Martyn Lloyd-Jones
No momento em que você começa a enfrentar o inimigo argumentando com a sua própria razão e com seu próprio entendimento, você já está derrotado. Ele o vencerá todas as vezes.
O nosso combate sempre deve ser travado de maneira espiritual. Toda a armadura de Deus é providenciada para nós. Assim, asseguremo-nos de que estamos revestidos de toda a armadura de Deus, a qual é, em última análise, o entendimento e a aplicação da verdade do Evangelho.
Cristo é o fim da lei no sentido de que Ele a cumpriu por aqueles que crêem nEle. Ele é o fim da lei no sentido de que Ele executou os ditames da lei perfeitamente, em todos os aspectos. Tudo quanto a lei requer, em função da justiça perante Deus, Cristo realizou.
A justificação pela fé somente estaria clara para nós? Estaríamos livres de qualquer tendência para voltar às obras? Há em nós alguma partícula que esteja confiando em qualquer coisa que tenhamos feito ou pensado ou dito ou experimentado? Porque, se estivermos baseando o fato de que somos aceitos por Deus na mínima extensão que seja em qualquer dessas coisas, já escorregamos de volta.
Se, quando acontece que você cai em pecado, você sente que, por causa disso não é cristão, e nunca pode ter sido, significa que você continua pensando em termos da justificação pelas obras. Se você pode encher assim de dúvida quando cai, ou quando lhe acontece alguma outra coisa; se você sente algum tipo de incerteza sobre a sua salvação por causa de alguma coisa imprópria que haja em você ou de alguma deficiência sua - se isso o faz duvidar de que é cristão - então você retrocedeu em seu pensamento e se converteu à justificação pelas obras. Nunca e de forma alguma a nossa salvação deve ser fundamentada em qualquer coisa que haja em nós. Baseia-se inteiramente no Senhor Jesus Cristo.
Todos nós temos a tendência de pensar que, se sabemos o que é certo, de um modo ou de outro o estamos fazendo. Mas não é assim. O nosso conhecimento, o mero interesse religioso que os outros não têm, não nos serve de nada. No mundo atual há pessoas que não reconhecem a categoria moralidade, entretanto, o mero fato de que a reconhecemos não nos faz pessoas dignamente morais.
O homem que morreu com Cristo terminou uma vez por todas com o pecado, e o fez como ser, como entidade, como alma. Nunca mais deverá levantar a questão da sua justificação ou do seu perdão ou da sua chegada à glória. "Aos que justificou a estes também glorificou." "Sendo, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus" - sim, "e nos regozijamos na esperança da glória de Deus." Apesar de estarmos ainda no corpo, apesar de sabermos que o pecado está no corpo, e apesar de ainda cairmos em pecado, uma vez que morri com Cristo, estou salvo. Estou tão seguramente salvo agora como estarei quando estiver na glória.
A maior dificuldade acerca da vida cristã é que as pessoas correm em busca do experimental antes de terem entendido a verdade. O experimental é decorrência do entendimento da doutrina, da verdade.
Sempre que vocês se defrontarem com uma dificuldade nas Escrituras, com alguma coisa sobre a qual vocês não têm um conhecimento preciso, o princípio que deverão seguir é: partam de algo a cujo respeito vocês estão certos e seguros, e abordem a sua dificuldade desde uma posição já estabelecida. Isso é comparável a dar uma boa corrida, se se quer saltar sobre um obstáculo. Não fiquem muito perto do seu problema, se este é difícil; recuem a certas posições gerais e avancem a partir dali. Vocês poderão vencer o obstáculo ou resolver a sua dificuldade.
Qualquer ensino concernente à santificação ou à santidade que nos diga que realmente não precisamos fazer nada, e que o maior apelo dirigido a nós é que paremos de tentar fazer alguma coisa com vistas à nossa santificação, é evidentemente uma contradição doutrinária.
Não devemos permitir que nenhuma das faculdades do corpo seja posta a serviço do pecado. Não devo permitir que minha força, não devo permitir que minha energia, meus apetites, minha fala, minha mente, meu pensamento, não devo permitir que a minha imaginação ou as minhas emoções - todas estas coisas que fazem parte de mim e que são a expressão da minha personalidade - não devo permitir que nenhuma delas seja jamais usada pelo pecado e seja posta a serviço do pecado.
Se o diabo não puder apanhar você em sua estrutura física, ele o apanhará em sua mente; se não puder apanhá-lo em sua mente, ele o fará por meio da sua imaginação; se não tiver sucesso aí, tentará apanhá-lo por meio de suas emoções. Não lhe importa quanto tempo demore para pegar alguma parte de você, ou alguma expressão da sua personalidade, e usá-la para seus fins nefandos.
Estar debaixo da Lei significa que você tem que tentar justificar-se na presença de Deus por suas ações, por suas próprias obras, por seus feitos. A Lei é sempre uma coisa que chega ao homem e lhe diz: "Faze isto, e viverás." É o oposto da justificação pela fé.
A lei não pode libertar-nos do pecado. Paulo a expõe nestes termos: "O pecado", diz ele, "não terá domínio sobre vós". Por quê? "Porque não estais mais debaixo da lei." "Se vocês estivessem debaixo da lei", diz ele praticamente, "eu não poderia fazer essa afirmação a respeito de vocês. Se vocês estivessem debaixo da lei, eu lhes diria, e teria que dizer-lhes, que o pecado de fato terá imenso domínio sobre vocês. Mas vocês não estão debaixo da lei, estão debaixo da graça. Portanto, o pecado não terá domínio sobre vocês." A proposição é que a Lei, qualquer espécie de lei, não pode libertar-nos do poder, da tirania e do domínio do pecado.
A lei nunca nos pode livrar da escravidão do pecado, porque nunca foi destinada a isso. "Pela lei vem o conhecimento do pecado." Não a libertação do jugo do pecado, mas o conhecimento dele! Ela nunca foi designada para fazer mais do que isso. Devemos ir até mais longe. Diz o apóstolo que a Lei, longe de libertar-nos da tirania e da escravidão do pecado, tende antes a agravar o pecado em nós, e a agravar a escravidão e a tirania do pecado sobre nós.
Não há nenhum poder na Lei de Deus que nos livre do poder e da tirania do pecado em nenhum sentido. Nunca houve o propósito de que fizesse isso. A função da Lei foi dizer-nos o que tínhamos que fazer: "Pela lei vem o conhecimento do pecado." Essa é a única razão pela qual a Lei foi dada. Seu efeito, Paulo afirma, foi pôr às claras "a profunda gravidade do pecado", ajudar as pessoas a verem a natureza e o caráter do pecado - a coisa terrível que era - e a enxergarem sua necessidade de Cristo. "A lei nos serviu de aio, para nos conduzir a Cristo", para mostrar a nossa condição de desamparo e a nossa terrível necessidade. Sim, mas, por causa da natureza decaída, a Lei de fato incentiva o pecado em nós. Longe de libertar-nos, agrava o problema. Se estivermos debaixo da Lei, esse será o efeito que a Lei terá sobre nós; e isso, por sua vez, produzirá um estado de completa depressão e uma sensação de desamparo. E isso nos torna mais suscetíveis ainda ao poder do pecado; pois, sempre que alguém está deprimido, está mais aberto à tentação. Ele desanima-se, e assim o pecado aproveita a oportunidade. Além disso, a Lei nos desanima porque nos mostra a santidade de Deus; mostra-nos o caráter enganoso do pecado dentro de nós; assinala-o; desmascara-o, agrava-o, e assim estimula em nós. Ela nos diz que não façamos alguma coisa e, dizendo-nos isso, apresenta-nos a ela e desperta dentro de nós o desejo de fazê-la.
Eis um homem que está debaixo da Lei. Sente-se desamparado, deprimido e desanimado; e quanto mais a Lei lhe diz que não faça certas coisas, mais ele deseja fazê-las. Não é o que faz toda criança? Diga-lhe que não faça uma coisa, e imediatamente ela vai querer fazê-la. A natureza humana é assim.
O homem que é escravo do pecado e de todos os seus poderes não pode crer; portanto, o simples fato de que um homem crê no Evangelho é prova de que ele foi "libertado do pecado".
A salvação é toda de graça, cada pequena porção dela; é inteira e unicamente pela graça. A graça reina, e não compartilha o trono com ninguém, nem com coisa alguma. Você não deve colocar as obras ali, nem a igreja, nem os sacerdotes, nem os santos, nem a "Virgem Maria", nem coisa alguma. A graça ocupa sozinha o trono; e se você tentar pôr alguma coisa ao lado dela, significa que você não entendeu o que é "o reinado da graça".
A graça não quebra a Lei, nem a anula. Não devemos pensar nela em termos de sentimento ou emoção. Esse é um modo inteiramente errado de pensar na graça de Deus.