tadeumemoria
MORENA
Pele morena,
saia pequena,
Pequena ensaia
sobre o meu coração...
o samba encanta,
quem canta e samba,
quem balança com graça e paixão...
JAGUARIBE
O que fazer...
meu coração é terra seca,
é flor de algodão,
é estio
ressecando o milho,
é sol do meio dia,
esfarelando o chão...
fiquei tão só como o rio,
como o rio surdo e mudo,
que serpenteava triste
como o jaguaribe
sem o seu jaguar...
o que fazer...
meu coração é rio seco,
sem eco, sem poema,
sem ecossistema,
nesse absurdo
sem serpentear...
pescaria
enquanto eu tento entender
o que eu não percebo
enquanto eu tento
ouvir o que é gritado
os peixes saltam na lagoa
querendo ser pescados
palavras são peixes,
poesia é pescaria
meu barco está abarrotado...
As esquinas estão cheias de filósofos,
as praças estão cheias de profetas,
os amantes se devoram em suas camas...
e a terra é como um pirulito na mão de uma criança...
Nem é tão tarde assim,
Preguiçosa, a lua, entre nuvens se esconde,
não sei de onde me vem a nostalgia,
não sei de onde me vem o desencanto,
eu canto assim tanta melancolia...
a noite é madrasta dos solitários
não tenho meta, não tenho itinerário
não é tão tarde assim...e a esperança definha
e o vazio de sala quarto e cozinha
silencia risos e promessas
nem é tão tarde assim... e já é tarde...
DELEITE
À noite me empenho
ao que eu não tenho da tua alma
convém que eu diga amém
a tudo teu que silencie este encanto
e mudo permaneço,
não mereço tudo, deveria te esquecer
mas esqueço tudo ...
eu sou assim,
a tarde vem e vai...
percebo universos em verbos,
em proverbios
e faço versos,
é o meu jeito,
eu sou isso, assim de descompor
até desexistir neste compor
a essência do amor,
mas ante tua presença
silencio é sinfonia
e eu me deleito...
REFERÊNCIAS
Depois de todas as lembranças tinha o sonho; o rio estava seco, a terra rachada como sua mãe contava; as carcaças dos animais em decomposição exalava um odor insuportável; uma mãe raquítica e maltrapilha conduzia sua criança por uma estrada sinuosa e poeirenta... jamais soubera explicar tal sonho. Ainda tinha as lembranças da mãe e conhecia as histórias tristes das secas mais duras, uma delas levara a sua mãe e fizera migrar o marido, que raramente mandava notícias. A estrada poeirenta dera lugar ao asfalto, que tornava o ato de migrar muito mais fácil, apesar de que, há alguns quilometros já se aproximava um sistema de irrigação. A terra ainda ardia, mas tinha anos com invernos rigorosos mudando totalmente a paisagem e o rio mostrava se caudaloso esverdeando os horizontes. Era motivo de júbilo e comemoraçãoes por todos do lugarejo e de uma forma geral por todos que dependiam do cultivo do solo ou da piscicultura, mas no fundo a aridez já estava em nossas almas, e o sonho não não mudava: o rio seco, a terra rachada, as cárcaças, a mãe maltrapilha e ráquítica conduzindo a criança.
um dia widelário apareceu, trazia uma mochila e muitas desilusões, surpresa pra si mesma foi a sua indiferença a ponto de não fazer nenhuma cobrança. Percebeu que somos como a terra, que precisamos de “chuvas” ou a gente seca. Esteve seca por muito tempo, árida como aquela terra estéril. Hoje os tempos são outros, tem chovido com frequência e sua filhinha Primavera já conta com um ano e alguns meses. Ainda sonha, outras paisagens ou antigas referências mais sonha... percebeu que não há vida sem sonhos.
ETERNIDADE
A noite ouço sons de violino,
passarinhos e a brisa abre meus caminhos
há muito tempo eu fui livre...
tipo de ícaro e astronauta
tocando flauta...
um dia empunhei a espada,
peguei meu escudo, montei raio de luz,
alazão branco, romântico...
eu galopei e de tanto sonhar
eu aprendi que eternidade é esta fantasia
que só dura um instante,
então acontecem todos os nascentes
e todos os poentes,
os pássaros cantam a profusão de luzes
ao tom de tua silhueta, sons de violinos...
Está tudo tão claro agora,
está tudo tão nítido
como o alvorecer
de uma aurora ensolarada,
como o céu anil de uma tarde de verão:
era amor...
O amor nos conduz por uma trilha
com o perfume das manhãs primaveris
e as matizes douradas dos verões...
o amor nos ensina com as sinfonias
dos pássaros e da brisa,
com a paciência de séculos
e com a sabedoria da natureza...
o amor nos fortalece com os invernos,
com as montanhas, com a força dos oceanos
e com as dificuldades e todas as adversidades da vida...
Antes que o sol se pusesse,
Ela se despiu e luziu
Mais que novecentas
e noventa e nove auroras,
Fascinou mais que o crepúsculo,
E meus nervos e músculos
Se contraíram...
Aprendi a ser super herói e fazer poesia,
Porque ela fascinava quando sorria
E eu tinha que lutar pra conquistar o território,
Porque todo poeta tem que ter a sua caneta
E todo herói tem que ter seu arco e flexa...
Antes que o sol se pusesse...
ela galopou pelos horizontes
catando os sonhos
e escondendo os medos,
ela espantou os espectros
e compartilhou segredos...
Antes de todos os olhares,
A ventania da solidão varria o superfluo,
O espirito purgava seus pecados,
Minhas roupas rotas me vestiam
A essencia com pérolas e brilhantes...
Antes de todos os sorrisos,
A alegria germinava um campo fértil
Minh’alma solo fecundo e profícuo
Antes de todos os abraços um turbilhão
De emoções me dizimava
O não saber-me pronto a colheita,
Mas ainda paupérrímo já saber-me rico
Não faz assim, vai devagar
tem pena de mim
só sei fazer poema
e tenho ponte de safena
o coração pode nem suportar...
A NOITE PASSA
O chato é que a noite passa
e o sorriso vira eco num silencio sem graça...
o chato que a noite passa
e a ausência se faz presente
e o presente se ressente
e a bebida traz a ressaca
um gosto amargo de um ontem doce
o chato é que a noite passa
e a praça fica deserta
e o fato vira lembrança
e a lembrança traz a saudade
e a tristeza se faz de fato
o chato é que a noite passa
a música cessa e a dança acaba
e a festa termina e o silencio pesa
como crimes na madrugada
o chato é que a noite passa
e a bebida pega e a gente se embriaga
e vem a despedida e vai a namorada
o chato é que a noite passa
e o sorriso vira eco num silencio sem graça...
ABSTRAÇÕES
Os meus olhos sustentam a lua
A rosa controla o beija flor
E os insetos fazem seu trabalho
As colunas que sustentam
a terra teu seus imãs
A terra fecunda germina a hortelã,
E a rebeldia dos anjos
Cria a harmonia entre o bem e o mal...
Daí surge a paixão
Que tinge de rubro mercúrio,
E o amor que tinge de opala a lua
A saudade que preenche os oceanos
e o que somos além de Abstrações???
NENHUM OLHAR
A primeira vez não percebi tristeza,
Não percebi alegria,
não percebi olhar,
não tinha o que se perceber...
estava sempre ali no ponto do ônibus
parecia esperar uma condução
que não chegava nunca...
sua roupa suja,
seus sapatos sujos,
sua pele suja...
e ali no ponto do ônibus, condomínio Belvedere,
Sargento Hermínio...
todos pegamos nossas conduções
para os nossos destinos e ele ficou ali...
no dia seguinte ele estava ali,
no ponto do ônibus e não tinha guarda-chuva,
não tinha chapeu, não tinha olhar...
não estava triste, não estava alegre,
nada percebia... todos partimos e ele ficou ali...
na manhã seguinte ele estava pálido...
e tinha um olhar, só um olhar,
um único olhar... um mísero olhar
ele partiu...no rabecão do I M L e ficamos ali,
a olhar, sem nenhum olhar...
“OI”
Estive, já há algum tempo pensando, o que o neon tem a ver com fantasia? As luzes brincam nos nossos corpos desviam nossas atenções de mãos estendidas, de ambiguidades que de uma forma ou de outra ainda ainda chocam, porque não estão intrínsecas em tudo o que recebemos de berço. O neon brilha e tem seu fascínio, encanta a multidão e a subjetividade de cada um; e de cada solidão, engana; é o centro da cidade. A catedral imponente com suas torres, seu estilo gótico, as praças com seus artistas anônimos, as galerias com suas joias e suas lentes e cada um de nós como uma partícula única de um conjunto indecifrável de um jogo e cada gesto, cada olhar cada caminhar, cada vestir é uma linguagem, e nessa discussão do “oi, eu estou aqui” ninguém se fere ou será assassinado por absurdo que possa parecer cada presença. Até que mãos frageis de um olhar pálido de uma inanição eloquente grite por tua atenção, então a catedral badala seus sinos e o neon é como o clarão de uma bomba H arremessando seu cogumelo e estilhaçando vidraças de edifícios luxuosos, mas já nos acostumamos com esse tipo de explosões; nada que um suco e um salgado não resolva e voltamos ao fascínio do neon e ao flerte do “oi, eu estou aqui...” e mergulhamos de cabeça no consumismo que nos consome.
ALCATÉIA
Tem uma noite dentro de mim...
Uma noite tenebrosa e itinerante
Que me extorque e me retém
Refém de traumas e pecadilhos...
Olhos me espreitam atrás de moitas,
Tocaias preparadas num pântano onde cerca-me
Uma faminta alcatéia...
Uma amante seminua atrás de cada arbusto
Mostrando seus seios empinados
E línguas encarnadas, propondo beijos
Nos quais deduzo doses de cianureto.
Continuo cercado pelos lobos
Que uivam como um mau presságio
Enquanto diante de mim a loba líder
Lambe-me o rosto com seu hálito fétido
E dentes afiadíssimos...
Do outro lado do córrego que separa o pântano
Há um vale verdejante,
Uma aurora com matizes maravilhosas,
Uma fonte de águas cristalinas...
Ovelhas bem nutridas de peles bem cuidadas
Num pasto irreparável...
Há uma ponte que conduz a esse vale...
Contudo, diante da fera
Eu contemplo a grandeza de Deus
E algo me diz que essa criatura
Quer apenas me proteger
Das matizes maravilhosas,
Da fonte cristalina e da alcateia...
Da alcateia de ‘ovelhas’...