Jean de la Bruyere
Ser-se livre não é nada fazer, é ser-se o único árbitro daquilo que se faz ou daquilo que se não faz.
O ciúme nunca está isento de certa espécie de inveja, e frequentemente se confundem essas duas paixões.
O dever dos juízes é fazer justiça; a sua profissão, a de deferi-la. Alguns conhecem o próprio dever e exercem a profissão.
Não poder suportar todos os maus carácteres de que a sociedade está cheia não revela bom carácter: e isso é indispensável no comércio das peças de ouro e da moeda.
Quem afirma que não é feliz, poderia sê-lo com a felicidade do próximo, se a inveja lhe não tirasse esse último recurso.
Arrependemo-nos raramente de falar pouco, e muito frequentemente de falar demais: máxima usada e trivial, que todo o mundo sabe e que ninguém pratica.
O homem que diz não ter nascido feliz, podia ao menos vir a sê-lo mediante a felicidade dos amigos e parentes. A inveja priva-o deste ultimo recurso.
As coisas maiores só devem ser ditas com simplicidade; a ênfase estraga-as. As menores precisam de ser ditas com solenidade; elas só se sustentam pelo modo de expressão, pela atitude e pelo tom.
Entre todas as expressões diferentes que pode tomar cada um dos nossos pensamentos só há uma que seja boa.
Todo o espírito que existe no mundo é inútil para quem não o tem; ele não tem perspectivas sobre nada e é incapaz de aproveitar as dos outros.
O interior das famílias é muitas vezes perturbado por desconfianças, ciúmes e antipatias, e enganam-nos as aparências de satisfação, calma e cordialidade, fazendo-nos supor uma paz que não existe; poucas há que ganham em ser aprofundadas.
A polidez nem sempre inspira a bondade, a equidade, a complacência, a gratidão; mas, pelo menos, dá-lhes a aparência e faz aparecer o homem por fora como deveria ser por dentro.
O homem honrado nunca jura; contenta-se com dizer: isto é ou isto não é. O seu caráter jura por ele.
A demasiada atenção que se emprega em observar os defeitos dos outros, faz que se morra sem ter tido tempo de conhecer os próprios.