MAJELA COLARES
AS CORES DO TEMPO
percebo o tempo farejando as cores
de um já vencido e desbotado instante
tingidas horas (reluzente tinta)
preserva apenas um azul distante
Pelas arestas espirais dos tons
embaça o risco do momento diante
frágil moldura irregular do tempo
descolorido feito sombra errante
Riscam as cores novo instante súbito
(um branco espaço a revolver o caos)
traçando o tempo - qual íris perfeito
Agora a tinta condensando as cores
consagra breve, colorido intenso
marcas de um tempo que se fez refeito
Palavras? Eram desnecessárias. Tuas fugas revelavam todo o falso desprezo por aquele sorriso que te causava taquicardias sísmicas.
Um vendaval de flores está chegando com a primavera e inundará campos, cidades, praças, jardins e sorrisos... Sem dúvida, uma forma de induzir a humanidade a deixar de ser tão inverno.
A paz, a luz, a harmonia e a esperança do mundo dependem diretamente do equilíbrio de forças da eterna queda de braço travada entre o bem e o mal.
Quanta frequência e ritmos cósmicos que nos induzem felicidade, alegria e prazer, em corpo e espírito, ao longo da história humana são sacrificados por meras convenções, regras e conceitos que nos revelam apenas sofrimento e dor. Pecado hipócrita e insensível feito este, são bem poucos que a ele se igualam.
Quando um sonho acaba, jamais tem um fim definitivo... sempre permanecem fragmentos da sua essência e deles poderão florescer sonhos e mais sonhos ao longo da vida.
TRATADO SOBRE UM POEMA
quis um poema sem razão nem fim
um canto surdo de areia e noites
bem mais veloz que a ilusão do tempo
que fosse a vida muito além da morte
quis um poema que tivesse o fim
de ser apenas um rascunho torto
entre as lembranças de qualquer rascunho
entre os rascunhos de alguém já morto
quis um poema de tempo e de tempos
regado a vinho – se possível tinto –
do instante imune, que não foi instante
do tempo impuro, do mais puro cisco
quis um poema que fosse um poema
de pele clara, de cabelo ruivo
que fosse a pedra fecundando o húmus
e a luz gestante fecundando a luz
quis um poema... se quis um poema
foi assim quase... meio, fim e meio
sangrei a noite, mas fisguei o verbo
quis um poema lacerado ao meio
Neste momento a desordem é que norteia a minha vida! A desordem é um tipo de ordem incomum; muitos naufragam em suas espumas, por não compreendê-la.
PAISAGEM DE GALOS
Um galo... a sombra de um galo
madrugadas acesas em cores
contidas nas imagens da noite
que guardam sombras antigas
o canto dos galos
ilumina as retinas da noite
e guardam mundos
demônios e deuses
na garganta...
aldeias remotas
cantigas futuras
cantigas passadas
longínquas, longínquas
as auroras dos galos
refletem todo o universo em fuga
que nasce e morre
na infinitude concisa
de uma noite em outra noite
de um galo em outro galo
Azul é a cor do sonho, e o infinito é azul. Até onde o meu olhar for azul, não encontrarei limites...
RES NULLIUS
na rua um vira-lata morde flores
– socorro!
Gritam as rosas, os cravos, as papoulas
os girassóis... apavorados
– cadê a jardinagem?
... um vira-lata morde flores
– o problema é grave
as flores já sentiram nas próprias pétalas