Sérgio Antunes de Freitas
ASSINCRONIA
Eu não sou deste tempo!
Já fui; não sou mais.
Sou do tempo em que, por desnecessárias, as atuais leis estarão extintas.
Restará apenas o “Estatuto do Homem”, do Thiago de Mello.
E a legislação decorrente será feita com retalhos de poemas.
A fome durará o tempo de se ir para a casa.
A solidão, só o tempo de encontrar um vivente.
As pesquisas darão prioridades para a cura das doenças físicas e de caráter.
O trabalho será sinônimo absoluto de geração da riqueza.
Os esportes substituirão, definitivamente, as guerras.
Os animais serão livres e nunca submetidos aos caprichos das pessoas.
As terras, as águas e o ares serão abertos à passagem de todos.
A natureza será sagrada.
E a paz, uma criação coletiva.
Sérgio Antunes de Freitas
Janeiro de 2024
O HORIZONTE
Eduardo Galeano respondeu a um estudante:
“A utopia está lá no horizonte.
Se me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos.
Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos.
Por mais que eu caminhe, jamais alcançá-lo-ei.
Para que serve a utopia?
Serve para isso: para eu não deixar de caminhar.”
Semelhante é a felicidade, pois aparenta estar no horizonte da estrada de nosso destino.
Vamos andando em seu leito, ora pavimentado, ora cheio de pedras, de lama, de osbstáculos deixados por quem ali passou.
Parece ter um único rumo, mas é farta de variantes e atalhos.
Placas de propaganda e locutores alegres indicam opções à monotonia do trajeto. Os locais ofertados são convidativos: fama, riqueza, sucesso, beleza, satisfação instantânea.
Muitas vezes, quem busca esses outros caminhos consegue retornar à via principal ileso; outros se perdem em labirintos desconhecidos. Apenas desperdiçam precioso tempo de vida!
Na senda primordial, as paisagens se modificam diariamente. As laterais podem apresentar árvores frondosas, sombreadoras, frutíferas; regatos de água potável, cristalina, sonoramente borbulhante; pássaros canoros, coloridos, graciosos.
A noite, com fresquidão, traz a lua e as estrelas. E a meditação, como um astrolábio, afere o rumo de nossas existências.
Os lixos largados pelas gerações se acumulam e se espalham. Há cadeiras antigas sem pernas, bonecas sem cabeça, fantasias rasgadas, notas de dinheiro desvalorizado, livros de autoajuda, componentes eletrônicos ultrapassados, pneus gastos, flores de plástico, estilhaços de louça.
Também há trechos inóspitos, com cruzes plantadas nas laterais dos acostamentos. São peças novas, antigas, muito antigas, pintadas, descascadas, enfeitadas, sóbrias, soturnas, miseráveis.
À medida de nosso deslocamento, observamos ser a felicidade apenas uma miragem, acenando no horizonte. Continuamos ultrapassando os mais lentos, sendo ultrapassados pelos mais vigorosos e na mesma velocidade de nossos ombreados pela empatia.
Quando as pernas estão cansadas e o tempo afoito por respostas rápidas e cabais, descobrimos que a felicidade sempre emanou das amizades e dos amores, incessantes, intermitentes ou fugazes - nossas companhias dessa jornada.
Sérgio Antunes de Freitas
21 de agosto de 2024
Bom dia!
Hoje, acordei enamorado pela vida,
Moça charmosa e sofrida!
Aurora musical em suaves tons,
Melodia pintada em neons!
Acompanhavam-na um sabiá em seu vai-e-vem,
E um bem-te-vi, cantando ao me ver tão bem.
Foi uma inexplicável paixão.
Pasmo, quis saber a razão.
Talvez, na madrugada, a noite-menina
Tenha me fascinado com seus olhos de felina.
Fique claro, porém,
Eu não assediei ninguém!
Abrandado, enternecido,
Simplesmente, fui seduzido.
Daqui a muitos anos, minha neta, ao ler esses versos, se lembrará de nossos passeios, para ver sabiás e bem-te-vis. Tomara!
Sérgio Antunes de Freitas
Outubro de 2024