Neirilane Lima
Eu te Levei Comigo Amor Amigo
Quando você foi visitar o Japão
Me senti tão frio
Uma folha caindo
Sopro do vento
Levando o barro
Vivi um tormento
Aquele pingo de tinta que cai
E não se vê parte da pintura
Um navio a beira mar
Viajante acenando pra quem lá não está
Só fui alí
Iluminar o oriente
E comigo te levei
Bem, grande bem
Desde a temporada das flores
Até a grande geada
Lá na imensidão do monte.
O Machucado Que Ofende o Sabonete
A justa razão de alguém nascer já justifica o esperar por acontecimentos, por isso muitas vezes não devemos dar tanto valor ao caos inevitável.
Nascer, crescer, viver. Fatores que contribuem para o "mal necessário" existir, estar alí.
Mas o que é mesmo necessário para que não xinguemos o sabonete que cai das nossas mãos? Penso o quanto é irracional culpar o outro pelos nossos desmazelos, pois se esquecemos de orar, enfiamos o pé na lama e permitimos as escoriações nos sabonetes da vida, a culpa é exclusivamente nossa.
As Chaves de Fendas Que Não Desapertam os "Nós"
É o dedo que aponta um deslize de quem se ama
A mágoa que insiste em permanecer após um pedido de perdão
O tapa na face do filho que chegou tarde e não avisou
O receio de novamente errar e o não querer mais tentar
A conspiração sobre o menino que ainda não aprendeu a ser "grande"
O descontrole ao traçar o próprio destino
A desculpa de não ter tempo para caminhar
O não querer dar, com medo de não receber
A insistência em lutar contra o que realmente se quer de verdade
A permissão dada à mesmice para que não seja necessário mudar o time perdedor.
Assim seguimos, levando nas costas uma caixa de ferramentas insalubres, alimentando o improvável sonho de consertarmos os desajustes da vida.
Qual o Desafio do Século?
Para muitos é controlar um vulcão em plena erupção, diminuir o desejo das lobas fêmeas em pleno cio, tornar retornar à torneira os pingos d'agua desperdiçados.
Já para outros, seria ter um dia de aconchego em seu lar, acalentar os seus filhos e pô-los para dormir, tomar uma xícara de chá com um amigo no final da tarde, sentar-se no sofá e uma fileira de chocolate degustar.
Assim, temos feito os nossos dias improváveis, não querendo calçar sapatos para não ser necessário justificar os calos nos pés, evitando sorrir para não fazer esforço em vão, afinal devemos viver para ganhar dinheiro e não permitir "perdas de tempo".
Diante de tanto caos, estamos eliminando de nós o racional, desfalecendo o "pensar" e desesperançando o se perceber como ser humano: cabeça, corpo e membros.
Voar ou andar?
Usar os olhos ou o faro?
Ter leves penas ou ser encoberto por pelos?
Não importa! O importante mesmo é ter coragem para enfrentar os desafios lançados pela vida.
É ter um voo lúcido e firme diante de um mar de impurezas alheias
Andar com os pés descalços e não sentir ardor ao pisar nos pedregulhos do desamor
É ver transparência ao olhar pela janela nublada a chuva incessante da ingratidão
Farejar as melhores essências nos maus-gostos da vida
É ter a suavidade ao tocar o "nu" dos desalmados
Usar o céu como cobertor para acalmar assim o desconforto e o peso da dor.
Estar tão longe
Em outro lugar
Andando em asfalto
Ou estático no decolar do avião
Esse pedaço de ti em mim
Vestido, capa transparente
Enraizado, protegido
Insuprimível
Nos explica o bom da vida
Paz, amor, realização.
Hoje te vi nascer
Junto com os pinguinhos da chuva
Era manhã, cedinho
Na companhia do mar
Maresia
E em meu percurso
Com a frieza batendo na face
Você me contou
Te trouxe sorrisos
Detalhes do meu mundo
Onde muitos por mim passam despercebidos
Desafio Inóspito
Quem te plantou, oh semente
Te percebi andando por aí
Parei e não pude deixar de observar
A sua força, a sua intrepidez
Os desafios que a vida te fez enfrentar
Tentando a sua timidez aguçar
Nascida, crescida, hoje você é vida
Desafiando as percepções
Contradizendo as razões
De quem em ti não acreditava
Achando que jamais seria notada.
Assim ele surge
Mesmo seguindo um destino congelado
Mantém-se firme em sua jornada
Sobre os trilhos encobertos
Sem medo de trepidar
E por fim descarrilar
Preparado não desiste
Segue radiante
Deixando para trás paisagens Passagens dos que perderam a hora Saudades dos que ficaram
E acenaram pra ti antes da aurora.
A Garota do Inverno
Ela não é triste
Apenas introspectiva
Percebe a vida como um passaporte, lenta
Segue sem ser notada
Timidamente passa
Seu olhar sério, disfarça
Intuitiva
Ela aguça o pensamento
Do menino que se ofereceu
A vir te encontrar
Junto ao frio tempo
Por ela se fazer encantar
Mas tijolo não revida
E ele tolo
Tão mal pensou
Achou que ela
Por ti se interessou
O seu desejo congelado
Em água se transformou
Acordou, não era o "tal"...
Por si só se convenceu
Que nem sempre tentar
É a melhor forma de conquistar
Mas quem sabe se deixar o inverno passar...
Um foco. Dois caminhos
A mesma entrada
O mesmo ponto de partida
E assim para um seguir
Precisa com o outro estar em sintonia
Início, chegada
Se na frente um lado parte
De imediato o outro atrasado
Corrompe, entorta, amassa
Desanda, estraga
Fere a arte.
Lua nova, foi você
Que mesmo estando pela metade
Aquele caminho iluminou?
Disfarcei, nem quis te ouvir
Pois sei que brilhaste não para alumiar
Mas sim para tornar notável a sua presença
E fazer todo ser sensível te contemplar
Olhar pro céu e contigo sonhar.
Amo sentir o seu cheiro
Inconfundível como a flor
Flor de laranjeira
Café na chaleira
Pimenta-do-reino
Chocolate amargo, cravo
Branco lírio, genipapo.
Você chegou
Estive a esperar por esse dia
Com a pontinha do meu indicador
Desenhei o seu nome no espelho
Já nublado
Não permiti que o tempo apagasse
Te protegi do descontrole do vento
E enfim te gravei em mim
Passaram as estações
Você pairou por outros hemisférios
E hoje retornou
Cedo me acordou
Trouxe chuva, preguiça
Uma sensação de "você"
Ergueu a grandiosa nave
Se convidou a me proteger
De junho a setembro
E depois, novamente voltar
Trazendo flores, primavera
Um buquê de tulipas amarelas.
O Viver Pelo Olhar
Em meio ao imenso vazio dos altos montes
Ela alí está
Divinamente se faz presente
Mesmo opaca, reflete
Faz o andarilho imaginar
Com quem viveu
A quem protegeu
Quando teve fim o seu apogeu
E nessa estrada
Chão, barro
Cheiro de mato
Quem dera
A sua porta não aberta adentrar
Chegar, cumprimentar
Fazer sorrir
Dizer sim, ficar
Quando anoitecer
O céu azul contemplar
E se chover
Correr
Embaixo dela me proteger
Esperar amanhecer e reconhecer
Que toda a sua beleza existe Independente do sol nascer.
Alcançar e ver do alto os seus sonhos
Mesmo andando a trepidar
Nada é capaz de retirar a ponte
Dos pés do andarilho perseverante
Do homem que voa
E reconhece o seu lugar.
As Várias Performances do Homem
Ora alegre, outrora triste
Aterrorizado, maltratado pelo próprio estímulo
Venturoso, glorioso com a vida
Segue o fluxo no tão corrido trilho
Muitos sem rumo seguem
Tentando achar seu destino
Viram o mundo de ponta a cabeça
Trazem consigo peso, fardo, tempo perdido
Deitam, dormem, levantam
E já abertos os seus olhos
Apenas enxergam aquele sonho nascido
De dentro de cada personagem vivido
José, Roberto, João
Carlos, Luiz, Genésio, Falcão
Janaína, Maria, Sofia
Marta, Bruna, Cássia, Luzia.
Ser Diferente é a Arma do Combatente
Nem sempre espinhos cravados ferem a pele
Às vezes são respeito, recanto, proteção
É tornar o ser peculiar
Vitorioso, reconhecido, destemido
Cada um carrega suas marcas
Cabe ao visionário percebê-las
Identificá-las como tamanha fortaleza
A grande diferença
A estranheza da beleza singular.
Nem adianta falar mais de uma vez
Quando o contrário se quer
E se o querer é tanto
Quanto um campo com bolas de neve
Ao insistir você se torna um sapato branco
Sapateando na lama escura da rua 7
Eu te disse não quero
Assim, você por mim passa
Procurando então me achar
Volta pelo mesmo caminho
Observando o chão
Como quem quer encontrar a moeda da sorte
Que nunca esteve na sua mão.
Baby
É você quem reflete no meu espelho
Meigo menino
Fazendo o melhor lugar
Ser onde você está
Mesmo apressado
Sem tempo para ouvir
O jazz da Wine
O piano do John
O blues da Nina
A guitarra do Pink
Sentes quem sou eu
Quando a canção que toca
Deixa o nosso mundo em paz
Chega em nós
Maciez do caju
Jabuticaba sabor
Tangerina em flor.
Ogros, papões, gnomos
Fadas, lendas, monstros
Sei lá...
A vida às vezes parece assim
Uma mera fantasia
Seres vivos com estranhos modos
Insistem em nos amar
Com peculiares formas de gostar.
O inusitado sempre será algo fascinante. Nos olhos de quem percebe e intensifica o surreal, a realidade é outra. É subjetivamente decifrável para o seu próprio EU.
A natureza surge
Para confundir os sábios
Desvirtuar o planejado
Desativar o programado
Sem deixar de ser
Quem ela nasceu pra "ser".
Sou fascinada pelo exótico. Ele é sobretudo fantástico. A sua estranheza intriga e me faz pensar o quanto é interessante o "ser" diferente.
Me vejo muitas vezes diante de sensacionais olhares, de movimentos precisos, do caçador em busca da sua presa e de golpes certeiros e por vezes incertos. Mas o objetivo da vida é esse: o observar com precisão. É golpear o dia a dia com a plena certeza de que somos um perigo iminente, mesmo que por dentro estejamos fartos e extremamente cansados da árdua peleja.
Se é de mim que gostas
Que fiques
Desenrole os fios
Desate os laços
Não apresses o passo
Siga o meu compasso
Aqueça o café
Esquente o pão
Ponha a mesa
Faça bigodinho de leite
E me beije a pontinha do nariz
Olhe comigo a janela
Descanse a sua mão sobre ela
E mais tarde segure a minha
Me leve para passear
Aqui, alí, acolá
Perca o passo
Se permita
Mas não repita
O que não te fez sorrir
Apenas diga
Onde eu for
Quero contigo estar
No frio do oceano
Ou no calor litorâneo.