Leonardo Kaefer
Sou complexado. Em um momento tô sorrindo, fazendo os outros gargalharem, pulando feliz por aí e no outro só quero deitar na cama e acordar mês que vem.
Ficar mal com cada pequena coisa — uma palavra dita errada, um gesto não feito, um olhar indiferente, uma indireta no ar —, porém sorrir duro e fingir que não foi nada. Ter tanta coisa pra falar, ensaiar tudo direitinho, pra na hora se atrapalhar e acabar por calando. Sentir muito, demonstrar pouco. Esse é o meu problema.
Estranho, só isso. É que antes nós conversávamos por horas, você compartilhava cada pequeno detalhe do seu dia comigo, por mais irrelevante que ele fosse e eu te fazia rir, confiei em você pra te contar coisas que não disse nem a mim mesmo. E agora eu fico surpreso quando você me dá um “oi”.
Eu não quero que você venha falar comigo porquê precisa de ajuda, porquê todo mundo te deixou de lado ou porquê eu mudei com você. Eu só quero que você chegue pra mim tipo “não tenho nada importante pra falar nem quero pedir nada, só tava com saudade da sua voz”.
Comente que eu fui — e como fui — idiota, conte à todos que só te fiz mal, só não diga que não valeu a pena.
Posso refrescar sua memória só um pouquinho? Me dá só dois minutos do seu tempo, por favor? Eu fui a única pessoa que ouviu os seus problemas todos, mesmo quando eu tinha os meus próprios pra cuidar, e te apoiou sem reclamar. Lembra quando você se sentia um lixo, se colocava pra baixo, machucava a si mesma e se sentia mal? Eu estive lá por você. Lembrou? Todo mundo te deixou, eu fiquei. Todo mundo te encheu de promessas, e eu de atos. Eu gastei todas as minhas palavras, meus gestos mais bonitos e minha energia tentando te confortar. Eu fiquei perto de você quando todo mundo me aconselhou a ir embora. Eu te dei valor, quando os outros faziam piada de você. Eu te botei pra cima, mesmo quando meu próprio mundo desmoronava. Quando você chorava por outra pessoa, eu fiquei lá e te fiz rir. Eu te dei todo o espaço do mundo pra que você pudesse se sentir confortável o suficiente pra ser você mesma comigo, e sempre, sempre te aceitei, mesmo quando algumas coisas em você não me agradaram. Tudo que você diz não significa nada, são só palavras e palavras que você gasta, que no fundo não tem valor algum Mas tudo bem, eu não sinto sua falta. A pessoa que eu amava foi embora há muito tempo, e foi substituída por… Você. E desse novo-você, eu não gosto nem um pouco.
Tô precisando de algo com pegada. Nada fofinho, não algo com muito amorzinho e carinho e blá. Tô querendo alguém que bata de frente comigo e que me retruque e que me tire do sério. Uma pessoa que me confronte, me faça questionar meus atos ao invés de aceitar tudo que eu faço e que e me tire dos eixos. Que me morda, me bata, me chantageie emocionalmente, brinque com a minha mente, me excite e depois pule fora. É isso.
Antes, eu pensava que o destino e o mundo conspiravam contra mim e sempre me traziam coisas pra me fazer lembrar de você. Agora, eu vejo que era só algo que eu usava como desculpa pra poder pensar em você o tempo todo sem me sentir tão babaca.
E desse nosso jeito meio estranho — indiretas sabor tapa na cara, brigas imaturas por motivo nenhum e trocas de insulto, reconciliações calorosas, ataques de ciúme, conversas noturnas, cochichos no telefone, provocações de madrugada, beijos no meio do filme —, a gente se declara.
E não é como se eu não pudesse viver sem você. Eu posso, e perfeitamente bem. Posso fazer minhas coisas, rir com os amigos, zanzar por aí, beber umas ou outras, beijar dezenas de bocas, talvez me apaixonar… Seguir a vida normalmente. Eu vivi feliz esse tempo todo antes de conhecer você, e vou continuar vivendo da mesma forma depois que você sair da minha vida. Normal, sabe? E é extremamente bobo que eu continue querendo rir com você e de você, andar com você por aqui, ter você regulando minhas bebedeiras, beijar a sua boca, continuar me apaixonando por você todos os dias, mesmo tendo outras opções mais fáceis… Anormal, né?
E eu, mesmo não falando nada, mesmo sem demonstrar qualquer coisa, mesmo escondendo praticamente tudo, ainda sinto muito mais coisa do que você que adora dramatizar, escrever e falar sobre tudo.
E quando você se isola do mundo, se afasta demais, não responde quando é procurado, não procura por livre e espontânea vontade, não dá sinal de vida e nem demonstra que isso faz alguma diferença… Também não pode culpar os outros por eles pararem de sentir sua falta ou cobrar qualquer coisa.
Quer um segredo? As pessoas — em geral — simplesmente adoram o quê não tem. Um desafio, uma causa quase impossível, uma adrenalina, algo pra correr atrás. Então, não seja muito fácil. Não inalcançável, mas também não tipo que é só estender a mão e pegar. Se mostre indisponível às vezes, desapegado. Aja um pouco como se não ligasse, mesmo que no fundo aquilo esteja te matando. Faça os outros se perguntarem por quê você é assim e faça eles sentirem vontade de saber mais sobre você. Não mostre tudo que tem; deixe um pouco escondido.
Claro, não tem problema você me ignorar. Nenhum. Também não tem problema você falar facilmente com tudo quanto é estranho, mas não comigo, que te conheço como a palma da minha mão. Afinal, pra quê servem os amigos, se não pra isso? Se tem algo errado você me deixar pra trás — não é nem de lado — quando eu mais precisava das tuas palavras e os teus cuidados? Nope. Mas, então, vem cá… Tu vai achar algum problema em eu parar de sentir tua falta?
Tem dias que tudo que eu quero é te puxar pros meus braços e te abraçar o dia todo, e tem outros em que só de ver a tua cara eu já fico com raiva. É como se eu quisesse te atirar na frente de um carro pra me livrar de você, ao mesmo tempo em que eu sei que me atiraria na frente dele pra te salvar.
Tenta multiplicar zero. Por um, quinhentos, um milhão. Qualquer número. Vai ser sempre, sempre zero. Nada. Isso somos eu e você. Por mais que eu bote as minhas últimas esperanças, meus sonhos e palavras mais bonitas em ti… Isso não muda nada.
Hoje em dia, se tu quer ser diferente, é só permanecer normal. Porque tá todo mundo tão preocupado em ter originalidade, não parecer com os outros e se sobressair, que acabam todos ficando exatamente iguais e sem graça.