tadeumemoria
ORAÇÃO DE UM SOLITÁRIO
Ensina- me a sonhar
Quando a madrugada se estender feito sangria
Trazendo a agonia de estar só
Faz-me acreditar no amor
Quando a saudade remoendo
Depõe contra a insanidade de querer amar
Ensina-me a conviver com essa loucura
Que fragiliza, mas nos dá a leveza
Insustentável das libélulas...
Ensina-me a aceitar
A insegurança como pilar,
A incerteza como esperança,
A loucura como refúgio...
Ensina-me a querer incondicionalmente
Com a dor dos que se sacrificaram,
Com a amargura dos mártires ;
Ensina-me a amar.
PENSAVA
Ontem eu pensava que te amava
E te amava tanto
Que toda flor
Tinha a cor do amor
E toda rosa
Tinha um dedo de prosa
E todo poema
Tinha a ternura dos loucos
E eu te levava pro lago
Quando a lua prateava a minha ilusão
Ontem eu pensava que te amava tanto
E tanto te amava, que acreditava nisso
Vivia do teu sorriso,
Do que de ti emanava..
.Eu me guiava pelo som das tuas palavras
Com o teu sorriso eu me alegrava
Eu era a sombra da tua sombra
Eu era as tuas verdades
Ou o que eu imaginava que era verdade...
Ontem eu pensava que te amava
E te amava tanto...
TESPERO
A noite é tão longa...
E as estrelas, apesar de serem tantas
Nem brilham tanto...
Falta a tua luz...
E apesar de serem de diamantes,
Esmeraldas safiras e ametistas...
Nem são preciosas...
Falta a tua presença...
A noite é tão longa...
Mas não tenho medo de divididas,
Não tenho medo de goleadas homéricas,
Não tenho medo de rebaixamento...
Tespero...
SOBRE ESTA ANSIEDADE
Houve um tempo que eu era triste só e infeliz,
Houve um tempo
Que eu era solitário demais pra ser infeliz
Houve um tempo
Que eu era triste demais pra ser solitário.
Houve um tempo
Que eu não tinha mais tempo pra ser só
Hoje não tenho mais tempo pra ser eu...
BANAL
Daqui a alguns instantes,
Ao som da tua voz ou do teu sorriso,
Ao som do teu pranto...
Ao som do teu silencio,
Vou te contar
Como se fosse a coisa mais banal...
Sem que você perceba toda esta ansiedade,
Que fervilha nas minhas veias...
Daí então andorinhas farão tantos verões...
Quantas manhãs relutarão
Com seus raios dourados
A se entregarem calmas, fagueiras
Às tardes silenciosas e preguiçosas,
Até que você perceba a dimensão exata,
Então algum dia depois de todas andorinhas
E todos verões, numa manhã ensolarada
Ou numa tarde quase noite, cinzenta,
Fria e monótona de algum inverno,
Admirando o orvalhar nas plantas,
Sob uma neblina fria e constante
O olhar perdido na luz tênue
De alguma estrela teimosa,
Entre nuvens grafites,
Ouvindo a voz assustadora da realidade,
Dando-te a dimensão exata
Do daqui a alguns instantes...
Daqui a alguns instantes...
Nesse esvair-se...
Nesse dissolver-se...
Nesse descompor-se...
De uma forma assim inapelável e quase imperceptível..
Como açúcar na água ou como sal.
Como se fosse a coisa mais banal...
Você percebe que as tulipas murcharam
E que as auroras se foram...
LINK
Vou me tratar desta gripe,
Comprar óculos de grife,
Paletó Alain Delon,
Comprar blusa de cetim,
Camiseta Calvin Klein,
Blazer Yves Saint Laurent,
Vou freqüentar high society,
Botar um link na net,
Vou dar um trato no look,
Vou me inscrever no the voice,
Vou postar foto no Skype,
E agitar o facebook ,
Vou tentar o BBB,
Curtir Idol e David Bowe,
Vou dar um “up” em mim,
Já cansei de estar sozinho,
De ser “estranho no ninho”.
Quero virar passarinho ,
Pra cantar no teu jardim...
Comboio
Sorriu... algo que eu mencionara... não lembro bem, mas percebi, aquele sorriso ainda levava-me à adolescência, às lembranças mais doces que jamais se esquecem, porque são rebuscadas da ansiedade que só a adolescência pode proporcionar; aos pormenores mais insignificantes, mas, não se esquece porque tudo é só um conjunto do que chamamos de paixão. Três dias atrás, pedira o divórcio como quem pede o guardanapo ou um paliteiro na mesa de uma lanchonete; há meses dormíamos em camas separadas; de vez em quando eu olhava os meus filhos e tinha a impressão de que eles me viam como um ET. Parecia uma situação insustentável, no entanto olhando aquele sorriso, percebia ainda um resquício de felicidade; algo vindo de muito longe e que resistira a todas as tormentas do convívio entre um homem e uma mulher, era um fiozinho muito frágil que sustentava o comboio com todos os vagões do nosso relacionamento. Sei que esse trem foi se desgovernando por excesso de zelos, por um super protecionismo, por um medo de um mundo cruel agressivo e traiçoeiro e não me dei conta que as crianças foram crescendo, que suas necessidades foram mudando; um dia um rapaz chegou na minha casa pedindo pra namorar minha filha, fui ignorante, xinguei o rapaz e o expulsei deixando a minha filha triste e ofendida, pois minha filha já contava com mais de dezoito anos; transformara-me num tirano tentando proteger meu lar; e assim de uma forma ou outra fui tolhendo seus passos com medo das agruras e perversão dum mundo exterior; posso pegar minhas poucas roupas e objetos pessoais e sair pela aquela porta e sei que isso seria motivo de comemoração para todos e de uma forma, ou de outra eu os estaria libertando, mas isso seria bom para eles? Deus nos deu o livre arbítrio, e isso foi bom? Sei que provavelmente a essas alturas minha esposa sonha com alguém, que, provavelmente lhe faz promessas e juras de amor; não vejo isso como uma traição, e até imagino que no começo, ela até que seja mais feliz, mas e depois? o desgaste com a rotina, as dificuldades do cotidiano, O cuidado com os meninos? Meus filhos não são filhos dele, e isso complica mais ainda um relacionamento. Não esqueci as agruras, acusações gratuitas e infundadas, palavras ríspidas e pesadas tão somente para magoar; relevo e compreendo que foram momentos de uma ira insana de parte a parte, mesmo sabendo que magoaram, compreendo. Poderia sair por aquela porta sem que o peso dessa separação pesasse somente sobre os meus ombros, onde estaria me esperando um campo de presas fáceis que satisfariam este meu ego de predador comum em todos os machos...mas não posso, pequei por excesso de zelo, por amor, para protegê-los de um mundo cruel, mas não posso pecar por omissão; ligarei para o Duílio, o rapazinho apaixonado pela minha filha, e que provavelmente anda se encontrando com ela por aí... Sei como são esses casos de paixão na adolescência... Permitirei o “face” pra mais nova, sei que “cairão”, machucar-se-ão, um arranhão ou outro... É a vida. Quanto a Sophia, minha esposa, ou ex, bem, tudo começou numa praia... Hoje é domingo, manhã ensolarada, maré cheia, um belo dia para um recomeço...
Tadeu G. Memória
TORMENTA
Se eu soubesse chover...
Não me molharia tanto.
Se eu soubesse sumir...
Seria só um crepúsculo,
Se eu soubesse morrer...
Não doeria tanto.
Mas porque tanto barulho,
Tanta comemoração,
Se todo dia é esta tormenta...
E me derramo todo,
Se sumo e desapareço
Nesse desalento
Se morro a cada momento...
arraigada
Nada que eu fizesse antes...
Nem flores, nem diamantes,
Nada que eu desse...
Primavera ou paraíso,
Nada que eu prometesse...
Paixão ou amor,
Nada que eu cantasse...
A emoção de olhar e querer,
Nada que me encantasse...
Tempestade ou lágrima,
Nada que eu morresse...
Nada que me matasse
Como o silencio indiferente
Nada que me dizimasse
Como se jubilasse
Diante da presença vil
Do estafeta de perfil marginal,
Nada lhe faria ver a luz do dia
Arraigada nas trevas do que lhe saciasse
Procurando a felicidade, como um ancião
Procura os óculos, que está na sua face...
POEMA MENDIGO
Estou cheio de ser poeta,
de sonhar com as estrelas,
estou cansado de me apaixonar
dez vezes por dia
e me desiludir quarenta,
estou cheio de ser poeta,
estou cheio de escorregar no arco Iris,
e mergulhar no buraco negro,
estou cheio de jardins
com abelhas venenosas
e acácias carnívoras
estou cheio de velhas palavras,
de doces rimas ,
do poema água com açúcar,
quero a verdade
de acordar as cinco da matina,
do imprensado do coletivo,
do odor de axilas expostas,
do martírio dos aproveitadores no metrô,
quero a verdade de mendigos sob viadutos
da epidemia de drogados,
quero ouvir a miséria vicejando,
as margens de alagados e palafitas,
quero sentir viciados definhando,
escravizados pelo poder da fumaça e do pó...
quero o meu poema chorando e gritando,
um poema bem inconveniente,
que consiga incomodar
essas assembléias dolentes ,
quero um poema que cheire mal,
que se vista mal ,
um poema mendigo
com a podridão das nossas realidades...
RIO
Rio de janeiro,
Rio de todos os meses,
Rio de todos os tempos,
Rio da minha infância,
Rio das pipas enfeitando o céu,
Rio das peladas nos fins de semana,
Rio de gente bacana,
Rio de gente bonita,
Rio tu és uma espécie de paraíso,
Que existe só para que se perceba
A existência de Deus,
Que provavelmente nasceu
Aqui em Nova Iguaçu,
Ou talvez na penha ou em Copacabana,
E jogava na areia, admirava as sereias
E se apaixonava...
E fez poesia como “olhai os lírios do campo”
E ganhou campeonatos,
Tantos que encheu de estrelas o firmamento...
Rio do Barry White,
Da Madona, do Barry Manilow,
Rio do Chico, do Vinicius do Tom Jobim,
Rio do Júnior que é paraíba
Mas ninguém é mais carioca,
Porque ser carioca é esse estado de espírito
Rio do Cristo, da Tijuca da Lapa,
Rio das mulatas, rio de todas as raças,
rio de todas as belezas,
Rio do meu irmão cearense...
Rio eu Tiãomo!
e
RAÍZES
Sei de mandioca,
Batata-doce e beterraba
Sei de raízes...
Até que o sol se encolha
Atrás da serra
Até que a boiada atravesse o riacho
Até que a tarde fique morna
E a passarada se aquiete,
Sei que o espantalho vigia o milharal
E que Guilhermina,
Moça velha encalhada,
Sonha com um marido,
Sei que é um perigo
Atravessar o rio na parte mais funda
Pro mode piranhas,
Sei que no canavial
Tem espírito de porco...
Ali morreu meu cunhado
Picado por uma serpente...
Ali conheci beatriz,
Com quem aprendi a gostar de raiz...
Aprendi a colher beterraba,
Batata-doce e mandioca...
Aprendi a contemplar o céu estrelado,
A me proteger de lobisomem e Ets,
A enganar saci pererê
Aprendi que a enxadada
faz a terra girar
Proporcionando madrugadas e auroras
E faz a gente envelhecer...
Mas beatriz também se foi
E hoje olho o gado, o riacho, a serra,
Castigo a terra com a enxada
E a terra gira, gira, gira...
E floresce a vida...
ANA SÍLVIA
o mar engoliu seu corpo,
numa manhã dominical,
o mar lambeu seus desejos...
o mar comeu seu sonho...
o mar bebeu suas paixões...
o mar levou seu olhar
cheio de promessas...
a primavera de um porvir
cheio de flores...
o mar também se apaixonou
e fez mais uma sereia...
REFLEXO
Eu quero esquecer o passado
Mas tenho medo
Eu quero esquecer o medo
Mas tem o passado
Eu quero esquecer o sorriso
Vermelho do palhaço
Mas tem o espelho
Eu quero esquecer o vampiro
Mas não tem reflexo no espelho
Eu quero esquecer que sou fraco
Mas tenho meus complexos
sou fraco, caio de joelhos
Eu quero esquecer a lua
mas tem a janela como uma moldura
Tem o lago prateado com a sua candura
tem o seu reflexo
Tem o lobisomem que resistiu ao folclore...
.Tem a estrofe de um soneto feito uma tocaia
Tem a lembrança de tua saia
Ao vento tem este querer imenso...
DOCES LEMBRANÇAS
O passado tem braços longos,
Tem mãos como tenazes,
Tem pernas compridas
Tem pés gigantescos
Que pisam na minha cabeça,
O passado é como uma tigresa
Dos dentes de sabre
Que tem minha cabeça
Entre suas presas...
Que tem meu coração
Pulsando na relva
E tem minhalma vagando sobre os lagos
Dançando as valsas
De madrigais inesquecíveis,
Doces lembranças que não se dissiparam...
Beira-Mar
A lua submissa
Mergulha no lago de prata,
Afoga a noite como um espelho;
Traz a luz do firmamento,
Narciso de sentimento,
Passeio nessa praia,
Pisando em estrelas,
Passeio na via láctea
Mais anjo que trovador,
Mais cangaceiro que pirata,
A cidade é adorno de luzes duplicadas,
Pelo espelho da praia
E o satélite me conduz
Como um deus da brisa,
Ou como um ateu sobre o cometa
Soprando a saia da diva
A me fazer sonhar...
TADEU MEMÓRIA
RELEVE
Sei no que pensa
Quando a noite tensa te envolve,
Quando os versículos te comovem,
Quando a vesícula explode,
.Quando a epiglote se recolhe,
E você se engasga com a saliva,
Sei no que você pensa quando é manhã,
.E os vestígios da noite passada,
Na cama desarrumada,
Manchas na coberta, marcas na pele.
Releve: Pelé disse: Love, Love, Love...
Para os ianques num estádio lotado na despedida,
Isso me comove, não somente pela cor da pele...
Mas por ser ele quem é
Mas o que diria pra sua filha
Que só queria ser reconhecida...
Minha nossa senhora aparecida!
Cida abrace Sandra agora, adote
Essa alma e perdoe nossos deuses...
Tão orfãos de consciência...
Tenha paciência,
Pelé disse: Love, Love,Love...
PATO COM LARANJA
Gafanhoto era o nome do meu pato,
Gato era o nome do cachorro,
Cachorro era o nome do papagaio
E o meu gato era canalha
Que um dia sumiu pelos telhados
Atrás da sardinha da vizinha
Cantava uma canção que eu não entendia
Fazia estardalhaço com a sardinha
Quebrava as telhas... ninguém dormia...
Até que gato latia
Como quem dissesse:
Esse vagabundo não tem jeito...
Até que um dia
Canalha apareceu todo duro,
Os dentes trincados
Mas essa história deixa tudo meio escuro...
Sardinha teve filhotes canalhinhas igual ao pai...
Gafanhoto voou pro quintal da vizinha
E virou pato com laranja...
Foi um almoço e tanto,
Mas depois deu até policia...
Gafanhoto ainda voa nas minhas lembranças
E se banha numa lagoa
Que nem existia,
E ali ele conheceu outros patos
Gansos e cisnes tudo fruto da minha fantasia...