Josane Hodniki
Escudo
De nada lhe adiantará escudos pesados
Forte mesmo ficarão seus braços ao carregá-los
Entenda quando digo que um coração não se deve proteger
Seria como segurar um pequeno pássaro com as mãos
Alegando proteção contra os predadores
E privando-lhe do vôo
Sortilegios...
Só foi eu dizer
cheiro de laranja
e água com dois corpos
que olhando pro céu
rindo, brincou
“Parece poeta baiana
enchendo a gente de mel”
Mas nem baiana eu sou
E muito menos poeta!
Glauco Villa Boas. O próprio nome parece que já abraça a gente. A verdade é que pessoas que nascem para fazer outras sorrirem deviam ter visto permanente nesse mundo e viver pra sempre.
Querida Clarice,
Ainda bem que a gente é assim, né? Eu também vejo bosques nas nuvens. Outro dia mesmo, passou um jacaré e um elefante. Vi da minha janela enquanto lia o que você escreveu. Depois eu adormeci coberta com suas palavras e foi tão macio. Adoro fins de semana com janela de olhos abertos, vento fresco trazendo folhinhas de árvores pra dentro do quarto e cheiro de livro velho na cabeceira.
Me aparece assim, de repente
na noite mais fria, sem metáfora
mas sonhadoras…
esquenta, nuvens, abraça, chove
E eu li outro dia uma frase de Quintana
que dizia… “tão bom morrer de amor
e continuar vivendo”
Pensei, enquanto o carro partia…
“tão bom acordar e continuar sonhando”
Vô Orlando
Lembrando dele com seu shortinho azul de nadar dando ponta na piscina do sitio. E quando ele parava de mergulhar e ficava com os braços abertos girando pra fazer onda. Ficava olhando pra gente, com aqueles olhos tão claros que pareciam bolinhas de céu.
Vô Gustim
Contador de piada. Gordinho, vivia pra baixo e pra cima na cidade que morava numa motinha. Gostava de passarinhos e tinha um monte em casa. Adorava pegar a gente e colocar no colo pra contar historias. Fazia a gente rir. Minha mãe me disse que ele costumava falar de mim quando eu era pequena, por que eu saia correndo pela casa e acabava com qualquer paz… ele dizia “ih, Rose, essa menina vai dar trabalho quando crescer…”. Eu acho que meus avôs sabiam das coisas.
Eu não sei se um dia minha roupa vai ter o cheiro daquele seu moletom. Ou se vou aprender a fazer arroz. Se vou pagar as contas de água e luz todo mês ou parcelar uma viagem para o nordeste com você. Eu não sei de quase nada mais. E não quero pensar tanto. Eu sei que odeio dormir sem ventilador…
Minha família é daquela que se junta no final de semana
Toca moda caipira, faz churrasco e bebe cerveja
Tem gente que conta piada, outros que contam “causo”
Cachaça boa não falta pra quem chega
E caldo forte no fogão é pra “arribá” quem parte.
Uma amiga escreveu assim:
“As vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido”.
E eu respondi:
“As vezes ouço a banda passar; e só de ouvir já saio atrás do trio elétrico”
Mesmo quando diz que a poesia não faz mais parte da sua vida
Ou quando contesta a lógica das abelhas
e se despede com beijo no rosto
Eu ainda a desejo
Ainda a desejo como aquela primeira manhã
Quando seu corpo se afastou do meu pela primeira vez
até a noite chegar….
Só as crianças (e os que realmente ainda tem uma criança no coração como eu) sabem o quanto é importante apagar as velas de um bolo de aniversário.
Mãe,
Eu guardei esse segredo 31 anos. Mas agora vou contar. Quando eu nasci, tinha duas meninas esperando junto comigo na salinha. É um lugar onde a gente fica antes de nascer. Uma foi e a outra menina ia ser sua filha. Eu ia depois. Mãe, ela era tão bonita. Inteligente, educada e ia ser médica quando crescesse. Ficamos conversando enquanto não chegava nossa hora. Ela me disse que já tinha planos. Que a mãe dela ia chamar Rose e o pai Paulo. Que ia ser a primeira filha. Nem te conto, acredita que ela tinha olhos azuis, igual do Vô Lando? Então, o telão ligou e apareceu você. Aí, eu te vi. É, é segredo. Mas antes de nascer, a gente vê a mãe da gente num telão. E eu me encantei por você, pelos seus olhos, pelo seu sorriso… Então, eu não tive duvida! Convenci a menina a deixar eu ir no lugar dela. Tá, tá… não foi bem aprovado por parte dela, ok? Mas eu era mais forte e mais esperta… corri primeiro… (mãe, ô menina boba aquela!).
Desculpa mãe. Eu tinha que te contar. Eu sei que tenho um monte de defeito… sou bagunceira, falo demais, não virei médica, não tenho objetivos claros na vida, não tenho olhos azuis, falo palavrão, conto piada suja, não lavo meu carro, não sei fazer arroz, falo da vida alheia, não tenho casa própria… (tá bom né?) É que… eu sei que não sou nada do que você esperava e com certeza estou na lista das piores filhas que uma mãe pode desejar… mas eu te amo. Eu me orgulho do que você é, todos os dias. Seu caráter, sua determinação. E eu sempre, sempre vou estar ao seu lado. E acredite mãe, aquela menina era muito chata mãe… no final você ia me preferir, eu acho… pelo menos eu faço você rir, alem de chorar muitas vezes.
Te amo!
Meus presentes preferidos:
Muitas bolinhas de sabão
Guerrinha de bexiga com água
Chuvinha na hora de dormir
Mãos dadas no cinema
Amigos velhos com histórias novas
Música no pôr do sol
Pés descalços nos finais de semana
Casa cheia
Brincadeira com travesseiro
Risadas de fazer doer barriga
Beijo quente
Abraço demorado
Cafuné nas costas
Amor dentro da banheira
Piscina com velas em volta a noite
Chiclete com recheio
Gente divertida por perto
Cochilo embaixo de árvore
Roda de viola
Novas receitas culinárias
Careta pra fazer criança rir no carro
Lua cheia na rede
Piquenique no parque
Família contando piada
Edredon com cheiro de confort
Sorvete de pistache e chocolate
Leite com canela no frio
Batida de coco no verão
Trabalho bem feito
Céu estrelado com beijo
Truco com baralho marcado
Colchão na varanda
Cantoria debaixo do chuveiro
Prosa boa no boteco
e algumas ressacas pra rir da noite anterior
No meio destes objetos nômades
Meu coração é estrada, sem placas, sem sinal
sem faixas e com multas altas
Uma estrada longa com sol insistente
e tal, como ele, meu amor ainda caminha
E quando é noite, o céu é estrelado
tão claro, que parece dia
e a gente dorme junto, mesmo longe
A saudade faz carinho
enquanto o sono não vem
E eu te desejo boa noite
e toco no seu rosto em pensamento
Então você me abraça forte
me diz que tudo vai ficar bem
e eu fecho os olhos...
Fico exageradamente fascinada pelo subjetivo, até pelo superlativo de qualquer adjetivo, como “exageradamente fascinada”. Um poema, uma musica, uma folha que cai ao meu lado, um pingo de chuva, tudo me atrai, me transforma. Tudo isso me move. Sabe quando chove a noite e a luz do carro reflete a chuva no pára-brisa? É minha cena preferida.
Meu maior medo, de todos, sem duvida, é perder essa visão que tenho sobre a vida, sobre as coisas que para tantos são insignificantes.
Meu pai ligou no celular agora pouco.
Eu: oi pai mais lindo do mundo…
Pai: tá… só liguei por que não vi uma ligação sua aqui no celular… agora que pegou… não tinha nenhuma mensagem com ligação sua…
Eu: é que todo dia alguém me fala como você tá… seja a Carol ou a Renata… mas então… como cê tá? Volta quando?
Pai: sei… ô Jô, é que passei pela cidade de Felixlândia, lembrei de você…
Eu: certo pai… vou ter que colocar isso no blog…
(risadas…)
Pessoa feliz é foda!
Ali, na beirinha, quantas noites eram dias
Alguém que já se foi, contava histórias pra chorar
Chorar de alegria, do homem sempre menino
Do menino contador de causos que gostava de cantar…
(homenagem a um grande homem, out/2010)
Quem é ela?
Josane é uma leonina teimosa
E exageradamente subjetiva
Que acredita que a vida
não se resume a uma poupança cheia
e sim numa cabeça cheia de bons pensamentos,
casa cheia de amigos,
família cheia de bons domingos
e amores cheios de paixões.
Por isso sua conta bancária vive cheia dessa vida
e quer abandoná-la.
(Agosto de 2003)
FORMIGUEIRO
Podia ser mesmo como eu imaginava quando criança
Que a gente é igual formiga morando ao lado da casa de um gigante
Na verdade faz tempo que ele vê o formigueiro
Mas fica na dele, só observando
Tem gente que diz que até já o viu olhando pra cá
Mas sabe como é, né? Tem louco pra tudo nesse mundo
Às vezes ele pega a mangueira e joga água
Vez ou outra alguém perde sua casinha e recomeça de novo
E ele admira essas formiguinhas
Tem noite que pra gente não ficar no escuro ele acende uma lâmpada
E quando ele viaja, o formigueiro faz a festa
Mas teve um dia que ele ouviu um barulho, que veio daqui
Atrapalhou o filme que ele assistia na TV
Desde então, ele ficou com o pé atrás com o formigueiro
Mas, como ele tem bom coração, deixou a gente ficar
O problema é que agora começou a feder
Um formigueiro fedido ninguém merece
Ainda mais um gigante solitário e bonzinho na sua casinha campestre
Já já ele cansa e pisa na gente
É, eu se fosse ele, pisava logo
Antes que o buraco que a gente anda fazendo
engula a casa dele…
(OUT/2010)
Comer, amar e rezar
E rezar muito para que sua mulher não te deixe depois de assistir esse filme…
Meus amigos, a não ser que queiram algumas pitadas de discussão de relacionamento em suas noites conjugais e estejam predispostos a um divórcio sem muita explicação, eu venho trazer alguns conselhos para se sair bem dessa.
Quando sua mulher disser “ah, vou assistir ao novo filme da Julia Roberts”, já fale: “amor, estive lendo a respeito… bem que poderíamos conhecer a Indonésia um dia hein?” (isso, por que quando ela estiver assistindo, ao seu lado, a cena do gostosão da bala chita com a adorável Julia no mar em Bali, você vai poder dizer “imagina nós dois nesse mar, amor”). Pronto, você já esta quase salvo! Por que isso já faz parte do conselho numero 2: quando vocês estiverem assistindo esse filme de conto de fadas bem dos feministas, fique dizendo frases tipo pedreiro sem receio: “que vontade de você, amor”, “não vejo a hora de chegar em casa”, “hum, saindo daqui quero comer…”. Eu sei que parece meio Dercy Gonçalves com Nelson Rodrigues e Marques de Sade, mas acredite, você vai precisar de muita safadeza e criatividade pra sair dessa sessão sem seqüelas.
Tirando três ou quatro mulheres no mundo todo, qual, me digam QUAL mulher não está ávida para viver um verdadeiro conto de fadas? Então, amigos, vamos entender a mulherada, ok? E se ainda assim, depois de assistir o filme com ela, deixando sua TV cheia de futebol e a geladeira cheia de cerveja, levá-la pra comer pizza (por que dá vontade, hein?!) vocês terminarem a noite com uma boa D.R. (discussão de relacionamento), melhor enviar flores no outro dia, vocês vão precisar de uma boa orquídea, por que o negócio tá feio, companheiro.
Boa sorte nessa nova empreitada. Beijo da Jô.
Neto,
Hoje acordei ouvindo a chuva e apertei o travesseiro quando me lembrei dos seus olhos. Até o dia amanheceu triste. Faz 22 anos que não te vejo. Faz 22 anos que nesta data o pai some e a mãe, como sempre, tenta chegar ao final do dia longe da cama. Faz 22 anos que eu penso que tudo poderia ser diferente se você estivesse aqui.
Essa saudade é gigante, igual seu coração. Coração de anjo… e eles diziam “anjo tem que ficar no céu” e eu, certa vez, desejei que você nem fosse tão bom assim, pra não precisar ir pro céu e ficar aqui comigo.
Neto, eu espero só um coisa… que seja você quanto for a minha hora…
Trecho do texto Carta para um anjo:
http://josane.blog.terra.com.br/2010/09/27/carta-para-um-anjo/
Eu quero a paz e a tranqüilidade de nada se exigir em troca. Eu quero apenas encontrar novas razões. Surpresas boas. Dias engraçados.
Fui na padaria, comprei umas besteiras e me enfiei debaixo do edredon pra assistir. Friozinho bom, hein?! Já que não tem cobertor de orelha, botei meia no pé mesmo!