Theodore Dalrymple
No meu estudo das sociedades comunistas, cheguei à conclusão de que o propósito da propaganda comunista não era persuadir, nem convencer, nem informar, mas humilhar e, para isso, quanto menos ela correspondesse à realidade, melhor. Quando as pessoas são forçadas a ficar em silêncio enquanto ouvem as mais óbvias mentiras, ou, pior ainda,quando elas próprias são forçadas a repetir as mentiras, perdem de uma vez para sempre todo o seu senso de probidade... Uma sociedade de mentirosos castrados é fácil de controlar.
O culto romântico da sensibilidade concedeu autoridade moral ao sofredor. Uma pessoa que não sofresse se tornava uma pessoa com deficiências de caráter, carecendo de imaginação e sentimento.
A primeira exigência da civilização é que os homens estejam dispostos a reprimir seus instintos e apetites mais baixos: falhar nisso faz deles, precisamente porque são inteligentes, muito piores que meras bestas.
O fato psicológico é que é impossível sentir algo muito intensamente por milhões de pessoas, mas só de maneira fria e abstrata. Como disse Stalin, uma morte é uma tragédia, um milhão de mortes é uma estatística, e ele tinha razão. É por isso que precisamos recorrer a memórias individuais para tentar compreender catástrofes históricas. E, quando a condição de vítima se torna o estado normal da humanidade, a verdadeira compaixão se torna impossível: é como tentar passar um pouco de manteiga sobre um milhão de fatias de pão.
Não é fácil definir o politicamente correto com precisão, mas é fácil de reconhecer quando está presente. Ele age em mim como o som, de quando eu era criança, da unha de um professor arranhando a lousa (quadronegro) porque seu giz era muito pequeno: isso me dava arrepios na espinha. É a tentativa de reformar o pensamento tornando algumas coisas indizíveis; também é a obscena, para não dizer intimidadora, demonstração de virtude (concebida como a adesão pública às visões ‘corretas’ , isto é, ‘progressistas’) por meio de um vocabulário purificado e de sentimentos humanos abstratos. Contradizer tais sentimentos, ou não usar tal vocabulário, é colocar-se fora do grupo de homens civilizados (ou deveria eu dizer 'pessoas'?).
"Ninguém percebeu que a perda do sentido da vergonha significa a perda da privacidade; e a perda da privacidade significa a perda da intimidade; e que a perda desta última significa a morte da profundidade. Com efeito, não existe maneira mais eficiente de produzir pessoas mais rasas e superficiais do que as deixar viver vidas completamente expostas, sem a ocultação de nada."
"A ideia de que a liberdade é mera habilidade de um sujeito em fazer valer os seus caprichos é um tanto quanto rasa, e mal consegue capturar as complexidades da existência humana; um homem cujos apetites são sua lei nos chama a atenção não como alguém liberto, porém escravizado. E quando uma liberdade tão estreitamente concebida transforma-se no critério das políticas públicas, a dissolução da sociedade estará próxima. Nenhuma cultura que tenha na autoindulgência publicamente sancionada o seu mais alto bem pode sobreviver por muito tempo, e um egotismo radical será desencadeado, no qual quaisquer limites sobre o comportamento pessoal serão experimentados como infrações contra direitos básicos. Perceber as distinções entre o importante e o trivial, entre a liberdade de criticar ideias recebidas e a liberdade para se consumir LSD, por exemplo, é o tipo de discernimento que mantém as sociedades livres do barbarismo."
Aqueles que em voz alta declaram sofrer muito por razões triviais acabam sofrendo mesmo. A imaginação alinha a realidade.
“O sentimentalismo é o aliado da megalomania e da corrupção. O calor confortante e gratuito do sentimento é um fim em si mesmo, uma mera muleta para a autoestrada.”
“Insinuar a mentes jovens que a história humana tem sido e não é nada mais que isto, um conflito entre vítima e perpetradores, entre oprimidos e opressores, entre o bem e o mal, é fazer com que seja improvável que eles desenvolvam aquele senso de proporções sem o qual a informação não passa de uma forma superior de ignorância.”
Não há comportamento humano que seja desprovido em absoluto de precedentes: o mundo é velho demais para que as pessoas inventem maneiras totalmente novas de agir.
Hoje se considera que controlar a expressão das emoções para não ser inconveniente nem causar constrangimentos aos outros, e em nome do respeito próprio, é algo que está longe de ser admirável.
O culto do sentimento destrói a capacidade de pensar e até a consciência de que é necessário pensar.
Obtêm-se mais votos lisonjeando a vulgaridade do que a combatendo.
Explorei os vales sombrios da vida por muito tempo para que consiga me contentar com seus planaltos ensolarados por mais de algumas horas seguidas.
Levada ao extremo, a castidade deixa de ser uma virtude e torna-se, se não um vício, ao menos um estímulo a ele.
Uma cultura grosseira gera um povo vulgar, e o refinamento privado não consegue sobreviver por muito tempo aos excessos públicos.
No passado, as primeiras experiências sexuais dos jovens vinham acompanhadas de culpa; agora é a vergonha que acompanha a falta dessas experiências.
Elevar o amor romântico acima de quaisquer outras considerações pode ser uma tolice, para dizer o mínimo.
Aproveitando o assunto, deixem-me apenas contar uma história que ilustra a seriedade com que o Estado britânico encara a defesa da propriedade de seus cidadãos. Estava eu passando os olhos pelo histórico criminal de um de meus pacientes presos e descobri que, pouco tempo antes, ele fora condenado por assalto pela 57ª vez. Já que a maioria dos criminosos jubilosamente admite, sob confidência, que na realidade cometeu entre cinco e quinze vezes mais crimes do que aqueles pelos quais foi capturada, era bem possível que aquele homem tivesse praticado mais de quinhentos assaltos. E qual seria a terrível pena que recebeu por sua 57ª condenação? Uma multa de $85, provavelmente paga com o fruto de suas atividades.
Os benefícios recebidos do Estado vêm acompanhados da servidão ao Estado.
Trata-se de um duvidoso tributo ao fato de que, no final das contas, são as ideias que governam o mundo.
Quisera eu ter-lhe dado o livro do professor Hollander. Talvez, se vislumbrasse as insensatas crueldades que se podem cometer em nome das utopias, ele não me tivesse desacreditado. Em sua introdução, o professor Hollander especula por que as atrocidades nazistas se tornaram (merecidamente) tão familiares e por que suas lições foram tão bem assimiladas, ao passo que aquelas do comunismo, que não são propriamente desconhecidas e ocorreram até em escala maior do que as dos nazistas (pelo que não se deve agradecer, é claro, ao nazismo, uma vez que foi ele detido no meio de suas atrocidades), possuem ressonância emocional comparativamente pequena. Essa é uma infeliz realidade que seu livro almeja transformar. Talvez a diferença exista porque certos elementos do comunismo ainda exercem atração sobre muitos intelectuais, e ninguém quer reconhecer que seus ideais justificaram, e em parte também motivaram, assassinatos cometidos em escala jamais dantes vista. Quem não preferiria negar o significado de milhões e milhões de mortes a abandonar as próprias ilusões?