JOANA DE OVIEDO
VOLTASTE
Voltaste do mar,
Oh ruidoso vento!
Ouviste a voz da terra em desalento.
Sofreu e até chorou
Alguns versos tristes
Na folha de papel.
E assim soprou
E tudo se refez, ruidoso vento!
Até os cabelos dela, os fez em desalinho...
Voltaste!
Um brinde! Um vinho!
SOBREVOO
Sobre voo?
Sobrevoo
Sobre tempestades
E até sob o ades
Mas quem sabe sobre o mar ?
E nesse desentoo
Eu sei que há o ar
E também o fim
De qualquer voo
E que seja um jardim!
Sobrevoo!
TEU SILÊNCIO
Amo teu silencio de frutas frescas
Assim amo teus lábios roxos das vinhas.
As tuas mãos de luvas bordadas e finas
Amo-as tão pequenas, quase de menina!
Teu silêncio... Esse de paz sepulcral.
Teus lábios, um mel que me alucina
Tuas mãos de luvas bordadas e finas
Em minha pele tu as faz tão divinal!
E então, pobre de mim que sonhei
Pela vida a fora desenhei-te
Para sempre tê-las agora...
Mãos de fadas encantadas, tão pequenas!
Suaves, feito luvas finas, bordadas
Alvas... Ainda sinto o cheiro das açucenas!
Joana de Oviedo
SÍNDROME NARCÍSICA
Em um mundo onde ninguém é de ninguém, ela era só dela: vendia seu corpo a muitos, e depois de receber ia embora levando-se a sim mesma, perpetrando o delito de apropriação indébita.
Quando eram jovens e apaixonados,
contavam seus segredos um ao outro.
Mas quando envelheceram sem ter podido
fazerem-se felizes, viram seus segredos
degladiando-se diante dos seus olhos
e de seus cansaços.
Não sei bem explicar o que me atraia
para aquele ser tão insignificante,
Talvez nossa insanidade fossem irmãs gêmeas...
Suas histórias preferidas
eram as de quadrinhos infantis,
mas nessa altura da vida
Não se cabia em nenhuma delas.
COMPLEXO DE INFERIORIDADE
Nunca se sentiam suficientes um ao outro.
Mas não se abandonavam a si mesmos.
Talvez porque ninguém os desejasse.
O TEMPO
O tempo se molda na luz
E sob a luz.
Não há como verificar o tempo
No estado escuro para os olhos,
A não ser no dormir ou quando não conscientizamos
Da existência das coisas, pois
o tempo nada mais é que as coisas
Existentes naquele momento
E em outros momentos.
E as lembranças é algo que olhamos
Na repetição do tempo - nas coisas que se repetem
Porque nada é único.
Um bebê existiu com sua mãe e cresceu e sua mãe envelheceu
mas cresceram outras mulheres e nasceram outros bebês...
Então aprendemos a fazer o relógio inexorável das coisas
já existentes e que se repetem.
O tempo é o casulo e a borboleta;
ou a borboleta e o casulo.
Joana de Oviedo – Direitos reservados
Mãezinha
Eu tenho uma flor. E todas as noite olho para o céu no intuito de vê-la, e assim vejo uma brilhante estrela, e quando o dia amanhece, olho novamente para o céu e vejo uma branca nuvem, passando, passando... À noite ela se transformará em estrela novamente.
PORQUE TE AMO
Ama-se pelo cheiro das maçãs
Descobertas nas manhãs de outono
No gosto das mãos nos pomos...
Ama-se quando não há mais o que amar
Quando não há mais mar.
Ama-se pelas mãos dadas
Por uma esperança de voos de fadas.
__Amo-te sem mesmo ter um porquê.
Não pare...
Não pare a música da vida!
Se possível dance!
Deixe-a tocar assim:
displicentemente, fluente...
Deixe-a até o fim.
E se possível cante.
(Joana de Oviedo- Direitos reservados)
BIPOLARIDADE
A casa do artista é seu recôndito secreto, onde busca sua arte nos porões e também no alto da infinitude. É um subir, e um constante descer.
SENSATEZ
Não é sensato prender-te na alma,
Nem nos meus sonhos ou pensamentos,
Se não queres mais estar comigo,
Se não desejas mais estar em mim.
Tudo pertence ao infinito:
O amor e também a dor.
Mas se o amor vai embora
A dor chora, mas tem que ficar.
LEITURA DE MIM
Leia-me
na escadaria de um palácio...
Leia-me
na ladeira de uma palhoça,
ao entardecer, a qualquer hora!
Será a mesma coisa andar de salto
ou de sandálias;
porém é mais difícil descer.
Mas leia-me nas entrelinhas da minha vida.
Saiba-me ler, em qualquer lugar,
onde talvez eu nunca venha passar.
Mas leia-me!
O REAL E O ARTIFICIAL
Ninguém nunca me ofereceu
Uma flor de verdade.
Na minha imaturidade
Eu sei decifrar o que é real
E fenece com o vento,
Mas também o que é artificial
E se deteriora com o tempo.
O TEMPO E AS BORBOLETAS
A distância te leva de mim
O tempo da distância tem asas
Mas não como as borboletas
Que retornam após dormir em seus casulos:
Outras borboletas, irreconhecíveis!
A distância nunca será apenas um adormecer
nos casulos, é sonhar com outras asas
onde possam pousar juntas.