Sammis Reachers
Enxergar linearmente e mais, enxergar linearidades é típico daqueles que foram agraciados/mimados por elas. Os perfeitamente educados na segurança e ortodoxia (simulacros, desde já entenda) de sua tribo; seja condomínio, seja favela, igreja ou partido. Os que picotam o mundo à perfeição em “bons” e “maus”, “comunistas” e “fascistas”, preto e branco. Gente que nunca foi confrontada a contento pela hostilidade criativa-disruptiva-funcional fundamental da vida, a que chamamos de CONTRADIÇÃO.
Não é um exclusivismo aleatório ou autoritário: A vingança pertence ao Senhor (Rm 12.19) porque nunca conseguiríamos vingar tudo o que precisa ser vingado.
Se o mal é empresa de expertise humana, a vingança é grandeza doutra magnitude. Pois estamos de tal forma embebidos no mal que é como se sequer soubéssemos o que fazemos (Lc 23.34: “Pai, perdoa-lhes pois não sabem o que fazem”); não podemos ver, (pres)sentir, compreender o volume e variedade de mal que se excreta de nós, que dirá o que vai no dentro. A vingança compete impreterivelmente a Outro: Um pincel azul embebido em tinta azul não poderia pintar nada de verde.
A burocracia é duplamente maléfica: ela desumaniza ao reduzir tudo a estatística, ao sacralizar o “preto no branco”, e a tudo nivelar pelo rigor (miopia) da lei; e ao comportar e alimentar seu feio irmão siamês: os mecanismos de apadrinhamento que a burlam – e o apadrinhamento, o compadrio, é mesmo tudo o que a burla, numa simbiose tão perfeita que faz corar a natureza. É um tipo de homicídio qualificado do tempo, das esperanças e mesmo dos méritos alheios, em benefício de um construto em geral grande e/ou vazio demais, e das elites que o propuseram, “em benefício do bem comum”.
Sem Nunca Ter Aberto os Olhos - Um poema sobre o aborto
Sammis Reachers
Envenenado enquanto sorria
Para a luz que atravessava
Os tecidos da barriga
Broto de bambu queimado
Para que sobreviva a floresta de incendiários
Queimado enquanto vive a floresta pragmática
Tua mão, tão pequena,
Botão de uma rosa silvestre
Ninguém a segurou, não foi?
Somos oito bilhões e
Ninguém de nós segurou
A tua mão enquanto você despencava
Na noite mais escura
Dessas que tantas acometem
As almas dos homens
Alguém imaginará
O que você poderia ter sido
Que caminhos e abraços você fluiria
E o filme se repetirá
Nas noites mais escuras
Dessas que tantas acometem
As almas das mães
que desistiram
E será tarde demais
E a pessoa dormirá e acordará
Com este edredom, "tarde demais."
Tarde demais,
Tarde, muito tarde
(Pois quando apagamos uma estrela
Tudo o que resta é a escuridão)
Teus olhos nunca chegaram a se abrir
O Universo, esse jardim de
Incredibilidades fulgurantes
Esse jardim que seria seu como é meu
Você nunca o viu
Ente guardado num ente
Apunhalado num ente,
Ente descartado, promessa
Abortada
Sem nunca ter aberto os olhos
Nos perdoa a loucura, o mar o oceano
De loucuras
Que levaram até teu fim,
– Civil a quem a civilidade
Negou civilização –
Até o assassinato de um começo
A história do cristianismo, ou uma delas, pode ser a história da tentativa de desconstrução do Sermão da Montanha.
O extremismo é um corredor veloz, mas sem pernas: precisa sempre das pernas e do lombo de um asno para avançar.
Não somos, mas estamos homens: vermes com a promessa do absoluto. E todo o absoluto jaz - possível e pulsante - em Cristo e em Cristo apenas.
Liberdade não é ausência de trabalho, é desobrigação com o relógio - ou com o relógio de outros homens.
Sem ser rico em misericórdias, ser rico apenas é uma maldição que aniquilará a você e aos seus, ao primeiro vislumbre da eternidade.
Olhe para os lados. Os homens estão cheios de dádivas para lhe oferecer; a maior delas e da qual estão repletos, fruta a qual dão e recebem por graça ou escambo, se chama decepção.
Olhe para o alto.
Ainda que o vento leve o teto e faça tombar as paredes, que fará contra teu alicerce, quando ele é Cristo?