Luciano Spagnol - Poeta mineiro do cerrado
Verão
Nos raios de calor do verão
O filtro solar tronou-se fator
O aquecimento global apreensão
E o tempo um mero espectador
Se o Sol tornou-se em demasia
O vento um bravo na destruição
As tempestades vilãs num só dia
O homem artesão desta mutação
Mas és ti Astro Rei, eterno douto
Genitor do afável abrigo o souto
Mestre da natureza o nosso couto
E em ti debruça toda nossa vida
Por nós temos que render a partida
Da ruina, pois tu és a nossa ermida.
(Salve o Verão! E sua alegria seja bem vinda).
Baú
Purgando a resenha de meus sonhos
Deparei com meus fados empoeirados
Num baú de olhares de risos tristonhos
E venturas soltas em escritos amassados
Cambaleei entre minhas fragilidades
Tentando ocultar as minhas fraquezas
Como se possível fosse rasgar verdades
De tantas alegrias e de tantas tristezas
São tempos passados e repassados
Agora relembrados num canto peculiar
Se esquecidos também guardados
No puro encanto de sempre amar
Já nem lembrava de alguma situação
Que faz vivar a alma em miragem
De afeto, de amor, fé e de emoção.
E que a esperança é que nos dá aragem...
(Renascidos neste baú de gratidão...
Pois aqui estamos só de passagem!)
O que a esperança é, que nos dá aragem...
Renascidos em gratidão...
Pois aqui estamos só de passagem...
Carta de amor
Amor, nestes rabiscos desenho só sentimento
Em cada linha a saudade nodoando o coração
Com seu cheiro, seu gosto, seu pensamento
Que me fazem nesta carta confessar paixão
Letra por letra, ponto por ponto, argumento
Que já não sei amar mais ninguém
Do que você! E neste meu firmamento
Está o meu rimar que me leva além
Dos sonhos sonhados, do chamamento
Nas noites solitárias, frias, porém,
O que mais importa neste momento
É saber que você também me ama
E que juntos estamos neste planejamento
De vida, de cumplicidade, afinidade, chama
Assim, assino com o meu poetar
Esta carta de afeição
Grifada com o seu doce olhar
E versada com a nossa paixão...
Amor nestes rabiscos desenho só sentimento
Em cada linha a saudade nodoando o coração
Com seu cheiro, seu gosto, seu afogueamento
Nestes versos de reconciliação
Poema sonoro
(DÓ – RÉ – MI – FÁ – SOL – LÁ – SI)
Um sentimento de DÓ
Quando o amor da RÉ
Na alma MI faz vibrar
São notas que FÁ
O poema ficar SOL
Na vida em sinfonia...
Se a paixão se perde LÁ.
SIlencia...
Serenata pra lua
Ó lua que me vê aí do céu
A cada face nova fase surge
Nos braços me faz de réu
Dos amores que no peito ruge
Segredados a ti no apogeu
Das lágrimas que o tempo urge
Em poemas de chegadas e adeus
Com travas rimas que a vida tuge
No ritmo dos versos de saudade
Desenhadas nas ondas de bafuge
Que refresca a doce felicidade
Ó lua que no céu desponta!
Crava na parceria fidelidade
E nos sigilos a fiel desmonta
Guardando contigo na eternidade
Acordado sonhei
Sonhei dormindo
Acertei e errei
A vida foi seguindo
Ao sonho falei
Me calei, outros sonhos foram surgindo
Novamente sonhei...
Toada de amor
O afeto para ser encantador
Tem que ter toada de amor
Tem que ter ritmo no coração
E na melodia versos de emoção...
Aquelas notas que nos fazem sonhar
São também rimas a nos encantar
Adormecendo o olhar no abraço
E acordando a paixão no compasso
Da vida, do carinho, do aconchego
Que ritma a alma de sossego
E a ternura de casualidade
Assim, criando possibilidade
De um acorde parcioneiro
Cheio de cadência, cheio de cheiro
Na fluência de querer repartir
No aguardo afável porvir...
Uma toada de amor
com sintonia, com fulgor
O afeto para ser encantador
Tem que ter toada de amor
Tem que ter ritmo no coração
E na melodia versos de emoção...
Quando chove no cerrado
Quando chove no cerrado
Metamorfoseia por todo lado
A natureza num abraço apertado
Cada gota no chão empoeirado
Sinfonia dos céus anunciado
Alegria, pois chove no cerrado!
Molha o chão, chão molhado
Cê bem vinda! Esperado, rogado
Quando chove no cerrado...
Eu em você, você em mim
Hoje, preciso de você
com qualquer humor
com qualquer sorriso... Pode ser!
Mas venha com amor
Aqui estou pronto para oferecer
Aqui cheio de terno calor
E também louco por ter
Se juntos podemos dispor
Porque não então viver
Caminhar lado a lado, onde for
E ser eu em você e você em mim
Transpassado o desencontro e a dor
E nesta solidão por fim...
Flores murchas
Desmaiadas na vida
Pálidas desabrochadas
As cores de partida
As pétalas cansadas
Ainda com viço
Afadigadas
De perfume postiço
E as forças exiladas
Feitiço
Da existência traçadas
Do fado mortiço
De inevitáveis jornadas
Perfazendo o curso
Revoadas
Incurso
Flores murchas, encantadas!
Poema ateu
Escondido no breu
Da madrugada
No fundo do meu eu
O corpo cala
Dormente acende o seu
Espírito, na lembrança que fala
Que um dia sofreu
Sofre, e ainda a nostalgia embala
Na noite, de um poema ateu
Que disfarça, clandestino
A saudade que um dia valeu
E hoje apenas brado peregrino
Amargura do cerrado
Aqui no centro do cerrado
Onde a chuva não chove
Chora o pó sulcado
Ressecado, onde o verde escorre
Pelo vento que levanta o chão
De sede que a existência morre
E o céu que rubra em explosão
O cinza que por ai colore
O rincão árido de erosão
O caboclo queixa por água
Nas promessas em oração
Das fendas escorregam bágua
Suspirando bafo de sequidão
De queimadas que frágua
A amargura do sertão
Poetado com carvão e mágoa
O estio do cerrado em aflição...
Poeminha para flor
Flor são flores
São primavera
De todas as cores
Haste da quimera
Falam de amores
Amor as venera
A flor tão bela!
Maçã em receita
Nada mais tentador que maçã do amor
Com canela tem cheiro de beijo
Nas tortas saliva gosto com fulgor
Assada derrete e da desejo
Maçã tão bela e de delicada flor
Na salada traz o seu azedume
Tem vermelha ou verde na cor
Inconfundível é o seu perfume
Enigmático é o seu lado pecador
Como réu se tornou incólume
Uma por dia evita o doutor
Numa simples mordida é revelação
E te leva na vida ser longevo
Na culinária de distinta sensação
Maçã por maçã que aqui escrevo
Vilã dos contos, símbolo da sedução
Eterno fruto da paixão
Chapéu de palha
Debaixo do chapéu de palha
Na aba da saudade, lembrança
Na copa rezas de acerto e falha
Da vida, nunca sem esperança
Este chapéu de palha, roceiro
Que não larga do caipira berço
Sempre riscando o fado roteiro
E na fé aduzindo trilha e terço
Chapéu de palha, cultor matuto
Do caboclo do cerrado, do chão
Do vento árido e do pó enxuto
Que traz o sal e feito ao coração
Tal chapéu de palha, tão original
Que compõe o poetar de emoção
Canta o sertão na sua arte capital
Trajando a alma capiau de tradição
(Chapéu de palha, remate vital!)
Poeta do cerrado
Sou da terra, do triângulo mineiro
Sou poeta do cerrado, estradeiro
De poeira e chão batido, cavaleiro
No espírito embebido, alma de peão
Caipira do amor poetando paixão
Trago nos olhos o sal do sertão
Do curral, do fogão de lenha, lamparina
Da moda de viola, catira e da ave de rapina
Sou araguarino, origem e apreço na sina
Sou interiorano com cheiro do mar
Onde nas tuas ruas eu pude me achar
Estrangeiro no Rio de janeiro, fui morar
Sou brasileiro de sobrenome e nação
Mineiroca de cognome de pura emoção
Aventurado no cerrado goiano sem direção
Louco
Na alegria escarno a tristeza
Incógnito fico a rir e a chorar
Esta é minha louca realeza
Doido, verso e reverso o poetar
Cada desatino de ser violador
Chora a minha total lucidez
De um insano no seu fingidor
Onde mascara a loucura de vez
Se existir é que é muito louco
Então existo mais que o viver
Ser louco ainda é muito pouco
Nos acertos do normal saber
Sem rumo, louco, afortunado
Desatinado e cheio de muafo
Da vida, vivo para ser amado
De amor, louco, sem parágrafo
(Quero da loucura ser inventado!)
Sem rumo, louco, afortunado
Desatinado e cheio de muafo
Da vida, vivo para ser amado
Quero da loucura ser inventado