós somos?
É porque eu não te amo e nem tu me amas. Descobri isso. A gente só se gosta. Só se curte. Mas não nos amamos o bastante para ficarmos juntos; para sermos um! Nos gostamos, simplesmente. Cada um no seu lugar, com o seu gostar, com seus dias separados e etc. E com aquelas nossas perguntas monótonas de “como foi seu dia?”. O meu dia? O meu dia era para fazer parte de ti, assim como o teu era para fazer parte de mim, mas não é assim. Nós não nos amamos. Estamos separados e achamos que estamos juntos… Estamos distantes e não sentimos.
Mas eu quero te amar. Quero pelo menos tentar, quem sabe, se você deixar. Eu quero saber que amor eu tenho para te dar. Mas só se tu deixares…
Só se deixares eu te amar.
Tu fazes isso de propósito. Eu sei… Somes porque sabe que a qualquer hora que voltar eu estarei aqui de braços abertos para te apertar e sussurrar no seu ouvido que senti saudades.
Conheces-me e por isso me usa.
Porque sabe que meu intelectual não funciona quando o assunto é amor; sabe que sou perdidamente apaixonada por tu e me doeria te recusar um retorno. Mas eu quero dizer que mudei Augusto. Eu mudei. E quando tu resolveres voltar será tarde demais. Não atenderei seus telefonemas, queimarei suas cartas e te enviarei as cinzas só para tu veres o quanto eu mudei.
Mas cadê você Augusto? Cadê suas cartas em minha caixa de correios? Cadê suas ligações perdidas e seus e-mails não respondidos?
Será que é tão orgulhoso ao ponto de nem ao menos tentar voltar?
Não conhecia esse seu lado orgulhoso, frio, soberbo, ignóbil, e por isso não faço questão que voltes. Mas se voltares… Não ligo. Sua voz grossa, porém macia, não me traz mais paz, seu sorriso largo e alvo não me tira mais suspiros e seu cheiro não me deixa mais ébria. Eu não te amo mais Augusto. Não mesmo, nem um pouco.
Mas eu queria saber: se não te amo por que é o teu nome que vejo quando viro a página do meu caderno? Por que é teu nome que rabisco nas capas dos livros de amor? Por que é em você que eu penso quando leio um texto clichê? É Augusto… Eu tenho que admitir: eu ainda amo você e, por mais que eu queira, não consigo te esquecer.
Não hesitei; nem senti medo. Quebrei todas as barreiras que me impediam e me atrevi. Fiz sem medo; venci meus limites e no final eu até sorri. Senti-me feliz por ter feito. Por ter conseguido escrever teu nome na folha do meu caderno. Eu não sei o que sentia antes; não faço a mínima ideia porque não conseguia fazer. Acho que… seu nome me dava calafrios, daqueles que me arrepiam toda, desde a cabeça até o pé. Só o teu nome me fazia perder o sentido de todas as coisas, pois ele me lembrava de todas as qualidades que tu trazias com ele… Então eu chorei. No meio a aula de história eu chorei sobre o teu nome, e enquanto minhas lágrimas pingavam teu nome desaparecia na minha folha de papel e virava apenas uma mancha.
Uma mancha azulada e torta.
Uma mancha…
Que manchou meu caderno, meus olhos e meu coração…
Mas o teu problema é o teu ego! Que anda contigo, dorme contigo e come contigo. Já cheguei a sentir ciúmes dele. Já cheguei a odiá-lo e ainda odeio. Pois tu se importas mais com ele do que comigo. Tu preferes aumentar teu amor pelo teu ego do que por mim. E talvez sejas por isso que não me preferes, pois preferes alguém que minta e inflame o teu orgulho a todo instante, alguém que te diga coisas das quais você quer ouvir. Mas eu não sou assim. Tu sabes disso. E por isso me joga fora. Esse é o teu problema. Você me joga fora e depois vem me “catar” no lixo. Você tem a ousadia de me rejeitar e depois dizer que me ama. Você é tão contraditório e por incrível que pareça eu amo isso em você. Eu amo você todinho mesmo meu corpo mandando eu não te amar, mesmo meu coração pedindo descanso, mesmo eu não aguentando mais os seus jogos.
A gente podia ter dado certo. Você sabe… A gente podia ter dado certo. Podíamos estar juntos agora se não fosse esse teu orgulho esdrúxulo que você tanto insiste em preservar. Tu devias preservar a mim, porque eu te amo, mas um dia eu vou cansar de estar em segundo lugar. Vou cansar de ter que te esperar no outro dia, de ter que te ver com outras e fingir que nada aconteceu… Eu vou cansar, cara. Eu vou cansar de amar um garoto imaturo e vou procurar alguém que me mereça.
E por incrível que pareça eu ainda me lembro daquele dia… Ainda me lembro daquele “alô” fechado que falei esperando ouvir tua voz do outro lado da linha. E mesmo antes de responderes meus olhos já se enchiam de lágrimas; eu pude escutar o som da tua respiração lenta e entre cortada, pude escutar o suspiro que deste antes de dizer “olá”. Aquele “olá”. O “olá” que quebrou minhas lágrimas, as fazendo escorrer sobre meu rosto. Eu chorava ao som da sua voz grossa e roca, chorava ao som do seu sotaque do interior, a cada vez que você falava “amor”, “meu amor” eu transbordava e tu nem sabias. Você dizia que me queria por perto, dizia que queria estar ao meu lado e eu concordava com a mais perfeita harmonia de que eu queria isso também. Eu te queria ao meu lado naquele exato momento. Eu não podia esperar, eu queria sentir o teu abraço, queria sentir a tua mão entrelaçada na minha. Mas eu só sentia a vibração da tua respiração e o nosso silencio a não saber mais o que falar. Então você quebra o silencio com um “casa comigo?”, eu aceito em meio aos risos…
“Não rir! É sério! A gente ainda vai casar.”
“Eu sei que vai…”
E por incrível que pareça eu ainda estou te esperando, sabe? Ainda estou te esperando aqui na porta com o seu terno marrom me chamando pra casar. Ainda estou sonhando com a sua mão entrelaçada na minha e com sua voz grossa ao pé do meu ouvido. Eu ainda estou esperando por você Augusto, ou por uma ligação sua no meio da noite. Mas eu sei… É patético esperar por você, é patético esperar que se lembre de tudo que um dia te fez bem, porque eu sei, eu te fiz bem. Te fiz muito bem, mas você esqueceu. Esqueceu que ninguém, nunca, será capaz de te amar como eu te amei.
Eu te amei Augusto, com todas as minhas forças, eu juro, eu te amei!
You know…
Finge que não, mas sabe. Sabe o quanto me machucou e o quanto me fez chorar. Mas você finge que nada aconteceu. Não completa as frases, as cenas e tampouco meu coração. Você prefere ficar no meio termo porque tem medo de se entregar. Porque tem medo de sair da sua área-de-proteção. Tem medo de dizer o que realmente sente, de falar que me ama sem jogar uma risada no final para parecer que é brincadeira. Você tem medo de mim. A verdade é essa. Tem medo de não ser o suficiente para mim quando na verdade você é o meu mundo. Você não se conhece, cara. Não sabe que eu sou um vazio total quando estou sem você. Que perco as poucas qualidades que tenho, a simpatia e a paciência… a sua ausência me estressa, mas a tua presença me completa, e mesmo eu estampando isso em todas as partes do meu corpo você não percebe, ou prefere não perceber. Mas um dia você vai me perder, eu sei. Um dia esse meu amor desajeitado e insano por você vai morrer, e eu morrerei junto com ele. Minhas metáforas não mais farão sentidos de tão reais, e minhas hipérboles virarão eufemismos comparadas à dor de sua perda. Mas perder você não deve doer mais do que não me achar em ti. Com certeza não dói mais do que a ilusão de te ter comigo… Porque perto de você eu sou fraca demais, fácil demais. Perto de você eu viro uma daquelas mulherezinhas fáceis que se entregam para qualquer um a troco de nada, que abrem as pernas de graça… Esse é o meu problema, eu me dôo tão facilmente pra ti que você nem precisa lutar por mim.
“Quer saber?
Eu desisti de você. Juro, de verdade, de dedos e pés juntos, por tudo que é mais sagrado. E eu não me importo de estar cometendo uns cem pecados agora, desde que seja para deixar isso bem claro para mim. Eu desisto, e preciso parar com isso. Essa coisa de desistir toda hora cansa. Preciso simplesmente parar e voltar ao meu “eu” de novo. Você tem razão… eu preciso voltar ao meu normal, preciso deixar você lutar um pouquinho, tomar a frente, a iniciativa. Por mais insano que pareça, eu preciso regredir. Deixar você tentar sustentar nós dois sozinho. No fundo eu sei que você não consegue. Você precisa de mim. Precisa dos meus elogios, mensagens, ligações e etc, para encher o teu ego e sustentar a relação que você tem com você mesmo. A verdade é que você não me ama. Ama a si próprio e as formas da qual pode se ensoberbecer quando está comigo.
Cheguei à conclusão de que você não precisa de mim, só precisa de si. Então eu estou indo embora, pegando o caminho de volta com os dedos cruzados, rezando para que nada de errado. Rezando para que o meu paroxismo não me domine desta vez, para que eu não sinta a sua falta; para que eu não chore; e principalmente… que eu não desista de desistir de você.
E eu não vou. Coloquei isso na minha cabeça depois que percebi que não estava sendo, somente, boa demais e sim idiota demais… Cara, você não percebe, mas eu suporto todas as suas babaquices, e às vezes quando você vira as costas e vai embora sem ao menos me dá tchau… Eu suporto tudo e quando você volta eu estou lá, segurando as duas pontas do barbante, forçando uma conversa agradável e feliz, porque eu sei que se eu não fizer você não irá fazer.
Ninguém sabe o quanto eu realmente queria dar um espaço para mim. Descansar. Soltar as pontas do barbante e saber que teria alguém para segura-las para mim. Mas não tem. Só tem você e suas mãos livres, suas pernas pro ar, esperando que todos façam tudo por você. E eles fazem, eu faço também. Quer dizer, fazia. Como eu disse estou indo embora, mas não se preocupe, não estou indo literalmente, só estou mudando, soltando o barbante e colocando-o em suas mãos. A escolha é sua, você se o segura se quiser realmente segura-lo. ”
“A verdade é que eu ainda guardo muitas mágoas lá no fundo, e por mais que eu saiba que guardar magoa é como beber veneno e esperar que outra pessoa morra, eu não consigo “querer-esquecer”. Sim, porque no fundo sou eu que não quero esquecer, eu que não quero voltar atrás. E mesmo meu coração gritando que preciso de você, existe uma outra parte de mim, que consegue ser absurdamente mais forte que tudo, me mostrando todo o nosso passado desastroso. Nós disfarçávamos bem, não acha? Escondíamos o lixo debaixo do tapete, jogávamos tudo dentro do armário e vivíamos de aparência enquanto o nosso interior só apodrecia. Você não sentia o cheiro, na verdade você adorava inalar o cheiro do clichê-podre que vivíamos, enquanto o mesmo me fazia vomitar. Sentia ânsias de vomito, gasturas, e borboletas no estomago – e não são aquelas que sentimos quando estamos apaixonados – quando você vinha me chamar. Eu sentia nojo de você e do que estávamos nos tornando. Aliás, do que já havíamos nos tornado. Não tinha volta, o retorno ficava a milhas de distancia e sua mania de varrer tudo para debaixo do tapete impossibilitava um conserto. Nós tínhamos conserto, não éramos um caso perdido… nos permitimos ser, é diferente.
E agora você quer voltar sem jogar todas as cartas na mesa, sem abrir o peito… Quer tapear as coisas entre nós como se apenas sentisse falta do clichê-podre e não de mim. Quer me sujar de novo com sua aparente preocupação, com seus “eu te amo” esfarrapados, suas encenações teatrais e suas frases ensaiadas na frente do espelho. Eu até aceitaria esquecer minhas magoas, mas você me obrigou a criar outras… Ela é sua melhor amiga agora? Aquela que você anda de mãos dadas na rua. Será que agora você entende? Eu nunca te substitui, nem quando eu quis eu consegui substituir você ou o termo que você tanto gostava de usar, de “melhores amigos”. Nunca me permiti usa-lo com outra pessoa, enquanto tu o repetias histericamente. E depois diz que sente falta, que não entende o por quê da nossa separação. É uma pena, se você entendesse eu tenho certeza que tudo seria diferente.”
~ Éramos melhores amigos, até que você arranjou outros.
A morte realmente nos surpreende. Nos pega despercebidos. Uma hora você está com a pessoa, brincando, conversando, pintando as unhas e segundos, minutos ou horas depois você está se lamentando em cima do caixão. Flores, algodões dentro do nariz e o corpo pressionado em um pedaço de madeira, pra meses depois aquilo tudo virar pó. Apenas pó enterrado no pó. Engraçado… Algumas pessoas nunca vão deixar de fazer falta. Os anos passam, você nem sente mais como no começo, mas de alguma forma a falta daquela pessoa nunca passa. E seria uma pena se passasse, não restariam lembranças, nem risos e nem choros. Um dia você está chorando por uma pessoa que, talvez, nem sabe teu nome inteiro, e no outro a vida lhe apresenta um real motivo para chorar. Uma pessoa para realmente sentir falta. Uma pessoa que realmente se importou, que chorou e se doou. Que deu o sangue por você, e que se privou das horas de sono para te fazer companhia enquanto chorava dentro de um berço. Que queimou a mão algumas vezes derramando o leite para ver se estava na temperatura ideal pra você. Te ninou, segurou seus braços enquanto aprendia a andar, escovou seus dentes e depois arrancou seu primeiro dentinho de leite, penteou teus cabelos, e depois quando grande mandava você aumentar a saia ou descer a blusa. Esse tipo de pessoa que deixa falta, deixa marcas… Uma pessoa, mesmo distante, consegue te fazer sorrir. Uma pessoa que nem a morte é capaz de separar. É tão clichê, mas é assim: ela sempre fica no seu coração; e depois ela vira aquela estrela que mais brilha no céu. É… como disse, a morte nos surpreende. Mas eu sei, Deus tem um plano pra tudo e não existe morte para aqueles que estão no Senhor, só um longo sono… Então, bons sonhos Vó.