Ricardo Maria Louro
- Tudo me fala de Ti -
Fado
Tudo me fala de ti
Dos Momentos que tivemos
Em cada hora de vida
Das promessas que fizemos!
Tudo me fala de ti
Dos momentos que tivemos ...
Tudo me fala da noite
Dessa noite em que partiste
E do silêncio que ficou
Na nossa casa tão triste!
Tudo me fala da noite
Dessa noite em que partiste ...
Tudo me fala de nós
Nas tristes horas marcadas
Por uma vida sem rosas
Por tantas dores passadas!
Tudo me fala de nós
Nas tristes horas marcadas ...
Tudo na vida me fala
Dessa noite em que partiste
Das amarras que ficaram
No meu corpo só e triste!
Tudo na vida me fala
Dessa noite em que partiste ...
Na expectativa de que um dia a vida me seja favorável, aqui estou, inteiramente desperto, despojado de mm!
QUANDO NADA RESTAR
Quando nada restar de nada, nessa hora antecipada à última hora, haverá sempre um poeta à tona do mar azul para ouvir a voz de todos os desesperos humanos e recolher no seio das húmidas palavras o perturbante gesto de escrever, aí, onde cabem por inteiro a Terra e os Céus ...
- CERTEZA VAGA -
Na solidão dos dias parados
Há esperas inúteis que nos doem
E há olhares do tipo cansados
Que nos entristecem e consomem.
No peso das horas marcadas
Há em nós suspiros profundos
E há mágoas que pesam, cansadas,
Em busca d'encontrar outros mundos.
Na loucura d'encontrar o amor
Fiz d'amargura um grito maior
E no passar dos dias, à dor,
Conheci-lhe os sonhos de cor.
Afinal ... Nem sei bem da onde vim!
Nas esperas inúteis que nos doem
Tracei um caminho de ti a mim
E meus sonhos já não vivem só morrem!
- IMPOSSIVEIS -
Há pessoas de quem os olhos não se esquecem
por quem a pele grita, outro instante!,
pessoas por quem os sonhos adormecem
na esperança que estejam mais presente!
A boca, o toque, o odor, o paladar,
tudo grita em nós o nome dessa dor
e os olhos cheios d'amargura teimam em chorar
carregando de noite a memória desse amor!
Mas a vida é mesmo assim, dá e tira,
é um vendaval de sonhos, vai passando,
e o que fica é a perda que em torno gira,
de quem se deu, acreditou e foi sonhando ...
Não sei se me apetece estar vivo,
porém, gosto muito da vida ...
Não gosto de ter que pensar sobre ela
mas gosto de senti-la ...
Não me agradam as quedas que ela traz
mas gosto de vivê-la ...
Em suma ... não sei... mas ao menos,
Sei que não sei ...
Quando por fora me virem sorrindo, saibam que, por dentro, choro! Talvez porque haja em mim qualquer coisa de fado, um não sei quê de poesia, um tanto de amargura, tristeza e solidão...
E O MUNDO CONTRAPÕE
I
Da natureza deste mundo de vaidade
nada resta além do que é triste e banal,
ser Cristão é assumir uma Verdade,
ser Bem-Aventurado, não ser igual!
Felizes dos que são pobres em Espirito!
E o mundo contrapõe: Felizes os poderosos,
aqueles que dominam, os que dando um grito
dizem, coitados desses tolos generosos ...
Felizes são os mansos de coração!
E o mundo contrapõe: Felizes são aqueles
que estando em solidão geram violência e solidão...
Felizes daqueles que choram p’lo caminho!
E o mundo contrapõe: Felizes daqueles
que tendo tudo sentem que mandam no destino ...
II
Felizes dos que querem a Vontade de Deus!
E o mundo contrapõe: Feliz és tu se fores livre
de um Deus ultrapassado que diz que vais p’ro Céu
se sofreres em silêncio e o seguires ...
Felizes dos que tratam os outros com Misericórdia!
E o mundo contrapõe: Não se impressionem
com a miséria nem a fome, elas são próprias
da natureza humana, não se emocionem ...
Felizes são os sinceros de coração!
E o mundo contrapõe: Felizes dos que mentem
porque a mentira alimenta a elevação ...
Felizes os que constroem a paz entre todos!
E o mundo contrapõe: Felizes dos que não sentem
medo de viver em guerra dominando os outros ...
III
Felizes os que são perseguidos em nome de Deus!
E o mundo contrapõe: Felizes os que sobem na vida
sem pensar nem olhar a quem sofreu
gerando em seu torno dor e dúvida...
Eis a diferença entre dois reinos tão duais!
O Reino de Deus não é o reino dos Homens!
O Céu e a Terra são realidades desiguais
onde alimentos tão diferentes se consomem ...
E continua a ecoar no mais dentro de nós:
“Sede hospitaleiros com os outros!”
Façam-no sem murmurar! Guardai a voz ...
Acolhei os Peregrinos, dai as mãos,
vede, todos os cuidados serão poucos
porque Cristo está no olhar de cada Irmão!
Inspirado no discurso do Sr Reitor Manuel Maria Madureira da Silva, Cónego da Sé de Évora e Prior de Santo Antão em noite de Novena à Senhora da Conceição na Catedral de Évora.
Évora 5 de Dezembro de 2017
- CASA DO COMENDADOR -
Naquela casa esquecida
Há janelas de saudade
Um brasão desenhado
E uma história perdida
D'um morto consagrado.
Pássaros sem asa
Olhares sem vida
Gente que sofreu
E quem por lá passa
Diz: "A casa morreu!"
O tempo falou
Nas paredes caladas
Mas a Alma da casa
Em nada mudou!
Alguém a abraça ...
Retornou o passado,
A casa renasceu!
E numa hora estranha
Viu-se a Tez do Fidalgo
Dom Infante Paçanha.
Poema ao Solar brasonado de Dom Infante Paçanha no centro histórico de Ferreira do Alentejo.
- SOL TRISTE -
Nos braços do sofrimento
tudo é nulo, tudo é vão,
e é em vão o pensamento
que dá voz à solidão ...
Sol triste dos dias meus,
dá luz aos meus cansaços,
traz-me novamente Deus
p'ra que eu durma nos seus braços.
Mas se vier a Primavera
e eu já tiver morrido,
(ai Senhor, ai quem me dera)
nestes versos estarei vivo!
Já que a dor está no sangue
esconde ao menos quem a fez
p'ra que a Alma sempre cante
mal lhe doa outra vez ...
A Sorte nasce quando a vontade do homem coincide com a Vontade de Deus.
A coincidência não é um acaso .
Está pensada por Alguém Maior!
O mar das minhas mágoas
Já não chama p'lo meu nome
Mas nos meus olhos profundos
Passa um vento que consome
Todas as mágoas do mundo.
Porque eu amo a poesia!
Amo a rosa que nasceu
Entre a noite e a madrugada
Que em seguida floresceu
Mas ficou abandonada ...
E hei-de amar o amanhã
No cantar dos seus regatos
Hei-de amar a multidão
Levar o Fado nos meus braços
Com amor no coração.
Os meus olhos não se esquecem
Dos sorrisos que fizeram
Ao chorarem docemente
O destino que me deram
Tantas vezes tristemente.
Amo a dor que já não dói
E os silêncios que ela faz
Amo a luz do meu olhar
A magia que ela traz
Ao ver os dias a passar.
O que mais me dói ao saber que vou morrer
é pensar que o amanhã já não é meu
e que o mundo há-de continuar a correr
como se eu 'inda fosse eu!
O que mais me dói ao saber que vou morrer
é pensar que a madrugada nunca mais
há-de chegar, só porque não a irei ver,
nesse mundo onde só existem vendavais!
O que mais me dói ao saber que vou morrer
é ter que me esquecer do cheiro a terra molhada,
não ouvir os regatos pelos campos a correr
ou a chuva que bate levemente na vidraça!
Nunca mais hei-de falar dos meu Poetas!
Nunca mais hei-de sentir ou hei-de ler
os seus Poemas, suas palavras de profetas.
Só por isso e nada mais terei pena de morrer!
Afinal o que me pode mais doer do que não
ouvir o som da poesia?! Não a ver!!!
Não sentir no corpo o toque da sua mão!!!
O que me pode mais doer ao saber que vou morrer!
Na solidão dos dias cansados
há sempre em mim, de noite,
um verso por escrever,
há em mim algo de oculto,
intenso e indiferente!
Na ilusão das horas marcadas
há em mim um poeta
que reconheço mas não
entendo nem desejo!
Estou triste como a noite
embora o dia 'inda agora
tenha começado ...
(...) esta noite tocarás para as estrelas,
esta noite, tocarás ao som do vento ...
Tudo porque as estrelas são belas
e a vida não passa d'um momento.
PARA CELESTE RODRIGUES:
- Que pena que tu Partiste -
Partiste! Que pena que tu Partiste!
A vontade de te ver não queiras imaginar.
Partiste! E afinal o que é que deixaste?!
A minha vida sem ti, sozinha, ao pé do mar.
Partiste! Que pena que tu Partiste!
E levaste contigo a alegria do teu olhar.
Partiste! E afinal porque é que Partiste?!
E me deixaste neste cais, tristemente, a chorar?!
Partiste, que verdade tão cruel,
Que silêncio tão fatal, que lamento tão profundo,
Partiste e só me resta este fel
Que não me mata nem leva da tristeza do mundo.
Partiste! Que pena que tu Partiste!
O que vivemos já não volta, p'ra nós tudo acabou.
Partiste, só já me resta não viver
Chorando os nossos sonhos e a tua vida que passou!
Em memória da minha grande referência na poesia para o Fado, à minha querida e doce Celeste Rodrigues - a essa "Pedra de Lisboa".
- Teus olhos na Noite -
Meu amor de madrugada
na solidão dos cansaços
só vejo dor e mais nada
sem o calor dos teus braços.
Mas de ti não me aparto!
E da cama, por instantes,
p'la janela do quarto
vejo duas estrelas brilhantes.
São teus olhos na noite
duas velas num altar
e fosse lá p'lo que fosse
vi-as tão juntas ao luar.
E pedi-lhes dois desejos
ao vê-las do Céu cair
senti depois os teus beijos
vi-te de novo a partir.
- Desabafo -
Há coisas que não doem porque já doeram,
medos que chegam sem chegar, e quando chegam,
não passam de temores, agruras, enfados, abanões ...
Há gente que vai e vem num continuo movimento de cumprimento e despedida,
e é nesse tempo do meio, entre chegarem e partirem, que estamos nós, parados, incólumes, em silêncio, a apreciar uma viagem circular.
Porque quem se vai, um dia torna, mas quando volta, já nem sempre os esperamos ... e adeus, sigam o destino ...
E há milhares de sentimentos que já sentimos: desilusões, tristezas, altos e baixos, momentos de solidão ...
Os sentimentos são como as pessoas, vão e veem, chegam e partem, mas quando voltam, já não os recebemos do mesmo modo. Tudo porque já um dia os acolhemos e já um dia nos abandonaram.
Hoje tenho medo! E não é fraco quem diz ser! É forte! Coragem não significa ausência de medo. Porque todo o corajoso tem medo, por isso é corajoso ...
Hoje visto-me de medo! Como com o medo! Bebo com o medo! E durmo com o medo, vivo com o medo ...
Um medo diferente, bem o sei, mas medo!
Minha casa, minha cama, meu fado, meu jardim d'angustias e solidão!
Dou-te a minha mão, olho-te nos olhos e desabafo: AMO-TE!
Ricardo Maria Louro
Café a Brasileira
Chiado/Lisboa
- AO VER-TE DAQUI -
É tão estranho hoje ver-te, ao ver-te daqui,
O amor quando chega a gente não espera,
A vontade de amar que um dia perdi
Talvez volte por ti, ai quem me dera!
Nem mar ou silêncio ou vendavais que vivi
Nada é mais triste que o amor que matei
Mas tenho medo de sofrer o que já sofri
Passar por aquilo que um dia passei.
Não quero voltar a chorar por ninguém
Nem mesmo que a vida um dia mo pessa
O amor que te tenho não veste o desdém
Haja o que houver, aconteça o que aconteça.
Já nada me espanta, já nada me espera
Já não quero sentir o que um dia senti
Acabou o Inverno, já é Primavera
E assim nasceu este amor que sinto por ti!
- QUEM DERA PODER NASCER DE NOVO -
Quem dera poder nascer de novo!
Ser diferente do que sou -mais feliz!-
Voltar alegre ao colo de meu Avô
E não lembrar a vida que já vivi ...
Quem dera poder nascer de novo!
Rasgar os tristes horizontes que guardei,
Deixar partir o passaro perdido, o corvo
adormecido, que ao meu destino acorrentei.
Quem dera poder nascer de novo!
Esquecer de quem um dia me fez mal
Sentir dentro de mim que os absolvo
E acreditar que nada mais será igual...
Mas tal coisa não irá acontecer!
Sou assim: vivo à margem deste povo,
Só esperando pela hora de morrer,
P'ra quem sabe, poder nascer de novo ...