Juan Victhor
No alto daquela montanha, em pleno céu nublado, vejo o sol raiar escondido entre as nuvens escuras. Há de se entender que nem todos os dias são bons e que em alguns queremos apenas nos resguardar nas nuvens chuvosas, mas é impossível te esconder, é impossível esconder o sol.
O GRITO
Quando o embrulho do estômago é mais alto que as formas de expressão, as palavras não me saem tão belas nem tão pouco formais, vejo-me ser atordoado pelas minhas próprias escolhas, todas baseadas na tolice da ingenuidade. O que mais quero é gritar até que todos aqueles ouvidos que me trazem tanta confusão, sufoquem em silêncio. Assim sou! Vendido por minha natureza selvagem, não mais atraído em satisfazer. Se tudo isso não lhe é correto, que se foda seu conceito ultrapassado. Rasgue-os na minha frente, eles não servem para mim.
GUIA
Cresci tendo que acreditar na mudança dos imutáveis, tendo que dividir aquilo de mais precioso que eu possuía, tendo que ter convicção que existia amor no errado. Como desprender-se de sua língua materna? Há de ser doloroso contrariar a própria natureza. Não pense que não me dói. Isso tudo, mal comparando, se assemelha há um cego que é guiado através de um cachorro, ao tato dos olhos vendados. Já não posso mais guiar-me pelo que sinto, pois, a cegueira invadiu meu coração.
SUBJETIVISMO
Nada fora concreto, somos um eterno subjetivismo. Do que se prece voltar e andar em círculos? Sabes bem que está nítido para o mundo que somos dois loucos, cada um vivendo sua história de fantasia, algo que a voz nunca materializou, mas que o peito adentrando o coração, já sentiu. Esse é o preço que se paga por uma visão turva, por agir como máquina, não sabendo o que quer, na verdade, pois se ninguém fala, ninguém sabe, se ninguém se entrega, hão de ser, um eterno subjetivismo.
A MENSAGEM
Todas às vezes que minha carne ansiar voltar para você, lembrarei das vezes em que me fez sentir-se louca, das vezes que vi você seguir, enquanto permaneci estagnada te esperando. Lembrarei de quando me aproximava de você e sentia meu coração pulsar, a ponto de perceber o sangue correr pelas veias. Recordarei de quando achei que todo meu estômago revirando, fosse as borboletas no estômago que muitos falavam, e enfim aceitarei, que por maior que seja o meu amor por você, nenhum arrependimento poderá apagar a dor que senti e que agora sinto quando estou ao seu lado. Nossa semelhança se bastou a morfologia, assim como a dor e o amor possuem a mesma terminação, teremos a parte igual que nos uniu; ainda assim, seremos extremamente diferentes, no que diz respeito a significados.
A PORTA
Espero que um dia você perceba, aquilo que pude perceber nos dias em que estive ao seu lado. Por vezes, me enxergam como a entrada de um cidade grande, onde passará uma vez e, ainda assim, enxergará vários caminhos para seguir. Se por acaso a vida quiser te levar ao mundo, atravessarás por mim novamente e eu te verei com os olhos brilhando, enquanto choro as lágrimas de felicidade.
Sou a porta de entrada e saída, meu destino é ficar aqui e esperar que me encontrem, mas não hei de permanecer para sempre, minha missão com você foi linda e passageira. Que meu ego não transforme isso em dor e que me lembre no amor, a saudade que tenho de ti.
A CHAVE
Sempre abri portas que não me pertenciam. Fui e sou ignorante demais para entender o princípio que me põe aqui, nessa repetição infinita de um ciclo aparentemente sem fim. Onde está a minha porta? De que distúrbio sofre minha mente fantasiosa, para ansiar tanto o desejo profundo, para saber quem de fato sou no mundo. Resta-me que solte a maçaneta; deixe-me cair sobre o véu outra vez; quero entender o que existe por trás da mente ilusória, do posto fim, que nunca me ocorreu.
O EGO E O LEÃO
Pôs-se, então, a repousar, e enquanto seus olhos descansavam, ouviu distante, mas em alto bom som, uma voz declarar, "Egoísta és tu leão, que negaste tua tribo pela cor do teu sangue. Voa-te para bem longe, imaturo ser, que somente da carne pertence."
Saiba leão, que assim funciona a liturgia dos ignorantes, quando ti colocares em primeiro lugar, hão de ignorar todos seus feitos de empatia.
O ego, quando ferido, declama sem hesitar, que todos os que se opuserem a sua vontade, serão julgados e queimados, no grande e impetuoso inferno "EGOísta".
O NASCIMENTO
Quando fui posto ao mundo, o médico ouviu minha mãe proferir que eu era o bebê mais lindo que havia nascido naquele dia. Não me questiono se de fato fora verdade, ou, apenas o amor de uma mãe que acabara de receber seu filho; sendo bem sincero, isso não importa.
A vida tem dessas, nem todas as palavras ditas no passado permanecerão para sempre. Foi como no momento em que escutei um parente próximo dizer que me amaria por toda a vida, mas com o passar dos dias ser levado a perceber que no raiar do sol de sua morte, o amor permaneceu apenas em meu coração, pois já não havia fôlego de vida para constatar em ações, todos aqueles bons sentimentos.
Algumas palavras não duram para sempre, e que bom que elas têm prazo de validade. Não sou mais o bebê lindo de minha mãe, o tempo, me fez crescer.
FANTASIA AMOROSA
Quando me perguntaram como eu sabia que você me amava, eu parei, pensei, e materialmente não achei nada. Eles não entenderiam...
Há ligações que vem da alma, então, como posso explicar o inexplicável? A certeza que vem de dentro? Por vezes, indaguei-me se de fato era amor, ou, apenas mais uma ilusão que eu havia criado pelo excesso de carência. Mas como explicar o inexplicável? Essa é a pergunta que me faço diariamente quando acordo e, ainda assim, não obtive resposta. Talvez porque ela não esteja comigo, talvez por simplesmente não existir.
PEIXE
Na catarse do não saber, embrulhado em meio a tantas incertezas, o nada é o meu peixe mais precioso. Não sei o que estou procurando, nem por quem anseio encontrar, apenas me vou como um peixe-palhaço, vagando o profundo mar. Se a vida, porventura, me desse um peixe, eu o colocaria num aquário. Não espere de mim tantos deslumbres, ele vive como eu; apenas, nada.
Por que temer o julgamento? Se hei de morrer no final.
É no sufocamento de uma grande caixa que qualquer poder se finda. Tal caixa, consegue ser forte o bastante para suportar o peso dos pisos e da terra, mas fraca o suficiente para não manter o corpo intacto. Hemos de morrer! E quão amarga precisa uma alma, para julgar no dia do sepultamento!? Se porventura julgar, qual poder terá sobre mim? Nenhum; um dia há de está no meu lugar.
Serdes ricos, influentes, pobres, frágeis, abatidos psicologicamente, serdes apenas um comum, no fim, chegaremos no mesmo lugar, alguns com um caixão mais bonito que outros, mas do que importa a mais beleza ilusão, se ela não me pode trazer a vida de volta. Hemos de morrer. Isso já não é suficiente? Porque, então, deixar que as palavras alheias antecipem a minha morte!?
Em suma, seremos pó do mesmo chão, lama de um grande temporal, mas basta-me de minha alma, essa, sorrirá orgulhosa, chorando a alegria de lhe ter sido fiel até a morte. Que me tirem a vida, mas a alma alegre, não me poderão arrancar.
A PANDEMIA
Há um vírus que assola a humanidade, muitos se encontram loucos, outros assim como eu, permanecem intactos. Dos que foram infectados, sabe-se que o coração parece palpitar mais alto, o estômago balançar friamente, e há quem diga que até cego pode ficar.
Muito ouvi dessa doença, mas não me cheguei a contaminar, às vezes penso que seja mentira, uma história para crianças naná. Certa feita, achei estar doente, mas não passava de ilusão, era uma simples gripe, causada pela mudança de estação.
Indago-me se a demora para adquirir a doença, seja um presságio de que quando eu alcançá-la, terei de morrer impiedosamente. A verdade, é que meu organismo já sofreu demais com outras doenças, quiçá por isso me proteja de forma excessiva, sendo essa, a forma que eles encontraram para cuidar-me do mal.
A calamidade se espalha cada vez mais pelo mundo, para alguns se assemelha há Lactobacillus, que mesmo sendo bactéria, traz benefício ao corpo, para outros como eu, são uma grande incógnita, trata-se de uma doença contagiosa; seu nome? Amor, para quem gosta, dor, aos que foram feridos, e ficaram sem resposta.
A VIDA NOS ANIMAIS
A vaca nunca chora pelo leite derramado, ou, pelo aperto que lhe foi aguçado, trata sempre de produzir mais, pois quem quer de verdade, em verdade sempre o faz.
O meu favo doce mel, que adoça a tua riqueza, parece-te um pouco frágil, remete-lhe uma borboleta, mas quem conhece de verdade, teme a dor da picada, ao saber que a linda abelha, também mata em ferroada.
Experimente roubar o que é meu, derramar a minha bela taça, e saberás que a doce ingenuidade, não lhe passa de uma carapaça.
É que sou um caranguejo, daqueles que vivem abaixo d'água, pertencente do mangue antigo, andante de lado ao nada.
Logo volto a caminhar, pois a água não me basta, não sou pouco, não sou nada!
Sou um belo caranguejo, em sua linda carapaça.
A MORTE
Quanto tempo leva-se para entender, de fato, que um dia iremos morrer? E quanto tempo requer para agimos como mortais? Talvez hoje, amanhã, talvez semana que vem, ou até alguns anos, mas quem se preste do papel impresso e que não me entregue o atestado de óbito!? Achamo-nos uma raça tão evoluída, mas vivemos acreditando no impossível controle da morte; alguns até anseiam pela sua vinda — quiçá por esquecer que um dia ela virá de qualquer forma — e que mesmo fugindo dela, no momento da fuga há também de lhe encontrar. É que a incerteza do que virá, pode até mesmo o olho cegar, vivendo como se a morte, não viesse a nos buscar.
A REVOLUÇÃO
As máquinas existem mais por natureza do que por altas revoluções. Há quanto tempo vivemos por nós mesmos? Há quanto tempo não reconhecemos nossos próprios erros, em vez de apenas apontar os erros dos outros? Há quanto tempo não escapamos da rotina automática da sociedade?
Ando confuso, talvez disperso, enfadado e enfraquecido pelo peso da tendinite da vida, do qual sou, dos quais são, daqueles que um dia foram, mas que hoje não mais são, servos do nada.
Em função do medo da morte ou da rejeição, dizer "não" parece ter me fugido do vocabulário, é que sempre uso e abuso dele para mim, mas para o outro tenho que subir ao trono, levantar a coroa, ajoelhar-se no chão, e dizer sorrindo que sim, pois a pobre alma, farta de sua riqueza egoica, não pode ouvir um não — nem uma recusa ao seu pudor — que logo se desfaz em lágrimas e no drama de ser um pobre infeliz, que nunca lhe conquistou nada.
Miseráveis máquinas somos! Para alguns, apenas em momentos, para outros, desde que a consciência se fez presente, pois esses, não entenderam que a revolução não se foi apenas em fio, mas em veias também. Portanto, não descabele seus fios, quando digo que vos sóis miseráveis, isso não lhe atenta o poder do que sou nem do que eres, a miséria não dura para sempre! Não para nós, que sabemos dizer sim, conosco, e também dizer não, convosco.
O AMOR DAS PALAVRAS
Eles eram iguais; ambos tinham três letras, uma única sílaba, também comunicavam e expressavam sentimentos, respondendo qualquer questionamento objetivo que fosse feito.
Eram tão parecidos! Tão iguais! E mesmo assim não podiam viver, o seu estrondoso amor.
Havia uma distância grotesca entre a semelhança que lhes perseguiam. Ainda que se encontrassem extremamente apaixonados, a sentença da vida fazia questão de separá-los toda vez.
Quando o "Sim" se declarava, o "Não" o rejeitava, e ao vê-lo fugir perdidamente — negado pelo seu grande amor — o "Não" se via assustado e apavorado; pedia, então, para que seu amado voltasse, e ele sempre dizia que "sim".
Acontecera tudo novamente. Outra vez se declarava e por enfim decepcionava, ao ouvir mais um "não" de quem tanto lhe amava. Não cabe aqui julgamento ao "Não"! Ele o amava tanto que lhe ofertava a única coisa que tinha na vida, o seu próprio "não".
Um dia, o "Não" entendeu que fazia mal ao "Sim", pois sabia que ele sempre aceitaria quando lhe pedisse para voltar, foi assim que fugiu descomungado! Por amor ao "Sim", negou o seu próprio amor.
LOCUÇÃO ADJETIVA
Desbocado que me encantei por ti enquanto cursava gramática. Fora um sujeito simples que se tornou composto, advérbios que pertenciam à extrema intensidade e adjetivos que somente serviam para te expressar qualidades.
Entrava e saia, quando certa vez restou-se apenas nós dois no eco daquela sala; mirei firme os teus olhos pretos — ou talvez a pupila que tanto havia delatado — e bastou-se apenas isso, para então dizer, "Eu te amo".
Acontece que os adjetivos são variáveis, e foi por esse motivo que nosso amor desandou. Havia variação de gênero, número de pessoas que contavam mais que dois, e até os graus; não existia mais lindíssimo, perfeitíssimo, generosíssimo e tantos outros superlativos! Agora brilhava em nós, a inferioridade e o complexo da comparação.
Foi no eco daquela sala, desolado sem a tua companhia, que percebi que ao te dizer "Eu te amo" o único pronome que determinou a ação de amar, havia sido "eu".
Atormentado perante tanto silêncio, gritei desesperado ao nada, "Eu te amo!". Por certo, você não estava lá, mas o eco tratou-me de retornar, "eu te amo, eu te amo, eu te amo".
Era jovem demais para entender que minha alma tentara explicar que o mais puro amor já havia me encontrado, seria aquele e somente aquele que minha mente dizia, quando ninguém podia escutar.
ALÉM DO ÓBVIO
Não me contenho com as verdades pré-estabelecidas nesse mundo; minha alma chama distante, meu espírito busca na saudade, o portal para casa.
A verdade que carrego, expande-se além do plano material, além da baixa gravidade, além das estrelas que mesmo, distantes, ainda permeiam sua luz fina e elegante na terra.
Somos constelações em outro universo, somos o amor universal, somos o brilho que outrora se esvanecia com o tempo.Na morte te encontro e no vento estou presente; teu choro inocente marca a entrada de uma alma que anseia sua casa; teu choro colhido da respiração e também da chegada do oxigênio, é o marco da tua perca de consciência, e da ressignificação da tua memória, para que tão somente o mundo brilhe ainda mais, seguida na luz da estrela que te guia.
Sou o acaso, e tu és obra do acaso. Em ti, estou, pois, de ti, desenhei todos os traços, enquanto chorava a disposição que teve ao se entregar nesse mundo cruel — que ainda carrega o amor nas entrelinhas — as entrelinhas criadas pelas minhas lágrimas, perante a criação das tuas linhas.
AS 5 LETRAS DO POUCO E MUITO
Quanto mais me distancio, mais vejo a lavagem que me foi posta ao cérebro e as loucuras que me induziram verdades. Se há preço em tudo na vida, há preço também em amar, há preço em falar e há preço também em morrer. Tudo envolve preço e somos meros estrangeiros sem moeda local. Disseram-me, também, que há preço no que escrevo e por isso não acredito em preço, pois apresso-me para escrever sabendo que aos poucos perco o preço. Também não acredito que o amor e a justiça caminhem iguais, pois não lançamos ao fogo quem mais amamos e não deixamos afagados em leite e mel quem por tanto achou-se amada, que impôs ao mundo seu infundado preconceito e que escondeu-se em ruínas depositando seu ódio no outro. Alguns vislumbram o céu azul, alguns enxergam-lhe verde, outros, branco, mas é te olhando céu, que tenho a plena convicção de que permaneces céu e sempre serás céu, pois sendo céu não somos nós que definimos a tua cor. Abrir-se inteiramente é o assopro da verdade. Quando perguntarem por nós, diga que somos aqueles que apresentam visões próprias, acolhendo quem porventura não pôde ver, pois cego foi deixado quando lhe cuspiram os olhos, não para curar, mas para afogar em humilhação as lágrimas que é ser.
GESTAÇÃO
Um dia, a única perspectiva de vida que tive era de viver para sempre envelopado numa bolsa aquosa como um peixe preso em meio ao oceano. Questionava-me constantemente o que haveria de acontecer quando chegasse o dia da partida, se haveria de existir um proceder depois dali e incansavelmente nunca obtive respostas. Nove meses se passaram e o meu espaço nunca havia sido tão reduzido, o ruído externo parecia estar cada vez mais forte, a morte suspirava-me o sangue. Conforme o tempo passava, a certeza da incerteza era cada vez mais latente e, no agir da não esperança, uma luz fina começou a invadir minha escuridão. Não sabia o que estava acontecendo, nem muito menos aonde iria chegar, mas de repente a firmeza de algo dividido em cinco partes me tirou do aperto em que eu estava e, enquanto a luz adentrava a escuridão, minha mãe dava-me a luz deitada sob a maca. Naquele dia, eu descobri que após minha aparente morte existia vida e hoje vivo sabendo que partindo hei de viver numa luz de parto, pois certamente nunca há espera quando existe vida.