Marcel Proust
Os dados reais da vida não têm valor para o artista, são unicamente um ensejo para manifestar o seu génio.
A mulher que amamos só poucas vezes satisfaz as nossas necessidades, pelo que lhe somos infiéis com a mulher que não amamos.
O artista que troca uma hora de trabalho por uma hora de conversa com um amigo sabe que está a sacrificar uma realidade a algo que não existe.
Uma vez descoberto, o ciúme passa a ser considerado por quem é objeto dele como uma desconfiança que autoriza a enganar.
Menosprezamos facilmente um objetivo que não conseguimos alcançar ou que alcançamos definitivamente.
Aquilo que para nós faz a felicidade ou a infelicidade da nossa vida constitui para qualquer outro um fato quase imperceptível.
O nosso eu é edificado pela superposição de estados sucessivos. Mas essa superposição não é imutável, como a estratificação de uma montanha. Levantamentos contínuos fazem aflorar à superfície camadas antigas.
É espantoso como o ciúme, que passa o tempo a fazer pequenas suposições em falso, tem pouca imaginação quando se trata de descobrir a verdade.
Às vezes, sem o sabermos, o futuro está em nós, e as nossas palavras supostamente mentirosas descrevem uma realidade que está próxima.
Passamos a vida a mentir, até, sobretudo, talvez apenas, àqueles que amamos. Com efeito, somente esses podem pôr em perigo os nossos prazeres e fazer-nos desejar a sua estima.
Não é apenas a arte que põe encanto e mistério nas coisas mais insignificantes; esse mesmo poder de relacioná-las intimamente conosco é reservado também à dor.
Acontece com a velhice o mesmo que com a morte. Alguns enfrentam-nas com indiferença, não porque tenham mais coragem do que os outros, mas porque têm menos imaginação.