Naty Parreiras

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AUTÓTROFO
Há cansaço em existir...

Nula,
Desisti de todas as querenças.


Quero regurgitar o veneno
Sistêmico
Do dia a dia

Expor o caos à exceção
Me fantasiar de tempo
E passar incógnita
Por cada ruela do esquecimento.

Eu morri à míngua
E o sol
Solitário e ambíguo
Tornou-se repouso à sombra
De uma lua qualquer.

Assombro-me da crueldade
Inanimada em olhos fixos
Distraídos do instante
Em que foram passíveis
De ver.

Cala-te boca
É o calabouço que te acorda
Subterrâneo
Ima translúcido de teus dedos
Metais de vidro
A atrair fragmentos ao vento.

Eu duvido
Que aceite o reflexo
Como ato involuntário
Do que tende a ser
Espelho
Desespero
Perto
Aperto
Não há pleito algum em quem
Esqueceu-se de reivindicar.

Fraco
A corda arrebenta do lado
Mais fraco
Mas apto à fraqueza
De arrebentar.

Só sei
Que só
Tenho aptidão para sobreviver.

E enquanto existo
Há uma naja sibilando
Dogmas em línguas febris
Contorcendo-se inebriada
Pelo claustro do próprio sufocamento
Por entre mágoas.

Agora vai
Troca de pele
Digere essa presa
Que abala o vazio
A fome
A finitude do ser
Que era
Antes do bote

E sobrevive.

Inserida por natyparreiras

MÚLTIPLA DE TI
Meu amor,

Não tome meu zelo como autômato
De quem crê portar o visto
Do que, alheio a tudo,
A tudo viu.

A começar por ti
Estréia concebida apenas na usura fantástica
Da minha imaginação.

Não...
Essa assimetria toda combinada
Calhou de me emudecer
E na ausência de um tipógrafo
Prefiro não tipificar cadências
Tímidas
Tão pouco
Avassaladas
Em mútuo estado de contingência.

Mas me diz
Conter por quê?
Se cada letra que cravo na vida
Me parece ter sido bem disposta
À tua espera?

E não que não seja
De perecer
O usufruto do nosso tempo
Disparado e vertido de ausências

Mas não posso
(nem quero)
Viver de cronometrar despedidas
Ou derreter a parabólica
Dessa nossa curta metragem de amor sem medida
Assim tão óbvio
Erguido em terreno inóspito
E entregue em cada (tão terna)
Premissa!

Não hei de estender o poema
Pudesse amplificar paradigmas recortados
De realidade

Não penso
Que quero
Ao que sintas
Desejar-te

Posto que já te tenho
Curvo e aliterado
Sem sombra
Suor
Ou sílaba
(Saussure)
Que sussurre...
Ou Sartre

Sorte
É estar

E eu
Estou na tua
Nu(n)ca
Repartida
Em todas as outras infantes
- Tuas musas de antes -

Mas eu sou
A branca
- Bem rubra -
Eu sou a única
Que fica.

Inserida por natyparreiras

DOMÍNIO
Se de me olhar
Me enxergasse
Não precisaria irromper
Vestígios de saudade
Extrema.

Em seus olhos
Há poema
Investidas tão torpes
Quanto anímicas estrofes
- Tão nobres -
Mas enfermas.

A poesia escorre
Não há tema...
Por mais que eu tema à morte
Ouso a overdose
Da ausência.

Inserida por natyparreiras

CULTO AO AUSENTE
Se queres me deixar
Me deixe
Este feixe de luz
Não é corrente
Flui e se finda...

Na ausência
O que seduz
É fonte etérea

Não é matéria prima.

Inserida por natyparreiras

SOFISTICADO
Eu te retiro
Dos direitos adquiridos
De todos os sábados
Dias santos
E domingos

Eu miro
E atiro

Meu amor é um cínico
Alvejado no rosto
E com um sorriso torto

Caído ao chão
Do sofismo.

Inserida por natyparreiras

INTERTEXTO
A liberdade
é liquida...

E escorre dos meus olhos
Nos teus
Subentendida.

Inserida por natyparreiras

TAL VEZ
Sabe
Que de sonhar
Um dia
Penso

Esse espelho
Esse outro
- idêntico -
Dentro do mesmo
Que se quebrou

- Foi o texto -
Não foi real

Foi por extenso.

Inserida por natyparreiras

CAPITAL
Sabes
Eu invejo o teu sono...
Como te toma e ampara
Nas hastes invisíveis do fantástico.

Como recobre teus olhos
De pálpebras súbitas e inalteradas
Tantas tais poucas as asas
de um poema.

Teu sono repousa minhas vestes
E me condena
A permiti-lo à espera
No desejo a salvo

Insone, meu apelo é um leigo
A guardar-me no enleio
De teus largos braços.

Inserida por natyparreiras

MAREMOTO (AMAR É MORTO)
Amar antes
Que a dúvida
Que a vida
Ávida
Escorra
Como única
Gota
De uma maré
Mansinha.

O mar é morto
A maré
Vinda.

Inserida por natyparreiras

POEMA PRETERIDO
E se eu te escrever
Um poema
Que não for teu
Mas capaz de restaurar
O silêncio que exalta
Nossas memórias ressequidas?

E se eu for capaz de te amar
Mas nunca mais
Capaz de te escrever
Poesia alguma?

Como fica?

Inserida por natyparreiras

FATAL
O vazio
De tantos corpos
- Inelegíveis -
Ao acaso...

Qualquer que seja
A desventura
Eu pairo olhos
A disparar sinos de vento.

Eu busco
- A contento -
Um pouco do pão
Em divino código
Sirvo-me da sangria
Vitrificada na espera
E no desamparo.

Dos teus medos
Eu sou a deusa
Que era

Eu sou o fato.

Inserida por natyparreiras

TUDO BLUES
Finalmente
O final diz a verdade
E você jazz era.

ESTOFO
Na glória
E à deriva
O vínculo simplório
Do reencontro
É o que rema a vida.

Inserida por natyparreiras

PARAGENS
Não te comparo
Pois amparar
Estrelas pode
Soar Atemporal.

Inserida por natyparreiras