Raniere Gonçalves
Agosto: ventos sibilam em rodopios.
Vou falar pro Miroldo trocar
o caiaque dele
por uma prancha de windsurf.
Vou cerrar meus olhos
como se faz com a porta de um empório.
Levantei com as galinhas,
hoje.
Agora o quilo me pesará mais.
Na rede.
Entre o coqueiro e o pé de mangaba:
a cidade aos meus pés.
O vento sopra como um sussurro de amor.
Sonoro,
cálido.
Tem mais água nos meus poros
que esse arremedo de chuva.
Parece que São Pedro não toma mais cerveja.
Sempre que venho nesse boteco
me sinto na áfrica.
Girafas, hipopótamos...
Uma gazela acaba
de passar do meu lado.
Quilo feito.
Tarde aberta.
O sol me envolve
com seus dedos de fogo.
Só mesmo uma cerveja
pra esfriar o sopro do inferno.
Esse vento vespertino
parece um sopro do capeta.
Na lida rural de agora
eu me sinto como uma costela no bafo.
Comi três pães de queijo.
Minha sobrinha com a vozinha de Barbie dela
me perguntando coisas.
Se um pão de queijo
é irmãozinho do outro.
Comer, beber, sorrir.
A ternura dos vizinhos.
O olhar varado
das moçoiras saídas da escola.
As rezes berrando, longe.
O zumbizar das cigarras.
Saudades que se amontoam
e não cabem num tuíto.
Um dia desses desato.
E apareço sem avisar
naquelas casas
dos meus amigos.
Só pra reviver passados inesquecíveis.
Pra beber vinhos que ficaram velhos
com tanto tempo escorrido por debaixo
da ponte entre o antes e o agora.
É isso: Nostalgias e gastrite.
Um dia mais perto da morte.
Duas ou três escolhas.
Apenas um caminho.
Lá vou eu.
Vento no rosto
e sorriso nos lábios.
O garanhão tem o membro pesado.
Coitadinha.
Eu a encontrei ali deitada,
descadeirada.
Posologias passadas: levantá-la na talha,
remédios e esperança.
Odes do Piancó,
do gadinho caracú tão alegre
quanto a chuva que virá.
Labutas rurais.
Deitado na rede,
no lusco-fusco do chove não-chove.
O vento balouça a cabeleira das guarirobas.
Eu?
Regurgito passados.
Fotografias recortadas,
verdades recorrentes...
Nada nunca muda,
realmente.
Sapatos se alargam aos pés
e aos calos.
A saudade vira nostalgia.
Você tem de olhar com olhos mansos.
Senão será impossível ver.
E sem passados impregnados.
Só com a alma,
só com o querer..
Uma brasa queima meu pescoço.
Acho que deve ser minha inocência.
Carne trémula.
Olhos e olhares.
Imaculados desejos.
O zéfiro balouça o ipê.
Longe ritomba um trovão.
Detrás do zíper: o ocaso.
Noite e vinho
derramando sono nos meus olhos.
As recorrências regurgitam.
Meu coração está vazio.
Continuo procurando por aquela
princesa pálida.
Ou por alguma mucama de ébano...
Que me deixe mole.
Com um brilho nos olhos.
E com planos para o futuro.
Que me ensine coisas idiotas.
Que me faça sorrir.
Me ardem os olhos.
Meu bruxismo suplantou todas
as fogueiras.. E cruzes!
Dia rompe a tépidas mordidas.
Quero carnes!